Sumário:
1 -
Katowice rima com aldrabice
2 - O
consumo energético no planeta (2007/17)
3 – As
capitações de consumo energético
4 - Os
futuros Katowices
Anexo 1 – As várias fontes
do consumo energético
Anexo 2 – A distribuição
espacial dos vários tipos de consumo energético
+++xxx+++
1
- Katowice rima com aldrabice
Segundo a Comissão Europeia, no período 1990/2016, no espaço
comunitário, a redução de gases com efeito de estufa foi de 22%; mas, o aumento
do PIB foi de 54%, ligeiramente acima dos 2% anuais, um ritmo que constitui a
meta que se pretende manter até… 2050! A disparidade entre a evolução das
emissões e a do PIB é grande e resulta da redução da atividade industrial, na
Europa e nos EUA, em paralelo com o fundamental contributo do impacto dos
negócios financeiros no PIB, que não estarão, entre as entidades mais
agressivas no capítulo ambiental[1].
O gráfico seguinte evidencia, por consequência, que o PIB mundial retomou o seu
crescimento acelerado, depois da crise financeira, numa evolução muito mais
dinâmica do que o observado para as emissões de CO2 que se
mantiveram numa mesma evolução, ascendente e regular, que vem do passado; e que
resulta, essencialmente, das áreas não europeias ou norte-americanas, como
observaremos com maior detalhe, mais à frente.
Fonte: BP Statistical Review of World Energy 2018
De
modo mais preciso e para o caso da UE (v. figura abaixo), depois da passagem
das emissões de gás de efeito de estufa de 5716.4 M t equivalentes de CO2
em 1990 para 4451.8 M t em 2017 (menos 468 M ton/ano) pretendem-se reduções de
… 1935 M ton/ano
até 2050 até se atingir o patamar das zero emissões!
até 2050 até se atingir o patamar das zero emissões!
- Acharão que toda a indústria sairá da Europa?
- Que os transportes coletivos vão expulsar o automóvel privado? Ou que estes serão todos elétricos, com toda a energia motriz produzida a partir de fontes renováveis ou importada de fora da Europa? Ou, que a limitação da circulação automóvel, prevista para o centro De várias cidades europeias, será suficiente para tal?
- Que o intenso trânsito de camiões nas estradas europeias ou de navios nos portos vai abrandar substancialmente?
- Que o espaço aéreo vai ficar menos saturado com um afundamento da indústria turística? E que será massificada a produção de aviões baseados em energia solar?
- Será plausível que as atividades emissoras deslocalizadas mantenham o CO2 produzido concentrado em seu redor, sem se espalhar pelo planeta de modo mais ou menos uniforme, não distinguindo os espaços territoriais dos países deslocalizantes dos que receberam as atividades nocivas?
Planear irresponsavelmente nunca foi difícil, sobretudo para
quem provavelmente não assistirá à chegada do calendário a 2050. Quem lá chegar
que cuide da questão… pensarão os burocratas de Bruxelas.
Porém,
as coisas são mais complicadas do que o acima referido desempenho, previsto pela UE,
enunciado, para brilhar recentemente na cimeira de Katowice. Há um paralelismo
histórico entre a produção de energia e as emissões de CO2 (v.
figura abaixo); e a substituição de uma forma de apresentação da energia fóssil
por outra, deixa sempre na base uma produção de CO2. Pode começar-se
a cozinhar numa fogueira, passar daí a um fogareiro a petróleo, depois um outro
a gás ou elétrico que sempre haverá uma fatia de combustível libertadora de CO2;
a não ser que a energia tenha origem numa fonte renovável ou numa central… nuclear.
Fonte: BP
Statistical Review of World Energy 2018
Entretanto
massificou-se o uso irracional do automóvel pessoal, o uso do avião, as longas
viagens nas cadeias logísticas e na distribuição, em prejuízo, por exemplo, do
comboio; como se massificou a utilização de tomadas elétricas, pilhas e
baterias numa infinidade de objetos e aparelhos, na indústria, nos serviços,
nos lares, nos bolsos ou nas orelhas. No fundo, só uma parcela pequena provém
de energia hídrica, solar ou eólica… como se observará, neste texto, nos Anexos
1 e 2.
