terça-feira, 13 de setembro de 2011

Para que servem as Forças Armadas?

Lutemos pela sua extinção!

1. A existência de forças armadas (FA) constitui um elemento unificador da burguesia, sacralizado e algo que os trabalhadores tendem a não discutir, muitas vezes devido à influência de um nacionalismo serôdio em tempos de unificação europeia e de desagregação dos estados-nação.

2. Exigir a extinção das FA portuguesas é uma jogada forte contra o militarismo. Denunciar o Bush e a pulsão militarista americana e esquecer a sua delegação em Portugal é uma posição de meias tintas que encobre o carácter subalterno da burguesia portuguesa e descobre as insuficiências das forças da esquerda "distraídas" face ao assunto.

3. Discute-se até à exaustão a importância da redução do deficit mesmo que isso conduza a desemprego, redução de poder de compra, aumento do IVA e dos preços dos transportes. E isso tornou-se um factor, não conjuntural mas, de estrutura, pois em seu nome se vai procedendo a uma enorme redistribuição do rendimento e à reformulação das condições de vida e dos direitos, sempre em desfavor dos trabalhadores.

Mais detalhadamente:

4. Portugal é, entre os países da Nato um dos que mais gasta com as FA - 2,3% do PIB, apenas superado pelos EUA, Turquia, Grécia, França e Inglaterra enquanto que a Espanha apenas gasta 1,2% do PIB. A existência de FA custa a cada cidadão cerca de 300 euros por ano.

5. Mais, as intenções do governo PPD/CDS, em revisão pelo executivo de Sócrates correspondem só em "investimento", a 356 M euros em aviões de transporte, 445 M em helicópteros, 382 M em blindados, 75 M em espingardas, 40 M em navios-patrulha e 973 M nos célebres submarinos. Se a isto se acrescentar despesas de funcionamento e manutenção, formação... E para quê ?

6. Desses equipamentos quase nada é produzido em Portugal que, desde há 30 anos vem reduzindo a suas indústrias da morte. Portugal não tem dimensão para uma indústria militar e não dispõe de um complexo militar industrial para o desenvolvimento de tecnologias guerreiras. Existem apenas algumas empresas (porventura já deslocalizadas para a Ásia) fabricantes de pendões, bandeiras, condecorações, galões e botões amarelos, daqueles com que a oficialidade tanto gosta de se ataviar. E as exportações de armamento existentes dirigem-se a países com regimes duvidosos e financiam negociatas cobertas pela figura do segredo de Estado.

7. Os programas de equipamento das FA portuguesas visam a viabilização das indústrias militares americana e europeias e de canalização de material obsoleto, consumíveis e sobresselentes. Desta forma, os impostos pagos pelos trabalhadores contribuem para a promoção dos lucros dessas indústrias. Todos observámos o carácter ostensivamente militarista do Portas e é de esperar que a política do governo PS nesta área (como em muitas outras) apenas se diferencie no estilo, eventualmente, menos exibicionista, do novo ministro.

8. Em 2004 foi extinto o serviço militar obrigatório, típico dos tempos de consolidação do estado-nação, substituído pela profissionalização. Isso significa a criação de uma milícia ao serviço da burguesia e do capital que se diferencia da GNR porque é mais abrangente no que se refere ao equipamento

9. A profissionalização das FA acentua o tradicional cariz reaccionário difusor do militarismo e de hábitos de "trabalho" pouco enquadráveis nas preocupações do momento sobre a produtividade nacional. Muitos oficiais superiores são adestrados em cursos-Nato para a defesa da ordem (das multinacionais e da especulação financeira), da civilização ocidental (contra a Rússia e os muçulmanos, como prega Huntington), contra o terrorismo, os esquerdistas, os imigrantes e as lutas dos trabalhadores e pelos direitos democráticos.

10. Esses oficiais enformam o SIS e os serviços de informações face aos quais qualquer cidadão pode ser um inimigo a controlar ou mesmo a abater, se conveniente como no caso da jornalista italiana no Iraque. Eles procedem ao abastecimento das bases de dados americanas e são uma ameaça permanente para os direitos democráticos, da esquerda e dos trabalhadores em geral.

11. Essas teses anti-democráticas e fascizantes manifestam-se na redução do exercício dos direitos sindicais dos trabalhadores civis e afastam qualquer hipótese de organização sindical de forças militares ou mesmo policiais. No entanto, a oficialidade reforma-se cedo, muito antes dos reais trabalhadores e muitos alistam-se como mercenários nos exércitos privados que actuam no mundo ou em empresas de segurança. A oficialidade e as FA em geral, são um foco de totalitarismo cortejado pelo poder e pela esquerda bem comportada.

12. As FA, mesmo em situações de calamidade, como no caso dos fogos florestais, são pouco utilizadas. A droga chega pelo mar e pelo ar impunemente, para distribuição na Europa e os petroleiros lavam os tanques perto da costa portuguesa. O carácter subalterno e parasitário da burguesia portuguesa (protagonizado pela banca) gera uma grande tolerância face ao tráfego e à circulação do dinheiro da droga; e para isso é preciso que militares e polícias se mostrem distraídos tal como é esterilizado em burocracia o aparelho judicial, para evitar a repressão do crime de colarinho branco.

13. Mais, no contexto geoestratégico actual, as ameaças para Portugal só podem resultar do alinhamento acrítico pelas posições americanas e da inclusão na Nato, como se verificou em Espanha em Março de 2004. As ameaças a existirem são voluntárias, resultantes da existência do poder frágil de uma burguesia inútil que, no seu miserabilismo, mesmo com os dólares do aluguer das Lajes não consegue evitar serem os Açores a mais pobre das regiões portuguesas.

14. E, do ponto de vista da História, o que têm sido as FA em Portugal ? Papel de carne para canhão em La Lys para servir os ingleses e conseguir garantir o triângulo de Quionga em Moçambique. Papel detonante na instauração do fascismo com o golpe de estado de Maio de 1926. Protagonista dos massacres de Pidgiguiti e Wiriamu, num contexto de 13 anos de guerra colonial e depois da qual ninguém foi acusado sequer de crimes contra a humanidade. E mais recentemente, o papel de auxiliar dos americanos na Bósnia ou no Iraque (aqui sob o uniforme da GNR). A única acção meritória das FA, de uma parcela minoritária dos seus quadros, melhor dizendo, foi de facto o contributo para o enterro do fascismo de origem salazarenta.

15. No âmbito da inclusão na UE, as FA portuguesas de hoje nem sequer servem para fazer golpes de estado, considerados politicamente incorrectos, uma vez que a democracia de mercado é o regime obrigatório. Até ver.

Conclusão:

16. Porque não levanta a esquerda parlamentar a questão da extinção das FA? No contexto de uma conciliação com a burguesia, parte da esquerda portuguesa, mais sentimental, ainda se sente em dívida com os militares que fizeram o 25 de Abril, esquecendo que os protagonistas já foram todos afastados e que as FA de hoje são uma corporação reaccionária, plenamente integrada nas suas funções ao serviço do capital.

17. Vamos discutir o assunto, gerar a controvérsia, abanar a modorra com que o governo de Sócrates quer adormecer as consciências. Porque não um referendo? É preciso animar a malta !

Maio 2005 

Este e outros textos em: 

http://pt.scribd.com/documents#all?sort=date&sort_direction=ascending&page=1
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
www.esquerda_desalinhada.blogs.sapo.pt

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