A despolitização (1) ou a baixa cultura política em Portugal, constituindo óbices evidentes para
alicerçar uma contestação ao poder, não é sinónimo de falta de sagacidade ou de
total inação perante a situação política, económica e sobretudo, mostra repúdio
ou desprezo pelo ignóbil mandarinato. A reação, na perspetiva de voto ou no
momento de preenchimento do papel, é uma atitude de baixa intensidade; revela
tibieza de atuação mas a indignação está lá.
Sumário
Conclusões
1 - A utilidade dos fantasmas como
eleitores
2 – A dimensão da abstenção
3 – Votos que expressam rejeição
4 – Os ganhos e as perdas de
mandatos
5 - A verdadeira representatividade
dos eleitos
Conclusões
- O recenseamento eleitoral está adulterado porque dá vantagens para os partidos e os seus vereadores, em número e remunerações, sobretudo para o PSD/PS. Há no mínimo 73 concelhos onde o número de eleitores supera o da população total;
- a abstenção passou de 41% dos inscritos em 2009 para 47.4% em setembro último; e, os votos brancos e nulos cresceram para 3.6% dos inscritos. Esses factos criaram uma situação nova – superam o volume dos votantes nas listas candidatas a mandatos autárquicos;
- A organização política, constitucional, expele a esmagadora maioria da população da prática democrática em favor de castas de gente medíocre, sem escrúpulos e intratáveis para quem os conteste. Os resultados de setembro revelam o descrédito do sistema partidário em geral;
- Em muitas câmaras há um número excessivo de vereadores o que corresponde à assunção pela vereação de funções meramente burocráticas com a desvalorização da estrutura administrativa das autarquias. Impõe-se um reforço das competências das assembleias municipais na elaboração de normas e na fiscalização dos executivos;
- A votação nas listas concorrentes reduziu-se em cerca de 720000 passando para 107 (contra 176 em 2009) o número de concelhos onde as listas tiveram mais de 60% dos inscritos. Inédito é o aparecimento em setembro de 17 concelhos onde as listas concorrentes não alcançaram 40% dos inscritos.
- Na conquista de mandatos, às 83 perdas do PSD/CDS correspondem ganhos dos grupos de cidadãos (47) e do PC (38), sendo marginal o sucesso do PS (6) pese embora a festa feita por aquele grémio no rescaldo das eleições. Há, contudo, que relativizar a importância dos resultados dos grupos de cidadãos nos casos em que não passam de emanações partidárias;
- A representatividade dos elencos camarários é muito baixa face à população e não existem mecanismos de responsabilização perante as decisões tomadas pela população, afastada de qualquer processo decisório efetivo;
- O PS representa apenas 19.3% da população recenseada susceptível de voto no partido, sofrendo uma quebra de 12.1% face aos votos recolhidos em 2009. A obtenção das 149 presidências de câmara em 2013 é conseguida com o apoio de apenas 11.4% da população total recenseada;
- O PSD e os seus atrelados recolheram o apoio de 18.3% da população inscrita nos municípios onde concorreram, com uma quebra de 24.8% relativamente a 2009. As suas 111 presidências foram conseguidas com 9.5% da população total;
- O PC aumentou em 2.4% a sua votação global em 2013 mantendo o mesmo grau de representatividade relativamente ao total dos inscritos (5.8%). No conjunto das 33 autarquias onde o PC assegurou a presidência como concorrente mais votado, os seus apoiantes aumentaram 19.7%;
- Os grupos de cidadãos aumentaram em 91% o volume de inscritos a cujo voto concorreram mas, os seus votantes não representam mais do que 3.6% da população recenseada;
- O BE, apesar de apresentar uma participação eleitoral mais concentrada territorialmente sofreu uma derrota esmagadora sob qualquer prisma, excepto no número de mandatos no qual a redução de eleitos é apenas de uma vereação;
1 - A utilidade dos fantasmas como
eleitores
É sabido que o atual sistema
político não trata bem a democracia, a começar pelo recenseamento eleitoral. Só
se preocupa com os cruzamentos de dados que conduzem a um aprofundamento do
saque fiscal, sendo bem mais benévolo quando se trata de favorecer capitalistas
endividados ou envolvidos em fuga ou fraude fiscal.
A questão dos eleitores fantasmas é
conhecida há muito e isso começou a colocar-se pouco depois do recenseamento
inicial, efetuado para efeitos das primeiras eleições, em 1975. A avaliação da
globalidade desses chamados fantasmas não é difícil; basta tomar os valores da
população total e subtrair as crianças e os jovens com menos de 18 anos.
2.009
|
2.013
|
|
População total
|
10.563.014
|
10.487.289
|
População < 18 anos
|
1.977.656
|
1.879.436
|
Eleitorado real
|
8.585.358
|
8.607.853
|
Eleitorado considerado
|
9.377.343
|
9.501.103
|
Eleitores fantasmas
|
791.985
|
893.250
|
Fonte: Eurostat
Essa sobreavaliação do eleitorado
não é inocente, pois favorece a classe política monetariamente, como
demonstrámos anos atrás (2).
Podem abundar na classe política
ineptos e corruptos mas, certamente escasseiam os descuidados quanto a criativas
possibilidades de rendimentos interessantes e prebendas associadas aos cargos.
O cálculo do número de vereadores em
cada concelho (para as freguesias o problema terá um impacto semelhante) não se
faz em função dos efetivos da população mas, tomando em consideração o número
de eleitores que, estando sobreavaliados permitem em vários casos, o aumento do
número de eleitos. É o que se chama um desvio de quantidade.
Mas, há também um desvio de valor
uma vez que nos concelhos onde fraudulentamente tenham sido imputados mais de
40000 eleitores… há aumentos de salários para os mandarins de serviço. Veja-se
a tabela de remunerações que se julga estar ainda em vigor, para os casos de
presidências a tempo inteiro (em % do vencimento do PR).