O
problema da reciclagem dessas pilhas e baterias e a raridade dos metais usados
em telemóveis e afins, cruza-se com a selvajaria e a economia do crime que rodeia
muita da sua extração, em África, o continente mais rico naqueles metais. O
combustível das centrais nucleares, sem emanarem CO2, obriga a
soluções para os resíduos radioativos, que são caras quando minimamente decentes;
ou, mais baratas, se aqueles são despejados em alguns países, contra um despejo
de moeda forte num offshore, às ordens dos oligarcas locais. Para além do encaminhamento
dos resíduos, há a considerar os casos devastadores, ainda que atípicos, de
Chernobyl ou Fukushima; e isso, a despeito de cientistas conceituados como
Lovelock entenderem que o nuclear seria uma solução excelente para a produção
de energia, uma vez que não produz efeitos de estufa.
As distintas fases de
desenvolvimento capitalista que coexistem no mundo correspondem a diferentes
patamares de consumo energético. Nos países mais ricos, a acumulação de capital
e as disponibilidades de tecnologias permitem, por um lado, investir em formas
menos poluentes de produção energética; e, ao mesmo tempo, exportar as
indústrias mais “sujas” ou, deslocalizar apenas segmentos - ou mesmo toda uma
fileira - que enforme um dado produto final, para os locais onde o trabalho
seja mais barato e as normas salariais ou ambientais menos exigentes.
Nos países pobres, as pessoas não gostam de viver com carências,
alimentares, na saúde, na educação, com menor longevidade ou, no meio de lixo e
poluição; mas gostariam de ter os bens e serviços que existem nos países mais
desenvolvidos. E, por isso, aceitam ser um misto de beneficiários e vítimas da
enviesada distribuição da produção capitalista que tem como principais
determinantes e beneficiárias as grandes multinacionais sedentas de lucros e
que delegam em oligarcas e corruptos nacionais o papel de manageiros dos seus
próprios povos, tratados como gado.
No
seguimento dessa “exportação” de lixo ou poluição, os países mais ricos podem
apresentar-se como ambientalmente mais avançados, com um alto nível de apuro
ambiental e mostrar-se muito ecológicos; e centrar-se nas áreas de negócio onde
a rotação dos capitais é mais rápida e o investimento material menor – a área
financeira e os serviços exigentes de maiores qualificações – consultadoria,
publicidade, conteúdos, gestão da informação… O seu azar é que o planeta é só
um, que as suas diversas parcelas estão integradas através de crescentes e mais
densas interligações; com a deslocalização, as emissões apenas mudam de local
do planeta onde se produzem, não alterando nada, em termos planetários.
2 - O consumo energético no planeta (2007/17)
A evolução do consumo
energético global mostra que em dez anos o seu volume aumentou 16.6%; o que
situando-se aquém do crescimento da economia global, não deixa de ser
preocupantemente elevado.
Evidencia,
porém, duas realidades bem distintas que segmentam o mundo em dois blocos
distintos. Um, composto por três conjuntos – Europa, América do Norte e ex-CEI[2]
- onde o consumo se reduz; e, uma outra realidade onde o consumo aumenta,
constituída pelos países do Médio Oriente, da América Central e do Sul, de
África e da Ásia-Pacífico, de acordo com a classificação dos países utilizada
pela BP – British Petroleum. Como é evidente, no seio de cada conjunto, há
situações distintas quanto à evolução e quanto à dimensão do consumo (ver Quadro
I). Outra abordagem interessante seria observar a correlação entre as variações
do consumo energético e as variações do rendimento; sobretudo tendo em conta os
impactos da crise financeira, a qual se manifestou de modos distintos, em
várias latitudes.
