domingo, 28 de agosto de 2022

As desigualdades entre mais pobres e menos pobres

 

Os países com grandes saldos positivos no comércio externo são a Alemanha, a China e a Rússia; os que acumulam grandes deficits são os EUA e o seu acólito Grã-Bretanha

 

As oligarquias financeiras, as classes políticas - regionais ou nacionais - e a competição comercial vão destruindo o planeta; perante a ausência e as dificuldades dos povos na superação do desastre anunciado. Talvez um dia a multidão dos humanos se liberte da estupidez nacionalista, do torniquete capitalista, se canse das corruptas classes políticas e saiba como coexistir sem preocupações com o PIB, a dívida, as fronteiras e a competição, sem forças armadas e seus arsenais. Convirá é que isso aconteça antes do planeta entrar em decadência irreversível e que o capitalismo, direta ou indiretamente, deite tudo a perder.

Os saldos comerciais

Procedemos a uma recolha para cinco anos de dados (2016/21) sobre o comércio externo de mercadorias, da maioria dos países europeus e ainda da China, da Rússia e dos EUA. Assim, para cada um dos países identificados, apurámos os principais parceiros na exportação e na importação, com o apuramento de deficits e superavits.

Os países com excedente comercial médio (milhões de dólares) nos seis anos do período (2016/21) são os seguintes, incluindo-se também no quadro, o excedente médio por ano e habitante. Os valores por habitante são baixos mas, quando multiplicados pelo volume da população, sobressai uma quantia enorme de dinheiro que, naturalmente, será gerido por capitalistas e pelas classes políticas, gestoras do aparelho de Estado, manipuladores da legislação e, sempre atentos para subtrair mais um pouco dos bolsos da população. É evidente que um excedente resultante de uma atividade assente na produção material tem um significado muito superior do que um outro onde, na contabilização do PIB, domine a produção de serviços e as habilidades do sector financeiro na criação de “valor”.


País

Superavit anual

médio

(2016/21) (M $)

$/hab

País

Superavit anual

médio

(2016/21) (M $)

$/hab

Alemanha

248.2

3.0

Itália

58.3

1.0

Bélgica

21.1

1.8

Países Baixos

65.5

3.9

China

478.8

0.3

Rep. Checa

19.1

1.7

Dinamarca

8.8

1.5

Rússia

154.6

1.1

Hungria

6.7

0.7

Suíça

36.0

4.0

Irlanda

61.8

12.4

Total

1159.0

0.6

Nos países atrás considerados e, quanto aos excedentes comerciais, sobressaem a China e a Alemanha, logo seguidos pela Rússia que, em conjunto, representam cerca de 2/3 do total do excedente relativo ao conjunto dos países destacados. Em termos de superavit anual por habitante, o país que mais se destaca é a Irlanda com $ 12.4, surgindo com um valor aparentemente irrisório, o indicador relativo à China… $ 0.3 por habitante.

O cálculo para os países com um regular deficit comercial, em todos os anos do período (2016/21) mostra uma grande diferença face aos países elencados atrás e, evidencia ainda, no quadro seguinte, quanto cabe anualmente, em média, a cada habitante.

 


País

Deficit  anual médio

(2016/21) (M $)

$/hab

País

Deficit  anual médio

(2016/21) (M $)

$/hab

Bulgária

-3.7

-0.5

Grã-Bretanha

-214.9

-19,0

Chipre

-5.7

-4.7

Grécia

-23.5

-2.3

Croácia

-10.0

-2.5

Letónia

-2.9

-1.5

Espanha

-30.7

-0.7

Lituânia

-2.3

-0.8

EUA

-947.6

-2.9

Malta

-3.4

-8.5

Estónia

-1,7

-1.3

Portugal

-18.7

-1.9

Finlândia

-2.9

-0.5

Roménia

-19.0

-1,0

França

-94.1

-1.4

Total

-1381.1

-2.4

Na sua maioria, trata-se de países de pequena dimensão demográfica e económica. Sobressai, claramente, o deficit anual médio dos EUA, com um valor cerca do dobro do superavit chinês durante o mesmo período, seguindo-se a Grã-Bretanha, o segundo maior desequilíbrio, com um deficit acumulado de $ 1289 M em seis anos. De modo mais preciso, os EUA, a despeito do seu potencial tecnológico, apresentam a balança comercial mais desequilibrada, entre todos os países considerados. Nenhum país poderia contrair empréstimos para colmatar tamanhos deficits; porém, os EUA, como emissores incontrolados e incontroláveis da sua moeda – que sabem ser aceite na generalidade – espalham a sua moeda pelo mundo, confiantes de que o resto do mundo não vai entregar dólares à Reserva Federal e, menos ainda, reclamar parte do ouro em Fort Knox; de facto, os EUA são totalmente insolventes.

