Sumário
Conclusões
1 - Um princípio elementar
de solidariedade
2 – O saque de fundos e
direitos dos trabalhadores
3
– Como garantir a sustentabilidade? Um exercício
4 -
O Estado como gestor da Segurança Social é garantia de roubo institucional
5 – Com a destruição da Segurança
Social constrói-se a miséria
Conclusões
- Só há sociedades equilibradas e pessoas felizes quando a satisfação das suas necessidades é o seu principal objetivo coletivo, do qual todos os outros decorrem;
- O aumento da longevidade humana, como elemento culminante de uma vida saudável é um bem a generalizar e não a sacrificar;
- A sustentabilidade do financiamento de quantos já não podem ou devem trabalhar, depois de contributos de dezenas de anos, é um imperativo ético e civilizacional inquestionável sem qualquer direito a devaneios políticos e financeiros em seu torno;
- É variado o arsenal que o partido-estado PSD/PS e o gang Portas utiliza para roubar a Segurança Social e os trabalhadores portugueses – o factor de sustentabilidade, a sobrecarga de pensões com cortes e responsabilidades familiares, o laxismo para com empresários em dívida e a sub-declaração de salários, o desvio de fundos para cobertura de gastos públicos, a alternância entre precariedade e desemprego, a sabotagem da solidariedade inter-geracional, o sub-financiamento da CGA e, recentemente, o famigerado Gaspar decidiu desvalorizar o FEFSS, trocando lebre (ações de multinacionais) por gato (títulos de dívida pública portuguesa);
- A acumulação de riqueza efetuada desde a II Guerra, saída do esforço laboral, do enorme aumento da produtividade do trabalho, não se refletiu tanto no bem estar das pessoas, como na dimensão dos meios de produção, da propriedade capitalista em geral, da concentração de riqueza num escasso número de indivíduos e empresas e nas desigualdades daí resultantes;
- Numa sociedade onde a atividade laboral se desenvolve em função da satisfação das necessidades das pessoas, o excedente bruto de produção terá de fazer face ao valor do desgaste do equipamento, considerar as necessidades de novo investimento e fazer reverter o restante para o bem estar social, no âmbito da saúde, como na educação, nos cuidados dirigidos a crianças ou idosos, etc.
- A atividade produtiva das populações gera os meios suficientes para a reprodução da força de trabalho, como ainda para a manutenção num plano de decência de ex-trabalhadores (idosos), futuros trabalhadores (crianças e jovens) e outros (deficientes), numa lógica de solidariedade coletiva. O elemento estranho e nefasto incrustrado nas sociedades é constituido pelos capitalistas em geral e pelas classes políticas que deles emanam e que os servem;
- No actual modelo social e político e em caso de necessidade, é possível recorrer a outras fontes que não as remunerações para o reforço dos meios disponíveis pela Segurança Social – o IVA, como aliás vem sendo feito desde meados dos anos 90, a tributação do excedente líquido de exploração, o volume de vendas de empresas quase sem pessoal ou ainda de empresas sem pessoal mas elevado valor em ativos imobiliários ou gestoras de carteiras de títulos;
- As classes possidentes e os mandarins sempre tentaram criar e aperfeiçoar os modos de incutir nos “de baixo” uma cultura de aceitação da necessidade do Estado. Porém, à medida que o neoliberalismo vem acentuando a punção fiscal paga pela multidão, com contrapartidas cada vez menores, os “de baixo” vão-se apercebendo do logro;
- Os media foram promovendo mandarins e “empresários” defensores de privatizações, da excelência do serviço privado, da maior eficiência da gestão privada, incutindo na multidão uma concordância ou uma relativa indiferença perante o tema, atitudes inerentes à grande despolitização reinante;
- Com a solidariedade inter-geracional inerente à sociabilidade humana nas mãos do Estado, esse gestor coletivo dos interesses do capital, só há a esperar maus resultados, sobretudo num país subalterno, desestruturado e minado por endémica corrupção;
- Na classe política, actualmente, não se levanta a questão da independência real da Segurança Social face ao aparelho de estado, não sendo também contestada a mistura das funções sociais do Estado com a gestão do fundo coletivo dos trabalhadores portugueses;
- O financiamento do Estado, é basicamente assente em impostos, por definição, sem uma contrapartida específica que possa ser exigida na sequência do seu pagamento e envolve todos os residentes. As quotizações e contribuições para a Segurança Social destinam-se exclusivamente às despesas com reformas e subsídios de doença ou desemprego dos trabalhadores que descontam ou descontaram para o sistema e não de toda a população;
- Há que saber distinguir o que são, por um lado, as funções sociais do Estado, com direito a cobertura orçamental e por outro, as funções da Segurança Social, constituida como fundo coletivo dos trabalhadores, com receitas próprias de aplicação muito bem delimitada;
- Não temos uma
solução acabada para a questão da gestão da Segurança Social mas, temos a
certeza que aquela é demasiado importante para trabalhadores no activo ou
na reforma, para ser gerida por mandarins em nome do Estado ou por
inclusão em lógicas privadas imanentes a fundos de pensões e seguradoras.
