Sumário:
1 – Conclusão
principal
2 –
Os resultados eleitorais
3
- Situação política lá e cá
4 –
Os truques da democracia de mercado
- - - - - -- - -
1 – Conclusão principal
As eleições gregas de 6 de Maio revelam evidentes vários traços da
radicalização da sociedade grega motivada pelas medidas da troika e o
consequente empobrecimento da população, em evidente contraste com a apatia vivida
em Portugal, submetido a medidas idênticas. Essa diferenciação obriga-nos, de
passagem, a refletir sobre a esquerda grega e a portuguesa bem como sobre o
nosso futuro coletivo.
A radicalidade tem crescido na Grécia perante o torniquete económico e tem
como primeiro alvo a direita, a Nova Democracia e o PASOK tomados como
representantes do capital internacional e dos bancos alemães, em particular.
Essa radicalidade significa a expansão de um espírito anti-capitalista e
anti-autoritário, devidamente criado pela repulsa da colonização coletiva
protagonizada pela UE e pelo FMI; em simultâneo, tem gerado um forte e
generalizado sentimento popular anti-alemão, que veio avivar a barbárie nazi,
quando da sangrenta ocupação da Grécia, no contexto da II Guerra.
Lastimavelmente, em Portugal, a consciência anti-capitalista é débil – mesmo
entre os militantes da esquerda - e muita gente considera, perante os
sacrifícios exigidos a propósito da dívida, que “temos que nos sacrificar
todos” ou que “não somos caloteiros”, como fruto de uma consciência distorcida
dos direitos e deveres de cidadania.
Para além da realidade económica, anos de protestos e greves, de
agressões às mãos da polícia, dos bandos fascistas ou dos PAME, a milícia de
caceteiros do KKE (o PC grego), criaram uma cultura de luta, de resistência,
que uniu jovens, desempregados e trabalhadores numa politização radical que incluiu
largas franjas de membros e simpatizantes do Syriza. Em Portugal, está-se bem
longe da violência do sistema evidenciada na Grécia mas, está em curso, a
preparação, a vulgarização da bestialidade policial, à sombra de informações
fantasistas dos serviços de informações que visam punir e aniquilar as
atitudes, as realizações, os protestos que não recebam o aval da CGTP.
Na Grécia, a situação económica e social é aproveitada por elementos
fascistas para captarem o apoio de gente acossada pela crise e incitarem-nos
contra um alvo tão fácil quanto falso, os imigrantes, na sua maior parte, de
passagem para a Europa rica. Nesse capítulo, em Portugal, o racismo e a
xenofobia são larvares e não têm alimentado mais do que pequenos bandos de
fascistas, oscilando entre o apoio policial e o envolvimento em crimes comuns.
As lutas dos gregos evidenciaram, no rescaldo das eleições, o estilhaçar do
rotativismo entre partidos de direita que carateriza as democracias de mercado
e apontado como condição essencial para a “estabilidade”. Em Portugal, nesse
campo, o atraso é patente, como se viu nas eleições de 2011.
Essas lutas tornaram evidente a um acrescido número de pessoas, que o
sistema não é reformável e que a solução não passa por participar em eleições,
dentro dos parâmetros atuais. Os abstencionistas em 2012 cifram-se em 3473 milhares,
mais 588 mil do que três anos antes. A redução do número de votos brancos ou nulos
provavelmente corresponde a pessoas que transitaram para a abstenção. Se a
todos estes se juntarem muitos daqueles que, tendo votado, são claramente pela
criação de um novo sistema político e económico, certamente que pelo menos metade
dos gregos não querem a continuidade do mesmo.
Os factos retratados justificam que um dirigente do Syriza tenha dito
claramente "O veredito popular indicou claramente que o ‘acordo de
resgate' é nulo". A partir de Junho de 2011, em Portugal, Passos tem
repetidamente expressado que “o veredito popular indicou claramente que o ‘acordo
de resgate' é para reforçar".