Presidentes
das câmaras de Lisboa e Porto
|
55%
PR
|
Presidentes
de câmaras com mais de 40000 eleitores
|
50%
PR
|
Presidentes
de câmaras com 10/40000 eleitores
|
45%
PR
|
Presidentes
de câmaras com menos de 10000 eleitores
|
40%
PR
|
·
As
senhas de presença obedecem à mesma hierarquia
·
O
vencimento atual do PR é na tabela € - 7415 mas a manhosa figura foi lesta em
preferir a acumulação de reformas (€ 10042) para se furtar aos cortes que
zurzem a vida da plebe (3)
Mas pode avançar-se mais um pouco no
detalhe deste sintoma claro do respeito do mandarinato pela qualidade da
democracia, comparando a população real, em 2011 revelada pelo Censo e o número
de inscritos para a romaria autárquica de setembro último.
- Apurámos 73 concelhos onde o número potencial de eleitores é superior à população total, obviamente incluindo nesta, crianças e menores de 18 anos. Naturalmente, em muitos dos restantes onde essa diferença é negativa, nada garante que estejam isentos da presença de elevado número de fantasmas;
- Desse total, sete – Montalegre, Vimioso, Boticas, Ribeira de Pena, Vila Nova de Paiva, Vila Pouca de Aguiar e Melgaço - apresentam inscritos para eleições com mais de 30% acima do efetivo populacional;
- Tratando-se, com uma excepção açoriana, de concelhos situados a norte do Tejo e, em grande maioria afastados da faixa litoral não é, de todo, compaginável… um acelerado crescimento demográfico em apenas dois anos. Assim sendo, ficam favorecidas, por um lado, as possibilidades de eleição de um excesso de vereadores do partido-estado (PSD/PS) ou, marginalmente do seu apêndice CDS; ou, em outros casos, apenas um aumento do pré dos mandarins, dada a promoção da autarquia a um patamar populacional que não é o seu;
- Destacamos alguns casos, em que seguramente o número de vereadores (sete) se acha acima do devido (cinco) dado que todos terão de facto, menos de 10000 eleitores, se se excluirem os fantasmas, crianças e jovens.
Concelho
|
Eleitores
|
População
|
Diferença
|
Montalegre
|
15201
|
10402
|
4799
|
Melgaço
|
11966
|
9102
|
2864
|
Vinhais
|
11179
|
8955
|
2224
|
Mogadouro
|
11222
|
9448
|
1774
|
Moimenta da Beira
|
11528
|
10149
|
1379
|
Pinhel
|
10236
|
9526
|
710
|
Carregal do Sal
|
10038
|
9760
|
278
|
Só nestes sete casos há
catorze vereadores indevidos a que se devem somar os respetivos séquitos de
secretariados, motoristas, carros e assessores;
- Por outro lado, pelo menos nas seguintes duas câmaras os seus vereadores receberão vencimentos acima do gabarito real fornecido pelo sua dimensão populacional, como se pode conferir pela tabela mais acima, dado que não terão certamente mais de 40000 eleitores.
Concelho
|
Eleitores
|
População
|
Diferença
|
Chaves
|
46095
|
40943
|
5152
|
Ponte de Lima
|
43131
|
43287
|
-156
|
2 – A dimensão da abstenção
Depois das linhas anteriores sobre a
falsificação programada dos elencos autárquicos, está dado um primeiro elemento
sobre as maleitas que a classe política introduz no sistema democrático
aviltando-o para seu benefício. Será por desatenção nossa que não ouvimos um
clamor de indignação, nem à direita, nem na esquerda do pentapartido? Quanto à
plebe, parece resignar-se com doses de televisão e as arengas dos 69 arautos
partidários travestidos de comentadores políticos, em bem pagos tempos de
antena; arengas complementadas por alguns com rotineiros desfiles sob o comando
do valoroso Arménio. Este, na única vez em que inovou, viu a coisa correu mal e
transformou um passeio na ponte numa fila de autocarros.
Como a permanência de eleitores
fantasmas é constante não é a variação quantitativa calculada para o período
2009/2013 que abastarda as comparações; quando os desvios da realidade se
mostram no mesmo sentido, essas comparações têm uma fiabilidade muito elevada.
Nesse contexto passamos a considerar
a abstenção e, sobretudo as suas variações, tomando os dados oficiais que a
definem, sabendo-se que em 2009 como em 3013 os fantasmas mantêm a sua
proporção no total dos abstencionistas – 20.6% e 19.8%, respetivamente.
Para a totalidade das câmaras a
abstenção passou de 41% dos inscritos para 47.4%. Em 2009, a menor taxa de
abstenção recaia nas câmaras PS e recentemente essa situação recaiu sobre as
autarquias PSD e afins; inversamente, as maiores taxas observam-se sempre entre
os eleitores das câmaras com presidência PC. Por outro lado, o aumento da taxa
de abstenção entre os dois momentos é mais elevado no ambiente dominado pelo PS
e mais baixo onde o PSD e afins é maioritário.
Estas situações poderão ter as
causas que adiantamos em seguida. O PS, como partido central no conjunto do
pentapartido poderá ser aquele que, em 2009, menos anti-corpos gerava no
eleitorado mais à direita ou mais à esquerda, menos fidelizado e, portanto o
mais constante, o menos prejudicado pela resultante dos movimentos pendulares
para a direita, para a esquerda ou para a abstenção. O grande aumento, em 2013,
da abstenção nos ambientes dominados pelo PS revelará que este não beneficiou
de grandes transferências de votantes mais à direita e menos ainda provenientes
das esquerdas. A menor abstenção nas autarquias dominadas pelo PSD e aliados em
setembro, estará relacionada com um maior empenho eleitoral quer da oposição
(ainda que insuficiente) quer dos fiéis do PSD para manterem a autarquia nas
suas mãos. A maior abstenção nas autarquias dominadas pelo PC terá relação com
as caraterísticas da população da margem sul do Tejo, com a longa permanência
do PC nessas autarquias, confortando uns, mais fiéis que votam na continuidade
mas, desinteressando muitos que não encontram na concorrência alternativa
viável ou necessária.