Convergências,
pensões e os golpes dos ladrões
1 - Um princípio
elementar de solidariedade
Qualquer
sociedade deve basear a sua constante reprodução enquanto tal, na satisfação
das suas necessidades. Só há sociedades equilibradas e pessoas felizes quando a
satisfação das suas necessidades é o seu principal objetivo coletivo, do qual
todos os outros decorrem. Qualquer outra base - crescimento económico,
competitividade, concorrência, integração no mercado global, etc. - constituem formas de efabulação ou expressam
encapotadamente interesses de grupos sociais específicos, poderosos e, em
regra, muito minoritários.
Qualquer
sistema social construido para a satisfação de grupos sociais específicos e
muito minoritários conduz a entorses na produção social, na formação e na
distribuição dos rendimentos, não é democrático e portanto, deve ser objeto de
liminar recusa e decidido combate.
O
aumento da longevidade humana, como elemento culminante de uma vida saudável é
um bem a generalizar e a sua consideração como um problema a sanar ou mesmo,
como algo de perigoso que exige a repressão dos mais velhos, é um
anti-humanismo, um fascismo. No contexto atual de desenvolvimento económico, de
articulação na produção, de imensas trocas culturais, esse fascismo propõe um
retorno às cavernas, quando os grupos humanos perante as dificuldades em obter
sustento, não desperdiçavam as proteínas contidas nos corpos dos seus mortos.
Assim
sendo, a sustentabilidade do financiamento de quantos já não podem ou devem
trabalhar, depois de contributos de dezenas de anos, é um imperativo ético e
civilizacional inquestionável sem qualquer direito a devaneios políticos e
financeiros em seu torno. Sobretudo quando, hoje, as bases materiais e
tecnológicas para essa sustentabilidade admitem uma população humana de 12000 M
de pessoas, muito para além dos actuais 7000 M.
2
– O saque de fundos e direitos dos trabalhadores
A
integração dos meios de sustentação de parte substancial da população nas
lógicas financeiras articuladas entre o sistema financeiro e o mandarinato
ancorado no partido-estado PSD/PS, acolitado pelo gang Portas, materializa-se
em várias formas de saque dos tais meios, por “poupanças” nas despesas ou por
desvio de receitas:
a.
O factor de
sustentabilidade - adaptação da idade da
reforma ao aumento da longevidade - foi introduzido pelo PS e materializado por
um tal Pedro Marques que agora se pretende na primeira linha da luta contra os
seus dignos sucessores no assalto à Segurança Social; estes últimos agudizaram
a questão pretendendo passar para os 66 anos a idade mínima para a reforma, com
o selo do carocho Mota Soares. Em resumo, o referido factor representa a
imposição de mais tempo de trabalho e de descontos e menos tempo com direito a
pensão e a um final de vida em sossego. E representa um obstáculo para a
chegada ao trabalho de uma geração mais nova, massacrada pelo desemprego ou
obrigada a emigrar;
b. Quando o
desemprego dispara e se reduzem os inerentes subsídios, as solidariedades
familiares[1] são o
último reduto de subsistência para muitos desempregados e seus dependentes. As
pensões tornaram-se assim, um recurso ínvio e supletivo, um conjunto de
rendimentos particulares, de que o poder político em Portugal se apropria, de
facto, para subsidiar desempregados;
c. Em finais de
2012, a dívida das empresas por contribuições não entregues à Segurança Social
era de uns € 9000 M – e cresceu € 2428 por minuto - na sequência de uma velha
política do partido-estado PSD/PS, de subsidiar empresários descapitalizados e
endividados perante a banca, à custa da descapitalização da Segurança Social[2];
d. Em 1984/95, a
governação de Cavaco subsidiou a ação social - que compete ao Estado pagar com
verbas dos impostos - com o desvio de
receitas da Segurança Social a qual, nesse contexto, foi objeto de uma burla de
€ 6017M, mantendo-se impunes, os seus protagonistas, como é timbre nesta
cleptocracia das bananas;
e. Toda a gente
conhece que há salários pagos em espécie – utilização de veículos, viagens,
despesas pagas – ou “por fora”, a trabalhadores para assim se reduzir o encargo
financeiro com as contribuições por parte das empresas; e os trabalhadores que
são coniventes com isso, julgando ser uma benesse, verão como tal se refletirá
nocivamente nas suas futuras pensões. Tudo isto resulta em prejuizo das
receitas da Segurança Social;
f. O pendor regressivo
dos salários e a sua alternância com o desemprego configuram o regime de
precariedade laboral vigente e, mesmo quando esses salários são objeto dos
pagamentos legais à Segurança Social, o modelo reduz a base de incidência das
contribuições. Por outro lado, as gerações produtivas de hoje, resultantes das
baixíssimas taxas de natalidade e, para mais, marginalizadas no acesso ao
trabalho poderão não ter a dimensão adequada para fazer face à entrada na
reforma de uma geração que teve uma taxa de atividade efetiva muito elevada.
