Portugal,
desastre periférico[1]
e pasto de ladrões (1995- …)
O país mais pobre da
Europa ocidental é dominado por capitais externos, vai pulando entre bolhas
imobiliárias e alimenta uma classe política constituída por corruptos e aves
canoras.
O que sobra é um
território desertificado, atravessado pelas redes das multinacionais e onde o
sistema financeiro montou uma renda ancorada em dívida.
Sumário
1 – Tempos de muita
tempestade e pouca bonança
2
-
A marcha das desigualdades no período 1995 – 2017
3
–
Um empobrecimento quase contínuo no plano europeu
: : : : : : : : : : :
: : ///\\\ : : : : : : : : : : : : :
1
– Tempos de muita tempestade e pouca bonança
Depois
do chamado Buzinão da Ponte[2],
Cavaco enceta, em 1995, a sua falhada caminhada para aceder à presidência da
República contra Jorge Sampaio e, entretanto deixa o seu PSD para um baço e
frágil – Fernando Nogueira[3].
O PS, dirigido por Guterres, ganha as eleições desse ano, assegurando a sós, a
posse do governo e essa reminiscência monárquica chamada presidência
da República.
Cavaco
tinha pensado reduzir a dívida pública através das receitas das privatizações e
que não conseguiu e os deficits[4]
continuaram, como norma dos governos seguintes, até hoje, a despeito da
intervenção saneadora (?) da troika, de mais uma rodada de privatizações e de
apoios financeiros externos. No final do período cavaquista (1995), o PIB
apresenta um crescimento nominal de 4.7 vezes e a dívida pública aumenta 5.9
vezes, com um concomitante aumento do peso desta no total do PIB. Em 1995, a
dívida pública correspondia a 58.3% do PIB, muito próximo, portanto do máximo
de 60% que viria a ser imposto pelo Pacto de Estabilidade e Convergência (PEC),
de 1997, para a entrada na moeda única da UE.
Essas
privatizações não sanaram as contas públicas nem criaram grupos económicos,
sobretudo porque os antigos donos, mesmo nos casos em que se reapoderaram das
empresas nacionalizadas em 1975, logo trataram de as vender a capitais
estrangeiros ou a mudar radicalmente de negócio. É paradigmático o caso do
grupo Melo cujo patriarca, o grande “capitão da indústria”, preferiu à banca e
à indústria, as rendas das portagens ou a área da saúde, beneficiando de um
mercado (?) com rentabilidade assegurada pelo orçamento; uma versão atualizada
de protecionismo e de dependência dos favores do Estado, vigentes no tempo do
fascismo.
O
governo Guterres herda a crise de 1993/95 mas, já na sua fase descendente.
Aponta como prioridades, a sua paixão pela educação[5], a
imitação do “tigre celta” (Irlanda), a sociedade da informação e a preparação
para o euro, sobretudo esta, que obriga à redução dos deficits para os valores
mais baixos depois do 25 de Abril, o mesmo acontecendo com a dívida pública que
passa de 58.3% do PIB em 1995 para 50.3% em 2000; voltando a crescer
acentuadamente a partir daí. As elevadas receitas das privatizações e alguma
criatividade contabilística[6]
na construção do deficit permitem esses resultados.
A
subida do petróleo em 1999 e a crise dos dotcom,
com o rebentamento da volúpia tecnológica nos EUA, são dificuldades que
coincidem com a entrada no euro. A partir daí assiste-se à escalada do deficit
e da dívida, enquanto os bancos lusos, esgotada a poupança interna, se
endividam perante os grandes bancos europeus, para alimentarem a bolha
imobiliária e a correspondente corrupção, na construção do Parque das Nações,
na Expo-98 e a demente deriva de crédito para consumo.
O
euro surge em 1999 em transferências e cheques, depois de já funcionar como
unidade monetária escritural e, em 2002 inicia o seu curso como moeda corrente,
no seguimento do PEC - Pacto de Estabilidade e Crescimento) que estabelece
aumentos de 3% para o PIB e uma dívida pública inferior a 60% do PIB, que o
“bom aluno” português procurou cumprir. Como é evidente, numa área económica
integrada, uma moeda única[7]
tem vantagens como se vem observando e observará a partir da Grã-Bretanha, se
se concretizar o Brexit (e nas condições em que isso ocorra); esperando Trump
que as coisas corram mal para que a Grã-Bretanha se torne a sua testa de ponte
na Europa.
Em
2002, após o descalabro nas eleições autárquicas, Guterres demite-se de
primeiro-ministro e de chefe do PS, sucedendo-lhe Durão Barroso, num governo
PSD/CDS que consegue agravar muitos indicadores em 2003 (decréscimo do PIB,
aumento do desemprego, consumo privado ou público a decair, bem como a FBCF).
Refira-se, por curiosidade, que o valor real do PIB em 2012/14 se viria a
situar abaixo do valor de 2003, por ação da troika
e do sinistro duo Passos/Portas, apostados em …“ir além da troika”. Durão brilhou no papel de estalajadeiro na cimeira das Lajes,
onde Bush (filho), Blair e Aznar decidiram avançar para a segunda guerra no
Iraque, em 2003. Com os méritos de bom estalajadeiro e mau primeiro-ministro,
aproveitou o convite para presidente da Comissão Europeia, cargo que exerceu
durante dez anos, sem brilho e, monitorizado por Blair, enquanto este facínora
esteve em cena; seguiu depois para lobista da Goldman Sachs junto das
instituições europeias.