Quadro I
Consumo mundial de
energia primária (Milhões TEP – ton. equivalentes de petróleo)
|
|||||||
2007
|
2017
|
var %
|
2007
|
2017
|
var %
|
||
Mundo
|
11588,4
|
13511,2
|
16,59
|
América Norte
|
2809,5
|
2772,9
|
-1,30
|
Europa
|
2041,7
|
1969,5
|
-3,54
|
EUA
|
2320,8
|
2234,9
|
-3,70
|
Alemanha
|
331,9
|
335,1
|
0,96
|
Amér. Cent./ Sul
|
587,0
|
700,6
|
19,35
|
Espanha
|
158,6
|
138,8
|
-12,48
|
Brasil
|
229,6
|
294,4
|
28,22
|
França
|
260,2
|
237,9
|
-8,57
|
Medio Oriente
|
618,2
|
897,2
|
45,13
|
GB
|
223,1
|
191,3
|
-14,25
|
Irão
|
202,6
|
275,4
|
35,93
|
Itália
|
183,4
|
156,0
|
-14,94
|
Arabia Saudita
|
169,0
|
268,3
|
58,76
|
Noruega
|
45,9
|
47,5
|
3,49
|
África
|
346,9
|
449,5
|
29,58
|
Polónia
|
95,7
|
102,1
|
6,69
|
Africa do Sul
|
116,9
|
120,6
|
3,17
|
Portugal
|
25,4
|
26,4
|
3,94
|
Asia-Pacífico
|
4195,2
|
5743,6
|
36,91
|
Rep Checa
|
45,4
|
41,6
|
-8,37
|
China
|
2150,3
|
3132,2
|
45,66
|
Suécia
|
54
|
54,4
|
0,74
|
India
|
450,4
|
753,7
|
67,34
|
Turquia
|
100,4
|
157,7
|
57,07
|
Japão
|
524,4
|
456,4
|
-12,97
|
Antiga CEI*
|
989,8
|
978,0
|
-1,19
|
Coreia do Sul
|
236,7
|
295,9
|
25,01
|
Russia
|
673,1
|
698,3
|
3,74
|
* Comunidade de
Estados Independentes
|
Fonte:
BP Statistical Review of World Energy 2018
Entre os países europeus
selecionados, observam-se quebras significativas na Grã-Bretanha, na Itália e
em Espanha mas um forte incremento na Turquia que mostra uma evolução com um
perfil mais próximo dos seus vizinhos a sul, no Médio Oriente. Na América do
Norte a quebra do consumo é marcada pela relevância regional dos EUA. Na ex-CEI
observa-se uma quebra que constitui o saldo do aumento do consumo russo
comparado com a grande redução registada na Ucrânia (cerca de 40%).
Em termos de aumentos de
consumo sublinham-se os casos da América Central e do Sul, do Médio Oriente e
da Ásia-Pacífico. No primeiro caso destaca-se o Brasil e quanto ao Médio
Oriente, as grandes potências produtoras de petróleo e gás são também enormes
consumidores, sobretudo a Arábia Saudita, cujo consumo global é próximo do
iraniano ainda que com uma população três vezes inferior. Finalmente, na
Ásia-Pacífico apresentam-se fortes crescimentos de consumo inerentes à
caminhada da região como principal polo de dinamismo da economia global; nessa
região, duas das economias mais capitalizadas – Japão e Coreia do Sul – mostram
direções antagónicas no capítulo da evolução do consumo energético. Ainda no
que respeita ao Japão é interessante notar-se o decrescimento de 90 % na
energia nuclear (para além do petróleo), como efeito do desastre de Fukushima,
compensados parcialmente com um maior uso de gás e do recurso a energias renováveis.
A Índia, no quadro acima, é o país com maior crescimento do consumo; no
entanto, o seu consumo global situa-se próximo da quarta parte do consumo
chinês, embora as suas respetivas populações tenham quantitativos próximos.
Note-se ainda que a
China é o maior consumidor mundial de energia e responsável por cerca de metade
do aumento do consumo mundial verificado entre 2007 e 2017. Enfim, o mundo é a
cores mas, do ponto de vista do consumo energético global e do subsequente
impacto ambiental, as tonalidades apresentam-se escurecidas.