Sabota-se assim a ossatura da coesão social no que se refere à solidariedade
inter-geracional, elemento sociológico cuja origem se perde nas profundezas da
História;
g.
O Estado, a quem
compete a execução de uma política de emprego terá de a cumprir com o produto
dos impostos e não com uma redução dos montantes que devem ser canalizados para
a constituição do fundo de pensões dos trabalhadores portugueses. Quando os
capitalistas precisam de ser incentivados pelo seu governo, para contratarem
jovens à procura do primeiro emprego ou desempregados de longa duração[3] isso
revela uma prática estranha ao modelo clássico do capitalismo e ainda que o tão
cantado empreendorismo só existe se levado ao colo do Estado. Mesmo nesse
modelo distorcido de capitalismo esses apoios não deverão provir da isenção do
pagamento de contribuições para a Segurança Social, tomados como equiparados a
receitas públicas, como o não são as receitas das seguradoras com planos de
reforma privados;
h. Nos finais do
século passado, tornou-se norma qualquer trabalhador contratado para a função
pública descontar para a Segurança Social e já não para a CGA; assim, à medida
que se têm reformado trabalhadores sob o regime da CGA, o fluxo financeiro que
deveria propiciar o pagamento dessas pensões reduziu-se e obriga à
transferência crescente de verbas do OE. As espertezas do PSD/PS…
i. O sistema da CGA
deixou de ser auto-sustentável porque o PSD/PS decidiu “secar” o sistema e,
naturalmente terá de o financiar para honrar os seus compromissos assumidos
durante décadas, com algumas centenas de milhar de pessoas; e certamente com
mais zelo do que o aplicado no cumprimento dos criminosos contratos com as PPP.
Não pode é empurrar para os reformados de hoje (462 mil em fim de 2012) os custos
dessa incúria;
j. Acrescente-se
ainda a utilização do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social
pelo governo, naquilo que terá sido o derradeiro despacho do ministro Gaspar.
Segundo este, o FEFSS deverá vender ações de empresas multinacionais, que têm
uma cotação certa nos “mercados” para comprar títulos da dívida pública
portuguesa, tomados como lixo pelos mesmos “mercados”[4]. Quem
venderia a sua casa por troca com uma barraca de praia?
Procedem
os actuais agentes políticos, ao abrigo dos memorandos da troika, a cortes nas
pensões, promovendo divisões (temporárias) no mundo do trabalho, entre
trabalhadores do sector público e do sector privado ou, entre trabalhadores
ativos e reformados, como formas de corrigir falsos privilégios. Se, pela sua
composição socio-profissional, os trabalhadores da função pública – onde
preponderam professsores, pessoal da saúde, quadros técnicos, militares e
juizes – têm pensões mais elevadas do que no setor privado – onde têm sido
comuns práticas de sub-declaração de remunerações – isso nada tem de estranho,
nem de injusto. Injusto é mesmo a consideração dos pensionistas do Estado como
criminosos a perseguir; a tal convergência é, na realidade, um roubo.
Mais
complacente é o poder relativamente às benesses oferecidas aos capitalistas de
maior gabarito. Na sua propaganda, a redução em 2% do IRC é virtuosa porque irá
aumentar (?) o investimento e a exportação; fora da sua propaganda,
discretamente, reduz em 90% o imposto de selo sobre as operações financeiras que
alegrará os bancos com um bolo de € 400/500 M anuais[5];
Neste
contexto global de submissão à troika e ao capital financeiro, o poder
político, mantendo o habitual carinho para com os capitalistas lusos[6]
cultiva a incúria e a visão de curto prazo; e daí, que não seja estranho que
haja anualmente vultuosas transferências de meios financeiros a favor daqueles.
Inversamente, por razões de comodidade que se prendem com a sua dependência
financeira e com o escasso poder reivindicativo, os antigos trabalhadores do
Estado estão na primeira linha da sanha genocida do governo.