Durão,
foi substituído como primeiro-ministro por um entertainer da noite lisboeta, Santana Lopes. Porém, o presidente
Sampaio não confiava em Lopes, nem no chefe do PS – Ferro Rodrigues - que,
agastado, se demitiu, permitindo a “invenção” de José Sócrates como elemento
credível e com perfil para primeiro-ministro; bastaria em seguida, promover
eleições (2005) e que estas fossem ganhas pelo PS, como aconteceu.
O
deficit passa de 6.1% em 2004 para 2.9% em 2008 para se alçar a cerca de 8% do
PIB em 2009/10; a intervenção da troika
provoca uma redução para 4% logo em 2011 e, nos três anos seguintes, não consegue
melhorar esse resultado. Por seu turno, o PIB real cresce no período 2005/8 e
não mais voltou a atingir o valor de 2008; seja com Sócrates, com Passos,
dentro ou fora do programa da troika
ou, com Costa e a sua geringonça. Por sua vez, a dívida que era de € 101758 M
em 2005, chega aos € 118463 M (2008) e já vai em € 174891 M no final do
primeiro ano da intervenção da troika
(2011). . . e vem-se fixando em torno de € 245000 M nos últimos meses, até
julho do ano em curso.
Como
se sabe não há almoços grátis. Assim, o aumento do IVA em 2005 foi de € 1330 M…
sensivelmente € 133 a mais por habitante, para o qual terá contribuído o
aumento da taxa normal do imposto de 19 para 21%. Até 2007 o aumento da receita
desse imposto situa-se em € 700/800 M, estabilizando depois em torno dos €13000
M até 2013 (com uma grande quebra em 2009) e isso, apesar de uma nova subida da
taxa normal para os atuais 23%, a partir de janeiro de 2011. Neste caso,
sabe-se bastante quem tem vindo a pagar os almoços e quem tem sempre muito IVA
no prato…
Na
sequência do da crise dos subprimes
(finais de 2007 nos EUA), o sistema financeiro global entra em grandes
dificuldades que conduzem a nacionalizações e reestruturações; e daí que tenha
acabado o crédito obtido com facilidade no exterior pelos bancos portugueses e
cedido, em seguida, a empresas, ao Estado e a famílias para sustentar a gestão
da dívida já assumida e, sobretudo contrair nova dívida.
Assim,
aumenta a carga fiscal, como enunciado acima, o governo Sócrates apressa-se a
nacionalizar o BPN[8],
a instituição que aglutinava o grupo dos fiéis de Cavaco, quase todos, vulgares
e impunes vigaristas. Sócrates avançou com o cancelamento de projetos de
investimento – novo aeroporto, plataformas logísticas… mas não nas prodigiosas
parcerias público-privadas. O governo aumentou a idade da reforma, observou-se
um decréscimo de 18% das exportações em 2009, os PIN – Projetos de Interesse
Nacional incluem desastres como os da La Seda ou Pescanova e “não é difícil que
se vá manter a recessão bem para além de 2013, data a partir da qual o PEC 4
(Programa de Estabilidade e Crescimento 2011-2014) - é estritamente omisso”
como referimos na ocasião.
A
sensibilidade social no partido-estado, já expressa no PEC, é confirmada após a
transição no governo, do PS para o PSD, nos valores do RSI (milhões de euros).
Isto é, com a austeridade a todo o vapor, o crescimento do desemprego e a perda
de rendimentos reais, os dados do RSI parecem indicar uma … redução da pobreza!
Passos e Portas no seu melhor…
Milhões de euros
2008
|
425.7
|
2012
|
387.9
|
2009
|
507.7
|
2013
|
315.1
|
2010
|
519.9
|
2014
|
294.4
|
2011
|
414.4
|
|
|
Em
todo o período, do cavaquismo até hoje, o regime cleptocrático e o seu
partido-estado PS/PSD, bem como a filial CDS, têm utilizado a Segurança Social
como fonte de financiamento do empresariato, através de uma atitude laxista
face ao não pagamento pelas empresas das contribuições; quando não se
assenhoreiam da parte diretamente paga pelos trabalhadores no que configura o
crime de abuso de confiança, uma forma suave de designar roubo.
Este
roubo, como se observa, tem décadas, agravando-se particularmente a partir de
2003 (ano em que Manuela Ferreira Leite celebrou uma operação de titularização
com o Citygroup, no âmbito do qual este comprou dívida) até atingir mais de 5%
do PIB há dois anos, a despeito dos programas de recuperação de dívida – que
são sempre a “última oportunidade” … até à próxima (Centeno avançou com a
última em 2016). Como a parcela a cobrar desta dívida acumulada é muito baixa,
trata-se de uma transição de capital destinado ao pagamento de reformas dos
trabalhadores para o financiamento de empresas que, assim conseguem fundos sem
recorrer à banca. E, para terminar, sublinha-se que este assunto nunca é
colocado na corporativa Concertação Social pelos putativos representantes (?)
dos trabalhadores, nem pelos chamados “partidos de esquerda” que revelam assim,
a sua aceitação deste roubo[9].
