quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Depois da romaria eleitoral o programa segue dentro de momentos

1 – Os acontecimentos recentes
2 – Cenários para os próximos tempos
 A1 – Passos e o acólito Portas conseguem governar com a compreensão do PS
A2 – Formação de um bloco central com ou sem Portas como adereço
A3 – A solução Papademos
A4 – A maioria de “esquerda”
3 – Notas sobre os intervenientes
4 - Os que só contam como farsa



1 - Os acontecimentos recentes

Lá se viveu a romaria eleitoral de 4 de outubro, apenas temperada pela atitude do PR, verdadeira encarnação do regime político, baço e tosco; optou por não discursar no dia 5 de outubro, o da instauração da República, cuja existência é que permitiu a existência do cargo de PR embora, nos tempos de hoje, seja tão dispensável quanto um monarca[1].

·        A vitalidade do regime cleptocrático e da sua representatividade transparece no entusiasmo e nas esperanças de mudança evidenciadas com o aumento de 186000 do número dos que não votaram;

·        Os votos dirigidos a partidos representam apenas 54.9% dos inscritos levantando claramente a questão da efetiva representatividade do sistema partidário na população e da exigência que se deve efetivar de um modelo de representação em que todos podem candidatar-se, tenham ou não vinculação ou melhor, subordinação partidária; 

·        A parcela PSD do partido-estado (PSD/PS), em funções desde 2011, somada com o parco contributo do seu apêndice CDS, perdeu 820000 votos. Mas canta vitória porque mesmo assim ficou muito acima do irmão gêmeo do partido-estado (PS) que apenas recolheu mais 188000 votos que no concurso anterior;

·      Assim sendo, o partido-estado, no governo há perto de 40 anos, mesmo reforçado com o acólito CDS recolheu menos uns 630000 votos. É interessante observar que a existência do CDS depende em absoluto do seu papel de desequilibrador entre as duas alas do partido-estado, inserindo-se cada vez mais como uma “sensibilidade” encastrada no PSD;


·        Tudo indica que muitos apoiantes do duo Passos & Portas se mudaram para o PS e que deste, desertaram para o resto da concorrência (ou para a abstenção) muitos que não ficaram agradados com o verbo sonoro mas vazio do António Costa;

·        Os patrocinadores de Bruxelas foram lestos em traduzir os resultados eleitorais como reveladores da satisfação dos portugueses com as reformas estruturais definidas pela troika. Sabem também que os seus funcionários do partido-estado, qualquer que seja a ordenação interna - PSD/PS ou PS/PSD - são fiéis cumpridores das ordens, provenientes de Bruxelas, de Frankfurt e Berlim, que filtram as conveniências do sistema financeiro e das multinacionais. O sub-chanceler Schauble revelou que os resultados eleitorais significam que a austeridade foi um grande sucesso (para o sistema financeiro e o acrescido número de milionários, certamente) e que valeram os sacrifícios. Os portugueses, de facto, com a sua inércia política têm-se revelado sofredores felizes, bem dentro da tradição católica que lhes trará, um dia a retoma, nos braços de um anjo, como na batalha de Ourique.

2 - Cenários para os próximos tempos

Cavaco irá brevemente dar posse a Passos que reformulará o elenco governamental e apresentará o seu programa de malfeitorias e promessas de benfeitorias a concretizar no Além. Isto não é um cenário é uma certeza, por muito entretenimento que a classe política e os media ofereçam com encontros, debates e congeminações para ocupar a plebe ao serão, entre dois momentos publicitários. Porém, algumas forças de caráter tectónico podem a médio prazo oferecer outras soluções, com distintos graus de probabilidade.

      A1 – Passos e o acólito Portas conseguem governar com a compreensão do PS

Trata-se de cenário com enorme probabilidade. Os efeitos no PS poderão ser desastrosos uma vez que o partido terá de viabilizar as medidas definidas e encomendadas por email pelos funcionários da Comissão Europeia ou do Eurogrupo.

Entendemos que o PS não está autorizado a fazer algo de diferente, pois não pode destoar no retrato da família “socialista” europeia. Recorde-se que o SPD alemão é sócio minoritário no governo de Merkel e que Hollande dá um bom exemplo de impopularidade para agradar ao capital; e a França não é exatamente um Deutsche Lusitanien Bezirke.