Assim, como os valores
globais demonstram, através do crescimento de 16.6% do consumo energético no
período 2007/17, esse aumento é uma síntese de vários elementos, atuando em
sentidos distintos e com causas diversas:
·
Um desses elementos aplica-se aos países com um padrão de
desenvolvimento capitalista que podemos designar por maduro. Trata-se ali de
uma desindustrialização cujo início se pode colocar na segunda metade dos anos
70, após o grande aumento do preço do petróleo; daí resultou uma concentração
da atividade económica nas áreas dos serviços e das finanças, em regra menos
energívoras. Porém, a densidade das trocas e a vulgarização da mobilidade
pessoal em veículo próprio joga em sentido contrário;
·
Essas alterações na estrutura industrial – quantitativa e
qualitativa – nos países ricos corresponderam à deslocalização de setores de
atividade na sua totalidade, como a siderurgia ou, de componentes industriais,
por razões de ecológicas mas, sobretudo, para onde os danos ambientais são
menos valorizados, os preços do trabalho mais baixos, as normas laborais menos
exigentes e os regimes políticos mais intratáveis face a reivindicações dos
trabalhadores;
·
Em termos globais, essa deslocalização não tem grandes impactos
no consumo energético ao nível da produção mas, como aumenta em muito a
distância entre a produção e a utilização final, promove um substancial aumento
da utilização das redes logísticas e de transporte, com o consequente acréscimo
de emanações nocivas. Assim, no quadro acima, as reduções observadas nos países
ricos terão de ser desvalorizadas tendo em conta que correspondem a parcela dos
aumentos registados nas periferias; pouco se alterando a situação global;
·
Os países com rendimentos elevados ou médios atravessaram uma
década de baixo desempenho das suas economias, na sequência da crise financeira
simbolicamente iniciada com a derrocada do Lehman Brothers. E isso, teve um
natural impacto negativo no consumo energético;
·
A preocupação pelos impactos da atividade económica e doméstica
no meio ambiente desenvolveu-se muito nas últimas décadas, com medidas que
focaram a poluição industrial, os lixos, a contaminação de águas e solos, o
perigo do nuclear, as emanações dos veículos, com a produção de equipamentos industriais
e domésticos com menores consumos. A massificação dos veículos elétricos durará
algumas décadas porque os rendimentos familiares estão condicionados pela
compressão salarial e pela punção fiscal e, continuando os veículos a consumir
energia, qualquer que ela seja, terá de ser produzida algures;
·
Tendo em conta que o ambiente é global e não reconhece
fronteiras estatais, as transferências de atividades económicas mais
consumidoras de energia por unidade de produto, dos países ricos para as
periferias, não admitem que mandarins e ecologistas de pacotilha se apresentam
como campeões na defesa do ambiente, visando um menor impacto ambiental; este,
globalmente é apenas transferido de lugar, é falso em substância ou mesmo,
aumentado;
·
Muitos dos novos países “industrializados”, além da herança de
desestruturação económica e social oriunda da colonização ocidental incorporam,
muitos deles, um conjunto de retalhos industriais, não integrados entre si mas antes,
nas cadeias logísticas das multinacionais; e como os rendimentos não são
elevados ou melhor, são claramente abaixo dos vigentes nos países ricos, faltam
recursos para evitar a pobreza, para uma utilização mais racional do consumo de
energia ou para produzirem custos ambientais aceitáveis;
·
Por seu turno, as classes políticas dos países periféricos,
tornando-se mandatários das transnacionais e propagandistas dos modelos
consumistas das sociedades ocidentais, pretendem conciliar o aumento das suas
rendas e a manutenção no poder, com a elevação dos níveis de vida das suas
(crescentes) populações; um equilíbrio difícil no âmbito do qual a eficiência
do consumo energético e a qualidade do ambiente ficam prejudicados;
3 – As capitações de
consumo energético
O consumo bruto de
energia em cada país ou conjunto de países apresentado no quadro anterior ganha
maior significado se se conhecer o valor médio desse consumo por habitante,
medido em TEP. Nesse contexto, é possível avaliar a pegada energética e as
diferenças na sua dimensão para vários países. (ver Quadro 2)
TEP/hab Quadro
2
2007
|
2017
|
2007
|
2017
|
||
Mundo
|
1,7
|
1,8
|
Turquia
|
1,4
|
2,0
|
Europa
|
3,4
|
3,3
|
Rússia
|
4,7
|
4,8
|
Alemanha
|
4,1
|
4,1
|
EUA
|
7,4
|
6,9
|
Espanha
|
3,4
|
3,0
|
Brasil
|
1,2
|
1,4
|
França
|
4,0
|
3,6
|
Irão
|
2,7
|
3,4
|
GB
|
3,5
|
2,9
|
Arábia Saud.