Gráfico
1
Em
2010 era claro que havia fortes razões para Portugal se tornar uma decadente
periferia, num processo continuado de empobrecimento. Dissemos então:
“As fraquezas da burguesia portuguesa revelam-se,
historicamente,
- no seu carácter bizarro de potência colonizadora intermediária, sem capacidade de gerar um modelo de desenvolvimento industrial com as riquezas e o trabalho dos colonizados;
- na geminação com o Estado, durante a monarquia, a primeira república, como no tempo do fascismo, ou da república cleptocrática em vigor;
- numa estrutura económica desajustada da inserção europeia.”
A
evolução posterior permitiu que se tivessem adicionado outros aspectos[10]
a essa debilidade política e económica:
§ A intervenção da troika,
efetivou-se em Portugal, Grécia, Chipre e Irlanda mas, não em Espanha e Itália;
o que é revelador das desigualdades políticas na UE e de que as suas
instituições são marcadamente oligárquicas (Comissão, BCE, Eurogrupo) ou
cosméticas (Parlamento Europeu). E que não acrescentam democracia às estruturas
políticas nacionais, antes pelo contrário, incentivam, suportam e condicionam as
classes políticas nacionais no seu tradicional papel de garantir a boa ordem do
capital;
§ A nova onda de privatizações impostas pela troika - bem como as conhecidas burlas
financeiras (BPN, BES, BPP, Montepio, Banif) - afastaram os capitais indígenas
do setor financeiro, das telecomunicações, da energia, da área aeroportuária;
ao contrário da Espanha que nunca se desfez dos seus grupos económicos e
financeiros, que reorganizou o seu sistema bancário e aproveitou a debilidade
portuguesa para se inserir mais no seu periférico vizinho, a ocidente;
§ Num contexto capitalista, seria relevante perante uma
entrada recente na CEE, com as maiores facilidades de movimentação de capitais,
a existência em Portugal desses grupos, com uma dimensão internacional. Como aqueles
têm pouco significado e diversificação, pode dizer-se que o país é um mero
território atravessado pelas redes das transnacionais e de onde os capitais saem
em grande volume; e, na entrada, destinam-se ao imobiliário, com
relevo para o refúgio de capitais mafiosos, sob a forma de “vistos gold”[11]
ou para o refinanciamento da enorme dívida pública;
§ A chamada esquerda, numa primeira fase, em 2011, entusiasmada
com o protesto de 12 de março - inconsistente e animado pela direita para
enfraquecer Sócrates - acaba por contribuir para a queda do governo, chumbando
o PEC IV; e nas eleições que se seguiram o BE teve uma enorme derrota (metade
dos votos de dois anos antes). Posteriormente, em 2013, a mesma ala esquerda do
regime, tudo fez para jugular toda e qualquer contestação popular, mormente
através de um diretório denominado “Que Se Lixe a Troika”, controlado pelo BE/PCP.
§ Durante esse período, a ala menos à direita do
partido-estado – o PS - esperava pacientemente que amainasse a borrasca
económica e financeira gerida pelo binómio Passos/Portas, colocando na
liderança uma figura de transição – Seguro; na aproximação das eleições de 2015,
Seguro foi dispensado para a entrada do manhoso António Costa;
§ No dia 4 de abril de 2011, às 10.30 da manhã, Carlos
Costa, o governador do Banco de Portugal numa reunião com os banqueiros
aconselha “Vocês não podem continuar a
financiar (as emissões de dívida portuguesa). O risco é afundarem-se os bancos,
a parte sã, e a República que é a parte que criou o problema”[12].
Dois dias depois, Sócrates pediu a ajuda financeira, onde se incluíram € 12000
M para ajudar a “parte sã”… a banca. E, três anos depois, o majestático BES
caía com estrondo enquanto o mesmo Carlos Costa, a gaguejar, viria a apresentar
a fórmula “fundo de resolução”, concebida no BCE.
2 - A marcha das desigualdades no período 1995 – 2017
O
último lustro do século XX, no rescaldo do cavaquismo e após a crise de 1993/95
é um período de euforia, com a aproximação da integração no euro e, mais
mediaticamente marcada com a abertura da ponte Vasco da Gama[13],
para além da operação imobiliária do Parque das Nações, da Expo-98 e dos € 445
M gastos nos dez estádios para o campeonato europeu de futebol, em 2004, alguns
dos quais, quase sem utilização, posteriormente.
A
observação do gráfico 2 revela uma grande proximidade entre a evolução dos
rendimentos do trabalho e a do PIB que só se deteriora a partir de 2011 quando
Passos, como funcionário da troika
aplica com zelo as ordens recebidas. A relação entre os rendimentos do trabalho
e os das empresas e da propriedade estabiliza numa proporção muito próxima de
2:1 no período 1997/2011, regredindo depois para 1,8:1 até 2015 e melhorando depois,
atingindo 1,92:1 em 2017.