Depois de quatro anos numa oposição cómoda e pouco efetiva, escudado na maioria absoluta do governo, o PS não beneficiou particularmente do descontentamento da plebe, nas últimas eleições; mesmo num país onde é enorme a despolitização, muitos portugueses perceberam a pouca confiança que o PS merece, como partido garante da bipolarização e da alternância, dentro de uma estratégia partilhada com o PSD e ditada do exterior.

O resultado de dia 4 foi o pior possível para o PS. Uma coisa seria ganhar as eleições, por maioria absoluta ou mesmo com o apoio do PSD, ao qual caberia a iniciativa de derrubar o governo com eventual suporte do lado esquerdo do hemiciclo, como em 2011. Se tivesse ganho, colocaria os seus quadros e apaniguados em cargos governamentais, nas direções de empresas, institutos públicos e reguladores ou, chamados para administradores de bancos ou de empresas do regime, para funcionarem como correias de tráfico de influências. Nesse caso, Costa sairia como líder incontestado perante o qual até os defensores de Seguro se vergariam, para além da oportunidade de recomporem as depauperadas finanças da agremiação. Perdendo as eleições, como aconteceu, o melhor teria sido, para a tranquilidade do PS (mas não de Costa), que Passos tivesse obtido maioria absoluta, para prolongar por mais uns anos o cumprimento sereno de uma oposição low profile como é exigido pelas instâncias comunitárias; e esperar uma nova oportunidade.

Finda a maioria absoluta, não há alibis para uma oposição morna. O PS só poderá ganhar espaço eleitoral para assumir o poder em duas circunstâncias. Uma, se arrastar o resto da oposição numa toada de contestação frontal ao governo, após um quase certo “benefício da dúvida” com a abstenção na votação do programa do governo e do orçamento para 2016; os recados que vêm de Bruxelas são imperativos quanto à necessidade de haver um orçamento a muito curto prazo. A outra circunstância consiste numa sucessão de erros políticos e de gestão de Passos, associados a uma degradação da situação económica e financeira de Portugal; aí, Merkel encomendaria novas eleições para que o PS substituísse Passos, como seu gauleiter.

A2 – Formação de um bloco central com ou sem Portas como adereço

Esse quadro poderá vir a colocar-se se, perante uma situação económica e financeira muito degradada ou por imposição de medidas muito gravosas, a suserania da UE exigir um reforço da estabilidade governativa, isolando na oposição parlamentar o BE, o PC e o solitário homem do PAN. Foi isso que aconteceu em 1983/85 para a gestão da segunda intervenção do FMI e a preparação para a entrada na CEE, então com predomínio do PS e um PSD enfraquecido e sem liderança a reboque.

Pode também aplicar-se essa configuração governativa no caso de forte contestação social, como união sagrada de defesa do regime e forma extrema de satisfação da estabilidade que os mercados gostam, o que nos parece pouco verosímil, por várias razões. Os sindicatos – que depois do 25 de Novembro de 1975 foram conduzidos a veículos únicos da parca e institucionalizada contestação social - estão exauridos de gente e de capacidades políticas ou de mobilização[2]; historicamente, têm-se resumido a atitudes reativas, de corridas atrás do prejuízo, temperadas com algumas greves, manifestações, concentrações e muitos abaixo-assinados e recursos a tribunais. Neste último caso, como formas de congelar a contestação sem assumir as debilidades próprias e ainda com o erro político colossal de se empurrar a solução dos conflitos sociais para as instituições do Estado; no seguimento aliás do desarmamento, nas últimas décadas de todas as atitudes de auto-organização dos trabalhadores, em detrimento da obediência a burocratas sindicais e funcionários partidários.

As movimentações sociais entre 2010/2012, apartidárias e mesmo em confronto com as estruturas estatais e da esquerda do regime[3] foram sendo objeto de invasão, controlo ou marginalização por sabotadores partidários, culminando com a burla “Que Se Lixe a Troika” que teve o condão de ajudar a contestação a dissolver-se ou a desaparecer no seio dos partidos[4] para uma tranquila aplicação da austeridade por parte de Passos. Hoje, não se observam indícios de qualquer ressurgimento de contestação social, podendo considerar-se Portugal um país simultaneamente esmagado pela austeridade e pacificado socialmente, com a ajuda da descompressão resultante da massiva emigração. Conclui-se daí que uma união sagrada, formal, dos partidos do “arco da governação”, nomeadamente das duas alas do partido-estado, nos surja como pouco verosímil.