Poder-se-ia pensar que os grupos de
cidadãos surgiriam como produto de uma maior mobilização das pessoas para o
voto mas tal não é visível, nomeadamente porque os tais independentes aparecem
mais como resultado de quesílias internas aos partidos do que emanação genuína
da sociedade. A relevância, em 2013, de listas de independentes (?) como as
surgidas no Porto, Sintra, V. N Gaia ou Oeiras são evidências do abastardamento
do conceito.
Para piorar as coisas, em Oeiras a
lista ganhadora une-se em torno da imagem de um corrupto com o apoio de um
volume significativo de pessoas tolerantes com a filosofia do “ele rouba mas
faz”. O outro lado do problema é que a concorrência à lista isaltina esteve
longe de ser considerada como alternativa condigna junto dos oeirenses,
temerosos de que pudesse surgir um novo poder baseado na filosofia do “rouba e
não faz”. Oeiras, nesse ponto é um laboratório da degenerescência do sistema
que confronta a saudade de um corrupto com a rejeição de outros mandarins,
tomados potencialmente como mais lesivos.
Nota: (a) Entendemos somar PSD/CDS e
outros, mormente MPT e PPM dado o número
e a variedade combinatória
dessas alianças; e porque a proximidade ideológica e
programática é próxima
(b) Incluimos a câmara de Salvaterra de Magos dirigida pelo BE em 2009
A abstenção apresenta maiores
dimensões relativas proporcionalmente à dimensão do eleitorado. Nos concelhos
mais pequenos a abstenção situa-se, nos dois actos eleitorais, próxima de um
terço dos inscritos para se colocar em torno dos 40% nas autarquias com mais de
25000 em 2009, subindo para perto de metade, quatro anos depois.
A diferença entre as taxas de
abstenção entre os concelhos maiores e os mais pequenos era de 8.5 pontos
percentuais (p.p.) em 2009 e alçou-se para 16.8 p.p. em 2013. Embora haja
certamente factores de ordem local, cremos que pesa sobretudo o
descontentamento face à situação económica global, a ausência de qualquer
esperança de soluções saídas do regime político e dos seus partidos, quer da
direita empenhada cumpridora do programa de empobrecimento coletivo, quer pela
chamada esquerda, arauto constante de propostas cosméticas dado o seu interesse
corporativo na manutenção do próprio sistema que lhe garante a sobrevivência e
a das suas castas de controladores sociais.
Se o aumento da abstenção é de 2
p.p. nas autarquias mais pequenas isso deve-se às maiores relações de
proximidade com os autarcas, em regra nativos locais que as pessoas conhecem
pessoalmente, seus familiares, amigos e vidas pessoais; mesmo que muitos não
sejam, objetivamente, muito recomendáveis. Por outro lado, os pequenos
concelhos não têm obtido dos interesses imobiliários o mesmo interesse que os
maiores, mais inseridos em malhas urbanas, onde são construídas as
urbanizações, os centros comerciais e inventadas as mais valias com as
conversões em urbanos, de terrenos rústicos.
Inversamente, nas autarquias com
maior dimensão, os elencos autárquicos mantêm-se afastados das vistas das
pessoas e mais próximo de “investidores”, de negócios e da obtenção de fundos
partidários o que contrasta, naturalmente, com a dimensão dos problemas
inerentes às maiores concentrações urbanas, ao seu dinamismo, à sua maior
diversidade. Esse afastamento ou a presença de mandarins de maior gabarito,
chamados ao comentário político nos media nacionais, são também elementos que
tornam as pessoas menos mobilizadas para a participação nas romarias eleitorais
que visam a revalidação do regime cleptocrático no seu conjunto.
A tendência crescente da abstenção acompanha
a dimensão dos inscritos e é regularmente observada nas autarquias de todos os
pendores partidários. Nas autarquias mais pequenas o pendor partidário não
produz sensíveis diferenças nas taxas de abstenção, pelas razões acima
aduzidas. O conhecimento dos autarcas e da sua vida sobrepõe-se muitas vezes à
filiação partidária no momento do voto; e mesmo a sua ação ou inação têm uma
visibilidade muito maior num meio social mais reduzido e humanizado do que em
urbes onde ninguém se conhece e onde quem mora numa ponta da cidade nada sabe
do que se passa na outra ponta.
Os níveis de abstenção, em 2009 não
se diferenciam particularmente nos concelhos de maioria PS, PSD e afins ou
mesmo onde preponderaram os grupos de cidadãos, para as diversas dimensões de
inscritos. A diferença está nas autarquias de maioria PC, onde os níveis de
abstenção são sempre muito superiores às restantes – cerca de 7 p.p. - excepto naquelas que têm menos de 10000
inscritos.
As taxas de abstenção superiores a
50% eram 16 em 2009 e passaram a 50 este ano, facto que inicia um conjunto de reflexões
sobre elementos que retiram legitimidade a qualquer eleição nestes termos,
sobretudo tendo em conta o poder real, relativamente discricionário dos eleitos
e que convive com a ausência de qualquer continuidade do escrutínio popular.
2009
Todos os concelhos presentes no
quadro acima, relativos a 2009 estão “bem classificados” em 2013; todos os
referidos aumentaram as taxas de abstenção este ano, excepto Lagoa (Açores) que
reproduz exatamente o mesmo valor. Note-se ainda que o primeiro classificado em
2013 não consta na tabela de 2009, por muito pouco; seria o 17º se o quadro
tivesse mais uma linha.
