Os
resultados das eleições para o Parlamento Europeu demonstram apenas um
exercício de legitimação do poder do capital financeiro e da austeridade.
Sumário
1
- A UE, versão para adultos
2
- A romaria europeia de maio
3
– Avaliação histórica das romarias em terras lusitanas
3.1 – Avaliação global
3.2 – Distribuição pelas cadeiras de
Estrasburgo
3.3 – As votações partidárias
4
– À guisa de conclusão
++++++++++ !! ++++++++++
1
- A UE, versão para adultos
Não
é uma união mas uma prisão. Não é europeia mas do capital financeiro global.
Uma burla desastrosa e genocida.
Entende-se
como evidente a existência de grandes desigualdades na UE, à qual
impropriamente se designa por Europa, como se os outros estados tivessem
perdido a sua localização geográfica, por estarem fora da UE. E, como vamos
assistindo, parece que a Ucrânia, sendo geograficamente Europa não o será ainda
totalmente enquanto não tiver a sua estrela plantada na bandeira azul. Essa abusiva
designação disfarça mal o pendor hegemónico do grande capital, desejoso de
dominar a bacia mediterrânica e as margens do mar Negro.
Na
UE podem desenhar-se, um centro de poder polarizado num triângulo que tem
vértices em Londres, Berlim e Milão e duas periferias, uma a Leste e outra a Sul
onde, por comodidade, incluímos a Irlanda. As periferias correspondem a áreas
de produção de bens e serviços que nada têm de relação com as necessidades dos
seus povos mas antes, com a segmentação da produção orientada a partir do
Centro, de acordo com os interesses do capital financeiro e das multinacionais.
Neste contexto, as economias periféricas vão perdendo o que ainda tiverem de
articulação interna entre as suas atividades económicas para se tornarem objeto
da “especialização” ditada pelo mercado, isto é, pelo poder sediado no Centro.
É ainda neste contexto que Portugal, por exemplo, se vem desindustrializando e
orientando para o mercado turístico, como produtor de têxteis e calçado ou como
terreno para a profusão do eucalipto, enquanto a Alemanha se vocaciona para a
produção de material de transporte (automóveis, locomotivas, material de
guerra, produtos químicos).
Esta
segmentação promove uma grande desigualdade na geração de rendimentos, deficits
comerciais nas periferias e superavits no Centro, onde se acumulam capitais
ávidos de uma colocação rentável. E daí o fornecimento pelos bancos do Centro,
de crédito aos bancos das periferias, para estes se encarregarem de encontrar
formas de colocação no financiamento de empresas e famílias, que paguem os
juros aos financiadores do Centro e ofereçam ainda margens de lucro para os
bancos das periferias. A integração numa mesma área económica, financeira e
monetária (como para os países onde vigora o euro) facilita esses fluxos: de empréstimos
do Centro para as periferias, reembolsos e juros das periferias para o Centro.
Como a aplicação desses capitais nas periferias terá de ter, forçosamente, em
conta a divisão de trabalho no seio da UE, aquele financiamento vai privilegiar
sectores virados para o consumo interno, para desenvolver bolhas imobiliárias
ou de obras públicas de utilidade duvidosa. Os Estados nacionais, como
departamentos do capital financeiro, dominados por classes políticas mafiosas,
entram nesta dança, endividam-se e quando a ressaca chega, está aberto o
caminho para um longo calvário de austeridade.
As
desigualdades daí resultantes geram dependências e subalternidades, grandes
diferenças salariais e na qualidade de vida, longe das promessas que pareciam
concretizáveis, sobretudo a partir das entradas massivas de fundos
comunitários, de uma homogeneidade de bem-estar para todos os povos
comunitários e que se demonstra ter sido publicidade enganosa para os povos das
periferias, como também para muitos milhões de trabalhadores dos países do
Centro.
2
- A romaria europeia de maio
As
recentes eleições para o Parlamento Europeu (PE) evidenciam várias
sensibilidades perante o fracasso (para os povos) do projeto da UE. Por um
lado, não é demonstrável que o PE tenha grande impacto na vida das pessoas; por
outro, é claramente perceptível que o PE é dominado por um cartel de partidos
de direita (PPE – Partido Popular Europeu e S&D – Socialistas e Democratas)
que engloba, naturalmente em posição subalterna e de obediência, os nossos bem
conhecidos institutos de tráfico de influências que as pessoas bem-educadas aqui
designam por “arco da governação”; para cúmulo, assistiremos à nomeação do novo
presidente da Comissão Europeia que será objeto de uma validação obediente pelo
PE, uma vez colocada fora de causa qualquer eleição direta pela população da
UE, que não para a palhaçada do PE. Como acontece com os parlamentos nacionais,
o PE é uma encenação, um género de teatro de marionetas, um biombo de negócios
escusos; e por isso defendemos a não votação ou a utilização de votos em branco
ou anulados, como forma de protesto e recusa da legitimação do statu quo[1].
Um
número crescente de pessoas na UE mostra desafeição face às fórmulas antidemocráticas
que caraterizam as instituições comunitárias e essa desafeição tende a crescer
onde maior é a degradação de condições materiais de vida; e daí, resultaram aumentos
no abstencionismo, nos nacionalismos ou novos projetos que geraram esperança
nas pessoas – Grécia, Espanha.
Vamos
tomar como indicador as taxas de participação eleitoral (que incluem escolhas
partidárias como também votos nulos e brancos) de onde se consegue, por
exclusão, obter a dimensão da abstenção; não são consideradas na informação da
UE sobre as eleições, o volume dos votos nulos ou em branco. Estes últimos, por
exemplo, na Bélgica e em Espanha correspondem, respetivamente a 6.1% e 4% dos
votos expressos; isto é, o volume das pessoas com uma bem expressa rejeição do
sistema é ocultada, as suas opções são escondidas na cave.
A
participação eleitoral, para o conjunto da UE tem vindo a reduzir-se desde o
início (1979), estabilizando este ano, face à eleição anterior, em 2009. Isso
revela, o gradual descrédito que a UE tem ganho junto dos povos e o aumento da
consciência de que o PE é um brinquedo e, demasiado caro.
1979
|
1984
|
1989
|
1994
|
1999
|
2004
|
2009
|
2014
|
62,0
|
59,0
|
58,4
|
56,7
|
49,5
|
45,5
|
43,0
|
43,1
|
Na
periferia Sul, em nove países, a participação eleitoral em 2014 só cresceu em
três. Na Grécia, a situação catastrófica do país e o desmoronamento da votação
na direita tradicional, conduziu a uma maior esperança numa mudança, em torno
do Syriza[2];
convém recordar que na Grécia, como em Chipre, está instituído o voto
obrigatório. Em Espanha, a participação teve um ligeiro aumento, para o qual
terá contribuído o apoio catalão aos partidos independentistas e ao surgimento
do Podemos. O terceiro caso de aumento registou-se na recente aderente Croácia
que, contudo, não ultrapassou os 25.1% de participação eleitoral.