Esta solução não agradaria particularmente a Portas que se resumiria forçosamente a um papel despiciendo no governo, no qual constituiria uma terceira força. Para tentar obviar a essa situação Portas fez um acordo de governo com Passos para amarrar este último a um compromisso utilizando o que lhe está disponível, um papel assinado; e que vale apenas isso, papel facilmente colocado num ecoponto, se necessário. O CDS poderia mesmo ser dispensado e tornar-se o elemento solitário e ferido de uma oposição de direita, contra as insuficiências do governo, na exigência de apoios aos empresários e na defesa de temas caros ao catolicismo ultramontano, podendo a médio prazo, se colocado fora da área governamental, caber todo dentro de um táxi.

A3 – A solução Papademos

Em 2011 e perante o descalabro da situação económica e do descontrolo da dívida, o governo PS dirigido por Sócrates apresentou um PEC IV que, embora susceptível de aceitação pelas instituições da UE, foi rejeitado por toda a oposição, de ambos os lados do hemiciclo. Uns, PSD e CDS, desejosos do acesso ao pote, de onde estavam afastados desde 2005. Os outros - BE e PC - por errónea leitura da situação social que fizeram das manifestações de 12 de março de 2011; não atenderam à origem obscura dos seus promotores ou dos seus apoios e confundiram a contestação a Sócrates e ao seu governo com uma viragem à esquerda da população. A esquerda do regime, marcada ideologicamente pelo trotsko-estalinismo, espera sempre que basta haver pastores para que o rebanho se reúna à sua volta; não perceberam que era parca a contestação social nas empresas, nas escolas e nas ruas. Esse erro foi particularmente caro para o BE que perdeu metade dos deputados.

Por seu turno, Sócrates poderia ter convocado um referendo do PEC IV, como o fizeram pouco depois George Papandreu (novembro/2011) e Tsipras em julho último. A tradição de desconfiança existente na classe política portuguesa face à população, herdada dos sustos sofridos durante o PREC, faz com que a consulta direta da população raramente seja considerada, preferindo-se sempre soluções no quadro dos partidos do regime, em conclaves para onde a plebe não é chamada nem ouvida; soluções no quadro das instituições do regime, com a população a assistir na tv, domesticada por comentadores arregimentados entre a classe política, grilos-falantes campeões do fomento da despolitização reinante.

A recusa da proposta referendária de Papandreu por parte da suserania europeia conduziu à nomeação de um financeiro, Lucas Papademos, como primeiro-ministro grego, de um governo Nova Democracia/Pasok/Laos, cujos homólogos em terras lusas serão o PSD, o PS e o CDS. Em Itália foi inventada, pela mesma altura, uma solução semelhante com o governo de Mário Monti. Esta solução recorda-nos ainda o tempo dos governos de iniciativa presidencial de Eanes em 1978/79 quando aquele pretendia uma solução bonapartista, adequada ao perfil psicológico de um general. A democracia de mercado está sempre aberta a excepções e distorções sempre que isso favoreça a estabilidade dos … mercados.

Em suma, em Portugal, nos próximos tempos, uma solução Papademos pode surgir na pessoa de um “técnico” capaz de impor pragmaticamente um governo com gente do partido-estado, para garantir a estabilidade política e financeira vital para os mercados. Isso, no caso de o PS se mostrar desobediente das ordens de Bruxelas e Berlim e dificultar um próximo governo Passos, num contexto de previsíveis dificuldades financeiras entrelaçadas com uma retoma que não se afirma.

A4 – A maioria de “esquerda”

É por essa designação que se conhece uma unidade entre parceiros variáveis mas que, no contexto actual deverá ser interpretada como constituída por PS, PC e/ou BE ou por PC e BE com mais uns convivas de perfil próximo, sempre que o PS está no governo.

Nunca houve um governo nacional com tal perfil, nomeadamente por recusa do PS que, como sequela do PREC se perfilou como um dos mais reacionários da Europa. O PS já esteve aliado ao CDS (1978) e ao PSD (bloco central 1983/85), só faltando uma união sagrada dos partidos do “arco da governação” como explicitámos em A2.

Não nos parece que com a prática actual das instituições europeias e dada fragilidade política de Portugal no seio da UE, tal solução tivesse a concordância de instituições como a Comissão Europeia, do Eurogrupo ou do venenoso Schauble. Bem sabemos como Varoufakis foi recebido nas instâncias por onde passou, verdadeiros ninhos de escorpiões, com fortes propensões fascizantes.