A
quebra dos rendimentos das empresas e da propriedade na sequência da crise
financeira é evidente em 2008/11, aumentando regularmente a partir daí. Para os
rendimentos do trabalho, a quebra só se regista em 2011, atingindo no ano
seguinte o ponto mais baixo, acompanhando a marcha do PIB posteriormente. Neste
último caso o valor agregado em 2012 (€ 75275 M) iguala o observado em 2005 (€
75699 M), refletindo um período de estagnação ou perdas; e só em 2017 apresenta
o máximo de toda a série, com € 85725 M, revelando a recuperação nos últimos
anos. No caso dos rendimentos do capital mantêm-se estáveis em torno dos €
42000 M em 2008/14 aumentando ligeiramente nos anos posteriores.
Gráfico 2
Fonte primária: Banco de
Portugal
Se
tomarmos como base o ano de 1977 (gráfico 3) – no qual a relação entre os
rendimentos do trabalho e os do capital atinge um máximo 3,58:1 – o afastamento
da evolução dos primeiros, face à dos proventos do capital ou à marcha do PIB é
marcadamente negativo para a massa dos trabalhadores. É a fotografia a cores do
caráter empobrecedor do regime pós-fascista; e mostra até que ponto a própria
acumulação de capital encontra dificuldades, perante a estagnação da atividade
económica, revelada pelo inevitável PIB.
Gráfico 3
Fonte primária: Banco de
Portugal
Voltando
ao período 1995/2017, a observação da tabela 2 permite a avaliação em detalhe
de alguns indicadores estruturais para o período 1995/2017 e a formulação de
algumas conclusões.
Tabela 2
|
1995
|
1996
|
1997
|
1998
|
1999
|
2000
|
2001
|
2002
|
2003
|
2004
|
2005
|
2006
|
2007
|
Remun. trabalho
|
9,0
|
7,3
|
8,5
|
9,4
|
7,3
|
8,3
|
5,9
|
4,5
|
2,6
|
3,0
|
4,6
|
2,8
|
4,3
|
Rend. capital
|
8,5
|
2,1
|
0,8
|
7,3
|
6,4
|
2,8
|
2,4
|
6,1
|
4,9
|
6,6
|
5,7
|
4,1
|
5,5
|
Pib
|
8,1
|
6,0
|
8,5
|
8,8
|
7,4
|
7,4
|
5,7
|
5,0
|
2,5
|
4,3
|
4,1
|
4,8
|
5,5
|
Inflação
|
4,2
|
3,1
|
2,3
|
2,6
|
2,3
|
2,9
|
4,4
|
3,6
|
3,2
|
2,4
|
2,3
|
3,1
|
2,5
|
|
2008
|
2009
|
2010
|
2011
|
2012
|
2013
|
2014
|
2015
|
2016
|
2017
|
Remun. trabalho
|
3,2
|
-0,2
|
1,4
|
-3,9
|
-7,7
|
1,3
|
0,4
|
2,9
|
4,1
|
4,6
|
Rend. capital
|
5,2
|
-4,2
|
2,8
|
-3,9
|
1,2
|
2,5
|
1,0
|
2,8
|
2,2
|
0,2
|
Pib
|
1,9
|
-1,9
|
2,6
|
-2,1
|
-4,4
|
1,1
|
1,7
|
3,9
|
3,2
|
4,1
|
Inflação
|
2,6
|
-0,8
|
1,4
|
3,7
|
2,8
|
0,3
|
-0,3
|
0,5
|
0,6
|
1,4
|
Chave de interpretação
Remun. do trabalho > Rend. do capital
|
Remun. do trabalho > PIB
|
Rend. do capital > PIB
|
Remun. do trabalho > Inflação
|
§
Em todo o consulado
de Guterres o crescimento dos rendimentos do trabalho supera o dos proventos do
capital. Isso só voltará a acontecer em apenas um dos anos de Sócrates como
chefe do governo (2009), quando a crise começa a revelar-se, bem como no último
ano de Passos (2015) e nos dois últimos anos, com Costa;
§
Os aumentos dos
rendimentos do capital superiorizam-se ao crescimento do PIB em 1995, o ano de
transição de Cavaco para Guterres; no período dos governos de Durão e no da
transição de Lopes para Sócrates (2005); e ainda na maioria dos anos que se
seguiram à crise dos subprimes, até
ao último ano da troika (2008/2013),
não voltando a suceder nos anos mais recentes;
§
O crescimento das
remunerações do trabalho superiorizam-se à evolução registada para o PIB, na
maioria dos anos de Guterres, em dois anos do consulado de Sócrates (2008/9),
nos anos inteiros de Costa (2016/7) e apenas em dois anos completos de
governação PSD/CDS (2003 e 2013).
§
Finalmente, na grande
maioria dos anos, a evolução das remunerações do trabalho supera o crescimento
da inflação, com pequenas diferenças, mormente porque as taxas de inflação
mostram-se pouco elevadas. Note-se, contudo que há um nítida perda dos
rendimentos dos trabalhadores em anos de crise mais aguda, como 2003 e 2011/12,
no primeiro caso em tempos de Durão e no segundo, quando Passos/Portas quiseram
ir para além da troika (2011/12).
A
comparação entre os rendimentos de grupos sociais distintos e potencialmente
antagónicos é um indicador da força desses grupos e do papel do Estado na
afetação do rendimento socialmente produzido. Como é norma no capitalismo, os
detentores do capital, em busca de um maior grau de acumulação, são servidos
nesse desiderato pelo Estado, ocupado por uma classe política, elemento essencial
para a prossecução dessa distribuição; sempre tendo em conta a essencial
manutenção de um nível aceitável de contestação social, que não perturbe a
reprodução do modelo económico, da hierarquia política e do padrão cultural
vigente.
