sábado, 29 de junho de 2019

Um perigoso circo ali, ao lado, no Médio Oriente


O perigo maior é que os estados decadentes, tendem a não aceitar essa decadência e provocam desastres, não optando preferencialmente pelo hara-kiri.

Índice

Apresentação dos palhaços
Um debicar errante, caótico
Golfo Pérsico - muitos agressores para um alvo
Onde estão as ameaças?

========== ##### ==========

Apresentação dos palhaços

Há mais de 2000 anos formou-se o primeiro triunvirato em Roma, com Júlio César, Pompeu (o Grande) e um tal Crasso que tinha como fixação conquistar o império parto acabando por morrer nessa guerra. Roma nunca conseguiu essa conquista, sendo o culto imperador Adriano a estabelecer a paz, muito mais tarde, depois de ter feito uma análise custo-benefício dessa contínua guerra. 

No decadente império americano de hoje também domina um triunvirato[1], de pechisbeque, com um outro Pompeu (grande e gordo), um Bolton que cumpre bem o papel de Crasso, pela insensatez que o fez estar na prateleira muitos anos e, deixando o pior para o fim, Trump está a anos-luz de ser um Júlio César. O perigo é que os estados decadentes, tendem a não aceitar essa decadência e provocam desastres, não optando preferencialmente pelo hara-kiri.


Um debicar errante, caótico

Nos altos e baixos da já crónica crise política no Golfo Pérsico, há vários campos em confronto, com menos ou mais moderação política, com vários níveis de integração e de contributos para essa crise. O Médio Oriente está agora na montra, depois das sanções à China e de uma tentativa de venda em saldo de um tal Guaidó, numa ação em que a uma ameaça qualquer se seguirá uma qualquer ameaça. Um percevejo, saltita sedento de sangue.

Os EUA constituem, apesar da sua distância geográfica e cultural face aos povos do Médio Oriente, a única presença[2] massiva, a peça mais relevante no xadrez político e, sobretudo militar, global, numa atuação frenética iniciada em 1990. 

Isso resulta em termos históricos da tara salvítica dos EUA quando se entenderam livres e acima das barafundas europeias do seculo XVIII que, no entanto, não compreendia qualquer respeito pelos nativos americanos, chacinados ou, pelos negros, escravizados. Daí resulta parcialmente o facto de os EUA de hoje continuarem a assumir um alegado direito de intervir nos problemas que existem ou vão surgindo na região do Golfo, como no Mar da China, preparando-se mesmo para colocar uma base militar num santuário da vida selvagem chamado Ilhas Galápagos, para prevenir que as iguanas possam prejudicar os interesses dos EUA e do “mundo livre”

Na sequência da II Guerra Mundial beneficiaram, numa fase inicial, do fim dos impérios coloniais europeus, do recuo estratégico das principais potências europeias, da implantação do modelo neoliberal, do desmembramento do Bloco de Leste, das tecnologias que desenvolveram a globalização dos mercados, mormente financeiros, bem como da tradicional subalternidade do “quintal” latino-americano, que hoje se vem reconstituindo. Como revezes, refira-se a derrota no Vietnam, como no resto da Indochina, a humilhação iraniana em 1979, o surgimento em força da China, como potência desafiante, a maior autonomia dos países asiáticos, o caos provocado pelas intervenções militares no Médio Oriente ou no Mediterrâneo, para além do retorno da Rússia, como potência também desafiante, para mais numa estreita relação estratégica com a China; e que para azar do messianismo dos EUA, veio coincidir com o descalabro do sistema financeiro, em 2008, baseado em pirâmides de Ponzi. 