Participação
eleitoral - Sul
2009
|
2014
|
Var. %
|
|
Chipre
|
59,4
|
44,0
|
-15,4
|
Croácia*
|
20,8
|
25,1
|
4,2
|
Eslovénia
|
28,3
|
21,0
|
-7,4
|
Espanha
|
44,9
|
45,9
|
1,0
|
Grécia
|
52,6
|
58,2
|
5,6
|
Irlanda
|
58,6
|
51,6
|
-7,0
|
Itália
|
65,1
|
60,0
|
-5,1
|
Malta
|
78,8
|
74,8
|
-4,0
|
Portugal
|
36,8
|
34,5
|
-2,3
|
Total
UE
|
43,0
|
43,1
|
0,1
|
* 2013 e 2014 Fonte: UE
Inversamente,
sublinha-se a grande queda da participação eleitoral em Chipre na Irlanda, na
Eslovénia e na Itália, países submetidos a programas de austeridade induzidos
dos desmandos dos banqueiros. Em Portugal, no contexto da periferia sul e
apesar do desastre económico e social, a queda da participação eleitoral é
pequena, a que não estará estranho a anomia coletiva, ou o impacto dos
populismos em torno de um candidato mediático ou da defesa da saída do euro e
da UE.
Na
periferia Leste a participação é mais baixa do que no Sul, sublinhando-se os
casos da Eslováquia e da República Checa que demonstram, de modo
particularmente claro, a ausência de representatividade dos “seus” deputados
europeus. A subida da participação apenas se observa na Lituânia e na Roménia,
com variações muito distintas.
Participação eleitoral
- Leste
2009
|
2014
|
Var. %
|
|
Bulgária
|
39,0
|
35,5
|
-3,5
|
Eslováquia
|
19,6
|
13,0
|
-6,6
|
Estónia
|
43,9
|
36,4
|
-7,5
|
Hungria
|
36,3
|
28,9
|
-7,4
|
Letónia
|
53,7
|
30,0
|
-23,7
|
Lituânia
|
21,0
|
44,9
|
23,9
|
Polónia
|
24,5
|
22,7
|
-1,8
|
Rep
Checa
|
28,2
|
19,5
|
-8,7
|
Romenia
|
27,7
|
32,2
|
4,5
|
Total
UE
|
43,0
|
43,1
|
0,1
|
Fonte:
UE
Todos
os outros países mostraram um crescente desinteresse pelas eleições para o PE,
nomeadamente a Letónia, vítima de um esmagador programa de empobrecimento
subcontratado pela UE ao FMI, já que o país não pertencendo à zona euro, não
poderia colher os ‘benefícios’ da atuação do BCE.
Nos
países dominantes do conjunto comunitário a situação evidencia um quadro de
maior participação do que nas periferias, porque nenhum é vítima de planos
acelerados de empobrecimento generalizado e porque são os menos prejudicados
com as desigualdades induzidas no conjunto da UE, pelo desenvolvimento
capitalista.
As
variações negativas na Bélgica e no Luxemburgo devem ser vistas tendo em
consideração a existência de voto obrigatório, que gera elevada participação.
Note-se que a existência de obrigatoriedade no voto conduz na Bélgica a um
relativamente elevado valor de votos brancos e nulos (6.1% em 2014 contra 6.3%
em 2009). Na Áustria e na Finlândia as variações, sendo negativas, são também
negligenciáveis.
Participação
eleitoral - Centro
2009
|
2014
|
Var.
|
|
Alemanha
|
43,3
|
47,9
|
4,6
|
Austria
|
46,0
|
45,7
|
-0,3
|
Bélgica
|
90,4
|
90,0
|
-0,4
|
Dinamarca
|
59,5
|
56,4
|
-3,1
|
Finlândia
|
40,3
|
40,0
|
-0,3
|
França
|
40,6
|
43,5
|
2,9
|
GB
|
34,7
|
36,0
|
1,3
|
Holanda
|
36,8
|
37,0
|
0,3
|
Luxemburgo
|
90,8
|
90,0
|
-0,8
|
Suécia
|
45,5
|
48,8
|
3,3
|
Total
UE
|
43,0
|
43,1
|
0,1
|
Fonte: UE
A
Alemanha apresenta a maior taxa de crescimento da participação eleitoral, o que
poderá resultar da não aplicação (a partir destas eleições europeias) da regra
dos 5% como limiar mínimo para um partido poder eleger um deputado europeu. O
fim dessa regra antidemocrática, ao aumentar as possibilidades de eleição para
candidatos de pequenos partidos, terá conduzido a essa maior participação
eleitoral.
Ainda
que não definitiva, a arrumação dos novos deputados pelos grupos parlamentares
revelou um género de vaga sísmica em alguidar. A observação da distribuição dos
deputados europeus revela uma razoável continuidade em torno dos partidos
nacionais, dos siameses inscritos no PPE ou no S&D, pontualmente reforçados
pelos liberais (grupo ALDE) que se pretendem menos conservadores que o PPE mas,
também menos “avançados” que os inscritos no S&D. O ALDE constitui, na
realidade, um espaço ideológico tão vasto como o que separa duas camadas de
cebola; e daí terem passado no PE a 64 lugares, contra os 83 de cinco anos
atrás, com um forte contributo dos liberais alemães para essa descida.
As
variações do número de deputados no PE, entre 2009 e 2014, revelam a santa
aliança entre o PPE e o S&D, com maiorias constituídas, em alguns casos,
com a inclusão de outros partidos, mormente da confederação ALDE.
2009
|
2014
|
|||||
PPE
|
S&D
|
% total
|
PPE
|
S&D
|
% total
|
|
Alemanha
|
42
|
23
|
65,7
|
34
|
27
|
63,5
|
Austria
|
6
|
5
|
57,9
|
5
|
5
|
55,6
|
Bélgica
|
4
|
5
|
42,9
|
4
|
4
|
38,1
|
Bulgária
|
7
|
4
|
61,1
|
6
|
4
|
58,8
|
Chipre
|
2
|
2
|
66,7
|
2
|
2
|
66,7
|
Croácia
|
5
|
5
|
83,3
|
5
|
3
|
72,7
|
Dinamarca
|
1
|
5
|
46,2
|
1
|
3
|
30,8
|
Eslováquia
|
6
|
5
|
84,6
|
6
|
4
|
76,9
|
Eslovénia
|
4
|
2
|
75,0
|
5
|
1
|
75,0
|
Espanha
|
25
|
23
|
88,9
|
17
|
14
|
57,4
|
Estónia
|
1
|
1
|
33,3
|
1
|
1
|
33,3
|
Finlândia
|
4
|
2
|
46,2
|
3
|
2
|
38,5
|
França
|
30
|
14
|
59,5
|
20
|
13
|
44,6
|
Grã-Bretanha
*
|
27
|
13
|
54,8
|
20
|
20
|
54,8
|
Grécia**
|
7
|
8
|
68,2
|
5
|
4
|
42,9
|
Holanda
|
5
|
3
|
30,8
|
5
|
3
|
30,8
|
Hungria
|
14
|
4
|
81,8
|
12
|
4
|
76,2
|
Irlanda
|
4
|
2
|
50,0
|
4
|
36,4
|
|
Itália
|
34
|
23
|
78,1
|
17
|
31
|
65,8
|
Letónia
|
4
|
1
|
55,6
|
4
|
1
|
62,5
|
Lituânia
|
4
|
3
|
58,3
|
2
|
2
|
36,4
|
Luxemburgo
|
3
|
1
|
66,7
|
3
|
1
|
66,7
|
Malta
|
2
|
4
|
100,0
|
3
|
3
|
100,0
|
Polónia
|
28
|
7
|
68,6
|
23
|
5
|
54,9
|
Portugal
|
10
|
7
|
77,3
|
7
|
8
|
71,4
|
Rep
Checa***
|
2
|
7
|
40,9
|
7
|
4
|
52,4
|
Roménia
|
14
|
11
|
75,8
|
9
|
16
|
78,1
|
Suécia
|
5
|
6
|
55,0
|
4
|
6
|
50,0
|
Total
|
300
|
196
|
64,8
|
234
|
191
|
56,6
|
Neste
panorama, a coligação efetiva entre PPE e S&D manteve-se em 2014, apesar da
perda de deputados registada. Nos casos marcados a azul as maiorias entre os
deputados nacionais só se conseguem com o apoio dos partidos pertencentes ao
ALDE. Em 2014 surgiram mais três situações desse género na Irlanda, na Lituânia
e em França; aqui, devido ao surgimento em força da xenófoba Le Pen que retirou
muitos deputados à direita tradicional. Em contrapartida, na República Checa o
binómio PPE/S&D conseguiu alcançar a maioria, contrariamente a 2009, quando
o partido maioritário estava integrado no CRE - Conservadores e Reformistas
Europeus.