2 – Os
resultados eleitorais
Comparem-se, em primeiro lugar, alguns resultados das recentes eleições legislativas
gregas com as portuguesas de 2011.
|
Grécia
|
Portugal
|
||
|
2012
|
2009
|
2011
|
2009
|
Eleitorado
|
9 945 922
|
9 929 065
|
9 624 133
|
9.347.315
|
Votantes
|
65,09%
|
70.9%
|
58.1%
|
58.7%
|
Abstenções
|
34.91%
|
29.1%
|
41.9%
|
41.3%
|
Nulos e brancos
|
1.53%
|
1.9%
|
2.4%
|
1.9%
|
Votantes em partidos
|
63.56%
|
69.0%
|
55.7%
|
56.8%
|
O maior leque de escolhas do espetro partidário grego, não conduziu, em
2012, a uma maior propensão para o voto em geral e em partidos em particular,
face a 2009, embora se tenha verificado uma mais reduzida incidência de votos
brancos ou nulos.
Em Portugal, apesar do domínio estável do pentapartido - com um adereço
que se diz ecologista - não oferecer muitas alternativas (ou talvez devido a
esse mesmo afunilamento), a parcela de votantes no sistema partidário é menor
do que na Grécia. Alguém, que nada soubesse de Portugal diria que aqui haveria
mais condições para uma contestação radical alargada, dada a maior proporção da
expressão de alheamento ou repúdio do sistema partidário. Mas não é assim, mesmo que haja uma grande
similitude na situação das economias e das condições sociais que pesam sobre os
dois povos[i].
O voto dos gregos em 2012 e o dos portugueses em 2011 é muito distinto. Na
Grécia, na evidência do criminoso papel das duas formações da direita – Nova
Democracia e PASOK – o voto da contestação dirigiu-se para um grupo de
esquerda, Syriza - constituído como plataforma de várias formações ainda que
dominada pelo Synapismos, um género de Bloco de Esquerda mas, bem mais avançado
e maduro. Acontece frequentemente que no nome de Syriza - Coligação de Esquerda
Radical seja sublinhado nos media o termo “radical” com o propósito de insinuar
desordem, violência, contestação destruidora e assim, assustar o telespetador,
bem instalado no seu sofá, a preferir a podre estabilidade dos “mercados” e o
voto nos partidos do roubo.
No entanto, propor como o faz o Syriza, o rompimento com o programa da
troika e reconhecer que a austeridade e o empobrecimento coletivo acelerado,
está longe de ser uma medida radical mas antes, um ato de elementar bom senso
que até Mário Soares subscreve para o PS português, na boleia da vitória de
Hollande. No entanto, a necessidade de derrube do governo da troika é uma
evidência para a sobrevivência do povo grego e a luta pela sobrevivência é, sem
dúvida e sempre, uma causa radical.
Em Portugal, em 2011, o desagrado pouco contestatário, lançou o voto para
os bolsos de uma direita ainda mais criminosa e genocida do que a dirigida por
Sócrates; e, de permeio castigou o ziguezague tático do BE, sem premiar um mono
estalinista chamado PCP.
A distribuição dos votos dos gregos pelos principais partidos revela uma
grande diferença de 2009 para os nossos dias. A distribuição dos votos saída
das eleições gregas produziu o seguinte quadro, onde se omitiram outras 23
formações concorrentes, cujo caráter político não nos é fácil determinar,
obtendo cada uma, entre 161 milhares e … 66 votos.
|
2012
|
2009
|
||
|
Nº
|
%
|
Nº
|
%
|
Votantes
|
6 474 173
|
|
7 039 707
|
|
Brancos e nulos
|
152 612
|
|
188 652
|
|
Esquerda
|
|
|
|
|
Syrisa
|
1 060 789
|
16.8
|
315 665
|
4.6
|
KKE (PCE)
|
535 902
|
8.5
|
517 249
|
7.5
|
Esquerda Democr.
|
385 949
|
6.1
|
-
|
-
|
Ecologistas
|
185 303
|
2.9
|
173 589
|
2.5
|
Direita
|
|
|
|
|
Nova Democracia
|
1 191 555
|
18.9
|
2 295 719
|
33.5
|
Pasok
|
833 109
|
13.2
|
3 012 542
|
43.9
|
Gregos Independ.
|
670 329
|
10.6
|
-
|
-
|
Aurora Dourada
|
440 735
|
7.0
|
19 624
|
0.3
|
LAOS
|
183 424
|
2.9
|
386 205
|
5.6
|
A vitória política do Syriza foi conseguida através de uma afirmação
clara de recusa da troika e da austeridade, de procura de uma vasta unidade que
atraiu muitos eleitores desencantados com a direita, mormente do PASOK que,
mesmo na derrota, continua a querer honrar o compromisso com a troika. Essa
fragmentação da direita, conduziu a criação da Esquerda Democrática, baseada em
antigos apoiantes do PASOK, sendo também ex-apoiantes deste partido, muitos dos
que engrossaram o voto no Syriza. Por seu turno, uma cisão da Nova Democracia
conduziu à formação dos Gregos Independentes, sendo plausível que daquela
também tenham transitado muitos dos que votaram nos fascistas da Aurora
Dourada.