A
convergência das pensões é uma burla, um crime de abuso de confiança pois
consubstancia-se num roubo das contribuições efetuadas pelos atuais
pensionistas, obrigados durante décadas a confiar o pecúlio para as suas
futuras pensões ao Estado, confiantes de que não viria a ser ocupado por um
gangs mafiosos. Observa-se, hoje, que teria sido mais avisado os trabalhadores
terem colocado as suas poupanças debaixo do colchão do que ao alcance da mafia.
3
– Como garantir a sustentabilidade? Um exercício
A instituição dos sistemas de segurança social
efetuou-se numa época em que a grande maioria das empresas e atividades se
alicerçavam no recrutamento massivo de trabalhadores; e daí que aqueles sistemas
se tenham construído com base em deduções nas retribuições dos trabalhadores
(salários diretos) ou no trabalho não pago (salário indireto) e que os
capitalistas entregam diretamente ao fundo coletivo dos trabalhadores, isto é à
Segurança Social.
Os
enormes rendimentos produzidos pelos aumentos da produtividade do trabalho, nas
últimas seis décadas - resultantes de avanços tecnológicos e do maior
investimento pessoal dos trabalhadores em qualificação - não foram minimamente
acompanhados, nem pelos aumentos dos salários reais, nem pelo aumento do
quinhão do salário indireto transferido como contribuição para a Segurança
Social nem, como seria imperativo civilizacional, com reduções dos tempos de
trabalho. E isso, pesem embora as benfeitorias inerentes ao pacto social
europeu e ao modelo keynesiano do capitalismo, estabelecidos após a guerra de
1939/45 e que foram gradualmente demolidos desde o início da década de 70 do
século passado[7].
Toda
a acumulação de riqueza efetuada neste longo periodo, saída do esforço laboral,
desse enorme aumento da produtividade do trabalho, não se refletiu tanto no bem
estar das pessoas, como na dimensão dos meios de produção, da propriedade
capitalista em geral, da concentração de riqueza num escasso número de
indivíduos e empresas e nas desigualdades daí resultantes. E, como se vai
observando, na fase actual do capitalismo, com o neoliberalismo genocida, a boa
vontade face ao mundo do trabalho e a multidão em geral, encontra poucas
simpatias junto de patrões e mandarins.
Nesta
sequência, a utilização de equipamentos que multiplicam a produtividade dos
trabalhadores e que nada mais são do que trabalho não pago a quem o produz – só
o trabalho produz valor – gera um processo de acumulação de valor à disposição
dos capitalistas porque, segundo as leis do capitalismo, são sua propriedade.
Essa é mesmo uma lei fundacional a revogar.
Procede-se,
em seguida, a um exercício com dados do INE, no que concerne às empresas não
financeiras portuguesas.
€ milhões
2010
|
2011
|
2012
|
|
VABpm
|
88245
|
82242
|
75515
|
Excedente
bruto de exploração
|
36313
|
31646
|
31117
|
Resultados
|
20083
|
5387
|
nd
|
Gastos
com pessoal
|
52212
|
50856
|
47381
|
Remunerações
|
40544
|
39403
|
36632
|
VABpm – Valor acrescentado
bruto a preços correntes, corresponde à riqueza criada num determinado período, avaliada a preços correntes
A
parcela da riqueza gerada (excedente bruto de produção) em cada ano e
disponível para os capitalistas decidirem como lhes aprouver ultrapassa sempre
os € 30000 M, aproximadamente 40% do VAB; corresponde, naturalmente a uma
avaliação aproximada do salário indireto, trabalho não pago realizado nesse
ano.
Deve
referir-se que nas remunerações está incluido rendimento de trabalho executado
por capitalistas ou outra gente com um comportamento anti-social. São bons
exemplos, os pornográficos € 3 M pagos a um Mexia, dois anos atrás ou, o
recebido pelos sacrificados banqueiros que em 2012 receberam, cada um, mais de
um milhão de euros.
Esclareça-se
ainda que a diferença entre o total dos gastos empresariais com o pessoal e as
remunerações corresponderá grosso modo
às contribuições “patronais” para a Segurança Social.
Numa
sociedade organizada, isto é, onde a atividade laboral se desenvolve em função da satisfação das necessidades das
pessoas, aquele excedente terá de fazer face ao valor do desgaste do
equipamento imputável ao processo produtivo do ano em causa (amortizações) e
considerar as necessidades de novo investimento produtivo, revertendo o restante
para o bem estar social. Esse bem estar social tanto poderá ser no âmbito da
saúde, como na educação, nos cuidados dirigidos a crianças ou idosos, etc.
