terça-feira, 9 de novembro de 2021

Glasgow – as canecas de Guiness e os COPos à solta

1 - O espetáculo dos mandarins – a COP 26

2 - Contra a irracionalidade imanente ao capitalismo? Nem por isso…

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1 - O espetáculo dos mandarins – a COP 26

Torna-se absolutamente evidente que a COP 26 não passa de um número mediático para convencer os ingénuos de que os grandes e pequenos mandarins nacionais presentes em Glasgow irão fazer algo de substantivo no capítulo do ambiente. Com menos mediatismo, celebrou-se em agosto um evento apoiado pela Alliance of World Scientists com mais de 15.000 signatários, de 160 países, em apoio à seguinte declaração: World Scientists Warning of a Climate Emergency.

Para a solenidade que se pretende dar à conferência de Glasgow, esta começou com um erro revelador de uma crassa ignorância. Os promotores apresentaram um vídeo sobre a extinção dos dinossauros e não pensaram que aqueles animais morreram perante um clima a esfriar depois do embate de um meteorito; e não com um aquecimento global como aquele a que se assiste. O meteorito de então, foi substituído hoje, pelo capitalismo. E, se algum demente pensar em aplicar uma solução radical para esfriar o clima, basta gerar uma… guerra nuclear; as bombas e veículos para as lançar estão em constante apuro...

A COP26 mostra claramente o seu espírito oligárquico ao considerar, quase em exclusivo, a presença de representantes dos países, das esferas governamentais, com o … natural afastamento de milhares de ONG’s que se dedicam a colher informação e a colocar no terreno opções que os governos, no alto dos seus pedestais de oligarcas, não consideram, de per si e, menos ainda, se dignam a aplicar. No dia 3 de novembro, entre milhares de ONG presentes em Glasgow, somente foram acreditadas quatro! É bem clara a dicotomia entre o conjunto das classes políticas presentes na conferência e as ONG, provenientes de iniciativas da sociedade, muitas das quais acreditam ingenuamente que aquelas classes políticas, sob o efeito de um sopro divino, se encarregarão de enterrar o capitalismo e de se redimirem, quais ascetas, numa vida frugal de convento…

Para os oligarcas nacionais o mundo pertence-lhes, mesmo que uns sejam mais iguais que outros…; e, as pessoas comuns, não se podem misturar com os oligarcas, ficam à porta. A jovem Greta Thunberg[1] retratou muito bem essa situação – “Esta já não é uma conferência sobre o clima, é um festival de lavagem da imagem verde para o Norte global”; assim, essa situação merece toda a radicalidade crítica, evidenciando-se como espelho do que é o capitalismo e, nesse contexto, merece toda a oposição que é necessário fazer às classes políticas que, em regra, são problemas em si e, só para os ingénuos, construtores de resoluções.

A classe política global, perante uma oposição tão débil como a proveniente dos partidos e grupos ecologistas, nem sequer se esconde; pelo contrário, não tem qualquer preocupação em esconder a sua imagem de estouvados gastadores, nem o exibicionismo e a arrogância própria de quem sabe ser parca a compreensão e a atuação das vítimas do sistema económico e político dominante. Como é espelhado em Glasgow… Vejamos alguns exemplos.

Uns dias atrás, de 29 a 31 de outubro, em Roma, na reunião do G20, um grupo formado pelos países com maior poder económico do mundo, a parceira Maserati colocou 40 automóveis à disposição dos mandarins (leia-se chefes de Estado e de Governo) para utilização durante o conclave.

Para participar na COP26 chegaram a Glasgow 400 jatos particulares, com um mandarim cada um (a boleia não está prevista!) todos “plenos de entusiasmo” para participar no circo. Ao que se sabe, emitiram 13000 t de CO2, o equivalente ao consumo de 1600 de escoceses durante um ano, de acordo como o Sunday Mail!