Registem-se,
contudo, alguns casos especiais. No caso da Grã-Bretanha, os conservadores não
pertencem ao PPE mas, ao CRE mais distanciado face ao projeto europeu que os
membros do PPE, que se pretendem os dirigentes máximos do chamado projeto
europeu. No quadro acima, a equiparação do CRE ao PPE para efeito da
constituição de maiorias não tem repercussões na última linha.
Salientam-se
duas situações inovadoras. Uma, em Espanha, com o surgimento do Podemos, entre
outros grupos mais pequenos de caráter autonómico e/autogestionários e de
esquerda, que produziram uma queda enorme na maioria PP/PSOE, sem contudo a suplantarem.
O caso mais revelador de uma possível e próxima mudança política, observa-se na
Grécia; em 2009, a Nova Democracia e o Pasok tinham uma vasta maioria na
representação grega no PE e que se transformou em minoria este ano (marcada no quadro a amarelo sublinhado). A grande
transformação do xadrez partidário grego tornou a esquerda detentora do maior
número de deputados, com realce para o Syriza; porém, para acentuar as
clivagens existentes há a registar a presença de três representantes dos nazis
da Aurora Dourada. A profundíssima crise económica e social tende a esfarelar
os partidos tradicionais no poder reforçando duas esquerdas, uma europeísta e
outra nacionalista mas, também a referida Aurora Dourada, não apenas
nacionalista mas também xenófoba, merecendo o epíteto de nazi.
A
acrescida presença de fascistas e fascistóides não altera a correlação de forças
no PE mas, serve para apontar aos protagonistas da abstenção, do voto nulo ou
em branco todas as acusações, idiotas na sua maioria; e de até os etiquetarem
como potenciadores da ameaça fascista, libertando as direitas europeias e os
seus banqueiros das culpas por todos os desastres que configuram o tal ‘projeto
europeu’.
A
ideia é a utilização do perigo fascista – que, contudo é real – para que os
praticantes da abstenção, do voto nulo ou em branco, sejam olhados
depreciativamente pelos seus concidadãos como despossuídos do proclamado
espírito cívico que encobre um antiquado dever patriótico. No âmbito deste
último, qualquer desempregado sentir-se-á orgulhoso perante a revelação dos
enormes lucros do compatriota Belmiro ou com o chorudo salário do Mexia,
desprezando um madrileno despejado da sua casa só porque está para além do Caia
e embora vítima da mesma política neoliberal que irmana as mafias
governamentais ibéricas. Há demasiada gente interessada em esconder o
internacionalismo no sótão para manter as pessoas comuns isoladas e divididas
em função da entidade emitente do seu cartão de identidade.
Nenhum
sistema político aprecia o desafeto da população, seja um sistema de democracia
de mercado ou de ditadura levantando-se vozes que apelam ao voto obrigatório,
para salvar as aparências. E daí que os seus agentes explícitos ou implícitos
se empenhem na quase criminalização dos protagonistas da abstenção, do voto
nulo ou em branco para aumentar o número de votos em partidos do sistema que
assim, resultará legitimado e perpetuado.
Essa
tentativa de criminalização torna-se mesmo ofensiva quando é evidente serem os
partidos tradicionais do poder que mais têm criado as condições para o
ressurgimento das taras nacionalistas, fascistas e xenófobas.
3
- Avaliação histórica das romarias em terras lusitanas
3.1 – Avaliação global
No
plano europeu, a situação em Portugal apresenta um conservadorismo entediante e
revelador da incapacidade do estagnado sistema político em apresentar qualquer
solução favorável à multidão; tal como revela o fracasso da esquerda
institucional na captação do descontentamento, em contrapartida do seu sucesso
no papel de manipulação/destruição dos movimentos sociais, obviando ou
retardando a construção de algo que remotamente se possa associar a um embrião
visível de contestação.
A
coligação no poder, ao perder agora três dos seus dez deputados europeus
assiste a um resultado medíocre do seu rival PS, também parceiro na aplicação
do memorando empobrecedor da troika,
que só acrescentou um deputado ao elenco anterior. O maior vencedor foi um
populista – Marinho Pinto – que, como criação televisiva[3], se
apresentou com um discurso contra a corrupção e o estagnante pentapartido,
captando audiência conservadora que assim, se não deslocou para o PS, no âmbito
do tradicional pêndulo eleitoral entre o PS e o PSD. No âmbito da esquerda do
sistema o facto mais marcante é a enorme queda do BE (mais uma) e algum apoio
ao discurso nacionalista do PC que lhe permitiu recuperar um terceiro deputado no
PE, perdido em 1999.
Em
27 anos de europeias a movimentação eleitoral em geral tem uma evolução que
evidencia o desinteresse popular e a redução da capacidade dos partidos
concorrentes em captar votos. Na realidade as eleições europeias constituem um
motivo para o elenco partidário se digladiar sobre questões da governação
interna, com a quase ausência da abordagem dos aspetos relativos ao cenário
europeu. No que se refere ao desinteresse com a votação nas europeias, a
situação surge mais ampliada do que a observada nas eleições autárquicas[4] ou
legislativas, como temos observado.
Sob
a designação de não integrados considera-se a abstenção, votos não expressos e
os brancos e nulos, expressos e tomados como não válidos por não indicarem unívoca
preferência entre os concorrentes. Entre estes últimos, expressos e reveladores
ostensivos de desafeição face à oferta partidária ou mesmo quanto ao sistema de
representação, têm havido escassa expressão nas eleições europeias em Portugal
mas, com uma tendência crescente, nos últimos anos. Nas últimas eleições
europeias, a soma dos votos brancos com os nulos situa-se em 2.5% dos
inscritos, um pouco mais do que o nível atingido por Marinho Pinto.
Em
termos concretos, as variações entre a primeira eleição de deputados europeus
em 1987 e a mais recente, no passado dia 25 de maio, apresenta o seguinte
perfil, que revela, de modo claro, que os protagonistas e açambarcadores do
sistema político vão atraindo cada vez menos pessoas. E se existissem
estatísticas para o voto útil, o desajustamento entre a multidão e a oferta
partidária seria bastante maior.
Variação 1987-2014
Inscritos
|
1913164
|
Votantes
|
-2356316
|
Abstenções
|
4269480
|
Brancos
|
76456
|
Nulos
|
26261
|
Votos não dirigidos
|
4372197
|
Votos em partidos
|
-2459033
|
A
variação entre inscritos e votantes entre 2009 e 2014 por distritos está
estampada no gráfico seguinte e revela que a um decréscimo global dos inscritos
de 0.4% corresponde uma redução de 7.8% dos votantes. Se, por um lado, existem
seis distritos eleitorais onde o volume de inscritos aumentou, no que se refere
aos votantes observa-se uma quebra generalizada.