Há muitas razões para a abstenção
para além das razões “administrativas”, inerentes aos fantasmas criados pela
incúria do poder face à qualidade do processo eleitoral. Se não é possível
medir essas razões, há, contudo um elemento a retirar, a da ausência de
valorização, de dignificação dos processos eleitorais e da participação das
pessoas. Na realidade, a existência de uma classe política, auto-centrada, com
tiques autoritários e de omnisciência, monopolizadora do desempenho das funções
políticas afasta a esmagadora maioria da população da prática democrática.
A Constituição define que “Os
partidos políticos concorrem para a organização e para a expressão da vontade
popular” (CRP, artº 10, nº 2); isto é, concorrem e é por seu intermédio que as
pessoas se devem organizar ou delegar para o exercício da democracia. Ora, os
partidos não são organizações abertas e para mais, controladas por grupos internos
de interesses, tendem a ser muito seletivas e criativas no fomento da
obediência e da subserviência dentro dos seus aparelhos. Por outro lado, como é
por seu intermédio que se acede a favores, lugares bem remunerados, capacidades
de decidir sobre a vida alheia, mordomias e aos frutos da corrupção, a
seletividade torna-se muito apertada. Para percorrer a escadaria do poder não é
preciso ser inteligente, qualificado ou trabalhador; é mais importante ter a
capacidade de obedecer e cumprir o que convém no seio do exercício do poder
cleptocrático que enforma Portugal e não só, pois o modelo não é exclusivo
português.
São cada vez mais comuns os casos de
elementos sem qualquer qualidade para produzir outra coisa que não a obediência
ao sistema financeiro que se apossou do poder político. A imagem da classe
política, nomeadamente, no chamado “arco da governação” é péssima, passam por
mentirosos, incapazes, sem gabarito cultural, falsificadores de habilitações
académicas, compradores de diplomas com escasso investimento intelectual,
corruptos vulgares… sempre de consciência tranquila, etc. Fora do referido
arco, a imagem é a da ineficácia real, de inutilidade, de ausência de
alternativas transformadoras, sentindo-se que as caraterísticas vigentes no
“arco da governação” seriam adoptadas naturalmente pelos caudilhos da
“esquerda”, quer porque para aí apontam os exemplos da História, quer porque a
cultura que está inculcada por todos os partidos na plebe é que ter o poder é para
mandar, é estar por cima e fazer-se obedecer.
Toda a gente sente os partidos como
algo que lhes é exterior, que só conhecem pela sua omnipresença nos media,
incorporados na programação como produtos de publicidade comercial, tão vazios
como esta última; ou que aparecem nas ruas, no seio de séquitos e bandeiras,
com sorrisos em épocas de campanha eleitoral.
O ordenamento político em Portugal
gera um fosso entre o comum das pessoas e a classe política, de que esta
precisa e que a grande maioria do povo aceita como fatalidade. Ora, se há uma
segmentação entre “nós” e “eles” e se são “eles” que têm o poder, se eles nos
menorizam e consideram incapazes de compreender ou atuar na decisão política
concreta, é natural que perante a dura crise de empobrecimento – procissão que
ainda vai no adro - a fatalidade se transforme num sentido de injustiça e de
acentuada descrença nas instituições. (4)
Neste contexto, a abstenção é a
reação mais básica de desapego para com o sistema político, é ignorá-lo nos
seus rituais de legitimação; mesmo quando isto não é assim conceptualizado pela
maioria dos abstencionistas. Se a crise promove um forte aumento das abstenções
nas eleições autárquicas – não sendo as autarquias o foco principal dos cortes
e perda de direitos – é evidente que representa esse desapego, essa recusa na
participação nos rituais que abastardam uma democracia que ninguém consegue
perceber onde se encontra na realidade, quando tudo o que acontece de mau é
decidido por alguns em conivência com a troika, sem qualquer possibilidade de
reporte democrático dos de baixo para com os de cima. Mesmo aqueles que não
votam porque preferiram ir à praia revelam que o sistema político gera a não
integração participada das pessoas, não fomenta o espírito de pertença a uma
sociedade.
A classe política odeia a abstenção
porque sabe que aquela é uma medida do desapego das pessoas face aos mandarins.
Daí que, em épocas eleitorais, se assista a todas as pressões conducentes ao
voto efetivo, ao encaminhamento do rebanho para as urnas, os caixotes onde
solenemente se deposita o voto e cuja designação tem um enorme simbolismo. Os
abstencionistas são objeto de todas as acusações; favorecem a direita para os
de esquerda ou vice versa e o seu voto torna mais forte uma democracia…
tutelada pelos “mercados”. Para lhe dar
um toque maior de farsa, em vésperas do torneio, o sinistro PR vem exercitar os
seus esgares na televisão para convencer o povo a participar.
Pretende-se apontar a salvação pelo
voto a quem acha que não tem escolha ou que a oferta eleitoral não o seduz
minimamente. E até aparecem salvadores do sistema político – mesmo quando se
afirmam críticos – a apontar para o voto obrigatório! Talvez fosse uma forma
interessante de obter receitas fiscais junto dos sucessores dos fantasmas– em
regra já falecidos - … pensará a Maria Luís. Uma coima de € 100 por cada
impossibilitado de participar numa romaria eleitoral traria mais € 90 milhões
para o vórtice orçamental; e não seria decerto mais idiota do que a exigência
de um pagamento a um homem por conta da sua gravidez de risco, como aconteceu
recentemente. Os políticos são decerto menos burros que os economicistas e
saberão que essa obrigatoriedade faria subir em flecha os votos de rejeição,
nulos ou em branco; portanto, é mais cómodo apontar para os abstencionistas
como pessoas comodistas e maus cidadãos.
3 – Votos que expressam rejeição
Pese embora a sua pequena dimensão,
o volume dos votos de rejeição (brancos e nulos) tem um significado inequívoco;
sobretudo, quando o seu aumento nas últimas autárquicas foi significativo,
deixando de ser marginal. A nível nacional, passaram de 1.7% dos inscritos em
2009 para 3.6% em setembro último.