Ainda em Glasgow, o entusiasmo de Biden foi tão grande que esteve a dormitar um pouco durante uma sessão… Dias antes, Biden (há quem lhe chame Zombiden) desembarcava em Roma para uma sessão do G20, no seu Cadillac One, um mastodonte com um motor de 8100 cc, muito ecológico pois… consome apenas 29 a 64 litros de gasolina por cada 100 quilómetros (!) e que circulou num cortejo com mais… 84 carros para a segurança do indivíduo. Mas, seríamos injustos se nos limitássemos aos comportamentos do limitado Biden pois Ursula von der Leyen, mais comedida, só usou o seu jacto privado em 18 das suas 34 viagens oficiais, incluindo numa delas um percurso de… 50 km, entre Viena e Bratislava.

Biden sabe que tem pouca margem no Congresso para aplicar $ 555000 M às mudanças climáticas. Pelo contrário, nos EUA, os setores dos combustíveis fósseis receberam $ 3 B nos últimos seis anos. Curiosamente, o mesmo Biden facilitou um aumento de 900 % no carvão enviado para a China ao mesmo tempo que pretendia limitar as vendas de gás russo e qatari para as substituir por gás de xisto, cuja extração é um crime ambiental![2]. Anos atrás observámos num artigo da National Geographic uma situação estranhíssima… Num local próximo de uma dessas extrações, nos EUA, quando se aproximava um fósforo a arder da água que saía de uma torneira, o líquido produzia pequenas labaredas.

Há uns três anos circulavam diariamente 300000 aviões comerciais, para além dos exercícios totalmente nefastos e inúteis levados a cabo no âmbito das manobras militares. Para além de outras operações pontuais com uma finalidade útil, entre os militares, em Portugal, só registamos como meritória a coordenação exercida pelo Gouveia e Melo no âmbito do covid.

Tão nutrida festa em Glasgow parece destinar-se a apresentar uma novidade – a criação do primeiro imposto global ("taxa de carbono”) por parte dos Estados, cobrados pelos respetivos mandarins locais que, se encarregarão de transmitir essa carga fiscal aos povos, naturalmente.

Claro que isso não afetará muito os empórios dos combustíveis fósseis; eles sabem bem que o automóvel é o elemento mais querido das famílias, que se sacrificam para ter um veículo disponível à porta de casa. A experiência mostra que o apreço pelo automóvel é tão grande que a plebe aceitará pagar, resignada, qualquer aumento dos impostos que venham onerar a posse de um veículo e a sua circulação. Por outro lado, ninguém sensato irá acreditar que as classes políticas se irão sobrepor aos interesses das suas empresas nacionais no âmbito do automóvel e da venda de combustíveis, impondo limitações e sobrecargas de impostos a quem, por tradição, financia os partidos dominantes e os seus chefes.

A OMS que não tem sido brilhante no combate ao coronavírus, mesmo com o substancial apoio financeiro de Gates apresenta, em tempos de COP26 uma proposta para reduzir os acidentes e os óbitos na estrada que se pautam, por ano, respetivamente, em 50 e 1.3 milhões de pessoas (Plano Global para a Década de Ação pela Segurança no Trânsito). Nesse plano aponta-se para a redução dos limites de velocidade para 30 km/h nos meios urbanos, para 80 km/h nas localidades e de 100 km/h nas autoestradas. Segundo o diretor do Departamento de Determinantes Sociais da Saúde da OMS, Etienne Krug, as mais de 50 M que morreram nas estradas desde que o automóvel foi inventado, suplantam claramente os mortos nos quatro anos da I Guerra Mundial (20 M).

O ambiente económico dominante é focado no acréscimo do lucro, no aumento da produção, da exportação, da concorrência, do consumo inveterado fomentado pela publicidade; bem como na redução da intervenção direta dos trabalhadores, na redução dos custos de produção ou, do ratio salários/lucros. O Plano da OMS confrontado com o ambiente económico real teria de implicar numa alteração profunda do paradigma económico, num envolvimento político pouco divisável no contexto global de economicismo, de classes políticas corruptas capturadas pelos interesses económicos. Sobretudo, exige um forte ativismo das próprias populações a favor da saúde e o bem-estar de todos, o que tornaria evidente a inutilidade das classes políticas, financiadas pelos Estados e por entidades com escusos interesses; uma alternativa de construção de modelos de representação política efetivamente democráticos com a anulação da existência de oligarquias políticas, como as presentes na COP26.