|
6,2
|
8,3
|
Itália
|
3,1
|
2,6
|
África
|
0,3
|
0,4
|
Noruega
|
9,4
|
9,0
|
Africa do Sul
|
2,2
|
2,2
|
Polonia
|
2,5
|
2,7
|
China
|
1,6
|
2,2
|
Portugal
|
2,4
|
2,5
|
India
|
0,4
|
0,6
|
Rep. Checa
|
4,3
|
3,9
|
Japão
|
4,1
|
3,6
|
Suécia
|
5,7
|
5,6
|
Coreia do Sul
|
4,7
|
5,8
|
Fonte:
BP Statistical Review of World Energy 2018
O
indicador do consumo global por habitante pouco se alterou entre os dois anos
considerados mas, esconde notáveis diferenças:
·
Entre os países considerados e com maior desenvolvimento
capitalista os indicadores mostram-se mais elevados do que a média mundial e,
na sua maioria, com um pendor decrescente;
·
Entre os países da UE considerados apenas se registam aumentos
do consumo por habitante na Polónia e em Portugal;
·
O caso de maior consumo por habitante observa-se na Noruega e
nos EUA em 2007 enquanto este último país, em 2017, é ultrapassado pela Arábia
Saudita que apresenta um notável crescimento, tal como acontece com a Coreia do
Sul;
·
A China em 2017 tornou-se o maior consumidor de energia,
ultrapassando os EUA que ocupavam essa posição dez anos antes. No entanto, a
capitação do consumo energético no país, apesar de ter crescido na década, não
passa de constituir apenas 1/3 da capitação norte-americana, em 2017;
·
São particularmente baixas as capitações de consumo energético
registadas em África e na Índia que, em conjunto, representam cerca de 1/3 da
Humanidade;
·
Em suma, o desenvolvimento capitalista tem promovido evidentes efeitos
no crescimento do consumo energético. As altas capitações dos países ditos
desenvolvidos (ou da petromonarquia saudita) tendem a constituir o exemplo a
seguir pelos países que pretendem seguir o seu modelo de desenvolvimento
capitalista. A entrada acelerada de vastas regiões, mormente da Ásia, naquele
processo, conduz ali a aumentos na capitação de consumo energético, em
contrapartida das reduções observadas nos países com estruturas capitalistas
mais antigas que tendem a reduzir os seus índices de consumo energético;
·
Essas duas tendências, de sinal contrário, poderão, a médio
prazo, cruzar-se num intervalo mais estreito, à medida que as novas tecnologias
permitam custos suficientemente baixos, acessíveis às vastas camadas sociais de
baixos rendimentos dos países ricos e às crescentes camadas médias dos países
ditos em desenvolvimento. Qual será a resultante?
4 - Os futuros
Katowices
Podem inventar mais
frequentes conclaves do tipo Katowice, onde se cruzam membros ilustres das
classes políticas nacionais, portadores de ordens emanadas das multinacionais,
para não apresentarem mais que soluções-placebo ou rematados embustes, como a
proposta da UE atrás mencionada.
Por outro lado, nem tudo se pode resolver no âmbito de atitudes
e práticas individuais conducentes a um contributo mínimo para as alterações
climáticas; sobretudo, sabendo-se que as práticas individuais estão muito
marcadas pela ideologia consumista que se apresenta como o instrumento para
atingir a felicidade. Até porque, como se viu na primeira parte deste artigo, as principais
responsabilidades do desvario ambiental cabem à indústria energética que
explora os combustíveis fósseis e à sua preocupação na contenção de
investimentos que prejudiquem a distribuição de lucros aos acionistas; uma
indústria que está bem inserida nas torres de controlo das decisões estatais.
Se a causa dos sofrimentos da Humanidade e dos danos provocados
no ambiente global é o capitalismo, em geral - e os seus promotores e
beneficiários, em particular -focar o combate nos seus nefastos efeitos pouco
ou nada resolve. É como tentar enxugar a água que inundou uma casa, sem fechar
a torneira de onde ela jorra.
É necessária uma atuação global, concertada e solidária dos
povos, sabendo-se que os capitalistas e as classes políticas tudo farão para
dividir os humanos e suprimir todos os esforços que afetam a produção de lucros
ou os seus privilégios. Pensar o contrário, é semelhante a esperar encontrar o
pai natal sentado na chaminé a descarregar o saco dos presentes.
Coloca-se a questão de uma alteração no modo de organização, de
convivência e de inter-relação entre os humanos; resultados credíveis ou
visíveis dificilmente surgirão com a presença do capitalismo numa velocidade de
cruzeiro. É da convivência humana, da reformulação dos seus objetivos de vida
que surgirão as grandes alterações nos paradigmas de construção social. O
decrescimento ou as práticas responsáveis de consumo, de per si são apenas
formas de medir a pegada da marcha do capitalismo; podem-no fazer reduzir o
ritmo da marcha mas não provocar o seu tombo no chão.