Esta subida, associada ao aumento
das abstenções criou uma situação nova, a de que a votação em forças
partidárias se situou aquém de metade dos inscritos. Isso é revelador de que a
crise económica não tendo como contraponto um sistema político susceptível de obter
a confiança das pessoas obviando aos efeitos daquela na plebe, afasta as
pessoas das instituições partidárias. E evidencia que os partidos da esquerda
institucional, que em regra, tendem a capitalizar o descontentamento da
população nas democracias de mercado, não constituem em Portugal alternativa
para estes votantes descontentes.
Os votos em branco ou os nulos
superam claramente a votação no BE, o quinto partido do sistema; os votos em
branco, por seu turno são mais do que os obtidos pelo CDS, como concorrente
fora de qualquer coligação.
Em 2009 somente em oito concelhos os
votos de rejeição ultrapassaram 3% dos inscritos – Vila de Rei (4.2%), Pedrógão
Grande (3.8%), Mourão, Idanha-a-Nova, Barrancos, Castanheira de Pera, Oleiros e
Penamacor. Trata-se de concelhos envelhecidos, fronteiriços, periféricos ou
situados no centro do país, na região do Pinhal Interior, alguns vítimas da
profunda desestruturação contida no fecho do sector têxtil nos anos noventa.
Daí os votos de desafeição para com o sistema.
Nesses concelhos vota-se no
partido-estado PSD/PS excepto, em Barrancos onde o PC detém a câmara, não se
tratando de concentrações de esquerdistas ou anarquistas em protesto.
Passados quatro anos, aquela fasquia
dos 3% foi ultrapassada em 175 municípios, (no total são 308) reveladora da
explosão dos votos de rejeição registada em setembro. Como não vamos enumerar
aqui todos esses concelhos, indicaremos no entanto aqueles onde os votos de
rejeição ultrapassaram 5% do eleitorado
- Gondomar (7.9%), Batalha (7.4%), Leiria, Alcobaça, Maia, Corvo, Mafra
e Idanha-a-Nova. Desta vez, predomina o Pinhal Litoral, o Oeste bem como duas
grandes autarquias do Grande Porto, todas com vereações baseadas no
partido-estado.
4 – Os ganhos e as perdas de
mandatos
Os mandatos para os executivos das
308 câmaras passaram de 2078 em 2009 para 2086 em 2013… precisamente numa época
em que se aboliram muitas centenas de freguesias, com poupanças ridículas mas,
com enormes incómodos para as populações das áreas rurais. Verifica-se uma
média de 6.8 vereadores, com situações que variam entre cinco e dezassete
indivíduos.
Aumentaram de cinco para sete
vereadores, Arruda dos Vinhos, Murtosa e Vila Franca do Campo; de sete para
nove, Felgueiras, Palmela e Vila Real; de nove para onze, Setúbal. Em
contrapartida, passaram de sete para cinco, os elencos de Idanha-a-Nova e Torre
de Moncorvo e de nove para sete a Covilhã. Como já referimos, dada a
inconsistência do recenseamento eleitoral, estamos perante uma variável
aleatória quanto à justeza da aplicação da lei nestes casos, como em muitos dos
restantes, onde não se procedeu a alterações.
Um executivo camarário não precisa
aumentar consoante o número de pessoas a “administrar”. Isso só acontece porque
não se pretende dignificar e responsabilizar os trabalhadores camarários e,
pelo contrário, centralizar a decisão sobre tudo nos vereadores. Conhecemos um
caso em que uma rotina como a remoção de um veículo abandonado na rua exige o
aval de um vereador, dado que a delegação de competências na estrutura
administrativa não deverá ser regra.
Por outro lado, muitas vezes os
vereadores não afetos ao partido a quem coube a presidência, ficam sem
responsabilidades executivas, por decisão dos vencedores ou opção dos vencidos;
quando não lhes são atribuídas responsabilidades tão pouco consideradas como a
toponímia ou os cemitérios.
A distribuição das câmaras consoante
a dimensão do elenco de vereadores é a seguinte em 2013 e contempla duas
excepções à regra – Sintra e V. N de Gaia – que tendo bem mais eleitores
inscritos que o Porto só (!) têm onze vereadores.
Eleitores
inscritos
|
Nº
vereadores
/câmara
|
Câmaras
abrangidas
|
<
10000
|
5
|
113
|
10/50000
|
7
|
145
|
50/100000
|
9
|
26
|
>
100000
|
11
|
23
|
Porto
|
13
|
1
|
Lisboa
|
17
|
1
|
Aparentemente, os vereadores sem
funções funcionam como fiscais do executivo efetivo, funções essas que deveriam
caber integralmente à assembleia municipal se esta tivesse um poder real sobre
o executivo e os seus deputados disponibilidades de tempo ou qualificações para
o fazer. Preferiu-se imitar a estrutura política das instâncias nacionais
criando assembleias municipais cujo funcionamento é uma réplica grotesca da AR,
tornadas, basicamente órgãos de cosmética democrática
Nesta lógica quantitativa não cabe a
ideia de que dificilmente será operacional um executivo camarário com mais de sete
ou nove vereadores com pelouros nas autarquias com maior dimensão humana; e se
houver, como é habitual, uma boa parte sem funções executivas, as reuniões
camarárias tendem a incluir vereadores com funções executivas e outros que
funcionam como fiscais dos primeiros, em verdadeiras assembleias, repletas das
discussões de ordem política e disputas que melhor caberiam numa assembleia
municipal e não num órgão vocacionalmente executivo.
Entendemos que não é necessário
órgãos executivos com tamanhas dimensões, devendo haver uma maior
responsabilização na decisão no seio da estrutura administrativa das câmaras,
com redução de vereadores e a total ausência dos costumeiros assessores
provenientes das canteras
partidárias, em rampa de lançamento para tachos mais largos ou mais fundos.