No
que se refere aos votantes, o quadro abaixo apresenta o valor concreto dos
distritos eleitorais com os indicadores mais extremados de variação.
Menores
reduções
|
Maiores
reduções
|
||
Setúbal
|
-3,6%
|
Vila
Real
|
-16,9%
|
Lisboa
|
-4,4%
|
Madeira
|
-16,4%
|
Porto
|
-5,7%
|
Castelo
Branco
|
-13,8%
|
Uma
comparação da evolução (2009/2014) entre os votos dirigidos a partidos e os não
integrados (abstenções, votos nulos ou brancos) revela um crescimento de 4.1%
dos últimos e uma redução de 8.6% dos votantes em partidos.
Em
todos os distritos eleitorais há uma redução dos votos em partidos, com
particular relevo para Trás-os-Montes e os distritos fronteiriços da Beira.
Menores
reduções
|
Maiores
reduções
|
||
Setúbal
|
-3,3%
|
Madeira
|
-19,5%
|
Lisboa
|
-4,7%
|
Vila
Real
|
-18,5%
|
Porto
|
-6,6%
|
Bragança
|
-15,2%
|
Por
seu turno, na maioria dos distritos há um aumento dos não integrados e, isso
não acontece, nos distritos alentejanos e nos do interior centro ou norte, onde
se registou também um decréscimo dos eleitores inscritos, reflexo da sua
desertificação humana. Inversamente, há distritos com pequena redução de
eleitores e elevado ou médio aumento dos não integrados (Madeira e Leiria) e
outros com aumentos mais modestos (Coimbra, Santarém, Viana do Castelo e
Viseu).
Maiores
reduções
|
Maiores
aumentos
|
||
Bragança
|
-6,0%
|
Madeira
|
10.5%
|
Vila
Real
|
-6,0%
|
Faro
|
10,2%
|
Beja
|
-5,7%
|
Braga
|
8,4%
|
PCP/CDU - PCP, MDP/CDE
Outros Esquerda – PCTP/MRPP, POUS, FER,
MAS, PAN, Livre
Outros Direita – PND, PPM, MPT,
PSN, MEP, MMS, PRD, PTP, PNR, PDA, PPV
Pode
proceder-se a um exercício de avaliação das transferências de voto nas últimas
eleições, de modo agregado. Uma primeira observação é que globalmente, os
partidos da direita ou da esquerda do sistema político perderam votos para a
abstenção e para os votos brancos ou nulos.
Dá-se
como adquirido de que não foram diretamente os assuntos de política europeia os
grandes definidores do voto em 25 de maio. Mas, todos se aperceberam que o
governo funcionou como o braço obediente das instruções do capital financeiro
global veiculadas pela troika, para
mais com uma descarada criatividade no sentido de favorecer os interesses do
capitalismo luso. E daí que a atuação do governo terá sido o principal decisor
do sentido do voto; por isso se poderá dizer que em 25 de maio houve um exame
(infelizmente não eliminatório) ao governo.
Admitindo
que não há grande comunicabilidade entre as duas áreas políticas, é evidente
que os modestos ganhos do PS e, sobretudo de Marinho Pinto, beneficiam da
debandada no apoio à coligação no poder, conduzindo indiretamente, para os
incómodos de Seguro; mas, em conjunto, não tiveram argumentos para atrair uma
grande fatia dos descontentes com o dueto Passos/Portas, que terão preferido
não dirigir os seus votos a partidos, particularmente com falta de comparência registada
nos solares das urnas.
2009
|
2014
|
variação
|
|
Esquerda
|
809.960
|
764.734
|
-45.226
|
PCP
|
379.707
|
416.425
|
36.718
|
BE
|
382.011
|
149.615
|
-232.396
|
Out.
Esquerda
|
48.242
|
198.694
|
150.452
|
Direita
|
2.498.487
|
2.273.168
|
-225.319
|
PS
|
946.475
|
1.033.088
|
86.613
|
PSD/CDS
|
1.427.300
|
909.855
|
-517.445
|
Out.
Direita
|
124.712
|
330.225
|
205.513
|
No
lado esquerdo do espetro parlamentar a aritmética não é muito distinta. Há um
perdedor claro, provavelmente incapaz de conter o interesse de muitos pelo
Livre, pelo PAN e marginalmente pelo MAS ou o MRPP/PCTP, estes dois últimos seguidores
do PC na onda nacionalista, pela saída do euro e da UE. E, o PC teve um aumento
eleitoral de uns 10% suficientes para conseguir um terceiro deputado em
Estrasburgo.
3.2
– Distribuição pelas cadeiras de Estrasburgo
À
distribuição dos deputados em Estrasburgo são-lhe devidas algumas observações;
1987
|
1989
|
1994
|
1999
|
2004
|
2009
|
2014
|
|
PS
|
6
|
8
|
10
|
12
|
12
|
7
|
8
|
PSD/CDS
|
14
|
12
|
12
|
11
|
9
|
10
|
7
|
PSD
|
10
|
9
|
9
|
9
|
7
|
8
|
6
|
CDS
|
4
|
3
|
3
|
2
|
2
|
2
|
1
|
MPT
|
2
|
||||||
PRD
|
1
|
||||||
PCP
|
3
|
4
|
3
|
2
|
2
|
2
|
3
|
BE
|
1
|
3*
|
1
|
||||
Total
|
24
|
24
|
25
|
25
|
24
|
22
|
21
|
* inclui-se aqui o Rui
Tavares que, zangado com a direção do partido por
onde foi eleito, não soube apresentar a
ética suficiente para abandonar
o lugar, em vez de saltar para outro
grupo parlamentar, para garantir a
boa vida de Estrasburgo
O
PS regressou como partido mais votado, ainda que somente tenha conseguido mais
um lugar mas, beneficiando das fortes perdas do PSD/CDS.
O
conjunto PSD/CDS, ou com os seus membros em desunião de facto, teve sempre a
maioria durante o cavaquismo, só recuperando esse predomínio em 2009, em
consequência do desgaste de Sócrates no governo do país. O PSD, em 2014, tal
como o CDS apresentam o menor número de deputados de sempre, muito longe dos
tempos áureos de 1987.
Quanto
ao fenómeno televisivo MPT (leia-se Marinho Pinto team) goraram-se as nossas
expectativas de ver as suas propostas criativas no grupo parlamentar europeu
dos Verdes, sobre o aquecimento global, os efeitos de Fukushima, os
transgénicos, etc. Acaba de se encostar à direita, ao grupo dos liberais, o
ALDE, onde já militou o glorioso PSD[5]. Não
ficarão por aqui as cambalhotas do advogado.
O
PC voltou este ano a ter um terceiro deputado em Estrasburgo, o que não
acontecia há vinte anos, enquanto o BE confirmou nestas eleições os efeitos das
suas opções estratégicas, já observados nas eleições autárquicas e nas
legislativas de 2011 - centragem na atividade parlamentar, incipiente trabalho
a nível local, atitude ziguezagueante face ao PS, apoio ao candidato
presidencial de Sócrates (Alegre), incapacidade de compreender as
potencialidades dos movimentos sociais, adotando atitudes desastradas de controlo
ou, de se demarcar do PC, entre outras.
Iniciar-se-á
assim, mais um período de cinco anos em que pouco se ouvirá falar dos deputados
lusos em Estrasburgo, das suas discussões e, menos ainda dos efeitos positivos
das suas decisões; para mais que, sendo poucos e integrados em grupos
parlamentares europeus numerosos (quando não mafiosos) não lhes será dada a
oportunidade para grande brilho mediático. Têm também contra si, o facto de os
media, sabendo do caráter cosmético do PE, pouco acompanharem o que se discute
em Estrasburgo, centrando-se mais na disneylândia de S. Bento, até porque nesta
o teatro também é a forma dominante de expressão artística.