Destacámos a votação nas prefeituras gregas onde o Syriza foi a força
mais votada, referindo ainda a votação da Nova Democracia, como partido mais
votado a nível nacional, bem como as posições do KKE, pelo seu caráter
considerado de esquerda e dos fascistas da Aurora Dourada, pelo crescimento do
apoio grangeado.
|
Xanthi
|
Kerkira
|
Kelafonia
|
Achaia
|
A Salónica
|
Eubeia
|
Syrisa
|
23.7%
|
19.3%
|
18.9%
|
21.8%
|
17.5%
|
18.5%
|
ND
|
21.8%
|
18.3%
|
18.0%
|
17.6%
|
14.8%
|
14.5%
|
KKE
|
> (7º)
|
12.8% (3º)
|
15.0%(3º)
|
7.9% (5º)
|
9.3% (5º)
|
8.3% (6º)
|
Aurora
|
> (7º)
|
7.2% (6º)
|
7.9% (6º)
|
6.3% (6º)
|
> (7º)
|
8.6% (5º)
|
|
Voiotia
|
Chania
|
Ática
|
A Pireu
|
B Pireu
|
A Atenas
|
B Atenas
|
Syrisa
|
19.4%
|
17.2%
|
19.4%
|
19.2%
|
23.9%
|
19.1%
|
21.8 %
|
ND
|
14.8%
|
8.4% (3º)
|
13.7%
|
16.7%
|
9.8%
|
15.8%
|
12.4%
|
KKE
|
9.2% (5º)
|
7.5% (3º)
|
8.7% (5º)
|
7.7% (5º)
|
12.3% (3º)
|
8.6% (6º)
|
9.6 % (4º)
|
Aurora
|
8.2% (6º)
|
> (7º)
|
9.7% (4º)
|
8.9% (4º)
|
8.5% (5º)
|
8.8% (5º)
|
6.7% (6º)
|
Os resultados do Syriza são conseguidos nos grandes centros urbanos
gregos – Atenas-Pireu, Salónica ou Patras. Por seu turno, o KKE apenas foi
maioritário em Samos, junto à costa turca enquanto Creta se evidencia como um
bastião do PASOK, tendo o resto do país dado a maioria à Nova Democracia.
A comparação com Portugal é algo deprimente. A título de exemplo, refira-se
que nas câmaras de Lisboa e Porto, a esquerda institucional cinge-se a um vereador
em cada cidade, depois de ter, em Lisboa, tido votações apreciáveis anos atrás.
E na margem sul da área metropolitana de Lisboa, nas autarquias dirigidas pelo
PC cultiva-se um espírito de afastamento relativamente à população, pratica-se
o trabalho precário e recusa-se um orçamento participativo, mesmo na sua versão
adulterada, lusa.
3
- Situação política lá e cá
O Syriza descende de uma plataforma de esquerda que incluía o KKE até à
saída deste nos anos 90 e, entretanto, evoluiu como plataforma aberta à
diversidade da esquerda, federando vários grupos[ii]
numa ação comum, construindo uma unidade ganhadora e atraente para muitos dos
desavindos com o PASOK. Frequentemente, nas lutas na rua, muitos militantes e
simpatizantes do Syriza juntam-se com jovens, desempregados, trabalhadores sem
partido e anarquistas em ações comuns contra a polícia, os fascistas e a
mílicia PAME, do KKE[iii].
Esta prática distingue o Syriza do BE, apesar da Marisa Matias se ter
apressado a dizer que ambos pertencem ao mesmo grupo do Parlamento Europeu e ao
PEE – Partido da Esquerda Europeia, cuja existência é pouco menos que
irrelevante. Aqui, o BE, só entende a diversidade entre as suas pequenas seitas
fundadoras, fechando-se aos grupos e movimentos sociais que não controla,
ignorando as iniciativas que vão pontuando a contestação crescente; a única
figura pública do BE que abertamente defende uma franca colaboração com os
movimentos sociais é o Mário Tomé.