Neste contexto, é todo o edifício em que assenta o capitalismo
que deve ser posto em causa; é preciso passar da denúncia e não afunilar a ação
em soluções empacotadas em abaixo-assinados junto dos grandes poderes
económicos e políticos, na presunção de que, arrependidos, irão mudar de rumo;
ações que, na verdade, não mobilizam ninguém, para além de uma distraída
assinatura. Uma vez mais surge a vã esperança do arrependimento (inserida no
ideário cristão) por parte dos arquitetos da constante adaptação do sistema
capitalista visando a sua perenidade. No mais sagrado da sua lógica está a da
acumulação de capital e não podem ter outra, porque qualquer alternativa, seria
a sua morte; e por isso, de motu próprio, jamais mudarão algo de essencial.
Essas piedosas iniciativas podem servir de entretenimento para
muitos dos que acham poder civilizar a selvajaria capitalista, sensibilizando
os mandarins das classes políticas, procurando apoios entre aquelas. Isso não
acontece, nomeadamente com poderes tão estruturados e repletos de meios
ideológicos, materiais e financeiros para enganar, conduzir e reprimir a plebe;
sem a já referida rede rizomática que enquadra milhões de
pessoas, não se vai a lado algum.
O capitalismo pode encarar, num cenário apocalíptico, encetar
uma redução da população global para 600 M de pessoas; mas, não pode admitir
condições globais tão extremas como um caos social, com levantamentos populares
em que o próprio capitalismo se esvai junto com a água do banho. Para a
Humanidade evitar esse cenário apocalíptico, só lhe resta extinguir o actual
paradigma económico – capitalismo – e o presente modelo político de
representação, que designamos por democracia de mercado. Tudo o mais são
placebos.
Anexo 1 – As várias fontes do consumo energético
O quadro que se segue contempla
o consumo mundial de energia primária (medido em milhões de TEP – ton.
equivalentes de petróleo), repartido para cada uma das principais fontes de
energia, para os anos 2007 e 2017.
- A nível global e na década finda em 2017, todos os tipos de energia consumidos aumentaram o seu volume global excepto a energia nuclear, com fortes reduções na Alemanha, na Itália em França e na Ásia-Pacífico; aqui, na sequência do encerramento forçado de Fukushima;
- Na Europa em geral, observa-se um decréscimo do consumo de energias fósseis, sobretudo no caso do carvão, com uma particular excepção na Turquia;
- Os casos de reduções no consumo quase se restringem à Europa e à América do Norte, não se podendo medir com rigor o que resultou de medidas com objetivos de redução de emissões e o que derivou das sequelas da crise financeira;
- Na América Central e do Sul, como em África ou na Ásia, o consumo de energias fósseis apresentou, em geral, um crescimento significativo;
- Quanto às energias hidroelétrica e outras renováveis sublinha-se a sua grande progressão na Ásia-Pacifico, região que se apresenta como a principal produtora de ambas; sobretudo porque o petróleo e o gás natural não são ali muito abundantes.