Como símbolos adequados dessa decadência podem considerar-se G W Bush ou Trump - cujas riquezas materiais contrastam com a impreparação intelectual, como se tem visto recentemente, na sucessão de ameaças e sorrisos de Trump, face à Coreia do Norte, à China, à UE, à Venezuela, ao México... às iguanas, como se disse atrás… Essa procura de retoma de hegemonia, é frequentemente desastrada, cada vez mais difícil e, crescentemente contestada, baseando-se em certos vetores:

·        O controlo político da produção e distribuição de hidrocarbonetos no Médio Oriente e na Venezuela, cujas transações, maioritariamente em dólares, constituem uma forma de manutenção de uma elevada dívida externa por parte dos EUA e dar viabilidade à exportação de petróleo de xisto made in USA;

·        O Médio Oriente, mormente as monarquias árabes são, com os países da NATO, os grandes compradores da produção da indústria de armamento dos EUA; uma “boa” guerra ou uma mera ameaça de guerra, incentiva os sultões a encomendar armas[3];

·        A tentativa de afetar ou condicionar o abastecimento de hidrocarbonetos à China, à Índia e todo o Extremo Oriente ou, boicotar a importação de petróleo venezuelano, congelando capitais desse país ou boicotando o seu abastecimento de bens essenciais à sua população;

·        A impotência face à integração energética euroasiática, bem como face ao canal de integração comercial com o mesmo âmbito geográfico (e incluindo a África), conhecido como Rota da Seda. A queda dos regimes latino-americanos de “esquerda” surge como uma forma dos EUA compensarem dificuldades em outras geografias e, restabelecerem a sua ordem no “quintal”.

Golfo Pérsico - muitos agressores para um alvo

Voltando ao Médio Oriente, os EUA ostentam as suas dificuldades de afirmação estratégica, depois dos desaires do Afeganistão, do Iraque, da Síria, do impasse iemenita e de assistirem à Turquia – o segundo mais populoso membro da NATO – comprar armas à rival Rússia. Neste contexto e, açulados pela sua fortaleza sionista, em estado de pânico, os EUA intentam atacar o país mais populoso da região, o Irão – uma das três mais antigas e consolidadas entidades políticas do planeta, em conjunto com o Egipto e a China.

No cenário do Médio Oriente podem considerar-se vários conjuntos… mesmo quando têm um só elemento:

1.     A entidade sionista surge, neste contexto, como a fortaleza norte-americana, com uma iniciativa estratégica mediatizada e inserida na dos EUA, dos quais depende a sua existência política, financeira e militar. Tem, porém, uma influência suficiente (via Jared Kushner[4]) para levar a administração Trump a actos insanos – Jerusalém como capital sionista e anexação do território sírio dos Golan – com a aceitação tácita dos sultões árabes. 

Note-se que na Palestina ocupada pela entidade sionista vigora um regime racista em que os eventuais judeus (?) mantêm a ferro e fogo uma raça “inferior”, os palestinianos, numa prática semelhante ao apartheid sul-africano ou da Alemanha nazi.

Sublinhe-se ainda que a entidade sionista possui umas 200 bombas atómicas - inicialmente construídas com apoio francês - fora do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares. Este último, foi assinado pelo Irão há uns cinquenta anos, não tendo o país armas nucleares; e, mesmo a sua utilização para produção de energia é submetida ao controlo da Agência Internacional da Energia, após validação de potências nucleares como a Rússia, a Grã-Bretanha, a China, a França ou a Alemanha, após a retirada dos EUA desse acordo, por iniciativa de Trump, para justificar a sua actual deriva guerreira no Golfo.

2 – As monarquias árabes, lideradas pela Arábia Saudita do mediático Mohammed bin Salman (MbS), tendo falhado no uso do ISIS para mudar o regime na Síria e com pouca influência no Iraque, jogam em dois planos. Um, no Yémen para anular o poder das tribos do norte - os huti - zaiditas, próximos do xiismo; e, sobretudo, controlarem a margem oriental do estreito de Bab el-Mandeb[5], estratégica passagem de 20 km de largura que liga o Índico ao Mar Vermelho, ao norte do qual está o canal do Suez… com a Europa “à vista”. O outro objetivo de MbS é procurar abater o Irão, seu grande rival na região, para o qual terá de contar, forçosamente, com os EUA. Finalmente, refira-se que não há total unidade entre o conjunto de reis, emires e sultões, pois o monarca do Qatar é ostracizado pelos colegas, uma vez que tem uma velha ligação ao Irão e, para mais tendo a Turquia como aliado, sente-se ao abrigo de intervenções musculadas do MbS e seus confrades.