Entendemos – ainda que no contexto da
atual configuração da organização política e do modelo de representação – haver
vantagens no plano do aprofundamento da democracia, com um reforço dos poderes da
assembleia municipal e das responsabilidades delegadas dos trabalhadores
autárquicos, em detrimento da vereação, no que respeita ao número dos seus
componentes, como da sua intervenção na decisão. O fulcro da decisão política
deverá ser a assembleia, por iniciativa própria ou do executivo, cabendo a este
a gestão de nível superior e a intermediação entre a assembleia municipal e a
estrutura executiva da câmara. Tudo isso, com um reforço da composição da
assembleia em termos da representação do espetro político e da intervenção da
população.
Nos pequenos concelhos, por exemplo,
com cinco vereadores, torna-se necessário e muitas vezes possível a cooperação
entre elementos eleitos em diversas listas, porque a ligação à terra, as
relações pessoais são superiores às diferenças partidárias. Já nas maiores…
Antes de abordarmos a composição dos
mandatos atribuídos, vejamos a sua efetiva representatividade na população
recenseada:
inscritos
|
abstenções
|
rejeição
|
votos
dirigidos
|
|||||
nº
|
%
|
nº
|
%
|
nº
|
%
|
nº
|
%
|
|
2009
|
9.377.343
|
100
|
3.843.519
|
41.0
|
164.103
|
1.7
|
5.369.721
|
57.3
|
2013
|
9.501.103
|
100
|
4.503.111
|
47.4
|
340.769
|
3.6
|
4.649.503
|
48.9
|
Só os votos dirigidos a listas
partidárias ou grupos de cidadãos podem eleger representantes, como é óbvio e
daqui resultam várias questões:
- Os candidatos são essencialmente incluídos em listas partidárias e para ocuparem essa posição passam por vários filtros partidários – locais e nacionais – sujeitos que estão à disciplina e às hierarquias existentes nos partidos;
- A constituição de listas independentes dos partidos, podem ter a tarefa facilitada quando promovidas por mandarins em dissonância com a direção nacional/local do partido, uma vez que, representando parte do aparelho local, têm a experiência, a notoriedade e os apoios financeiros e mediáticos convenientes. E nos grupos de cidadãos que concorrem, sobretudo às câmaras de maior dimensão, preponderam mandarins de maior gabarito e apoios financeiros de gente que espera cobrar depois em favores por parte da vereação;
- As listas realmente independentes podem ter algum sucesso em concelhos de pequena dimensão, onde o conhecimento dos candidatos é maior por parte da população e onde esta atribui mais relevância à participação nas eleições para os órgãos autárquicos. Mais complicada é a tarefa nos concelhos mais populosos, onde os relacionamentos sociais são mais difíceis e o anonimato mais frequente;
- Neste contexto, não é tarefa fácil nem apelativa a recolha de assinaturas e a instrução de um processo de candidatura a uma junta de freguesia que seja; e isso torna-se mais um incentivo ao afastamento da esmagadora maioria das pessoas da participação política que vá além do voto ou da assistência às arengas dos mandarins;
- Uma vez que uma lista é eleita por maioria simples, qualquer que seja a participação no acto eleitoral, está aberta a caixa da ilegitimidade. Há sistemas eleitorais que exigem um mínimo de votos expressos e outros que exigem uma segunda volta entre os dois primeiros classificados no caso de nenhum ter mais de metade dos votos no primeiro acto. Nenhum deles está isento de dificuldades ou atropelos a uma verdadeira expressão democrática; porém, o sistema político e o modelo de representação, tal como funcionam em Portugal mostram-se cada vez mais fechados e, portanto, mais repudiados;
- Para além das questões anteriores acontece que também as pessoas que votaram podem ficar sem qualquer representação nas decisões sobre a comunidade; basta que tenham votado em lista que não teve nenhum eleito;
- Sucede, finalmente, que qualquer executivo camarário,
eleito por poucos ou por muitos votos actua da mesma forma; sabe que irá
ter um período de quatro anos de livre arbítrio e sem qualquer obrigação
de consultar as pessoas ou - horror dos horrores - torná-las partes na
decisão.
A votação nas listas concorrentes
reduziu-se em cerca de 720000 eleitores passando a representar menos de metade
dos inscritos, atestando a erosão da confiança das pessoas nas listas
propostas.
A evidente ausência de respostas que
favoreçam a vida das pessoas na crise que se vive atinge toda a classe política
e não apenas os partidos do governo pelas suas ações como delegados da troika
mas, também a oposição, simulada por uns ou, efetivamente omissa, por outros.
Em 2009, as votações em listas,
muito maioritariamente partidárias, atraiam parcelas confortáveis dos inscritos;
com mais de 60% dos inscritos perfilavam-se naquele ano, 176 concelhos, um número
que se reduziu para 107 em setembro último. No polo oposto, o apoio às listas
correspondente a menos de metade dos inscritos, observava-se em apenas 20
concelhos em 2009 e subiram para 86 em 2013, surgindo entre estes, 17 onde a
votação não alcançou os 40%; esta última, uma situação inexistente em 2009.
Nº de concelhos consoante os
escalões das
votações em listas (%
dos inscritos)
2009
|
2013
|
|
Com 30 a 40%
|
-
|
17
|
Com 40 a 50%
|
20
|
69
|
Com 50 a 60%
|
112
|
115
|
Com 60 a 70%
|
129
|
87
|
Com 70 a 80%
|
47
|
20
|
Média nacional
|
57.3%
|
48.9%
|
Neste contexto, a sermos exigentes,
conclui-se que em 2013 a legitimidade de uma eleição com tais resultados não
existe em 86 autarquias ou, numa lógica de grande tolerância, evidencia um
fosso entre os eleitos e a maioria da população.