3.3
– As votações partidárias
Votação
no PS
O
PS aumentou a sua votação em todos os distritos eleitorais com uma média
nacional de 9.2%, representando esse crescimento apenas 86,8 mil votantes para
o total do país, servindo de argumento para a contestação a Seguro, em torno do
promotor de eventos publicitários, António Costa.
De
facto, o PS, a despeito da vitória eleitoral sobre um adversário enfraquecido,
obteve a sua segunda pior marca quanto ao número de eleitores e quanto à
efetiva representatividade democrática que se cifra apenas em pouco mais de um
décimo dos inscritos.
PS
|
|||
votos
|
% dirigidos
|
% inscritos
|
|
1987
|
1.267.672
|
23,1
|
16,3
|
1989
|
1.184.380
|
29,4
|
14,6
|
1994
|
1.061.560
|
36,0
|
12,4
|
1999
|
1.498.820
|
44,8
|
17,4
|
2004
|
1.517.282
|
46,6
|
17,3
|
2009
|
946.475
|
28,5
|
9,8
|
2014
|
1.033.088
|
34,0
|
10,9
|
As
razões para a contestação interna na agremiação não aconteceram há cinco anos,
no tempo de Sócrates. Este, detinha um efetivo poder sobre a seita e esta, por
outro lado, como tinha um acesso privilegiado ao pote, poucas razões tinha para
se manifestar. Agora a situação é outra, Seguro é uma pileca política que
serviu para o interregno e na perspetiva de regresso ao controlo do pote, os
barões agitam-se e querem um dos seus no trono.
Em
termos regionais, as maiores subidas verificam-se particularmente nos distritos
onde o eleitorado decresceu, na sua maioria colocados no interior. Há, porém,
casos de aumento significativo da votação no PS em distritos com crescimento de
eleitores inscritos (Açores, Faro e Setúbal).
Menores
aumentos
|
Maiores
aumentos
|
||
Porto
|
4,3%
|
Madeira
|
28,3%
|
Lisboa
|
4,3%
|
Bragança
|
21.8%
|
V.
do Castelo
|
4,9%
|
Évora
|
16,1%
|
A
representatividade do PS na população contudo, não apresenta grandes disparidades
face aos 10.9% do total dos inscritos, como se poderá observar:
Menor
representatividade
|
Maior
representatividade
|
||
Madeira
|
7,6%
|
Portalegre
|
13,9%
|
Leiria
|
8,0%
|
Cast.
Branco
|
13,9%
|
Açores
|
8,2%
|
Beja
|
12,6%
|
Votação
no PSD/CDS
A
coligação PSD/CDS constitui um agregado curioso. O primeiro comparsa precisa do
segundo para ter alguma hipótese de ganhar eleições e o segundo precisa do PSD
para existir. Cada vez mais parecem um único partido, dadas as vezes em que
aparecem juntos e a escassa diferença programática entre ambos.
Os
resultados eleitorais recentes demonstram perdas enormes na votação do dueto
PSD/CDS face a 2009 e menos de 1/3 dos votantes nas primeiras eleições
europeias, no auge do cavaquismo. Porém, esta enorme derrota, embora não tendo
repercussões favoráveis à multidão das vítimas do governo, ficou na sombra dos
resultados medíocres obtidos pelo PS, pela sua guerra intestina e, pouco
depois, pelo ruído feito pelo PSD/CDS no rescaldo das tíbias decisões do
Tribunal de Contas que, ordeiramente, esperou pelas eleições para emitir as
suas salomónicas bulas. A realidade, porém, levanta-se e impõe-se pela sua
crueza; a dívida pública aumenta, a economia sofreu nova quebra (0.7%) no
primeiro trimestre, enquanto o gang governamental prescinde da última fatia da troika, para mostrar uma cara lavada
perante os mercados, tentando aproveitar a onda de baixas taxas de juro para as
quais em nada contribuiu.
Após
a derrota de 25 de maio a coligação governamental passa a representar apenas
9.4% da população. Sabendo-se que as pessoas votaram essencialmente tendo em
mente a atuação do governo e muito menos as questões da política europeia, o
resultado eleitoral evidencia que está totalmente prejudicado o princípio da
representação. O governo não se demite, nem é demitido no âmbito dos mecanismos
que enformam a falsa democracia existente, uma vez que isso não é entendível de
imediato no âmbito de uma organização política em que os governos aprisionam a
vontade das pessoas e tomam medidas absolutamente ao arrepio dessa vontade.
Passos não sofre contestação entre as suas hostes que preferem cerrar fileiras
em torno do chefe, para garantir o acesso ao pote e a instalação no Estado, a
máquina do tráfico de influências.
PSD/CDS
|
|||
votos
|
% dirigidos
|
% inscritos
|
|
1987
|
2.980.546
|
54,2
|
38,3
|
1989
|
1.946.455
|
48,4
|
24,0
|
1994
|
1.425.962
|
48,3
|
16,6
|
1999
|
1.360.593
|
40,6
|
15,8
|
2004
|
1.133.647
|
34,8
|
13,0
|
2009
|
1.427.300
|
42,9
|
14,7
|
2014
|
909.855
|
30,0
|
9,4
|
A
abordagem dos resultados por distrito eleitoral revela a já referida quebra
global que, no caso menos desastroso, corresponde à perda de 30.5% (Leiria). É
notável a redução eleitoral na Madeira, feudo histórico do PSD, mais
especificamente do AA Jardim, bem alcunhado de Bokassa[6], pelo
seu estilo de imperadorzinho, um desaire aliás, já observado nas autárquicas de
setembro último[7].
Menores
reduções
|
Maiores
reduções
|
||
Leiria
|
-30.5%
|
Madeira
|
-57.4%
|
Braga
|
-31.5%
|
Açores
|
-43.3%
|
Aveiro
|
-33.1%
|
Cast.
Branco
|
-42.9%
|
A
representatividade da coligação a nível nacional fixou-se em 9.6% da população,
contra 15% em 2009. As diferenças entre os distritos com maior ou menor
representatividade são mais dilatadas do que no caso do PS, como resumidamente
se expõe:
Menor
representatividade
|
Maior
representatividade
|
||
Beja
|
4,1%
|
Braga
|
12,8%
|
Setúbal
|
4,9%
|
Viseu
|
12,1%
|
Açores
|
5,8%
|
Leiria
|
11,9%
|
Votação
no PC
Embora
formalmente se trate de uma coligação, é bem conhecido que o Partido Ecologista
‘Os Verdes’, parceiro habitual do PC em todas as eleições, não passa de um
expediente eleitoral criado para a captação do apoio de pessoas com relutância
em votar em algo que inclua a palavra ‘comunista’. Trata-se de um resquício de
uma prática frentista que, provavelmente, nada acrescentará em termos de votos,
dada a irrelevância política de ‘Os Verdes’, somente conhecidos pelos seus
deputados na AR. Preferimos relevar o que nos parece mais transparente.
O
PC aumentou em 9.7% os seus votos face a 2009, um pouco acima dos acréscimos
percentuais obtidos pelo PS (9.2%) não sofrendo a sua direção, minimamente,
qualquer contestação como a que logo surgiu face a Seguro; o que não admira,
quer pelos resultados obtidos, lisonjeiros, quer pela estrutura organizativa do
partido e pela disciplina que é incutida aos seus militantes.