                    Salvador Dali – El Jinete de la Muerte

3 – O Irão é um “problema” que os EUA tentam resolver desde a queda do xá, em 1979, quando o país deixou de ser um vassalo americano. O apoio dos EUA ao repressivo regime monárquico conduziu à ocupação da embaixada americana, por estudantes que fizeram reféns os seus funcionários, num processo que só terminou em 1981. A desastrada tentativa militar de resgate (poucos anos após a derrota no Vietnam) acentuou nos EUA um sentimento de humilhação que promoveu a vitória de Reagan nas presidenciais daquele mesmo ano. A chegada de Reagan constituiu um pilar essencial para o reforço do neoliberalismo, já em aplicação na Grã-Bretanha pela baronesa Thatcher; Reagan foi um género de anjo anunciador dos trastes que se lhe seguiram, George W Bush e Trump.


Imagem pintada no muro da antiga embaixada dos EUA em Teerão
      
       Os EUA, encomendaram a Saddam Hussein uma guerra contra o Irão em que aquele se apoderaria do petrolífero Kuzistan como recompensa, caso conseguisse derrubar o regime iraniano. Essa guerra provocou um milhão de mortos, consolidou o regime mas fragilizou o Iraque, levando  Saddam a invadir o rico Kuwait para fazer face às dívidas contraídas com a guerra; e, fez isso, sem curar de obter o aval da suserania americana, sem contar que os EUA são o tutor das monarquias petrolíferas do Golfo, sucessor dos britânicos que as inventaram, depois da descoberta de petróleo sob as areias do deserto. 

       Seguiram-se duas intervenções ocidentais no Iraque, comandadas pelos EUA e de onde resultou a queda e posterior execução de Saddam, novos sofrimentos para o povo iraquiano e a transição de antigos militares para o Daesh/ISIS, cuja missão seria a criação de um califado (!) juntando territórios curdos, sírios e iraquianos. Para os EUA o importante nessa conjuntura era a venda de armas (pagas por qataris e sauditas) para a queda de Assad, o que, a acontecer, fragilizaria, na sequência, o Líbano, dando ao regime sionista uma fronteira tranquila a norte e causando alegria às monarquias sunitas por verem alauitas sírios e xiitas libaneses em desgraça e com o Irão em maior isolamento.

       Como se observa, há hoje um eixo xiita (e afins) que vai do Irão ao Mediterrâneo, onde os EUA e os seus cadetes europeus perderam posições, incluindo nessas perdas, as boas graças da Turquia, parceiro na NATO.

Ainda no que respeita ao Irão, este país tem o estatuto de observador junto da OCX – Organização de Cooperação de Xangai e relações próximas com os seus membros, mormente Rússia e China (nos hotéis de Teerão é visível a forte presença de quadros chineses) mas também com a Índia e o Paquistão. Ao que se sabe, o recuo de Trump (pressionado por Pompeo e Bolton) 15 minutos antes de um ataque ao Irão - na sequência do abate do drone americano (20/6) - não se ficou a dever a um impulso humanitário de Trump, perante a perspetiva do mesmo resultarem 150 mortos; a causa estará numa comunicação russa de que estariam ao lado do Irão face a qualquer agressão.