Alargando
a análise ao conjunto dos 40 anos decorridos até 2017 - gráfico 4 – observa-se
a grande deterioração da parcela de rendimento afeto ao mundo do trabalho,
desde tempos próximos do período de mudança de regime (1977) até à grande crise
de 1983/85. O período que se seguiu, de vigência do cavaquismo é marcado pelo
início da chegada dos fundos comunitários e isso permite que a relação entre os
rendimentos do trabalho e do capital se desenvolva, de modo favorável aos
primeiros, ainda que com alguns solavancos até 1993/95, quando uma nova crise
deixa o indicador ao nível do observado em 1983. A euforia do governo Guterres
é bem clara durante a sua vigência (1995/2001); no entanto, o ratio entre os
rendimentos do trabalho e os do capital, situam-no ao nível registado em
1980/81 e… nunca mais foram atingidos até hoje.
Quase
toda a primeira década deste século é um período de perda da posição relativa
dos rendimentos do trabalho, através dos governos de Durão, Lopes e Sócrates,
apesar da melhoria observada em 2009. Segue-se um ligeiro deslizamento até 2011,
sendo patente até 2015 a atuação da troika
através do dueto Passos/Portas que deixam a relação trabalho/capital ao nível
da registada em 1996 ou…1982! Têm-se vivido nos últimos anos, com o governo
Costa algumas melhorias na distribuição global dos rendimentos a favor dos
trabalhadores no seu conjunto, embora isso se deva apenas a um aumento do
número de gente com trabalho, ancorado na especulação imobiliária, com o seu
recurso a trabalhos de construção, bem como ao grande crescimento na entrada de
turistas e o surgimento de muito alojamento e restauração; este sector além de
se caraterizar pela grande relevância da sazonalidade e da precariedade é
também aquele onde se verificam as mais
baixas remunerações na Europa,
Gráfico 4
Viu-se
atrás que o grande decréscimo do indicador rendimentos do trabalho/rendimentos
do capital (Gráfico 4) termina em 1984 com alguma posterior recuperação do peso
dos rendimentos do trabalho até 1991. Porém, nesse período, a população
empregada cresce mais de 27% (cerca de um milhão de pessoas, Gráfico 5) e esse
grande aumento não tem um reflexo equiparado na relação entre os dois tipos de
rendimentos. A evolução apontada pode ser explicada pelos enormes crescimentos
dos rendimentos do capital em 1977/84, um tempo de recuperação do modelo de
acumulação, perturbado pela contestação social que se seguiu ao 25 de Abril,
conforme explicitámos na segunda parte deste trabalho. E, também se explica pelo
facto de tão grande aumento de trabalhadores ter tido um impacto menos do que
proporcional no volume de rendimentos afetos aos trabalhadores, cuja evolução
se situou muito aquém das taxas de inflação, em 1977/84.
Em
1991/95 regista-se uma quebra de uns 450000 trabalhadores, o que está bem
traduzido no gráfico 5. Nesse período regista-se uma relativa estagnação na
evolução dos rendimentos do capital (1993/95) e é, também, um período em que há
uma
redução
nos ritmos de crescimento da totalidade dos rendimentos do trabalho.
Gráfico 5
Em
1994/2002 a população empregada cresce cerca de 700000 pessoas atingindo o mais
elevado nível dos últimos 40 anos; e isso traduz-se num aumento das
remunerações do trabalho acima do observado para os rendimentos do capital
(gráfico 4). Posteriormente, observa-se uma tendência para a redução do ratio,
isto é para uma redução da importância dos rendimentos do trabalho face aos da
empresa e da propriedade, com um interregno em 2008/11, a que se segue uma nova
perda que coloca o indicador ao nível do observado vinte anos atrás. Nos dois
últimos anos o indicador melhora um pouco mas mantêm-se ainda a um nível
semelhante ao dos finais dos anos noventa.
Estas
grandes variações, em consonância com continuados baixos valores para a relação
rendimentos do trabalho/rendimentos do capital, em termos de economia
capitalista, revelam as limitações para acréscimos de consumo susceptíveis de
gerar aumentos da renda. Por seu turno, as variações nos níveis de emprego,
mostram uma sociedade atrasada, incapaz de gerar estabilidade no volume de
emprego e, daí, dos níveis de bem-estar como se demonstrou, recentemente no novo
período de emigração. Revela-se também na patética e esmoler atitude de recurso
a vistos gold para aumentar o investimento
estrangeiro, os incentivos fiscais para atrair estrangeiros ricos (Madona, por
ex), reformados abastados ou ainda, para obter o retorno de emigrantes a um
país que vive da especulação imobiliária, a servir cafés e a fazer camas para
turistas; ao mesmo tempo que não se verificam alívios da carga fiscal para os
indígenas.
3 – Um empobrecimento quase contínuo no plano europeu
De
forma numérica (Tabela 1), pode observar-se a regressão portuguesa no contexto
europeu através da capitação média da remuneração dos empregados - expressa em
paridades de poder de compra - comparando a situação em 2004, ano da integração
dos 10 países do Leste e do Mediterrâneo, com a situação no início da
intervenção da troika (2011) e,
finalmente, em 2017, ano em que Portugal tem oito países em pior situação,
contra doze em 2004, apesar de algumas melhorias nos últimos anos.