2 - Contra a irracionalidade imanente ao capitalismo? Nem por isso…

Os elementos atrás referidos apontam para alterações profundas a desenvolver na mobilidade humana, quer nas longas distâncias como nas movimentações correntes, de curta distância e, sobretudo nos movimentos pendulares casa/trabalho, para mais quando acompanhados por percursos triangulares que envolvem escolas ou creches. As soluções contemplam a redução dos tempos e da dimensão dos percursos casa/trabalho através de transportes públicos, sem emissão de gases e, em prejuízo e discriminação do transporte automóvel quando, para mais é efetuado tendo o condutor como único passageiro. E, poder-se-ia ir mais além, mesclando os locais de trabalho com zonas habitacionais no sentido de reduzir os percursos pendulares em transportes ou mesmo, percorrer esses percursos a pé.

É completamente irracional passar um tempo desmesurado em transportes públicos, repletos de gente, com o ar saturado e engarrafados no trânsito, no conhecido pára-arranca; é irracional permanecer uma parcela considerável de tempo numa interminável fila de automóveis, em marcha lenta, a libertar gases tóxicos para a atmosfera, de manhã e ao fim da tarde, com passagem por uma escola ou infantário; é irracional o baixo investimento em percursos ferroviários movidos a eletricidade: é irracional a construção de prédios enormes com vários fogos por piso, com gastos de elevador e escasso espaço para o parqueamento, mesmo que gratuito e, não objeto de pagamento a uma autarquia ou a uma empresa. O constante aumento das áreas urbanas e suburbanas surge sempre antes de um planeamento cuidado da rede de transportes e, estes acabam por se adaptar ao traçado dos arruamentos, à disposição do edificado, sem qualquer planeamento ou racionalidade por parte de autarquias minadas de negócios escusos entre mandarins e promotores imobiliários.

A concentração das atividades económicas em áreas urbanas, por vezes gigantescas, atrai população constantemente, contribuindo para o esvaziamento de áreas rurais, com pouca atividade económica e cobertura sanitária reduzida, ajustada para uma população envelhecida, com aldeias desertas e casas fechadas, quando não em degradação acelerada. Isto é, uma ocupação dicotómica e regressiva do território.

As energias limpas dividem-se em dois grupos.

Umas, exigem infraestruturas pesadas e caras, funcionando numa lógica contratual, de mercado, entre produtores e consumidores, com a inevitável presença de uma carga fiscal acrescida para alimentar classes políticas, sempre ávidas do uso da máquina estatal, não recuando perante favores e outros actos corruptos. Baseiam-se na lógica mercantil e tendem a ser invasivas – torres eólicas, hectares cobertos de painéis solares, exigindo redes de transporte com inerentes perdas no percurso.

A segunda versão consiste na fácil adaptação a uma habitação familiar ou um conjunto de inquilinos num prédio de média dimensão, susceptíveis de produção para autoconsumo, sem carga fiscal mas com uma interferência parcial de grandes empresas elétricas, em períodos de baixa produção própria. Em Portugal, a intervenção da troika em 2013/15 introduziu uma taxa de 23% de IVA, a mesma que se utiliza para consumos sumptuários como para bens de primeira necessidade, como a eletricidade consumida nas habitações; essa situação inclui-se na ação de um Estado predador, cobrador de uma carga fiscal desmesurada e, reveladora de uma realidade em que os impostos podem ser criados, mantidos mas raramente reduzidos. E, quando reduzidos, é porque foi encontrada uma compensação num outro imposto.

A ligeireza das classes políticas perante a situação associa-se ao menosprezo pela multidão humana por parte dos capitalistas, mormente os poderosos, como Bezos[3] ou Gates; ou de políticos ineptos como Biden ou Boris. Temerosos de qualquer atitude mais lesiva das suas importantes carcaças, só se sentem seguros, na companhia dos seus pares, sempre rodeados de polícias e seguranças.