Consideramos um governo PS em aliança com o BE e/ou o PC como algo impossível, sobretudo apenas com um dos dois últimos; aquele que entrasse sozinho no governo com o PS não constituiria uma maioria parlamentar e ficaria refém do segundo partido da “esquerda” uma vez que o PSD/CDS em conjunto teriam mais deputados do que um governo PS aliado apenas a um dos partidos da ala esquerda de S. Bento, colocando naquele que ficasse de fora, o papel de viabilizar as propostas do governo para não se colocar do mesmo lado do tandem Passos/Portas. Lá teríamos, no fundo uma desunião … das tais esquerdas do sistema partidário.

Uma outra hipótese, muito desconfortável para o PS seria tornar-se governo minoritário, com um apoio parlamentar casuístico, dos dois (e não só de um) partidos da esquerda do hemiciclo e que seria um brinde político para os últimos, embora não isento dos riscos inerentes às responsabilidades governativas assumidas por terceiro, o PS.

Finalmente, a nocividade residente em Belém, pelo seu perfil, jamais daria posse a um governo com essa constituição tripartida ou um governo PS, dependente da boa vontade da esquerda parlamentar. Em breve, o Palácio de Belém mudará de inquilino mas, o novo ocupante, qualquer que seja a sua posição pessoal, arrogar-se-á a desagradar às suseranias europeias ou preferirá contentar-se com o seu papel de berloque institucional?

3 – Notas sobre os intervenientes

Consideremos agora algumas notas em torno dos resultados eleitorais de dia 4, reveladoras do bloqueio que carateriza o actual regime, com sua antidemocrática organização institucional e o seu excludente modelo de representação.

·        O próximo governo, como definido na presidencial preleção de dia 6, deverá garantir a estabilidade politica, o cumprimento das obrigações com a UE e a NATO, a afluência do investimento estrangeiro, o equilíbrio das contas públicas e externas, os acréscimos da competitividade e o regular funcionamento dos mercados. Nada que se não saiba mas, reconhecemos, é obra! Por ser obra pesada, a esguia nocividade, para não azedar o jantar dos que o ouviram, não referiu um desígnio nacional chamado mar, que lhe cai sempre nos discursos; nem apontou as obrigações dos governantes no capítulo do bem-estar da população e muito bem, pois de há vários anos a esta parte, passaram de moda.

o    Se Passos, mesmo com o trintanário Portas na carruagem, está em minoria, do ponto de vista aritmético, a forma de sair dessa situação é cooptar o PS, através de boleia na carruagem ou apenas através do fornecimento dos serviços necessários à estabilidade política e dos mercados;

o    Essa cooptação é sugerida ao PS num mau momento. Depois de falhar o título no campeonato eleitoral, o PS vai entrar num período de convulsões no balneário, numa era de traições e vinganças, com os amigos de Seguro e outros camaradas a prepararem as brasas para queimar Costa, nos próximos meses. Esse programa trará diversão para o outono e poderá arrastar-se até à eleição presidencial, onde um tal Sampaio da Nóvoa não deverá chegar, perdido na névoa;

·        Na esquerda do sistema partidário há a registar os bons resultados do BE, particular fruto do desempenho de Catarina Martins e Mariana Mortágua que parece terem feito esquecer a memória dos gurus do trotsko-estalinismo, Louçã e Fazenda; e tiveram o bom senso suficiente para não replicar Louçã na sua estouvada ideia de saída do euro. De qualquer dos modos, a performance foi apenas a suficiente para retomar uma votação semelhante à de 2009, beneficiando das desconfianças face ao PS e da noção geral de inutilidade dos vários candidatos ao pote que apostavam na queda do BE.

Está na moda incluir-se numa esquerda radical, forças políticas institucionais à esquerda dos partidos da mafiosa “Internacional Socialista”. O epíteto de radical visa, nos plumitivos do sistema, colocar um anátema equivalente ao “comer as criancinhas” de umas décadas atrás, no sentido de confinar as escolhas aos partidos do TINA – There is no alternative, inscritos nos gangs europeus PPE e S&D.

O que se passa é que partidos como o Syriza, o Podemos ou o BE, têm apenas um ideário social-democrata tal como ele vigorava até aos anos oitenta e que esteve na base do estado social ou modelo social europeu (embora houvesse deste várias versões, a nórdica, a renana, a japonesa). Surgiram para ocupar o espaço político e ideológico abandonado pelos velhos partidos socialistas e sociais-democratas convertidos ao neoliberalismo, mormente após o desmoronamento do modelo soviético e na sequência do empobrecimento exigido pela fórmula actual de capitalismo especulativo e excludente.