Tabela 1
2004 - Média UE-28 – 10 620.5
Bulgária
|
Roménia
|
Letónia
|
Polónia
|
Lituânia
|
Eslováquia
|
Estónia
|
2.615,0
|
2.827,7
|
3.950,2
|
4.184,1
|
4.419,7
|
4.648,8
|
5.377,3
|
Croácia
|
Hungria
|
R. Checa
|
Grécia
|
Malta
|
Portugal
|
5930,0
|
6.235,3
|
6.966,9
|
7.126,3
|
8.097,8
|
8.626,1
|
2011
- Média UE-28 –
12 463.0
Bulgária
|
Roménia
|
Letónia
|
Polónia
|
Lituânia
|
Grécia
|
Eslováquia
|
4.186,1
|
4.479,6
|
5.887,1
|
6.386,4
|
6.777,7
|
6.977,6
|
7.205,0
|
Croácia
|
Hungria
|
Estónia
|
Rep. Checa
|
Portugal
|
7.424,8
|
7.566,0
|
8.283,7
|
8.758,3
|
9.358,8
|
2017 - Média UE-28 – 14181.7
Polónia
|
Bulgária
|
Grécia
|
Roménia
|
Croácia
|
Hungria
|
Eslováquia
|
Letónia
|
Portugal
|
-
|
6.730,3
|
6.752,6
|
6.755,1
|
8.491,2
|
8.893,9
|
9.220,2
|
9.353,8
|
10.213,3
|
Por
outro lado, comparando essa capitação portuguesa com a média da UE-28, a
evolução é também negativa, evidenciando que, no último ano, a situação se
mostra longe do que ocorreu nos alvores da intervenção da troika e, muito longe do verificado em 2004:
2004 – 81.2%
2011 – 75.1% 2017 –
72.0 %
Quando
se compara a mesma capitação portuguesa com a do país mais pobre da UE-28, a
situação está longe de ser lisonjeira:
2004 - 3.3 vezes 2011 – 2.2 vezes 2017 – 1.5 vezes
4
– Nem bom viver, nem democracia; apenas subalternidade e corrupção
A
adesão à UE, para além do forçoso acompanhamento da Grã-Bretanha e da Espanha,
representa uma mudança de capítulo na história portuguesa; ficava para trás - e
como elemento pouco dignificante - o (ainda tão cantado) período colonial. A
adesão tornaria Portugal o mais pobre dos países comunitários, onde os salários
seriam os mais baixos; e, portanto, um país vocacionado para oferecer trabalho
pouco qualificado, um género de cantinho de Leste asiático no seio da Europa
comunitária. Por outro lado, havia algo que fazia brilhar os olhos do tosco
empresariato luso e da classe política; iria perpetuar-se a entrada de fundos
comunitários, cujo volume líquido, depois das ajudas de pré-adesão, cresce
rapidamente até se situar a partir de 1992 em valores acima dos € 2000 M
anuais.
Como
se observa, nada teve como objetivo a melhoria das condições de vida da multidão,
em Portugal; a CEE/UE foi sempre um projeto de concentração de capital para
compensar a redução de peso político das suas principais potências e nunca foi
um projeto de unificação democrática, solidária e não-capitalista dos povos da
Europa, como defendemos[14].
Vivia-se,
nos anos 90, a força do neoliberalismo, herdada de Thatcher e Reagan na década
anterior e a guerra contra o Irão encomendada a Saddam Hussein pelos EUA e que,
não atingindo os objetivos desejados, deixou o ditador em tão maus lençóis que
decidiu apropriar-se do Kuwait para sanar as contas. Como os EUA são os grandes
sustentáculos dos emires do Golfo, George Bush (pai) ataca o Iraque – sem
molestar Saddam - e cria uma zona de exclusão e sanções que geram enorme
sofrimento entre a população iraquiana. Por outro lado, em 1989 o muro de
Berlim deixara de dividir a Alemanha e o Comecon desmantela-se em 1991, tal
como a URSS.
Assim,
passados poucos anos da integração portuguesa na UE, acendem-se as luzes sobre
a Europa de Leste, onde se apresentam vários países soltos de integração em
blocos políticos e económicos, embora a penetração dos capitais alemães já
fosse significativa na Checoslováquia, por exemplo. E, poucos anos depois, o
desmantelamento da Jugoslávia acrescenta mais uns quantos países aos
anteriores, ainda que através de guerras brutais animadas por um curioso
triunvirato – EUA (Clinton), Alemanha e Vaticano – com a NATO a estrear-se,
como efetiva máquina de guerra e a mostrar que afinal tinha préstimo no
pós-guerra fria.
Muitos
destes países tinham (e têm) níveis de instrução superiores ao
de Portugal; mão-de-obra qualificada abundante e barata, para além do forte
desejo das suas populações em beneficiar dos níveis de vida da Europa
Ocidental, mormente dos países-âncora da UE; e, encontram-se numa posição
geográfica mais próxima dos países ricos da Europa. Por outro lado, os
investimentos dos países mais desenvolvidos da UE sucedem-se, através da compra de instalações e equipamentos privatizados a
preços de saldo, com a mediação dos corruptos oligarcas
do “socialismo” reconvertidos em assanhados neoliberais. Estava aberta a porta
para a integração desses países na UE.