Dentro da boa gestão da presença na televisão, típica do BE, a deputada
pelo Porto apareceu na Es.Co.La quando a polícia a destruiu e as televisões
estavam no terreno, seguindo o cheiro da brutalidade das bestas e esperando que
o sangue escorresse entre as pedras da calçada. O BE, sobretudo depois da
derrota eleitoral de 2011 adoptou uma maior proximidade com o PC, alheia-se das
realizações organizadas pela esquerda desalinhada e alternativa, preferindo
funcionar como rabejador nas pendulares manifestações do sindicalismo
situacionista do PC, que tanto tranquilizam a direita[iv].
Incumbido de formar governo, o Syriza mantém-se coerente com as promessas
eleitorais, apresentando um programa-chave de governo, assente numa base clara de
e fratura e mudança – “É óbvio que o
veredicto popular torna nulo o acordo do resgate”, como já atrás foi referido.
“1) Rejeição imediata do memorando, cancelando
todas as medidas prestes a acontecer que vão "empobrecer ainda mais os
gregos", como cortes de pensões e de salários;
2) Cancelamento
imediato de todas as medidas a acontecer que vão "minar os direitos
fundamentais dos trabalhadores", como abolição de acordos de trabalho
colectivos;
3) Abolição imediata da lei que garante imunidade
aos deputados, reforma da lei eleitoral e do sistema político, abolição os 50
assentos para o partido mais votado;
4) Controlo estatal dos bancos e uma
investigação aos bancos gregos, com a imediata publicação da auditoria do
BlackRock à banca grega;
5) Formação de um comité
internacional para investigar as causas da dívida pública, com moratória sobre
todo o serviço da dívida até que sejam publicadas as descobertas da auditoria.”[v]
Nas negociações para a constituição do governo, o Syriza incitou os dois
partidos da direita, responsáveis pela situação da Grécia a escreverem aos
dirigentes da UE denunciando o memorando com a troika, obrigando-os a uma
natural recusa. Entre os outros partidos, a Esquerda Democrática já manifestou
o apoio à proposta do Syriza mas, não o KKE.
Se o KKE tivesse aceite participar numa coligação pré-eleitoral com o
Syriza, numa demonstração de respeito para com os anseios do povo, a soma dos
votos do Syriza e do KKE – sem contar com o poder mobilizador dessa união –
permitiria a eleição de 78 deputados e o primeiro lugar nas eleições, à frente
da Nova Democracia. Posteriormente, esses deputados, somados aos 19 obtidos
pela Esquerda Democrática e aos 50 oferecidos pela “secretaria” à força
política com mais votos, daria 147 deputados, sabendo-se que a maioria no
Voulis se consegue com 151. E demonstraria que o truque eleitoral criado para
favorecer a direita ter-se-ia virado contra esta.
Isso, porém seria um cenário idílico que não consideramos possível dentro
da ortodoxia estalinista. Nesta, a unidade só é concebida como ato de submissão
de outras forças de esquerda à supremacia dos ungidos ou, como integração subalterna
em coligações de direita, para garantir a paz na rua e nas empresas. Para
demonstrar esse pendor, recorde-se que em 1989/90, o KKE apoiou ou participou
em governos dirigidos pela … Nova Democracia, em nome de uma unidade nacional
que permitisse a governabilidade da Grécia[vi].
Aceitou então uma unidade nacional e agora recusou uma unidade social e de
esquerda, conclusão que servimos à mesa dos crédulos da utilidade dos PC’s para
a emancipação dos trabalhadores e da multidão, contra o capitalismo.
Perante as propostas do Syriza, a direita do rotativismo irá manter-se
confortável no número de deputados oferecidos pelo truque eleitoral dos 50
deputados previsto na constituição e jogará tudo em novas eleições, depois de
aliciar ou comprar outros partidos ou, mandarins da direita e do centro, para
garantir uma maioria parlamentar. Também é certo que o Syriza não conseguiu
formar governo mas, as propostas de atuação transmitem uma coerência que pode
trazer novos votantes nas eleições que seguramente se realizarão muito em breve
(junho). O KKE aposta também em novas eleições.