PETRÓLEO
|
GÁS NATURAL
|
CARVÃO
|
|||||||
2007
|
2017
|
var %
|
2007
|
2017
|
var %
|
2007
|
2017
|
var %
|
|
Mundo
|
3939,4
|
4621,9
|
17,3
|
2652,2
|
3156
|
19,0
|
3194,5
|
3731,5
|
16,8
|
Europa
|
947,5
|
731,2
|
-1,4
|
1024,5
|
457,2
|
-7,14
|
528,9
|
296,4
|
-14,27
|
Antiga CEI*
|
203,4
|
494,1
|
157,0
|
||||||
Alemanha
|
112,5
|
119,8
|
6,5
|
74,6
|
77,5
|
3,9
|
85,7
|
71,3
|
-16,8
|
França
|
91,3
|
79,7
|
-12,7
|
38,3
|
38,5
|
0,5
|
12,3
|
9,1
|
-26,0
|
Itália
|
84,0
|
60,6
|
-27,9
|
70,0
|
62
|
-11,4
|
17,2
|
9,8
|
-43,0
|
Espanha
|
78,8
|
64,8
|
-17,8
|
31,6
|
27,5
|
-13,0
|
20,2
|
13,4
|
-33,7
|
Grã-Bretanha
|
79,2
|
76,3
|
-3,7
|
81,8
|
67,7
|
-17,2
|
38,2
|
9,0
|
-76,4
|
Rússia
|
126,2
|
153
|
21,2
|
383,1
|
365,2
|
-4,7
|
93,5
|
92,3
|
-1,3
|
Turquia
|
30,5
|
48,8
|
60,0
|
31,6
|
44,4
|
40,5
|
31,0
|
44,6
|
43,9
|
América Norte
|
1134,5
|
1108,6
|
-2,3
|
739,3
|
810,7
|
9,7
|
614,6
|
363,8
|
-40,8
|
América C /Sul
|
260,0
|
318,8
|
22,6
|
124,1
|
149,1
|
20,1
|
22,5
|
32,7
|
45,3
|
Médio Oriente
|
290,1
|
420,0
|
44,8
|
273
|
461,3
|
69,0
|
9,3
|
8,5
|
-8,6
|
África
|
129,9
|
196,3
|
51,1
|
80,3
|
121,9
|
51,8
|
105,7
|
93,1
|
-11,9
|
Asia-Pacífico
|
1177,4
|
1643,4
|
39,6
|
411,2
|
661,8
|
60,9
|
1913,5
|
2780,0
|
45,3
|
NUCLEAR
|
HIDROELÉTRICA
|
RENOVÁVEIS
|
|||||
2007
|
2017
|
var %
|
2007
|
2017
|
var %
|
2017
|
|
Mundo
|
622,5
|
596,4
|
-4,2
|
695,8
|
918,6
|
32,0
|
486,8
|
Europa
|
276,4
|
192,5
|
-6,5
|
179,6
|
130,4
|
4,2
|
161,8
|
Antiga CEI*
|
65,9
|
56,7
|
0,9
|
||||
Alemanha
|
31,8
|
17,2
|
-45,9
|
4,7
|
4,5
|
-4,3
|
44,8
|
França
|
99,6
|
90,1
|
-9,5
|
13,3
|
11,1
|
-16,5
|
9,4
|
Itália
|
33,7
|
-100,0
|
7,3
|
8,2
|
12,3
|
15,5
|
|
Espanha
|
12,5
|
13,1
|
4,8
|
6,0
|
4,2
|
-30,0
|
15,7
|
UK
|
11,9
|
15,9
|
33,6
|
0,0
|
1,3
|
-
|
21,0
|
Rússia
|
36,9
|
46
|
24,7
|
40,4
|
41,5
|
2,7
|
0,3
|
Turquia
|
0
|
0
|
0,0
|
8,0
|
13,2
|
65,0
|
6,6
|
America Norte
|
215,4
|
216,1
|
0,3
|
145,6
|
164,1
|
12,7
|
109,5
|
America C /Sul
|
4,4
|
5
|
13,6
|
152,6
|
162,3
|
6,4
|
32,6
|
Medio Oriente
|
0
|
1,6
|
-
|
5,2
|
4,5
|
-13,5
|
1,4
|
África
|
3
|
3,6
|
20,0
|
22,1
|
29,1
|
31,7
|
5,5
|
Asia-Pacífico
|
123,3
|
111,7
|
-9,4
|
190,7
|
371,6
|
94,9
|
175,1
|
Fonte: BP Statistical Review of World Energy 2018
Anexo 2 – A distribuição espacial dos vários tipos de consumo
energético
Repartição das principais fontes do consumo de energia
|
||||||||
Milhóes TEP
|
PETRÓLEO(%)
|
GÁS NAT. (%)
|
CARVÃO (%)
|
|||||
2007
|
2017
|
2007
|
2017
|
2007
|
2017
|
2007
|
2017
|
|
Mundo
|
11104,4
|
13511,2
|
35,5
|
34,2
|
23,9
|
23,4
|
28,8
|
27,6
|
Europa
|
2956,9
|
1969,5
|
32,0
|
37,1
|
34,6
|
23,2
|
17,9
|
15,0
|
Antiga CEI*
|
nd
|
978,0
|
nd
|
20,8
|
nd
|
50,5
|
nd
|
16,1
|
Alemanha
|
309,3
|
335,1
|
36,4
|
35,8
|
24,1
|
23,1
|
27,7
|
21,3
|
França
|
254,8
|
237,9
|
35,8
|
33,5
|
15,0
|
16,2
|
4,8
|
3,8
|
Itália
|
212,2
|
156,1
|
39,6
|
38,8
|
33,0
|
39,7
|
8,1
|
6,3
|
Espanha
|
149,1
|
138,7
|
52,9