Em
termos globais, o PC representa agora 4.4% da população, contra os 4% que
atraiu há cinco anos. Perante a dimensão da crise social e das perdas de
rendimentos e direitos por quase toda a população, os ganhos do PC são
marginais, como consequência do divórcio existente entre a população e o
sistema partidário e, pese embora a agenda populista e nacionalista do PC,
propondo a saída do euro e da UE, como reforço da habitual reivindicação da
queda dos governos e eleições, algo que para muitos é reconhecido como um
placebo para os problemas existentes.
Como
abaixo se pode observar, o PC obtém o seu melhor resultado dos últimos vinte
anos mas, muito longe dos resultados obtidos na década de oitenta.
PCP *
|
||||
nº
|
% dirigidos
|
% inscritos
|
||
1987
|
676.378
|
12,3
|
8,7
|
|
1989
|
654.659
|
16,3
|
8,1
|
|
1994
|
340.725
|
11,6
|
4,0
|
|
1999
|
358.404
|
10,7
|
4,2
|
|
2004
|
309.421
|
9,5
|
3,5
|
|
2009
|
379.707
|
11,4
|
3,9
|
|
2014
|
416.425
|
13,7
|
4,3
|
* Nas duas primeiras eleições incluímos nos
resultados obtidos pelo MDP/CDE
que ficaram muito longe de justificar a quebra de 1994
que ficaram muito longe de justificar a quebra de 1994
Na
análise regional e ao contrário da concorrência à direita que apresenta perfis
de um só tipo em todos os distritos eleitorais – o PS sobe em todos e o PSD/CDS
é, em todos, esmagado - o PC apresenta resultados eleitorais dispares. Há
situações de grandes subidas de votos (Faro, Leiria e Lisboa) e também perdas
no Alentejo, na raia a norte do Tejo e, sobretudo, na Madeira.
Maiores
reduções
|
Maiores
aumentos
|
||
Madeira
|
-39,6%
|
Faro
|
24,4%
|
Bragança
|
-10,2%
|
Leiria
|
20,1%
|
Guarda
|
-8,1%
|
Lisboa
|
19,1%
|
No
capítulo da representatividade e perante um coeficiente de 4.4% para a
totalidade do país as regiões de maior ou menor implantação do PC são as de há
muito conhecidas e exprimem as grandes desigualdades que se sabem.
Menor
representatividade
|
Maior
representatividade
|
||
Açores
|
0,8%
|
Beja
|
12,8%
|
Bragança
|
1,3%
|
Évora
|
11,8%
|
Vila
Real /Viseu
|
1,5%
|
Setúbal
|
10,3%
|
Votação
no MPT ou melhor, em Marinho Pinto
Diz-se
que o MPT foi uma barriga de aluguer para Marinho Pinto depois de habitualmente
ter surgido em coligações locais com o PSD/CDS, no âmbito das suas propostas
políticas de um ecologismo conservacionista aliado a um tradicionalismo
nacionalista.
O
MPT decuplicou a sua votação face a 2009, representado este ano 2.5% da
população inscrita para votar. O aumento dos votos do MPT em Lisboa e Porto
suplanta todos os ganhos eleitorais do PS a nível nacional, registando-se
apenas cinco distritos onde os ganhos eleitorais do PS superam os do MPT (Beja,
Bragança, Évora, Portalegre e Açores). Por outro lado, há casos em que as
perdas do PSD/CDS se acham muito próximas da soma dos ganhos do PS com os do MPT
(Beja, Évora e Setúbal) e outros em que se encontram bastante afastadas,
mormente na Madeira ou em Vila Real.
Em
termos de representatividade apresentam-se algumas disparidades no apoio a
Marinho Pinto. Suspeitamos que nenhum votante no MPT saberá o que vão fazer em
Estrasburgo os dois deputados que elegeu; e o mesmo deverá acontecer com
Marinho Pinto e o seu colega de carteira.
Menor
representatividade
|
Maior
representatividade
|
||
Açores
|
1,0%
|
Madeira
|
3,4%
|
Beja
|
1,1%
|
Porto
|
3,1%
|
Bragança
/Évora
|
1,5%
|
Aveiro/Braga
|
2,8%
|
Votação
no BE
Há
cinco anos o BE era a estrela que, fulgurante, ocupava um espaço crescente no
seio do pentapartido, superando o seu concorrente direto, o PC. A partir daí
sucederam-se os erros políticos que afugentaram parte substancial dos seus
eleitores, para os quais o BE deixou de ser novidade, mostrando-se apenas
radical na ação e conservador nas suas propostas políticas que não as
relacionadas com as questões de género, orientação sexual e adopção.
Ainda
em 2009 o BE lançou o seu apoio à candidatura presidencial de Alegre que,
depois do brilharete conseguido ao afrontar a direção do PS em 2005, se
preparava para ser o candidato de Sócrates como então apontámos[8].
Apoiar o candidato de Sócrates e zurzir no primeiro-ministro terá sido certamente
tática muito criativa mas, pouco compreendida pela plebe. Em 2010, depois de
atitudes pouco dignas de percurso, na manifestação contra a NATO o BE passou
pela vergonha de se colocar do lado da polícia e da CGTP, benzendo o cerco
policial de umas centenas de pessoas acusadas do crime de desobediência ao
cacique Carvalho da Silva ou ao seu patrono Jerónimo[9].
Em
2011 inocentemente animados pelas manifestações de 12 de março[10], o
BE tal como o PC, imaginaram uma radicalização popular que não havia, apostaram
na queda de Sócrates e recusaram-se infantilmente em falar com os funcionários
da troika. Nas eleições que se
seguiram à queda de Sócrates, o BE perdeu metade dos seus deputados enquanto o
PC, fidelizava os seus apoiantes e regressava ao primeiro posto da esquerda
institucional portuguesa.
A
partir daí, o BE manteve o seu atrativo pela cena par(a)lamentar, em condições
muito difíceis, dada a redução do número de deputados e uma sólida maioria em
torno de Passos e Portas. Adoptou uma posição tíbia e institucional sobre a
dívida, assumindo-a mais como um problema financeiro do que político, e
impulsionou a criação da IAC para veicular a defesa da “reestruturação” da
dívida, ao mesmo tempo que inventava o Congresso da Alternativas do qual nada
saiu de alternativo[11].
Para trás tinha ficado também a pouco edificante colaboração com o António
Costa na CML e a elevação ao estrelato de um idiota cognominado “O Zé que faz
falta”, em vez da procura de trabalho autárquico junto da população, cujos
reflexos se verificaram em setembro último.
Mais
recentemente, o BE animou um grupo fechado, o “Que se lixe a troika” que, em
torno de um manifesto lamecha nunca acrescentou outra proposta política para
além da reivindicação de queda do governo e eleições legislativas, um género de
trajo típico da esquerda institucional (BE, PC e afilhados), para qualquer
conjuntura. O povo percebeu bem que o PS não seria alternativa de governo que
interessasse, devido ao seu compromisso com a troika e que o memorando delimitava a economia e a política em
Portugal; e por isso, após duas manifestações multitudinárias em setembro de
2012 e março de 2013 - … sem que o governo caísse… - , o QSLT terminou sem
glória, nas escadarias de S. Bento com música (?) emitida em muitos decíbeis e
arengas ridículas emitidas do lado de dentro das grades montadas pela polícia
em torno da AR[12]. Simbolicamente, o QSLT
esteve com a polícia no espaço reservado da AR, do lado oposto aos
manifestantes.