Neste
contexto, a parte do excedente bruto de produção que não constitui resultados
(lucros, nos anos referidos) reparte-se entre valores imputáveis a
amortizações, rendas ou juros. Se as amortizações constituem um elemento
técnico da produção de bens e serviços, já as rendas, os juros e os lucros
correspondem a valor criado pelo trabalho e ilegitimamente apropriado pelos
capitalistas (acionistas, sócios), numa primeira instância. Numa segunda
instância, existe uma redistribuição operada a favor de outros naipes de
capitalistas - as rendas são cobradas por senhorios do imobiliário alugado e os
encargos financeiros pagos pelo crédito obtido destinam-se ao sistema bancário.
Não
se conhecem valores separados e conjugáveis com os apresentados, para rendas,
juros e amortizações. Por outro lado, observa-se no quadro uma substancial
redução dos resultados entre 2010 e 2011 para o conjunto das empresas não
financeiras, como produto da crise que reduziu o volume de vendas e as
dificuldades financeiras que, por sua vez, terão aumentado a parcela de
encargos de financiamento, reduzindo, consequentemente os resultados a dispor
por acionistas e sócios deste conjunto de empresas, destinados a um reforço ou
manutenção da solidez revelada nos balanços ou para distribuição de lucros. Os
juros e similares registados e consolidados como receitas do sistema bancário
português revelam um aumento de € 20042M em 2010 para € 22493 M no ano
seguinte; isto, no que concerne não apenas às empresas não financeiras mas,
também ao setor público, indivíduos e famílias.
Voltando
ao assunto central deste texto, a atividade produtiva das populações gera os
meios suficientes para a reprodução da força de trabalho, como ainda para a
manutenção num plano de decência de ex-trabalhadores (idosos), futuros
trabalhadores (crianças e jovens) e outros (deficientes), numa lógica de
solidariedade coletiva. O elemento estranho, anómalo e nefasto incrustrado nas
sociedades é constituido pelos capitalistas em geral e pelas classes políticas
que deles emanam e que os servem.
Mesmo
sem a abordagem anterior que toca o cerne do modo de produção capitalista, a
sustentabilidade de um sistema adequado de segurança social pode ser facilmente
garantida.
a. Em meados dos
anos 90 o governo de Cavaco decidiu reduzir em 1% a contribuição “patronal”
para a Segurança Social no sentido habitual de aumentar a competitividade das
empresas e outras prerrogativas virtuosas no quadro do capitalismo. Em
contrapartida, houve um aumento do IVA de 16% para 17% cujo produto reverteu
futuramente para a Segurança Social;
b. Sendo o IVA um
imposto muito abrangente, que todas as pessoas pagam, tratou-se na realidade de
uma transferência indireta de rendimento das pessoas para os ditos empresários,
muitos dos quais eméritos utilizadores de carros topo de gama com custos
incorporados nas empresas ou de bravos municiadores de contas em off-shores. Do
ponto de vista estritamente financeiro, para a Segurança Social, o negócio até
trazia menos encargos de cobrança e de burocracia;
c.
Esta operação
contudo abriu um precedente com um significado particular. Ao se admitir o
financiamento fiscal do fundo coletivo dos trabalhadores portugueses abre-se o
caminho à utilização de outras fontes de financiamento para além das
tradicionais quotizações e contribuições, baseadas na prestação e na
remuneração do trabalho. O regime cleptocrático assumiu, através do seu mais
ínclito símbolo – Cavaco – que a Segurança Social pode ser financiada
diretamente, a partir da riqueza social global criada e não somente tendo como
base a massa salarial;
d. Assim sendo,
tendo em consideração o desemprego, a precariedade e a redução de salários que
a deriva neoliberal vem impondo – e cuja responsabilidade não cabe a
trabalhadores nem a reformados - maior justificação terá a canalização de uma
parcela do excedente líquido de exploração (excluídas, portanto, as
amortizações) para efeitos da solidariedade inter-geracional, uma vez que
aquele excedente é um produto direto do trabalho de uma população determinada
num dado período;
e.
Outra questão
prende-se com a existência de muitas empresas que não têm trabalhadores
registados ou têm-no num número reduzido mas, apresentam valores elevados de
vendas. Neste caso poderá encarar-se a aplicação sobre o volume de vendas de
uma taxa consignada ao fundo coletivo dos trabalhadores, de modo equiparado a
uma taxa Tobin, à taxa sobre as transações financeiras já anunciada pela UE e,
conceptualmente semelhante à taxa de IVA;
f. Há ainda
empresas que servem apenas de repositório de elevados valores, sejam eles
títulos ou imobiliário, verdadeiros parques de capital especulativo, com nula
ou parca utilização de trabalho. Os fundos imobiliários são um caso típico
desse tipo de parques, hoje, objeto de escandalosos tratamentos fiscais de
excepção. Conceptualmente, o IMI que lhes deveria ser aplicado é um imposto
sobre o capital[8]
como o aqui proposto pelo que nada há de inovador neste conceito.