4 – A Turquia, país da NATO com uma posição estratégica ímpar, com influência na Europa, nos mares Negro, Egeu e Mediterrâneo, no Próximo Oriente e na Ásia Central tem-se distanciado dos EUA e mesmo ameaçado as monarquias árabes em caso de intervenção no Qatar. Por outro lado, a Turquia, a despeito da sua posição de sempre, contra as autonomias curdas, vem atuando no norte da Síria com a mediação da Rússia que tem na Turquia – país da NATO – um comprador de armamento; e tem uma relação amistosa com o Irão, ao contrário dos países árabes que estiveram incluídos no Império Otomano durante quatro séculos.

5 - Os EUA constituem o único caso, entre os presentes na área do Golfo que desempenha um papel global e que, a despeito das suas próprias e crescentes fraquezas, em termos comparativos com outras potências, se arroga ao direito de ameaçar, intervir, emitir recados e opiniões, inclusivamente nas questões internas de outros países, como se viu recentemente na Grã-Bretanha onde Trump anunciou, sem qualquer detalhe, um plano gigantesco de apoio ao país, uma vez concretizado o Brexit… como brinde de desempenho.

Para um retrato simplificado da decadência dos EUA, vejam-se as dinâmicas recentes:


2017
2000
2017
2000

Grandes Exportadores (% do total mundial)
Grandes Importadores (% do total mundial)
Alemanha, Espanha, França, Holanda e Itália
19,0
21.9
24.3
29.6
China
15,0
  5.7
9.5
  3.0
EUA
  7.7
12,0
13.0
19.0
Deficit/Excedente externo
China
EUA
     Milhões $
896500
391400
- 863900
- 434000
                              ver: Comércio internacional – quem ganha e quem perde

A isso soma-se a regular emissão de sanções e ameaças contra o Canadá, o México, a UE, a China, a Venezuela, a Coreia do Norte, o Irão, para além do já crónico caso de Cuba e de outros de que… já ninguém se lembra; para além da procura de semear bases militares um pouco por todo o lado, sendo o último dos casos, o das ilhas Galápagos - um santuário de vida selvagem - e que terá já obtido o acordo do mordomo-mor do quintal equatoriano, um tal Lenin Moreno. 


Salvador Dali – O Grande Masturbador

Onde estão as ameaças?

Vamos proceder à apresentação de alguns indicadores sobre os países que protagonizam a crise do Golfo para que se possa aquilatar a diferença de forças em presença. Uns, serão indicadores económicos e outros de conteúdo eminentemente militar; e inserimos dados sobre Portugal para efeitos de comparação.

Indicadores económicos
Irão

Emiratos
Oman
Kuwait
A. Saudita
Israel
Qatar
Bahrein
EUA

Portugal
População (milhões )
83.0

9.7
3.5
2.9
33.1
8.4
2.4
1.4
329.3

10,4
                                                                     PIB per capita ($ )                                   2017  Banco Mundial
 5470

39441
20224
41423
20747
42056
69554
25309
59172

21087
Dívida externa (% PIB)
1,8

62,1
65,4
39,3
29,9
25,1
100,5
147,2
91,9

204,7
Divida externa per capita ($)
96

24495
13220
16290
6196
10555
69917
37250
54388

43173
Dívida externa/Reservas de ouro e divisas
0,1

2,5
2,9
1,4
0,4
0,8
11,2
22,2
145,3

17,2
Gasto militar per capita ($)
76

1482,0
1918,6
1793,1
2114,8
2333,3
804,2
521,4
2174,3

365,4
                                                         Fonte: https://www.globalfirepower.com/countries-listing.asp

Em termos demográficos, o Irão supera largamente a população dos seus antagonistas da outra margem do Golfo, incluindo a da entidade sionista, onde se incluem vários milhões de “árabes israelitas” ou falachas etíopes, cidadãos de segunda categoria, segregados, porque os sionistas são eminentes racistas e temem os efeitos das ligações daqueles com os seus concidadãos que vivem fora das fronteiras guardadas pelos sionistas. Nas monarquias do Golfo encontram-se milhões de imigrantes, vindos de África ou da Ásia (com relevo para as Filipinas) remetidos aos seus espaços e com a negação de reagrupamento familiar. Nas crispações que se revelam regularmente nesta região, os EUA são o grande desequilibrador, tendo em conta o seu poder militar e económico. Não incluímos no quadro acima dados sobre a Jordânia porque é apenas uma monarquia débil, mais uma criação britânica do final da I Guerra, com forte população palestiniana e dependente do financiamento exterior, vindo das petromonarquias vizinhas.