A
participação do BE em eleições europeias cresceu substancialmente até 2009,
multiplicando por seis o resultado de 1999). Este ano, o BE situou-se aquém da
representatividade registada em 2004.
BE *
|
|||
nº
|
% dirigidos
|
% inscritos
|
|
1987
|
105.904
|
1,9
|
1,4
|
1989
|
76.792
|
2,1
|
1,0
|
1994
|
49.066
|
1,7
|
0,6
|
1999
|
62.022
|
1,9
|
0,7
|
2004
|
167.286
|
5,1
|
1,9
|
2009
|
382.011
|
11,5
|
3,9
|
2014
|
149.615
|
4,9
|
1,5
|
* Como o BE foi criado em 1999,
incluimos nos anos
anteriores os partidos que vieram a
nele confluir –
UDP, PSR, PC (R), FER e Política
XXI
Neste
contexto, o BE reduziu os 4% do eleitorado que representava em 2009 para uns
parcos 1,6% em maio último, passando de terceira força eleitoral para o quinto
lugar, ultrapassado pelo PC e pelo fenómeno Marinho Pinto. Para além dos
elementos de desgaste do partido atrás referidos, para a quebra de 232 mil
votos terá concorrido, pelo menos em parte, o surgimento do Livre com um
ideário muito próximo do BE e o MAS, criado a partir de uma cisão do BE, para
além do poder de atração do PAN, pela primeira vez em eleições europeias.
Porém, mesmo que todos os votos destes três partidos tivessem sido de
ex-votantes do BE em 2009, ainda sobrariam uns 90000 eleitores que terão
deixado de apoiar o BE, eventualmente com destino mais provável para a
abstenção, para o voto nulo ou em branco.
Quanto
às variações por distrito eleitoral elas são pesadas, com uma média 60.9% de
perdas face a 2009 e valores regionais relativamente próximos. Os resultados
obtidos nas regiões autónomas são os menos maus, os únicos com perdas inferiores
a 50%, seguidos por Coimbra, Faro, Lisboa e Porto, onde as perdas se situaram
abaixo dos 60%.
Maiores
reduções
|
Menores
reduções
|
||
Vila
Real
|
-73,6%
|
Madeira
|
-43,4%
|
Cast.
Branco
|
-70,1%
|
Açores
|
-47,6%
|
Portalegre
|
-68,3%
|
Porto
|
-57,3%
|
No
capítulo da representatividade na população em geral o BE recolheu o apoio de
1.58% das pessoas, quando havia alcançado 4% em 2009. A sua implantação
eleitoral revela algumas diferenças regionais mas, está longe das assimetrias
reveladas entre os apoiantes do PC. E revela também a sua maior ligação aos
meios urbanos, de maior rendimento e mais elevados graus de instrução.
Menor
representatividade
|
Maior
representatividade
|
||
Vila
Real
|
0,6%
|
Setúbal
|
2,1%
|
Açores/
Bragança
|
0,7%
|
Faro/Lisboa
|
2,0%
|
Viseu
|
0,9%
|
Porto
|
1,9%
|
Outras
votações
Este
ano as eleições europeias tiveram, no lado esquerdo do espetro partidário, um
elevado número de participantes. Para além dos mais mediáticos PC e BE atrás
individualizados pela sua relevância eleitoral, manteve-se o concurso habitual
do PCTP/MRPP e do POUS, com sortes distintas, como se pode observar:
1987
|
1989
|
1994
|
1999
|
2004
|
2009
|
2014
|
|
PCTP/MRPP
|
19.475
|
26.682
|
24.022
|
30.358
|
36.000
|
43.141
|
54.619
|
POUS
|
-
|
11.182
|
-
|
5.508
|
4.279
|
5.101
|
3.695
|
O
primeiro insistiu na tecla nacionalista copiada do PC, por um governo
democrático e patriótico, cujas semelhanças com um governo patriótico de
esquerda apontado pelo PC, há pelo menos quatro anos, são notórias. Ambos
defendem o abandono do euro e a saída da UE como alternativas virtuosas mas,
quanto à dívida o PCTP/MRPP defende o não pagamento – toda ela é ilegítima –
enquanto o PC aponta para a reestruturação, objetivo contraditoriamente muito
moderado para quem se mostra tão radical, contra o euro e a UE. Na realidade,
desde 1994, o PCTP/MRPP vem subindo nos resultados das europeias embora não
represeente em 2014 mais de 1.8% dos votos dirigidos a partidos e 0,6% da
população potencialmente votante.
O
PCTP/MRPP obteve sensivelmente um terço da votação do BE, ficando a sua
representação na população total com os melhores resultados relativos em Beja
(1%), seguindo-se Évora, Faro e Setúbal.
O
POUS apresentou o seu pior resultado de sempre, embora se saiba ter sido seu
intuito a campanha e não a competição eleitoral propriamente dita. Sem figuras
mediáticas e remetido a uma atividade localizada em alguns locais e sindicatos
específicos, não seria fácil um melhor resultado. Por outro lado, colocando-se
fora da ladainha da saída do euro e da UE, nem sequer arvorou a bandeira do
populismo patrioteiro.
Entre
as novidades eleitorais neste campo político, colocamos o PAN, o Livre e o MAS.
Certamente
que entre os militantes do PAN haverá quem recuse a integração do partido no
pêndulo esquerda-direita. Entendemos que as propostas do partido, centradas na
ecologia, nos direitos dos animais e da natureza, constituem temas caros a quem
tem uma visão progressista da inserção da espécie humana no planeta, que pouco
é integrada nas propostas da esquerda institucional, de cariz
trotsko-estalinista e, menos ainda, pela direita dos mercados. Embora com uma
agenda temática circunscrita – tal como os Piratas em outras latitudes – o PAN
conseguiu apoio em 0,6% da população (ligeiramente à frente do PCTP/MRPP – com
maior representatividade na Madeira (1.1% e muito próximo da votação do BE),
Lisboa, Setúbal e Faro.
O
Livre é um projeto criado à pressa para a recondução do Rui Tavares no areópago
de Estrasburgo; tudo, incluindo o arremedo assembleário foi construído com
aquele propósito. Apesar do apoio prestado à divulgação do projeto do
candidato, pelos seus amigos espalhados nos media, aquele não voltou ao PE,
apesar de uma votação lisonjeira (obteve o apoio de 0,8% da população
inscrita), aproximadamente correspondente a metade da obtida pelo BE, o antigo
hospedeiro do ex-deputado.
Consideramos
que a política é algo que exige um sentido ético irrepreensível que Tavares não
teve. Pouco importa que tenha tido divergências públicas com Louçã, do partido
que o catapultou para o estrelato, sabendo-se que só uma sorte tremenda colocou
o cronista em Estrasburgo, com imenso espanto para o próprio, conta quem
assistiu. Uma vez que foi eleito pelos apoiantes do BE e não pelos seus
próprios méritos, competia-lhe ter renunciado ao lugar e não passar para uma
bancada parlamentar da vizinhança, em Estrasburgo, obviamente, para continuar a
beneficiar das mordomias inerentes ao lugar. Com esta postura, Tavares não é
fiável, merece um enterro político, não se destacando das qualidades
evidenciadas pelos protótipos da classe política.
No
que se refere à distribuição regional dos votos, o Livre tem uma
representatividade de 1.4% em Lisboa e 0.9% em Setúbal situando-se esse
indicador inferior à média nacional em todos os outros distritos eleitorais.