4 -
O Estado como gestor da Segurança Social é garantia de roubo
institucional
"O Estado Moderno, não importa qual a forma que
tenha, é uma máquina essencialmente capitalista, o Estado dos capitalistas, o
capitalista colectivo em ideias"
Friederich Engels - Anti During
Não
se conhecem mandarins ou capitalistas que dispensem a figura do Estado; podem
dividir-se entre partidários do Estado mínimo ou do Estado máximo mas, não
prescindem da sua existência, por troca com regras sociais igualitárias,
democráticas, de propriedade coletiva ou ausência de propriedade, com
auto-gestão e auto-organização para a satisfação das necessidades comuns.
Para
o efeito e através da História todas as formas sociais de coletivismo ou
auto-organização sem Estado – sejam alicerçadas em séculos de prática ou
experimentais - têm sido combatidas pelos Estados e pelos poderes económicos,
com particular zelo; no fim de contas, percebe-se que mandarins e capitalistas,
donos da terra e afins não apreciem quem não aceite a utilidade da sua
existência[9].
As
classes possidentes e os mandarins sempre tentaram criar e aperfeiçoar os modos
de incutir nos “de baixo” uma cultura de aceitação da necessidade do Estado. Se
este se tivesse sempre restingido às funções repressivas e militares há muito,
a multidão já o teria dispensado. Os capitalistas, hoje, interessam-se muito
mais pela capa que o Estado oferece para incorporar em lei os seus interesses e
privilégios. Por seu turno, as pessoas interessam-se particularmente pelas
funções sociais desempenhadas pelo Estado e é esse desempenho que justifica a
seus olhos a permanência de um aparelho tão caro, distante e opaco.
Essa
cultura inculcada pelos “de cima” faz com que seja aceite pelos “de baixo”,
como parte da natureza das coisas, a intervenção do Estado nessas funções
sociais. Essa cultura incorpora um comodismo que sai caro, particularmente em
tempos de crise económica e numa época em que o capitalismo neoliberal pretende
segmentar a multidão mundial entre submissos escravos e inúteis factores de
custo, a eliminar.
Mesmo
para quem aceite a necessidade da existência de Estado é-lhe, perfeitamente
transparente que este deve cumprir escrupulosamente o papel que lhe é imputado,
de garante do conveniente funcionamento de uma vasta área de fornecimento de
bens e serviços. Se o não fizer, não serve para nada, perde toda a
legitimidade; e com ele toda a classe política que se lhe acopla como carraça.
A
já longa duração da versão neoliberal do capitalismo em Portugal foi amenizada
durante algumas décadas devido às transformações havidas na sequência do 25 de
Abril e, porque não tem sido fácil a aplicação da agenda neoliberal no seio das
rivalidades partidárias. Os mandarins no poder, querem aplicar essa agenda e os
outros, os da oposição, não pretendem acarretar com o ónus dessa aplicação uma
vez que as penalizações eleitorais podem prejudicar a dimensão do quinhão no
pote.
Lentamente,
os media foram promovendo mandarins e “empresários” defensores de
privatizações, da excelência do serviço privado, das vantagens da concorrência,
da maior eficiência da gestão privada, incutindo na multidão uma concordância
ou uma relativa indiferença perante o tema, atitudes proporcionais à iliteracia
de um povo que pouco lê e que adormece ao colo dos zappings televisivos. Assim,
a despolitazação[10]
decapitou a multidão em termos de reação, organização e desobediência.
Assim,
só a crise económica e financeira, a austeridade e a troika é que vieram
colocar na praça pública a privatização, de facto, dos cuidados médicos, por
delegação de instituições como o SNS, a ADSE e outras fórmulas de benefício,
primeiro do baronato médico e depois do sistema financeiro, consoante os
manuais do “project finance” ou das parcerias público-privadas. Na educação o
processo parece só recentemente estar a avançar mais rapidamente, com a criação
do cheque-ensino. A habitação foi entregue ao livre arbítrio dos bancos, da
construção/imobiliário e à corrupção autárquica, com o bendito Estado a ajudar
inicialmente com bonificações de juro e deduções em IRS, para que a máquina da
especulação funcionasse.
Há
uma questão central na problemática da solidariedade inter-geracional inerente
à sociabilidade humana; é a questão dessa solidariedade ser gerida,
tendencialmente, pelo Estado, esse gestor coletivo dos interesses do capital.
Nesse
contexto, há um plano inclinado que conduz a políticas de desvio dos
verdadeiros objetivos do fundo coletivo dos trabalhadores e a consequente
apropriação dos seus recursos pelos capitalistas, como aliás se exemplificou
acima (2 – O saque de fundos e direitos dos trabalhadores).