·        Quanto ao PC, salvou a honra do convento com uma votação quase igual à das três eleições anteriores evidenciando o esgotamento das suas capacidades de atingir a população em geral, apesar da dureza da austeridade, falhada a cartada CGTP como polarizador de contestação. O seu nacionalismo bacoco com as referências a uma saída do euro e da UE não cai bem na população, um pouco mais instruída sobre as consequências dessas decisões, do que o líder da classe operária, Jerónimo de Sousa, imaginaria.

Sem prejuízo do seu papel histórico na luta contra o fascismo, o PCP e ainda mais o KKE grego, tornaram-se verdadeiros museus de teorias e práticas sem grande aplicação nos dias de hoje, de capitalismo globalizado, de acesso generalizado à informação, de apagamento do papel dos estados-nação como estruturas ao serviço de capitalistas indígenas e prisões de povos. Note-se que em Portugal nem sequer surgiu, com relevância, em devido tempo, uma deriva eurocomunista, como na Grécia após a invasão da Checoslováquia e, sobretudo depois da queda do Muro, derivas essas que conduziram mais tarde ao Syriza enquanto em Portugal só registamos uma presença consistente muito mais tarde, com Miguel Portas, entalado dentro do BE, entre trotskistas e discípulos de Enver Hoxha.

4 - Os que só contam como farsa

Passamos a seguir a momentos de humor a propósito do falhanço estrondoso dos chamados pequenos partidos. Os fervorosos defensores da prática do voto como ritual aconselham os abstencionistas, incompatibilizados com os grandes partidos, a votar nos pequenos partidos. O voto, em democracia de mercado é um instrumento de natureza política que se usa ou não consoante as circunstâncias; se serve para mudar alguma coisa e se os candidatos surgem num processo democrático e não designados por oligarquias. O voto, nas atuais circunstâncias é como uma pomada para o reumatismo; de pouco serve para tratar pneumonias.

·      Começamos pelo Livre. Muita gente percebeu que Rui Tavares se preparava para se entregar, ele e os votos no Livre, ao António Costa, numa de emprego que ele já tinha praticado em Estrasburgo, para manter uma paga interessante depois de se zangar com o Louçã.

A união das esquerdas – onde Tavares inclui o PS, demonstrando ter estudado mal o século XX na universidade – é, para muita gente de fé, um desígnio caro mas, tão longínquo como ganhar um Audi nos concursos das faturas. Ora, Tavares arrogou-se ao papel de árbitro agregador das ditas esquerdas, que naturalmente se borrifaram nele, tal como aconteceu com o eleitorado.

Há muito se percebia que Tavares e Ana Drago apostavam numa presença em S. Bento que lhes desse uma vida excitante e agradável, sobretudo se fossem necessários para dar uma maioria governamental ao PS, com integração a médio prazo no mesmo. Não perdemos a oportunidade de relembrar este momento de glória…


Neste clube de estrelas, para além de Ana Drago, ressabiada por Louçã a ter preterido a favor de Catarina Martins como sucessora, conta-se Viriato Marques, André Freire ou Ricardo Araújo Pereira que demonstraram uma inépcia política imensa ao aderirem a um projeto como o Livre; no caso do último, que prezamos, admitimos ter sido mais uma forma de fazer humor. Outros, porém, só confirmaram uma ligeireza política já vinda de longe, como o Boaventura, o Castro Caldas e o José Reis. E poderíamos referir também Ricardo Sá Fernandes, advogado de negócios e monitor do mano Zé (o que fazia falta) e o manhoso Carvalho da Silva que se manteve discreto para não estar na fotografia do desaire. Na universidade, em tempos neoliberais, confirma-se que nela se desenvolvem todas as capacidades, inclusive a estupidez, como dizia Tchekov. Requiescat in Pace, Livre!

·      Um tal Agir partiu de um iluminado da área estalinista com vasto currículo no controlo das massas - Nuno Ramos de Almeida. Comprou um partido, saiu da direção do jornal “I”, cargo incompatível com a assumida função de pastor e agregou alguns grupos de deserdados, como o MAS (trotskista), um tal PTP e um PDA (bem conotados à direita do espetro partidário) e, ao que parece, também um rancho de fantasmas vindos da Luar, extinta nos anos 70. Sem personagens mediáticas, o Agir escolheu como emblema uma loura de verbo fácil, um género apeado de Lady Godiva do século XXI. As massas não se sensibilizaram com a vacuidade do Agir. Requiescat in Pace!