O PIB per capita do Irão é sensivelmente mais baixo do que o dos restantes antagonistas que, em regra, têm um indicador superior ao europeu Portugal, como também acontece com os EUA. Os níveis de desigualdades são enormes dentro de cada país. No entanto, quem conhecer o Irão saberá que Teerão tem 12 milhões de pessoas, que recebe diariamente 4 milhões de trabalhadores que vivem fora, tem um trânsito intenso, um elevado grau de autossuficiência e as pessoas apresentam-se com um aspeto digno, não se observando os magotes de pedintes que se conhecem em outras paragens do mundo islâmico. Porém, o regime, decidiu construir um espaço luxuoso, faraónico, para conter o corpo do… fundador Khomeini.

Ao contrário do Irão que é uma das três mais antigas entidades políticas do planeta – a par com a China e o Egipto - entre as monarquias árabes, abundam entidades de criação recente, antigas possessões e protetorados britânicos que a descoberta de petróleo elevou, para muito além de chefes tribais, de comerciantes, de criadores de cavalos e camelos e que os diversos impérios que se sucederam no Médio Oriente nunca cobiçaram. A família Saud por exemplo, teve de esperar até aos anos 30 para, com a ajuda ocidental, constituir um reino, abandonando então a tradicional prática de assalto a caravanas. O Qatar foi um território persa durante séculos, o Bahrein vivia da apanha de ostras e o Oman é o único caso com presença na História porque constituiu uma potência marítima no Índico ocidental, durante alguns séculos, criando, por exemplo, Zanzibar.

Tendo em conta que Portugal está no pódio europeu da dívida, todos os indicadores de capitação de capitação apresentam-se como desprezíveis, excepto no Bahrein que já não tem reservas petrolíferas. É notória a irrelevância da dívida externa iraniana no contexto do PIB, o que tem consequências na capitação, apresentando-se como verdadeiros campeões nesse indicador, o Qatar e os EUA.

A comparação das reservas em ouro e divisas com a dívida externa evidencia grandes desigualdades. A dívida externa dos EUA corresponde a 145.3 vezes o valor das reservas monetárias do país o que, associado ao seu gigantesco deficit comercial, só é admissível por razões de ordem política, ancoradas na sua supremacia militar disseminada pelo planeta evitando, com toda a artificialidade, que se considere o dólar como algo sem qualquer préstimo. Entre os restantes países considerados, todos com indicadores substancialmente mais baixos do que os EUA, sobressaem o Bahrein e Portugal - pelas piores razões em termos de solvabilidade - e o Irão bem como a Arábia Saudita, por razões diametralmente opostas.

Finalmente e antes de se abordarem os indicadores de cariz militar, são visíveis os enormes gastos dos países do Golfo, sendo comparativamente mais modestos nos casos do Bahrein e do Qatar; os quais se mostram claramente superiores aos (já exagerados) gastos militares portugueses. Os gastos militares por habitante são particularmente elevados nos EUA e na Arábia Saudita, superados apenas pela fortaleza sionista; e, em contrapartida, são comparativamente muito mais baixos no Irão. Levanta-se a questão dos gastos militares portugueses que, tendo em conta o enquadramento geográfico, se mostram muito elevados, como aliás referimos, anos atrás e somente justificados pela pertença à NATO, como escoadouro de armamento made in USA, como determinante do envio de tropas para locais onde Portugal não tem qualquer interesse estratégico ou comercial e ainda, porque “é preciso” manter um número demasiado elevado de generais sentados”. Neste contexto leviano de gastos militares, a compreensão da realidade no Golfo será mais nítida se se souber que o orçamento militar da Arábia Saudita é 23 vezes superior ao português.