O
dilema aprofundamento/alargamento estava presente no seio da UE. Entretanto, em
1995 acontece a adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia, cujos níveis de
vida, salariais e de desenvolvimento capitalista se situavam vários furos acima
dos homólogos portugueses; o que não afetava a estratégia inicial do
empresariato luso e da classe política que até viam nisso um potencial
alargamento de quem quisesse aproveitar o trabalho barato em Portugal,
oferecido pelos negreiros da classe política.
Mais
problemática foi a adesão à UE, em 2004, de dez países do Leste e
mediterrânicos (Chipre, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Hungria, Letónia,
Lituânia, Malta, Polónia, Rep. Checa), com uma posição na Europa menos
periférica que Portugal, com níveis salariais mais “competitivos” e níveis de
instrução superiores. Por outro lado, esse alargamento aumenta o papel da
Alemanha como área pivot na Europa, entre a Europa Ocidental e de Leste, incluindo
os Balcãs e as duas antigas fortalezas europeias no Mediterrâneo, Malta e
Chipre; e, confrontando diretamente com o mundo russófono e os estados
islâmicos.
Como
é evidente, a relevância de Portugal na UE reduziu-se, contrariamente ao que se
pensava no momento da adesão; parece-nos, contudo, que o país, pelas suas
debilidades próprias, pela sua integração geográfica ou pela incipiência
económica das suas relações com a CPLP e os países fora da Europa, não poderia
evitar a sua inclusão na UE, antes ou depois da integração dos referidos dez
países. E isso, por muito que desagrade aos saudosistas de Salazar e do
império, da extrema-direita ou da “esquerda” trotsko-estalinista que, a
espaços, se mostram ativos na defesa da saída da UE, da moeda única, defendendo
um encerramento autárcico ancorado no seu bacoco nacionalismo.
A
adesão dos referidos dez países reformulou o quadro global das transferências
da UE para os seus estados-membros menos ricos. E isso refletiu-se no saldo das
transferências para Portugal, que se reduziu, gradualmente de € 3081.5 M em
2004, até atingir um mínimo em 2008 (€ 1956.1 M). Durante a intervenção da troika aquelas transferências voltaram a
subir, reduzindo-se, posteriormente até 2017, quando atingem um montante
próximo do observado em 2008.
Em
capitalismo, produtos com mais baixos preços, fabricados a partir de salários e
normas laborais que resultem em mais baixos custos, acabam sempre por vencer
quaisquer barreiras; a não ser quando se opta por lógicas nacionalistas de
proteção do mercado interno, como se evidencia, hoje no discurso de Trump e
cujos resultados não parecem auspiciosos. E, há uma década, o protecionismo não
estava na moda.
No
âmbito do comércio global, em meados da primeira década do século XXI, a
evolução também não se mostra favorável à estratégia portuguesa da prática de
baixos salários, para um grande mercado protegido por direitos alfandegários,
como a UE, face aos países asiáticos.
O
Acordo Multifibras findou em 31/12/94 mas foi estabelecido um período de transição
gradual, de 10 anos. Nesse período, alguns dos capitães portugueses do têxtil
deslocalizam a produção para a Ásia ou a Roménia, por exemplo; e esses ou
outros, abandonam o negócio, procurando transformar os seus grandes espaços
fabris, junto das cidades do Norte de Portugal, em empreendimentos imobiliários
ou centros comerciais… não se esquecendo, entretanto de deixar grandes dívidas
junto do Fisco e da Segurança Social, crónicos benfeitores do empresariato, à
custa dos direitos dos trabalhadores e da população que paga impostos. Por
outro lado, a adesão da China à OMC, em finais de 2001, introduz um outro
elemento de peso na liberalização do comércio e do acentuar do papel da Ásia
Oriental na produção têxtil.
A
crise financeira expandida em 2008 tem efeitos ampliados e desastrosos em
Portugal, cuja governação foi obrigada a proceder a um extenso programa de
privatizações, ao resgate dos bancos - a que se seguiu a quase total tomada do
sistema financeiro (bancos e seguros) por grupos estrangeiros (mormente
espanhóis e chineses) - e à gestão de
uma dívida pública enorme e sem perspetiva de redução. A análise dos últimos
dez anos de crise económica e financeira[15],
sobretudo no mundo ocidental, bem como a chegada de Trump à Casa Branca, apontam
para uma nova crise financeira, que os bancos centrais sabem não poder debelar.
Por
outro lado, em termos políticos, mantém-se o predomínio da democracia de
mercado, com eleições regulares para a colocação de representantes diretos de
gangs conservadores (com rótulo liberal ou social-democrata) e, na sombra,
porta-vozes das transnacionais, do sistema financeiro, quando não do mundo do
crime.
A
intervenção militar ocidental em África e no Médio Oriente, por seu turno,
desencadeou uma crise humanitária, com gente deslocada na direção da Europa, em
busca de trabalho e segurança para a qual as instâncias comunitárias e
nacionais intervieram defendendo a exclusão, promovendo a xenofobia e a
irracionalidade do medo que incha a popularidade de uma extrema-direita
fascizante.
Quanto
aos partidos ditos de esquerda, na Europa, mantêm a sua deriva histórica a
caminho do lugar onde estiver o pote, com o culto do estado-nação, da
autoridade estatal e a continuidade das hierarquias que dividem os senhores dos
servos.
