sábado, 24 de dezembro de 2011

O novo valor do salário mínimo nacional

O novo valor do salário mínimo nacional (SMN) entra, com pompa e circunstância, em vigor a partir de 1 de Janeiro. E, quando o robot Sócrates se apresentou com aquele seu ar imaculado, decidido, seguro e arrogante, a anunciar o novo valor do SMN, vimos-lhe espelhado na cara o lugar geométrico onde se cruzam o plano do sorriso alvar com o do riso alarve. 

Com o desprendimento próprio das boas almas, qual emanação das suas “profundas” preocupações sociais, o dito robot anunciou um aumento para o SMN de 4.4% que assim será fixado em € 403, com a promessa de o mesmo atingir os € 500 em 2011. Quantas dores de cabeça não terão tido, o governo e os seus mandantes para outorgar à plebe tão suculento bodo nataleiro !

Mas, afinal, de que se fala de substantivo, para justificar tão cuidado número mediático quando nos caiu na sopa do jantar, o tal robot e aquele cúmplice da barba branca que, se tivesse um barrete vermelho pareceria um inovador pai natal vesgo?


Benefício irrelevante para os trabalhadores

·         O “enorme” aumento corresponde a € 0.57 por dia o que representa, de outro modo, a permissão para os eternamente gratos beneficiários tomarem um café por dia. Até se poderá dizer que quem mais vai ganhar com a benesse socratóide  é ... o Nabeiro !

·         Deixam de estar indexadas ao SMN várias prestações sociais que, assim podem ter acréscimos menores do que os referidos 4,4% beneficiando assim as continhas do guarda-livros Teixeira dos Santos.

·         Só 5% dos trabalhadores recebem o SMN e não consta que haja penalizações para quem pague menos. E, por isso cheira a encenação a preocupação da CIP com as empresas que poderão fechar.

·         Fica definido que o salário efectivo possa ser 20% inferior ao SMN nos casos em que o trabalhador está no seu primeiro ano de trabalho na empresa. Naturalmente, os patrõezinhos lusos tratarão de despedir o trabalhador em devido tempo, reiniciando o processo com uma nova vítima desse “dumping”.

·         O mesmo sucede se o trabalhador não tiver curso técnico-profissional ...adequado.

·         Acrescenta-se ainda que muitos trabalhadores exercem um trabalho subordinado como se de conta de outrém se tratasse mas, são pagos como prestadores de serviços, “a recibo verde” e, como é óbvio, não há um limite mínimo para o valor de uma prestação de serviços. Para os muitos trabalhadores “a recibo verde” o novo SMN passa ao lado, não é aplicável.

·         Neste contexto, não entendemos a satisfação de alguma esquerda institucional.


Benefício suculento para os partidos políticos


Aspecto particularmente interessante e pouco glosado nos media prende-se com a relação entre o SMN e a Lei 19/2003 de 20/6, aprovada, portanto no parlatório de S. Bento e que define as regras do financiamento dos partidos, nomeadamente a partir do erário público.

·       Os partidos com lugares em S. Bento recebem anualmente 1/135 do SMN por cada voto   que tiverem recebido nas últimas eleições para deputados podendo esse subsídio ser extensível aos que tiverem mais de 50000 votos, mesmo sem elegerem ninguém.

·       Com o aumento do SMN os partidos passam a receber em 2007, € 2,985 por cada voto obtido, contra € 2,859 em 2006. Com certeza que se não trata de valores escandalosos pela dimensão do incremento mas sim, pornográficos porque coexistem com as muitas e variadas formas com que se restringem os rendimentos de trabalhadores, pensionistas e desempregados (aumentos dos preços dos transportes, da alimentação, dos cuidados de saúde, da energia…).

·       Nesse contexto, o PS irá receber, em 2007 € 7,7 milhões (+326 mil que em 2006), os confrades do PSD, € 4,9 milhões (+208 mil), o PC e o CDS cerca de € 1,2 milhões cada um (+55 e +53 mil, respectivamente) e o BE € 1 milhão (+46 mil).

·       Como se depreende, o problema do deficit justifica as dificuldades que o mandarinato impõe à multidão, com ar austero e ameaçador. Mas como o folclore pseudo-democrático é essencial para que a multidão se mantenha mansa, naturalmente que os figurantes têm de estar bem remunerados.

·       A talhe de foice, chama-se também a atenção para aquela Lei19/2003 que define mais umas quantas benesses para os partidos políticos: não sujeição a IRC, isenção do pagamento de imposto do selo, do imposto municipal de transmissões (IMT), imposto municipal sobre imóveis (IMI), imposto automóvel, IVA e também taxas de justiça e custas judiciais. Nada mau, não ?

·       Finalmente, refira-se, os financiamentos genéricos dos capitalistas aos partidos do poder, as comissões cobradas aos adjudicatários de concursos públicos, ou por favores prestados através de um despacho ou um elemento legislativo, os “trabalhos a mais” facturados por adjudicatários e consultores, obras em casa dos mandarins, participações, sob várias formas, em empreendimentos imobiliários, etc. Como é óbvio, grande parte da economia paralela ou mafiosa, em Portugal ou noutros países, passa pelos partidos do poder e, leizinhas como a citada  19/2003 mais não servem que para salvar as aparências, dar um ar de legalidade a um sistema político, na essência, corrupto e cleptocrático.

Dezembro 2006 

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