|
46,7
|
21,2
|
19,8
|
13,5
|
9,7
|
Grã-Bretanha
|
211,1
|
191,2
|
37,5
|
39,9
|
38,7
|
35,4
|
18,1
|
4,7
|
Rússia
|
680,1
|
698,3
|
18,6
|
21,9
|
56,3
|
52,3
|
13,7
|
13,2
|
Turquia
|
101,1
|
157,6
|
30,2
|
31,0
|
31,3
|
28,2
|
30,7
|
28,3
|
America Norte
|
2849,4
|
2772,8
|
39,8
|
40,0
|
25,9
|
29,2
|
21,6
|
13,1
|
America C /Sul
|
563,6
|
700,5
|
46,1
|
45,5
|
22,0
|
21,3
|
4,0
|
4,7
|
Medio Oriente
|
577,6
|
897,3
|
50,2
|
46,8
|
47,3
|
51,4
|
1,6
|
0,9
|
África
|
341,0
|
449,5
|
38,1
|
43,7
|
23,5
|
27,1
|
31,0
|
20,7
|
Asia-Pacífico
|
3816,1
|
5743,6
|
30,9
|
28,6
|
10,8
|
11,5
|
50,1
|
48,4
|
NUCLEAR (%)
|
HIDROELÉT. (%)
|
RENOVÁV. (%)
|
||||
2007
|
2017
|
2007
|
2017
|
2007
|
2017
|
|
Mundo
|
5,6
|
4,4
|
6,3
|
6,8
|
nd
|
3,6
|
Europa
|
9,3
|
9,8
|
6,1
|
6,6
|
nd
|
8,2
|
Antiga CEI*
|
nd
|
6,7
|
nd
|
5,8
|
nd
|
0,1
|
Alemanha
|
10,3
|
5,1
|
1,5
|
1,3
|
nd
|
13,4
|
França
|
39,1
|
37,9
|
5,2
|
4,7
|
nd
|
4,0
|
Itália
|
15,9
|
0,0
|
3,4
|
5,3
|
nd
|
9,9
|
Espanha
|
8,4
|
9,4
|
4,0
|
3,0
|
nd
|
11,3
|
Grã-Bretanha
|
5,6
|
8,3
|
0,0
|
0,7
|
nd
|
11,0
|
Rússia
|
5,4
|
6,6
|
5,9
|
5,9
|
nd
|
0,0
|
Turquia
|
0,0
|
0,0
|
7,9
|
8,4
|
nd
|
4,2
|
America Norte
|
7,6
|
7,8
|
5,1
|
5,9
|
nd
|
3,9
|
America C /Sul
|
0,8
|
0,7
|
27,1
|
23,2
|
nd
|
4,7
|
Medio Oriente
|
0,0
|
0,2
|
0,9
|
0,5
|
nd
|
0,2
|
África
|
0,9
|
0,8
|
6,5
|
6,5
|
nd
|
1,2
|
Asia-Pacífico
|
3,2
|
1,9
|
5,0
|
6,5
|
nd
|
3,0
|
Fonte: BP Statistical Review of World Energy 2018
· A utilização de combustíveis fósseis corresponde a mais de 85%
do consumo energético em 2017, sendo pouco significativa qualquer evolução
positiva que se tenha verificado desde 2007;
·
No que se refere ao petróleo, num contexto de ligeiras
alterações da sua relevância relativa global no período 2007/17, há a destacar
o aumento do seu consumo na Europa e em África, com reduções do seu papel no
Médio Oriente e na Ásia-Pacífico;
·
Quanto ao gaz natural verifica-se uma forte quebra da sua
utilização na Europa, com aumentos significativos da sua quota na América do
Norte, no Médio Oriente e em África;
·
A energia nuclear só tem relevância em alguns países da Europa e
da América do Norte;
·
O carvão, sendo o mais poluente dos combustíveis fósseis,
manteve a sua quota no consumo global. Sublinham-se as quebras do seu uso na
América do Norte e em África e que o seu principal consumo se observa na
Ásia-Pacífico;
Este e outros textos em:
[1] Os grandes bancos dos EUA, os tais “too big to fail”
distribuem 80% dos seus créditos para “investidores” em especulação e
atividades financeiras. As cascatas de títulos emitidos que na base têm
produções agrícolas, combustíveis minerais, créditos imobiliários que
enformaram desde os anos 90 os chamados produtos derivados que constituem o
grande destino desses créditos. Segundo o BIS – Bank of International
Settlements.
[2]
CEI – Comunidade de Estados Independentes, uma estrutura efémera constituída
por antigas repúblicas soviéticas
Sem comentários:
Enviar um comentário