Se
a deriva ambiental e climática se acelerar para não prejudicar a sacrossanta
acumulação de capital isso conduzirá a uma verdadeira implosão demográfica que
poderá reduzir a espécie humana a uns escassos 600 milhões. E resta saber se
esses sobreviventes sobreviverão à putrefação do planeta…
Os capítulos anteriores deste
texto encontram-se aqui:
1 - A longa marcha das desigualdades – 1 (O
período 1953/77 e o fim do regime fascista em Portugal )
2
- A longa marcha das desigualdades – 2 Da
primeira intervenção do FMI ao cavaquismo (1977/95)
Aqueles
e outros textos em:
http://grazia-tanta.blogspot.com/
https://pt.scribd.com/uploads
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
https://pt.scribd.com/uploads
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
[1] Sobre o acentuar da
periferização portuguesa, no contexto europeu e ibérico, ver:
[2] Um bloqueio à entrada na Ponte 25 de Abril, no verão de
1994, que faz cair a popularidade do governo de Cavaco; e que, por ironia,
resultou de uma iniciativa de militantes do PSD
[3] Nogueira era um apagado controleiro do aparelho partidário.
Como licenciado em direito e ministro da Justiça mostrou-se tão apto nas suas
funções que era conhecido por… “senhor engenheiro”
[4] Entendemos apresentar uma reflexão sobre os deficits,
nomeadamente, atendendo à sua continuidade, à sua banalização, ao seu caráter
estrutural que tanto interessa às classes políticas e aos banqueiros. Os deficits
correntes resultam de um excesso de despesa sobre a receita e, têm como
contrapartida um endividamento. Ora, em capitalismo, quando se contrai um
empréstimo, os mutuantes exigem um juro e, portanto, a aplicação pelo mutuário,
do capital emprestado, terá de ser suficiente, não somente para garantir o
reembolso do capital emprestado como para pagar os juros correspondentes
acordados.
Isso significa que é insano e estúpido
o endividamento aplicado em algo que não gera um rendimento, no mínimo,
equivalente aos juros contratados; que é o habitual em quem recorre a um
empréstimo para comprar bens de consumo ou serviços, como um automóvel para
passear a família ou uma estadia em Cancun. O mesmo não acontece num crédito
para habitação própria que, em qualquer momento pode ser vendida; não é um
gasto corrente, é um investimento e o reembolso desse empréstimo bem como o
pagamento dos juros efetua-se num determinado lapso de tempo. A comparação que
se fará é feita face ao pagamento de um serviço de arrendamento de um espaço; o
que não é, obviamente, um investimento.
O deficit corrente não resulta de uma
aplicação de capital mas da aquisição de bens ou serviços, de um excedente da
despesa sobre a receita que poderá ser equiparado a um crédito para consumo. A
dívida pública - ao contrário da dívida privada, cujo titular é escrutinado com
grande minúcia – é genérica, não tem uma afetação específica, como deveria ter
por respeito para com quem paga impostos; o que revela que vivemos em regimes
políticos não democráticos, mesmo que regularmente organizem romarias
eleitorais.
Os chamados mercados gostam
particularmente da dívida pública e pouco se importam com a aplicação
específica do produto do crédito pois sabem que os Estados, tendo o poder de
exação sobre a população, garantido por máquinas fiscais, judiciais, policiais
e militares, nunca vão, verdadeiramente, à falência. Os Estados funcionam como
auxiliares do capital financeiro, como emissores de dívida, a subscrever pelos
especuladores que, de imediato entregam esses títulos de dívida pública aos
bancos centrais como “colaterais”, como garantias à criação de moeda a lançar
na especulação global.
[5] Cerca de 20 anos
depois, o nível de instrução em Portugal é o segundo mais baixo da Europa,
somente acima da Turquia
[6] No contexto europeu
essa criatividade valia pouco, comparando com o evidente incumprimento da
Itália e da Bélgica, cujas enormes dívidas públicas superaram largamente as
obrigações contidas no PEC
[8] O
custo da transferência do buraco negro BPN para a esfera estatal tem custado
vários milhares de milhões de euros. Em 2014, no seguimento da falência do BES,
numa concentração
de protesto baseada na recusa do envolvimento de dinheiro público no apoio
ao gang BES/PT… um conhecido membro da constelação trotsko-estalinista apontou
como solução para o BES… a nacionalização! E, pior que isso, foi aclamado por
muitos dos presentes, evidenciando-se assim o caráter fóssil da dita “esquerda”
portuguesa
[9] Nos últimos anos, várias vezes colocámos esta
questão, sempre silenciada pelo regime pós-fascista:
Para uma breve história de uma
soberania fictícia – 1 e 2
Dívida pública – Cancro não se
trata com paracetamol
O projeto UE. Desvalorização
interna, o euro e os novos Viriatos
[11]
Onde também brilhou um gang criminoso cujo capo era um ministro de Passos
Coelho, Miguel Macedo
[13] Pese embora a estupidez dessa segunda
travessia do Tejo não contemplar caminho-de-ferro, esse desprezado meio de
transporte, face à rodovia, mais adequada aos interesses das empresas de obras
públicas e às burlas das parcerias público-privadas
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