Observe-se em seguida, a
distribuição dos mandatos em 2009 e 2013, com maior atenção para a dinâmica
entre os concorrentes no contexto dos diversas dimensões das autarquias.
Nota: Entendemos somar PSD/CDS e outros,
mormente MPT e PPM dado o número e a variedade combinatória dessas alianças; e
porque a proximidade ideológica e programática é próxima
Das evidentes perdas dos partidos do
governo e dos seus ajudantes habituais (MPT e PPM) - 83 vereações – quem mais
beneficia são os grupos (47 mandatos) e o PC (38) apesar de termos aqui incorporado
as perdas em Salvaterra de Magos e um outro mandato, por parte do BE, relativamente
a 2009.
Interessante é que a ala menos à
direita do partido-estado (PS) que tanto procura catalisar o descontentamento
popular face ao governo e à troika, apenas apresenta um ganho líquido de 6
câmaras em 2013, embora tenha ganho mais dezassete presidências e a despeito do
aumento em 8 unidades do total de lugares a preencher. Refira-se que incluímos
no âmbito do PS as coligações que a agremiação fez no Funchal e em Câmara de
Lobos, com o BE, o PND, o MPT (que na Madeira esteve contra o PSD), o PTP e o
PAN e que em conjunto ganharam 6 mandatos em 18 possíveis.
No caso das autarquias mais
pequenas, com menos de 10000 inscritos, houve uma ligeira quebra nos mandatos
atribuíveis por despromoções havidas como referido no princípio deste capítulo.
Neste segmento, há perdas visíveis do partido-estado (16 e 14 mandatos,
respetivamente, para PS e PSD e aliados), com maiores ganhos para os grupos
(18) e menos para o PC (7) relativamente a 2009. Note-se que nestas autarquias
a taxa de abstenção é comparativamente baixa e o seu crescimento é muito
inferior ao dos outros escalões de conjuntos de autarquias. Convirá recordar o
caráter enganador de alguns grupos de mandarins que se apresentam travestidos
de cidadãos.
Entre os concelhos com 10/25000
inscritos o aumento de mandatos reduz os impactos na sua distribuição. Somente
o PSD e seus aliados perderam um mandato tendo todos os restantes aumentado o
volume das suas representações, nomeadamente o PS e os grupos (mais 11 e 9
mandatos, respetivamente). No capítulo das presidências, o PS aumentou as suas
maiorias (mais 12 concelhos), em detrimento do PSD e aliados (7) e do PC/BE
que, neste caso perdem uma câmara cada um.
No caso das autarquias com 25/100000
inscritos observa-se uma grande quebra entre os partidos do governo (40
mandatos), sendo os principais beneficiados o PC e os grupos (mais 19 e 7
mandatos) para apenas mais 4 para o PS, valores que não são mais elevados
porque neste segmento houve uma redução de 10 mandatos atribuíveis.
Finalmente, no que concerne às
maiores urbes a situação é semelhante à espelhada no parágrafo anterior, com
ganhos mais visíveis entre os grupos e no PC (mais 13 e 10, respetivamente),
uma vez que o PS apenas acresce sete mandatos ao seu pecúlio. Quanto ao PSD e
seus comensais as perdas correspondem a 28 mandatos.
Em suma, os votos dirigidos a
partidos contribuíram para reforçar a presença dos grupos e do PC nos
executivos camarários em detrimento do PSD e dos seus aliados; por seu turno,
os ganhos do PS são marginais como produto dos ganhos nos concelhos com
10/25000 ou nos grandes, compensados com perdas nas pequenas comunidades.
Estruturalmente, nada mudou de
substantivo; o partido-estado e os seus apêndices ou, como sai bem dizer nestes
tempos que correm, o “arco da governabilidade” detém 83.9% dos mandatos, contra
88% em 2009, embora as suas perdas sejam mais pronunciadas nos concelhos mais
populosos; 73.2% atualmente contra 81.5% quatro anos atrás. Há, contudo, que
relativizar a importância dos resultados dos grupos de cidadãos nos casos em
que não passam de emanações partidárias.
5 – A verdadeira
representatividade dos eleitos
Procede-se, em seguida, a um
exercício aplicado aos vários concorrentes nos dois últimos torneios eleitorais
autárquicos, avaliando os seus desempenhos e, principalmente as suas efetivas
representatividades.
Abordámos atrás os vários segmentos
de comportamentos em eleições autárquicas – abstenção, voto em branco ou nulo –
quedando, agora, a distribuição dos votos com escolha de lista concorrente, observando
sobretudo a sua representatividade efetiva.
Como agremiação que enforma o
partido-estado, o PS tem uma presença na quase totalidade do território,
reduzindo-se mesmo a parcela de eleitores impossibilitados de escolher os
candidatos do partido nos pleitos autárquicos analisados (cerca de 190 e 130
mil, em cada um dos anos).
Os votantes no PS representavam
22.2% e 19.3% dos inscritos, respetivamente em 2009 e 2013. Claramente, os bons
resultados do PS em setembro são relativos e estão longe de ser produto de uma
confiança nas virtudes salvadoras de Seguro e dos seus compadres – o partido
recolheu menos 12.1% dos votos comparativamente a 2009.