A imprensa comum vive numa relação de mancebia com a classe política; em conjunto constituem uma dupla de entertainers da multidão. Os membros da classe política precisam dos media para uma divulgação constante das suas capacidades, dos seus discursos, das suas presenças em lugares públicos, dos aplausos dos basbaques; e, vice-versa, os media, para venderem a publicidade que paga os custos, desdobram-se na recolha e divulgação de opiniões, promessas, críticas à oposição, por parte dos mandarins; quanto mais crispado for um diferendo político, mais o assunto interessa aos media. Classe política e imprensa constituem dois mundos osmóticos onde a vacuidade, a mentira, constituem os principais elementos colocados na imprensa em geral ou, transmitida na tv, para os mais mediáticos, 24 horas por dia, intercalados por concursos, séries idiotas ou pejadas de violência e futebol; e, neste último caso, trata-se de um tema de conteúdo efetivo extremamente estreito, feito de rivalidades e conflitualidades exacerbadas, entre dirigentes ávidos do dinheiro das transferências de jogadores.

É evidente que os capitalistas e as classes políticas sempre tiveram uma atitude de ligeireza perante as transformações que desembocam, um pouco por todo o lado, em má qualidade do ar, nas doenças, nas esgotantes deslocações dentro das áreas urbanas, no esgotamento e envenenamento dos solos agrícolas, etc. tudo, na seguimento do seu produtivismo, da sua ânsia pelo crescimento do PIB ou, da acumulação de capital, se se preferir…

Dizer ligeireza é, de facto, muito… ligeiro. Ambos os grupos - capitalistas e classes políticas - são defensores ferozes do mercado, dito livre, mesmo que o seu funcionamento, nas principais áreas de negócio, venha sendo controlado por empresas ou oligopólios de enorme dimensão e poder. A pulsão para uma constante valorização dos títulos nas bolsas, domina os grandes empórios globais e, essa pulsão repercute-se nos escalões inferiores do empresariato. Por outro lado, essa valorização incorpora biliões de unidades monetárias fictícias para que os ditos mercados financeiros se mantenham sempre em expansão. E, a mesma lógica é seguida pelos governos que encandeiam os povos tomando como objetivo o crescimento infinito do PIB, encobrindo, de permeio, a estagnação ou a fraca evolução dos rendimentos reais do trabalho[4].

Quanto ao aquecimento global, o assunto irá sair da agenda quando fechar o encontro de Glasgow. Os capitalistas e seus pares continuarão a apresentar um razoável desinteresse, mais focados na valorização dos títulos na bolsa. E, as classes políticas manterão o aquecimento global na agenda, em lume brando, como modo de mostrar pressão sobre os governos. Quanto aos grupos ecologistas, tornam-se partidos iguais aos outros, como os Verdes alemães, a entrar no governo alemão, como anos atrás na guerra na antiga Jugoslávia; ou, contentam-se em apresentar tecnologias criativas para adiar o momento de um colapso de grandes dimensões, sem tocar no modelo global de gestão capitalista ou sequer no modelo de representação, oligárquico e autoritário.

Este e outros textos em:

http://grazia-tanta.blogspot.com/                               

http://www.slideshare.net/durgarrai/documents

https://pt.scribd.com/uploads



[1] Greta terá aprendido que não há diálogo construtivo com os altos nomes da classe política? Recordamos a seu (inútil) encontro de há uns dois anos com Obama, o promotor das guerras de destruição na Líbia, na Síria e no Iraque; o mesmo Obama que aparece com a pureza de uma pomba, no conclave da COP26, tal como se apresentou  como pomba da paz, a merecer o Nobel, pouco antes de decidir invadir a Líbia , a  proceder à desestruturação da Ásia Ocidental e a validar o golpe de estado no Egipto para colocar no poder o ditador al-Sisi.

[2] Os elementos factuais  contidos nos parágrafos anteriores são na sua maioria provenientes de https://informacaoincorrecta.com (G20 e COP26: WYSIWYG)

[3] Bezos não encontrou nada mais inteligente do que pagar uma fortuna por quatro minutos de viagem suborbital https://www.globalcitizen.org/en/content/jeff-bezos-space-flight-money-better-uses/

[4] O primeiro-ministro português propôs recentemente um aumento, para 2022, do salário mínimo, de € 700 para € 705, isto é + 0.71%, o que se situa abaixo da inflação prevista (0.9%). Trata-se do miserabilismo de um Portugal dos pequeninos.

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