Indicadores militares
Irão

Emiratos
Oman
Kuwait
A. Saudita
Israel
Qatar
Bahrein
EUA

Portugal
Militares no ativo por 1000 habitantes
6

6,6
12,1
5,3
6,9
20,2
5,0
5,9
3,9

2,9
Força aérea (nº)
509

541
175
85
848
595
100
107
13398

87
Tanques de combate (nº)
1634

510
117
567
1062
2760
95
180
6287

186
Veículos armados (nº)
2345

5936
735
715
11100
6541
465
850
39223

700
Lançadores de rockets (nº)
1900

72
12
27
122
150
17
17
1056

0
Navios de guerra (nº)
398

75
16
38
55
65
80
39
415

41
                                           Fonte:    https://www.globalfirepower.com/countries-listing.asp

Quanto aos efetivos militares por cada mil habitantes, há um destaque evidente para a entidade sionista, cerca de cinco vezes a dos EUA que se pretende com capacidade de intervenção em todo o globo. Nos outros países da região, os indicadores têm valores próximos, excluindo o caso do Oman. 

Quanto a Portugal, o indicador deveria ser mais baixo, ainda que seja compreensivelmente inferior aos registados para a região do Golfo. Em Espanha, há uns anos, havia um oficial general por cada 186 militares; em Portugal o número reduz-se a 131.

No capítulo da força aérea, sem entrarmos em detalhes quanto à sua composição e modernidade e, para além do caso especial dos EUA, sobressai a Arábia Saudita, surgindo num segundo plano a entidade sionista, os Emiratos e o Irão. O Kuwait, a despeito da exiguidade da sua população e do seu território apresenta uma força aérea quantitativamente semelhante à portuguesa.

Como potência global, os EUA apoiam-se sobretudo na força aérea e menos em tanques de combate, necessários em casos de combates convencionais, em terra. Como as guerras tendem, hoje, a ser muito assimétricas, a utilização de tanques contra forças de guerrilheiros ou em cenários urbanos não é a mais adequada. Neste tipo de arma, sobressai o seu número entre os sionistas, temerosos de ataques convencionais ou, para eventuais penetrações profundas em terreno dos países limítrofes. Quer o Irão ou a Arábia Saudita têm territórios vastos para poderem circular com tanques. Mais estranho é o número destas máquinas de guerra em territórios tão exíguos como os do Kuwait (quiçá ainda temeroso de uma nova invasão iraquiana…) do Qatar ou do Bahrein. Este último é um pequeno estado insular (780 km2 repartidos por 35 ilhas) e tem um número de veículos semelhante ao de Portugal, muito maior e com uma longa fronteira terrestre. Os sultões são muito criteriosos; saberão certamente utilizar uma tal frota de tanques num tão pequeno território insular …

Quanto aos veículos armados, mais ligeiros do que os tanques, é também curioso o seu número entre os sauditas (pouco menos que 1/3 dos norte-americanos) mas com uma população quase quarenta vezes inferior; outro indicador espantoso é o da fortaleza sionista, com um veículo armado por cada dois quilómetros quadrados,,, e que não poderão ser todos usados em simultâneo para não gerarem… engarrafamentos. Uma vez mais, observam-se as assimetrias nas dotações destes veículos, com números próximos para territórios tão desiguais, nos casos do Kuwait, ou do insular Bahrein, quando a comparação é feita com Portugal.