As transações e pagamentos feitos na Ásia – mais ou menos no seio da Organização de Cooperação de Xangai - vão-se processando nas suas moedas próprias, sem intervenção do dólar, como se assistiu, recentemente, na sequência da guerra na Ucrânia.

A soma dos deficits dos EUA e da Grã-Bretanha em 2016/21 foi de $ 6974 milhões, um valor que quase corresponde ao total dos excedentes revelados pelo grupo de países com superavits comerciais ($ 6954 milhões). Enquanto a maioria dos países procura tanto quanto possível gerar um superavit – o correspondente a uma poupança – o neoliberalismo descabelado e agressivo do binómio EUA/GB, apresenta deficits enormes que se situam fora das preocupações do FMI. A arrogância associada às taras imperiais está bem espelhada na incapacidade de Biden e do recentemente apeado, Boris.

A França surge, em seguida, com um deficit global acumulado muito acima do observado por Espanha, Portugal Roménia e Grécia; no entanto, quando se focam os valores do deficit em $/hab, os casos mais relevantes são os de Malta e Chipre. Uma comparação entre os países ibéricos mostra uma clara diferenciação entre ambos.

Como dissemos, o volume de dólares em circulação tem pouco a ver com a produção de bens e serviços e, de facto ancora-se na especulação financeira; o sistema financeiro dinheiro abundantemente e em cada momento. Há poucos anos, os valores ancorados na bolsa de Nova York e no NASDAK representavam 46% do total das bolsas mundiais e, as principais empresas americanas de referência (Microsoft, Apple, Amazon, Alphabet e Facebook) eram avaliadas na revista Fortune em $ 5,444 biliões (um bilião, na norma maioritária na Europa corresponde a 1*10^12).

O terceiro grupo de países, exceptuando a Polónia, é constituído por países de pouca população, três dos quais com um grau elevado de riqueza – Áustria, Luxemburgo e Suécia. Neste conjunto heterogéneo, os resultados líquidos têm pouco significado excepto no caso da Áustria que em 2017 evidenciou um superavit distanciado dos deficits observados nos outros anos em apreço; e, refira-se ainda, um centro financeiro chamado Luxemburgo que só em 2016 mostrou um superavit comercial externo.

 


País

Deficit/superavit  anual médio

(2016/21) (M $)

$/hab

País

Deficit/superavit    anual médio

(2016/21) (M $)

$/hab

Áustria

8.8

5.8

Luxemburgo

-6.4

-64,1

Eslováquia

0.7

0.9

Polónia

-1.3

-0.2

Eslovénia

-0.1

-0.3

Suécia

0.6

0.3

 

Para todos os países considerados, vamos observar as respetivas dinâmicas, entre 2016 e 2021, no âmbito da globalidade das suas relações comerciais. Os indicadores que se apresentam em seguida mostram as situações de países com superavit comercial em todos os anos do período referido (valores em US $ 10^6).

 

 

 

2016

2017

2018

2019

2020

2021

2016/21

Alemanha

276

280

271

251

207

205

1489

China

530

431

359

430

535

588

2873

Bélgica

19

20

14

19

24

31

127

Dinamarca

10

9

7

13

10

3

53

Hungria

11

9

7

5

7

2

40

P. Baixos

60

66

67

62

67

71

393

Irlanda

50

44

57

69

81

70

371

Suíça

33

30

31

37

28

57

216

Itália

55

54

46

63

72

59

350

Rep Checa

20

19

18

20

21

17

114

Rússia

103

130

211

179

105

199

928

 

1167

1093

1087

1146

1157

1303

6954

Descortina-se, neste conjunto, a elevada dimensão do superavit chinês e, num plano inferior, os indicadores positivos da Alemanha e da Rússia; mais modestos são os valores associados aos Países Baixos, à Irlanda e à Itália.