Finalmente,
o MAS, constituído em 2012 a partir de duas centenas de militantes do BE,
inspirados na versão morenista do trotskismo, revelou-se uma verdadeira
desilusão para os próprios, certamente. Na decisão de abandonarem o BE terá
contribuído uma avaliação errada da movimentação social de 2011/12 que, aliás
foi objeto de tentativas de controlo por parte de alguns vanguardistas ligados
ao grupo.
Votação
da diáspora
A
avaliação do recenseamento eleitoral junto dos emigrantes é sintomática da
hipocrisia genocida do poder. Os inscritos considerados em maio eram cerca de
244 mil, uns 50 mil acima dos registados em 2009, não refletindo, portanto, as
288 mil pessoas que terão emigrado entre 2010 e 2013. Evidencia também que para
o poder, importa apenas que os emigrantes enviem dinheiro para Portugal, para
equilibrar as contas externas e municiar os depauperados cofres bancários.
Certamente que muitos dos forçados à emigração terão muitas razões para não
votar e outros, tê-lo-ão tentado mas, esbarraram com o caos que são as
delegações consulares, também vítimas dos cortes e do desprezo do gang PSD/CDS.
As
abstenções no âmbito da emigração foram da ordem dos 97.9% (!), o que ilustra
bem as esperanças dos emigrantes face à classe política. Os votos dirigidos a
partidos reduziram-se 9.1% face a 2009 e correspondem ao ‘considerável’ volume
de 4884 eleitores, onde avultarão, porventura, as burocracias diplomáticas e
consulares; daí resulta que na diáspora, o PSD/CDS tenha… ganho as eleições
europeias, com o decisivo apoio dos residentes fora da Europa.
4
– À guisa de conclusão
Formalmente,
o modelo de representação vigente é imune ao volume de participação eleitoral e
o mandarinato sente-se legitimado para a ação política autocrática que permite
o cálido encosto ao pote, qualquer que seja o nível de participação.
Essa
atitude é acima de tudo de ordem prática pois dispensa atitudes e esforços para
captação do apoio popular, para além da apresentação do produto eleitoral nos
mesmos moldes em que se publicitam sabonetes ou automóveis mas, com uma maior
margem de falsificação face à real valia do produto.
Consuma-se
assim a existência de uma clivagem profunda entre “eles” e “nós” o que
configura a razoabilidade da referência à existência de uma “classe política”
termo que agasta todo o espetro partidário e provoca pinotes de indignação
entre as suas claques; a classe política mostra-se um género de nobreza, a quem
compete a política e a gestão da res
publica, distanciada da multidão de servos, reduzida por diversos
regulamentos e práticas sociais ao imundo planeta do trabalho ou da indigência.
Como no ancien regime, esta nobreza
considera como legítima a posse de direitos próprios, tenças, mordomias, imunidades
diferenciadoras e é particularmente cuidadosa com a sua inclusão em leis de
nível superior.
No
tempo do fascismo qualquer pessoa detentora de esquerda considerava que a
democracia dita representativa interessava como forma transitória entre as
burlas eleitorais dos fascistas e a democracia “proletária”, embora se tenha
tornado claro que esta última também se veio a revelar como pouco recomendável.
Atualmente, a “civilizada” esquerda do sistema, tosco esquiço de qualquer
pensamento alternativo de sociedade, aceita e privilegia os pleitos eleitorais,
a democracia (não) representativa, a verbosidade fútil nos parlatórios, em
detrimento da defesa da democracia de base, direta ou, da autogestão, da qual
se terá esquecido, na sua senilidade. E, quais cabouqueiros da ordem
capitalista, zurzem os abstencionistas e outros que se recusam a mostrar
preferências de voto em gangs partidários.
Durante
o fascismo era, de facto, mais fácil perceber do que atualmente, a inutilidade
do voto, em eleições grosseiramente falsificadas ou restritas a uma minoria de
potenciais inscritos. A possibilidade de defesa de ideias e de crítica não conduz,
hoje, a uma perseguição policial extensiva mas seletiva, pois os sistemas
políticos atuais emitem formas mais subtis e leves de controlo social. Entre
essas formas, destacam-se uma escolaridade tecnocrática e apolítica prolongada,
uma exposição elevada à boçalidade televisiva ou a superficialidade dos media
em geral e o culto do individualismo como arma de sucesso, num contexto
competitivo de superação ou esmagamento do outro. Sendo o sucesso, em última
análise, medido pelo volume do consumo de bens e serviços, fica assim
justificada a aceitação de jornadas de trabalho mais intensivas e extensivas,
absolutamente em contradição com as capacidades dos meios de produção e de
comunicação existentes, capazes de permitir uma redução substancial da parcela da
vida dedicada ao trabalho. O consumo inveterado induz uma alegre submissão
esclavagista ao mundo da mercadoria.
Os
tópicos anteriores configuram a passagem das sociedades disciplinares para as
de controlo biopolítico e que conduzem a diferenças na configuração dos modelos
de representação que perpetuam, com normas distintas, a dominação da multidão
pela minoria capitalista e pelos seus funcionários políticos.
Em
Portugal e perante a crise económica e social em curso, já anunciada para durar
décadas; face à existência de um sistema político e um modelo de representação
criados ambos para garantir a perenidade do capitalismo dependente tradicional;
e com a impune corrupção que por aí lavra, evidenciando a domesticação do poder
judicial é, sem dúvida, de espantar a eficácia do caldo de cultura que incute a
crença ou a inocência de quem votou em partidos, sem ter nada a ganhar com a
continuidade da situação atual.
Esse
conservadorismo resulta da perigosa ausência de contestação social, de
construção política alternativa. Prefiguram-se iniciativas de faixas próximas
da decadente esquerda institucional de pendor social-democrata e europeísta
para manter morna a contestação e procurar ganhar algum alento, colando-se ao
mediático Podemos e, numa segunda linha, ao Tsipras. Esse segmento político
constitui um novelo que tem pontas soltas em Carvalho da Silva e no seu CES,
atrelado ao Boaventura, o Tavares, a Ana Drago, o Daniel Oliveira; para mais, a
guerra de chefes no PS pode fazer aproximarem-se alguns militantes que se
juntem ao projeto de criação requentada de uma social-democracia. Do lado do
PC, espera-se a continuidade da gestão sindical, recheada das rituais
manifestações que não assustam o governo, nem fornecem qualquer incentivo à
plebe, da gestão das câmaras que domina e a presença na concertação social,
para além do habitual discurso nacionalista e de apelo a eleições.
Em
Portugal, vive-se a continuidade do empobrecimento, económico e político.
Este e outros documentos em:
http://grazia-tanta.blogspot.com/
http://pt.scribd.com/profiles/documents/index/2821310
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
http://pt.scribd.com/profiles/documents/index/2821310
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
[3] Todos sabemos que através da televisão é possível
alimentar um populismo ao agrado do consumidor, capaz de vir a votar num
qualquer pato donald bem falante e que saiba tocar temas caros como a
corrupção, com tiradas que fazem agitar os traseiros alapados nos sofás.
[4] http://grazia-tanta.blogspot.pt/2013/11/autarquicas-2013-e-putrefacao-do.html
[10] O comportamento dos promotores da manifestação – M12M ou
‘Geração á Rasca’, denominações que se apressaram a registar comercialmente
- fortemente apoiados pelos media contra
Sócrates, veio a revelar-se com fortes laivos de provocação. Nunca procuraram
promover a unidade do povo contra o regime, como aconteceu em Espanha com os
organizadores do 15M; colaram-se a eventos da CGTP e à futura IAC,
provavelmente em busca de emprego; e tentaram conduzir e sabotar os esforços de
unidade em torno do 15 de Outubro para apresentar serviço.
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