Quanto a lançadores de rockets – uma arma com grande mobilidade, usada por exemplo, em Gaza contra alvos sionistas - o Irão está mais bem munido do que os próprios EUA que, naturalmente, não esperam ser atacados numa guerra convencional. E isso justifica que se diga que "o sistema de defesa aéreo iraniano é extremamente poderoso" e que os Estados Unidos iriam enfrentar "um inimigo que, apesar de ser militarmente mais fraco (...), tem uma capacidade de retaliação e de causar dano tremenda" (afirmações de Carlos Branco major-general na reserva). Para além do encerramento do estreito de Ormuz[6], em caso de guerra, com implicações incalculáveis na economia global.

Note-se que os outros países da área do Golfo têm, comparativamente, poucos lançadores de rockets pela simples razão que não esperam ser atacados. Nessa lógica percebe-se a razão para Portugal não ter lançadores de rockets. 


Quanto à dimensão das marinhas de guerra – todos os países considerados são ribeirinhos – a maior é a marinha iraniana ainda que a Arábia Saudita e Oman detenham também litorais extensos. Em termos de unidades a marinha iraniana tem uma dimensão próxima da dos EUA mas os respetivos perfis são muito distintos; num caso trata-se de uma frota de vigilância de costa e no outro uma armada poderosa, presente em todos os oceanos. Assim, por exemplo, os EUA têm 24 porta-aviões e, entre os restantes países do Próximo e Médio Oriente somente o Egipto tem esse tipo de navio e, apenas 2 unidades.

Que solução para o Médio Oriente? Algumas ideias gerais:

  • Todas as mediações em conflitos deverão passar pela ONU
  • Afastamento de bases militares estrangeiras e de qualquer outro tipo de intervenção militar, na região
  • Canalização das reservas monetárias e das riquezas detidas pelas oligarquias para vastos planos geradores de bem-estar das populações
  • Redução substancial dos meios militares existentes, mormente com a renúncia à posse de armas nucleares
  • Efetivação de um estado palestiniano, democrático e multiconfessional, no seguimento da extinção do regime de apartheid montado pelos sionistas
Este e outros textos em:
http://grazia-tanta.blogspot.com/                             

http://www.slideshare.net/durgarrai/documents



[1] Como triúnviro suplente apostamos no secretário interino da Defesa, um tal Mark Esper, um espírito brilhante que anunciou deverem os países preparar-se contra ataques de mísseis russos. Esper espera que todos escavem um abrigo no quintal.
[2]  A Rússia, desde há poucos anos mantém duas bases militares no norte da Síria (Tartus e Latakia), com uma capacidade de intervenção militar muito limitada no âmbito da região conhecida por Próximo e Médio Oriente.
[3]  Muito recentemente os EUA venderam $ 8000 M (mais do dobro do orçamento português de defesa) de armamento aos sultões do Golfo, mesmo sem o aval do Congresso. O businessman Trump não se prende a… burocracias… Por outro lado, a Turquia ao pretender comprar armamento à Rússia incorre em represálias e ameaças por parte dos EUA; e o mesmo Trump vem ameaçando a Índia com sanções, pela sua compra de $ 5000 M em mísseis S-400 à Rússia, revelando assim a sua função de vendedor ao serviço do complexo militar-industrial americano.
[4]  Kushner, com o seu irmão ideológico Netanyahou desenharam um plano de criação de um estado palestiniano que na realidade é uma mudança de nome para o bantustão actual mas onde se prevê a construção de pesadas infraestruturas para alegria de empresas de topo na área do betão. O plano é tão irreal no seu facciosismo que dá vontade de rir…

[5] Do outro lado do Bab el Mandeb, no Djibouti, estão instaladas bases militares dos EUA, da China, do Japão e da França onde se acolhem como hóspedes, militares alemães e espanhóis: num terreno onde se verifica a maior densidade de bases militares do mundo, confraterniza-se.
[6] Pelo estreito de Ormuz, passa 76% do petróleo destinado à China, ao Japão, à Coreia do Sul e à Índia, bem como 25% do comércio global de gás liquefeito

Sem comentários:

Enviar um comentário