·      Garcia Pereira e seu comité central apresentaram mais um número de cópia do programa do PC em tons mais vivos, de amarelo e vermelho, esquecido o tempo em que o PC era o inimigo revisionista e traidor; a abater, no contexto da matriz estalinista deste grupo. Apesar do menor apoio da classe operária e do povo trabalhador face a 2011, como passaram dos 50000 votos terão direito a uma subvenção pública[5], um bom motivo para a continuidade e que vai valendo o esforço do papagueio de uns quantos disparates.

·      Na classe política, Marinho e Pinto, a quem alguém designou por “bastonadas”, carateriza-se como o campeão no débito de decibéis. Depois de ter utilizado o MPT como barriga de aluguer para se sentar confortavelmente em Estrasburgo, inventou um PDR e resistiu valentemente à inesperada incursão de uma seita religiosa no evento que entronizou o causídico. O Pinto preparava-se, se tivesse representantes na AR, para olhar para ambos os lados da capoeira, para ajudar o PSD ou o PS de igual modo, numa versão mais plural que o Rui Tavares, que excluía o apoio ao PSD. O advogado ao concorrer por Coimbra cumpriu a formalidade eleitoral pois, sabendo não ser eleito, tinha um bom argumento para continuar em Estrasburgo onde a mesa é mais farta.

·      Para terminar notámos que na AR, o placebo ecologista “Os Verdes” alojado desde sempre na mansão PC vai passar a ter a concorrência do PAN, à partida, mais genuíno quanto a assuntos ambientais e da inserção dos humanos no planeta do que “Os Verdes” contidos na estratégia global do PC.


Este e outros documentos em:    







[1] Trataremos deste tema na proximidade das eleições presidenciais de janeiro, no seguimento das várias abordagens que fizemos sobre a Constituição
[2]  Em abril de 2014, a polícia grega registava nos últimos quatro anos 20000 manifestações; para além de várias greves gerais. O contraste com Portugal. Em meados de maio de 2012, Varoufakis assinalava “Situação de Portugal é igual à grega mas sem resistência” (conf “O Sobressalto Grego” de Pedro Caldeira Rodrigues
[3] http://grazia-tanta.blogspot.pt/2012/01/amiseria-da-esquerda-que-anda-por-ai.html
[4] http://grazia-tanta.blogspot.pt/2012/11/os-movimentos-sociais-e-as-vigarices.html
[5]  http://www.noticiasaominuto.com/politica/463554/votos-rendem-14-milhoes-de-euros-anuais-aos-partidos

3 comentários:

  1. Excelente. Admiro-o.
    Julgo que ainda analisará mais detalhadamente a abstenção e o seu significado. Eu não partilho da opinião generalizada que os abstencionistas são uns seres superiores e iluminados , aptos a orientarem-se no escuro, ao contrário de todos os outros parvos que fazem escolhas erradas.
    Julgo que o que se passa entre os votantes é a pertença a clientelas apoiantes dos gestores da propriedade privada, os políticos.
    Os não votantes, quanto a mim, enquanto não expressarem o seu voto efectivamente - e o mais correcto seria expressar um NÃO no boletim, não saberemos a sua verdadeira intenção. Inclino-me para preguiça, indiferença, fé no sentido providencial e ignorância.
    Se aparecessem na noite de 4 do 10 44% de votos inutilizados com expressões ou termos inequívocos de repúdio pelo sistema, hoje estariamos a festejar o fim deste sistema partidário e, quem sabe, o que mais.

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  2. Senhor António Erre . Recordo-lhe que para a Constituinte votaram 96 % .dos inscritos . Depois , eleição após eleição esse número tem vindo a diminuir .Na última campanha o apelo ao voto roçou , por parte de muitos , o insulto .A abstenção tem muitas e variadas causas , para mim votar significa legitimar tudo o que nos trouxe até aqui .

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  3. Nesta última eleição os nulos e brancos não chegaram a 200 mil. Se fossem 4 milhões , de certeza que ninguém teria coragem e desfaçatez para afirmar nos media que apenas os votos validamente expressos contam.

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