O
problema assume maior acuidade quando se trata de um país como Portugal, onde o
frágil capitalismo autóctone depende sobremaneira dos apoios públicos de toda a
espécie, incluindo a generalizada corrupção, para sobreviver. Por consequência,
o funcionamento das instituições enquadra-se nessa fragilidade e gera um sistema muito deficiente de instituições
públicas no que se refere à satisfação das necessidades da população, embora
bem mais eficaz no saque do orçamento e no apoio a manhosos empresários de
várias estirpes. Para controlar o aparelho do Estado, a estirpe dominante - o
capital financeiro - mantém contratada uma classe política, culturalmente
indigente, constituída por obedientes mainatos.
Do
lado esquerdo da classe política, flutuam formações políticas empenhadas no
controlo social e, porque bem na esteira totalitária e autoritária típica do
trotsko-estalinismo, colocam o Estado como ente virtuoso e insubstituível para
a decisão e gestão das necessidades coletivas[11].
5 – Com a destruição da Segurança
Social constrói-se a miséria
Pelas
razões expostas, entre outras, no pentapartido não se levanta a questão da
independência real da Segurança Social face ao aparelho de estado, não sendo
também contestada a mistura das funções sociais do Estado com a gestão do fundo
coletivo dos trabalhadores portugueses, no seio de instituições comuns geridas
pelos mandarins de serviço. E, permite-se que o habitual superavit da Segurança
Social seja incluido nas contas consolidadas do Estado (central, serviços
autónomos, regional e local), mascarando os tradicionais deficits destes
últimos.
Para
estas considerações não contam apenas factores de ordem organizativa como atrás
referido mas, sobretudo, um elemento de abrangência e um elemento relativo aos
direitos.
Os
direitos e as obrigações face ao Estado e aos serviços públicos abrangem todas
as pessoas uma vez que o Estado se pretende universal e generalista; por outro
lado, a financiamento do Estado, é basicamente assente em impostos, por
definição, sem uma contrapartida específica que possa ser exigida na sequência
do seu pagamento. Pagar IRS ou IVA, por exemplo, nada tem a ver com a afetação
desses meios financeiros, seja na manutenção do SNS ou num voo militar. Nesse
campo, os governos não têm constrangimentos porque não é regra a consignação de
receitas fiscais.
O
mesmo não sucede com as quotizações e contribuições destinadas à Segurança
Social que se destinam exclusivamente às despesas com reformas e subsídios de
doença ou desemprego (neste caso, não em todas as suas formas) dos
trabalhadores que descontam ou descontaram para o sistema. Dito de outro modo,
as receitas são consignadas a fins específicos e só é beneficiário quem
contribui ou contribuiu para o espólio comum, excluindo-se todas as outras
pessoas.
Ouve-se,
por vezes, gente a protestar contra quem recebe pensões no âmbito do regime
não-contributivo pois com isso estarão a sobrecarregar a Segurança Social. Na
realidade, isso não é assim, pois essas pensões são pagas com verbas
consideradas no OE e não através dos descontos para a Segurança Social cuja
intervenção, neste particular, se resume à administração desse regime.
A
relação das pessoas com o Estado é uma inerência do que se designa cidadania. A
relação de pessoas com a Segurança Social insere-se numa esfera muito mais
circunscrita. Esta última relação não exclui ninguém de uma inclusão nas várias
esferas de atuação do Estado; por seu turno, a comum relação com o Estado não
obriga a um vínculo com a Segurança Social.
O
vício ideológico da consideração do Estado como ente virtuoso é algo que
resulta do contágio da lógica do capital e dos capitalistas como grupo social
dominante e contempla a incapacidade de entendimento da diferença existente
entre a Segurança Social e as funções sociais próprias do Estado. Para além da
educação, da saúde, da habitação, há a considerar, no âmbito deste texto,
regimes da área social que estão cometidos à responsabilidade administrativa e
financeira do Estado – a ação social enquanto enquadramento do bem estar de
crianças, deficientes, idosos em situação de dependência física ou económica, a
aplicação do RSI, o abono de família, os subsídios de desemprego complementar e
social, etc. Todas essas funções constituem direitos das pessoas, em
complemento ou à margem de qualquer relação com a Segurança Social e, the last but not the least, com financiamentos
públicos, contemplados no orçamento do Estado e não financiados pelas receitas
próprias da Segurança Social.
A
confusão junto dos mais desatentos resulta de o Estado incorporar numa mesma
estrutura – ministério – a Segurança Social e as funções sociais que lhe
competem incluir no OE e cobrir com receitas fiscais. A incorporação das contas
da Segurança Social a par com as dos órgãos do Estado, sob a designação de
“Administrações Públicas”, é a fonte de todos os abusos.