PS
2009
|
2013
|
variação
|
||||
nº
|
%
|
nº
|
%
|
nº
|
%
|
|
Total inscritos
|
9.377.343
|
100,0
|
9.501.103
|
100,0
|
123.760
|
1,32
|
Inscritos nos
concelhos com presença
|
9.185.969
|
98,0
|
9.371.815
|
98,6
|
185.846
|
2,02
|
Votação nas listas -
todas
|
2.084.382
|
22,2
|
1.832.802
|
19,3
|
-251.580
|
-12,07
|
Votação nas listas
vencedoras
|
1.174.646
|
12,5
|
1.079.758
|
11.4
|
-94.888
|
-8.08
|
Votação nas listas com
eleitos
|
2.078.637
|
22,2
|
1.827.690
|
19,2
|
-250.947
|
-12,07
|
Votação nas listas sem
eleitos
|
5.745
|
0,1
|
5.112
|
0,1
|
-633
|
-11,02
|
Nota – Incluem-se aqui os elementos relativos às coligações
vencedoras no Funchal e em Câmara de Lobos,
que integraram também, o BE, o PND, o MPT, o PTP e o PAN
O PS foi o vencedor em 2013 com mais
câmaras (149) do que em 2009 (132) e isso com menos cerca de 95000 votos. Daí
que, atualmente quase metade das autarquias tenham presidentes provenientes do
apoio de 1/9 dos inscritos, e previamente peneirados por uma agremiação com
pouco mais de 100000 sócios, sobre os quais domina um diretório de umas dezenas
de entes.
O mesmo sucede com o total dos
mandatos, ainda que de modo menos pronunciado – 927 mandatos em 2013 (44.4% do
total), contra 921 quatro anos atrás – obtidos os primeiros com 19.2% da
totalidade dos inscritos.
A presença do PSD, do seu irmão CDS
e dos grupinhos MPT e PPM pelo território só deixou uns 14000 eleitores, em
2013, sem a possibilidade de gozar da alegria de votar na aliança que
protagoniza o saque que vem conduzindo ao alargamento da pobreza em Portugal.
Como é sabido, este conjunto, perdeu
mais de 574000 votos entre 2009 e 2013, passando a beneficiar das preferências
de 18.3% dos inscritos quando havia tido a confiança de quase um quarto em
2009. A quebra no que respeita ao número de presidências é maior e evidencia
que com apenas 9.5% dos votos possíveis o PSD/CDS garantiu a supremacia em quase
1/3 das autarquias, reproduzindo-se o que atrás se expendeu sobre o poder das
oligarquias partidárias.
De modo idêntico, os votantes que
contribuíram para a entrega de mandatos do naipe PSD/CDS são 18.1% do total
embora isso corresponda a 39.5% do total dos mandatos a nível nacional, em
2013.
O PC apresenta-se regularmente, em
quase todas as autarquias, nos dois últimos actos eleitorais autárquicos. A
votação nas suas listas cresceu apenas 2.4% entre as duas eleições, mantendo-se
idêntico o peso dos seus eleitores no total dos inscritos (5.8%).
O elevado aumento da votação onde o
PC assegurou presidências (19.7%) corresponde a um aumento de apenas quatro
relativamente a 2009, porque os ganhos se concentraram em municípios mais populosos,
como Loures, Évora ou Beja.
No que respeita ao número de
mandatos para vereadores observa-se um aumento assinalável de 39 lugares embora
a votação tenha crescido apenas 10.9% o que, sendo um acréscimo interessante
está longe de refletir uma variação indiciadora de um muito maior interesse das
pessoas pelo PC, apesar do actual contexto da realidade socio-económica.
Regista-se finalmente, uma redução
substantiva dos votos no PC não conducentes à eleição de vereadores que,
contudo se pauta por 1% dos inscritos, contra 0.1 ou 0.2% revelados no âmbito
do partido-estado.
Entre as listas eleitorais
formalmente desligadas dos partidos, muitas delas nada têm de independentes dos
mesmos. Cerca de 1/3 dos seus votantes pertencem a listas com fortes conexões
partidárias (V. N. de Gaia, Porto e Sintra) ou a algo de pouco exaltante como a
lista que ganhou em Oeiras – o concelho com maior poder de compra e nível de
escolaridade - tendo como ícone um criminoso chamado Isaltino, facto que não
abona muito a favor da maturidade política ou da ética que enforma os seus
votantes.
De qualquer dos modos os inscritos
com listas sem siglas partidárias à disposição aumentou bastante, atingindo em
setembro 34.2% do total. Porém, os votos recolhidos não representam mais do que
10.6% dos inscritos possíveis.
A votação nas listas vencedoras
aumentou substancialmente (127.7%), passando de sete para quinze presidências;
contudo, essas presidências – cerca de 5% do total - foram ganhas com votantes
que não representam mais do que 2.1% da totalidade dos inscritos. Quanto ao
número total dos mandatos, os ganhos são também muito significativos,
revelando-se uma pequena parcela de votantes que não conseguiram eleger
ninguém.
O BE reduziu a sua exposição a cerca
de 2/3 dos inscritos e, mesmo assim, somente obteve o apoio de 1.3% da
população, com perdas significativas face a 2009. Apesar da perda da
presidência de Salvaterra de Magos, os mandatos obtidos (menos um) foram
conseguidos por um escasso número de votantes e, ao contrário dos outros
concorrentes, a parcela daqueles sem a eleição de qualquer vereador é enorme. A
polarização da atividade política na AR e nos media, com profundo desinteresse
pelo trabalho político local não poderia conduzir a bons resultados.
Este e outros textos em:
http://grazia-tanta.blogspot.com/
http://pt.scribd.com/profiles/documents/index/2821310
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
Tem uma gralha(até onde eu consegui ler)pois onde diz está 2005 a respeito de primeiras eleições devia dizer 1975 não?
ResponderEliminarClaro que é erro e foi ser detetado. Já emendei. Obrigado
ResponderEliminarVou reenviar aos conhecidos. Trabalhos destes merecem que os eleitores conheçam a ver se da proxima votam com mais criterio. Já chega de tanta fé em capangas que enterram as finanças do país mas não param de achar que são governates de país rico- atendendo as mordomias que se atribuem e permitem em toda a administração publica e local;um escandalo que o tuga papa com ostias aodomingo namissa.
ResponderEliminarObrigado, António
EliminarEsteja atento a novos textos. O próximo é o nº 2 sobre o investimento estrangeiro, essa miragem
GT