Os valores associados aos países com deficits persistentes são muito díspares, com destaque para os indicadores dos EUA e muito mais atrás, para a Grã-Bretanha, com a França num terceiro posto; qualquer deles com uma clara progressão durante o período. França e Grã-Bretanha mostram valores muito distintos, embora com volumes de população pouco diferentes. Num terceiro escalão de valores, destacam-se – Espanha, Grécia, Roménia e Portugal, ainda que sejam distintos os graus de riqueza entre a Espanha e os restantes citados.

             

 

2016

2017

2018

2019

2020

2021

2016/21

Bulgária

-2

-3

-4

-4

-3

-6

-22

Chipre

-5

-6

-6

-6

-6

-6

-34

Croácia

-8

-9

-11

-11

-10

-12

-60

Espanha

-19

-30

-45

-38

-18

-35

-184

EUA

-798

-859

-943

-921

-982

-1183

-5686

Estónia

-2

-2

-2

-2

-1

-2

-10

Finlândia

-3

-3

-3

-1

-3

-5

-17

França

-69

-86

-96

-87

-93

-132

-565

Grécia

-20

-23

-26

-24

-20

-28

-141

Letónia

-2

-3

-4

-3

-2

-3

-17

Lituânia

-2

-2

-3

-3

-1

-4

-14

Malta

-3

-3

-4

-4

-3

-4

-21

Portugal

-13

-17

-21

-22

-16

-23

-112

Roménia

-11

-15

-18

-20

-21

-29

-114

Grã-Bretanha

-225

-199

-181

-224

-238

-222

-1289


-1182

-1258

1367

-1371

-1417

-1692

-8287

Os países selecionados que se seguem têm pouca relevância, bem como os resultados das suas balanças comerciais. A Áustria tem um valor acumulado enganador porquanto ele resulta do resultado de um único ano. O Luxemburgo tem uma balança comercial negativa, o que nada tem a ver com o papel que o país desenvolve na área financeira. Quanto aos restantes países os saldos, positivos ou negativos, têm pouco significado.

 


2016

2017

2018

2019

2020

2021

2016/21

Áustria

-5

92

-9

-6

-3

-16

53

Eslováquia

2

2

0

-1

2

0

4

Eslovénia

1

1

0

-1

1

-3

-1

Luxemburgo

4

-10

-8

-8

-7

-9

-38

Polónia

8

3

-6

5

0

-18

-8

Suécia

-1

-1

-4

2

5

3

3


8

88

-26

-9

-3

-44

14










 Para cada um dos (32) países considerados apurámos quais se apresentam entre os principais cinco clientes; e tomámos em conta apenas alguns exemplos de uma matriz muito complexa de relações comerciais.

A Alemanha, apresenta como seus primeiros clientes, países como Áustria, Bélgica, Bulgária, Eslováquia, Dinamarca, Eslovénia, Finlândia, França, Hungria, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Polónia, República Checa e Roménia; nos segundos lugares posicionam-se países como Espanha, Grã-Bretanha, Grécia, Suécia e Suíça. Esta situação evidencia o relevante papel do país no seio europeu; o que não esconde a irrelevância europeia no plano global.

Os outros países europeus apresentam-se muito distanciados daquele papel cimeiro desempenhado pela Alemanha no comércio comunitário e não só. A Itália mostra o seu papel comercial dominante perante a Grã-Bretanha; a França é o maior cliente da Espanha; a Grécia tem como importador mais relevante a Itália, entre outras relações bilaterais

No caso dos EUA, os seus principais clientes são o Canadá, o México, a China, o Japão e a Coreia do Sul[1]… evidenciando o papel secundário que a Europa desempenha no plano global. E, dessa situação, resulta que os EUA são pouco afetados pela conjuntura europeia, que não para tornar a Europa – e a UE em particular - como peão, como auxiliar na estratégia global do Pentágono.

Sabe-se que o Pentágono é uma instituição marcante para um país que se pretende como hegemónico e que dá à força armada um papel essencial de intervenção; e isso, onde seja tomado como importante para firmar negócios, impor regras comerciais, fomentar guerras, corromper políticos ou, conter rivais, semeando bases militares um pouco por toda a parte.

 (continua)

Este e outros textos em:

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[1] Comércio internacional – quem ganha e quem perde

 https://grazia-tanta.blogspot.com/2019/03/comercio-internacional-quem-ganha-e.html

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