O
modo como o Estado vem actuando na Segurança Social em particular, é o de um
auto-imposto delegado dos trabalhadores portugueses, o de um gestor de negócios
corrupto que burla o delegante. Trata-se de um delegado que incorre no crime de
abuso de confiança pois se apoderou do cofre onde os trabalhadores portugueses
têm acumulado poupanças para fazer face às contingências da vida biológica e
laboral.
A
ilusão na multidão face à natureza do Estado faz com que se aceite com
tristeza, espanto ou indignação a forma como os governos gerem a Segurança
Social e as novelas que tecem para justificar o desvio de fundos ou das
condições para os trabalhadores usufruirem das suas poupanças, acumuladas em
dezenas de anos de trabalho.
Certamente
que a atitude das pessoas face às empresas detentoras de fundos de pensões não
deve ser mais tolerante pelo facto de serem privadas pois os riscos de
descalabro são também elevados uma vez que as reservas das seguradoras e dos
seus fundos de pensões assentam em valorações especulativas ou nas cadeias de
activos voláteis, típicas dos mercados financeiros. O caso recente da
gigantesca AIG[12]
evidencia-o e, não fora a intervenção do governo norte-americano com um apoio
de $ 85000 M… Contrariamente ao referido pelos meios afetos às seguradoras[13] não
são as empresas de seguros que acodem aos sistemas públicos de pensões mas, o
Estado que socorre as empresas da “indústria”, para evitar a sua falência.
Cabe,
finalmente, a questão de se saber o que poderá, alternativamente, ser feito
para que o fundo coletivo dos trabalhadores portugueses não seja pasto das
manobras fraudulentas dos gangs governamentais.
Não
temos uma solução acabada para o problema e consideramos que tal deverá ser o
resultado de uma discussão profunda e alargada entre trabalhadores no ativo e
na reforma, dada a sua complexidade. Mas, damos como certo que aquela é
demasiado importante para trabalhadores no activo ou na reforma, para ser
gerida por mandarins em nome do Estado ou por inclusão em lógicas privadas
imanentes a fundos de pensões e seguradoras;
Assim
como entendemos que os organismos da administração pública devem funcionar com
quadros próprios, escolhidos em concursos transparentes e sem a interferência
dos governos - estes, sem poder para procederem a nomeações ou exonerações -
entendemos que o aparelho da Segurança Social poderá funcionar do mesmo modo.
No
âmbito de uma visão naif poderiamos
pensar que uma confederação sindical seria o órgão indicado para gerir a
Segurança Social. Porém, em Portugal, é baixa a taxa de sindicalização e portant,
dificilmente as existentes se poderiam assumir como representantes da grande
massa dos trablhadores. Por outro lado, os sindicatos são pouco participados
pelos trabalhadores, estão muito descredibilizados e são partidarizados ou
dirigidos por grupos de indivíduos desempenhando funções dirigentes por longos
anos, construtores de estatutos bloqueados para evitar que se perca o controlo
partidário. Na sua ampla concertação com o aparelho político-partidário e com o
alto patronato, os sindicatos comportam-se como verdadeiras direções-gerais
vocacionadas para o controlo social dos trabalhadores, não sendo, portanto,
instituições democráticas. Finalmente, perante a precariedade do trabalho e as
caraterísticas técnicas do mesmo – segmentação, encadeamento em redes de
decisão – cabe perguntar se os sindicatos atuais terão ainda alguma viabilidade
de agregação e libertação dos trabalhadores face ao capital.
Este
e outros textos em:
http://grazia-tanta.blogspot.com/
http://pt.scribd.com/profiles/documents/index/2821310
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
http://pt.scribd.com/profiles/documents/index/2821310
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
[2] http://grazia-tanta.blogspot.pt/2012/07/a-divida-seguranca-social-o-longo.html
[4] http://grazia-tanta.blogspot.pt/2013/07/seguranca-social-compra-titulos-da.html
[5] http://www.noticiasaominuto.com/economia/131055/imposto-de-selo-no-financiamento-da-banca-reduzido-em-90#.UoTGIPnwbAg
[7] http://www.slideshare.net/durgarrai/estratgia-para-um-sistema-de-segurana-social-favorvel-multido-de-trabalhadores-e-ex-trabalhadores
http://grazia-tanta.blogspot.pt/2013/01/a-nao-politica-de-habitacao-e-o-imi.html
[9] http://www.scribd.com/doc/5570973/Afinal-qual-a-funcao-social-do-capitalista
[10] http://grazia-tanta.blogspot.pt/2012/10/a-despolitizacao-o-controlo-social-e-as.html
http://www.slideshare.net/durgarrai/capitalistas-e-estado-a-mesma-luta
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