O KKE, é a versão grega, ainda mais estalinista, do PC português, tendo
ambos uma boa relação[vii].
A sua costumeira visão sectária, a
pretensão a ser o condutor e controleiro da luta do povo, torna-o
particularmente agressivo, quer contra os outros grupos da esquerda – incluindo
o Syriza – quer contra manifestantes de esquerda que agride, desempenhando as
funções da polícia, que deverá agradecer. Tal como com o PC em Portugal em
2011, o KKE não grangeou agora o reconhecimento eleitoral dos gregos,
mantendo-se isolado e nacionalista, recusando uma aliança ao Syriza, tal como a
UE mas… não o euro ou a suspensão do pagamento da dívida. A típica atitude
nacionalista dos PC’s – herdada da postura da URSS na luta contra a invasão
nazi – coincide com as propostas igualmente nacionalistas, dos fascistas que
acusam os imigrantes de “roubarem os empregos” aos autótones. Essa cultura
patrioteira da parte dos PC’s, que esqueceu há dezenas de anos o
internacionalismo e a multiculturalidade como valores progressistas, facilita a
passagem de votos para a extrema-direita; agora, nos centros urbanos gregos
como há uns vinte anos na “cintura vermelha” de Paris, a favor de Le Pen.
4 – Os
truques da democracia de mercado
Variados são os truques dos regimes de democracia de mercado para
oferecer o poder executivo a congregações políticas conservadoras – são o
método de Hondt, a criatividade na repartição do território em circunscrições
eleitorais, a exclusividade dada a partidos para participar em eleições e o grosseiro caso grego que vamos explanar.
Na Grécia, o primeiro partido votado recebe sempre um bónus de 50
deputados (num total de 300) a acrescer aos que ganha em eleições. Em 2012, na
realidade a Nova Democracia elegeu 58 deputados mas acaba por ficar com 108 com
apenas 18.9% dos votos enquanto o Syriza com pouco menos votos (16.8%) fica
apenas com os 52 que conquistou. Em 2009 o PASOK elegendo 102 correspondentes a
41.8% dos votantes esteve representado no parlamento por 152 – maioria absoluta
- enquanto, por seu turno, a Nova Democracia com 38.1% dos votos ficou apenas
com 91.
É o que se chama … democracia. Sendo 300 deputados, a Nova Democracia tem
no Voulis – que, aparentemente, não chegará a reunir para já - quase tantos
deputados eleitos como os oferecidos pelo sistema eleitoral; com menos de 1/5
dos sufrágios ultrapassa 1/3 da composição do hemiciclo.
Este brinde constitucional visa a criação de governos maioritários à
revelia dos resultados eleitorais e promove a desvalorização de todos os
partidos que não o primeiro classificado e, implicitamente, a consideração da
maioria dos eleitores, aqueles que não apoiaram o partido mais votado, como
pessoas de segunda categoria. Aliás, na Grécia, os mandarins afirmam, para
justificar esta aberração democrática, que os gregos “querem ser governados e
não representados”; dito de outro modo, o povo é uma amálgama de idiotas que,
felizmente tem uma classe política de primeira escolha para zelar por si.
Este truque, criado para favorecer, naturalmente, os partidos do
rotativismo da direita (Nova Democracia ou PASOK) não merece qualquer incómodo
ou protesto da célebre “comunidade internacional”, sempre tão atenta ao
comportamento democrático dos regimes de que não gosta. O pânico do mandarinato
grego e dos seus colegas europeus decorre de que o povo helénico não se mostra
muito tolerante face aos partidos do poder, obrigando-os mesmo a uma
fragmentação que não estava nos seus planos.
Não sendo fácil constituir governo nas condições de subordinação à troika
e aos seus tutelares, haverá novas eleições para se encontrar uma maioria
“estável”, um governo forte como também se diz, um “governo sensato” como
exortado pelo ministro dos negócios estrangeiros alemão, Westerwell, capaz de agradar
aos prósperos bancos gregos e de brutalizar os desempregados e os jovens nas
ruas.
Quando Papandreu se demitiu e falou de referendo[viii],
em outubro último, foi mandado calar e ir para férias, dando lugar a um clone
neoliberal, o funcionário Papademus, escolhido pelas altas esferas para aplicar
docilmente as receitas da UE/FMI para o empobrecimento e o genocídio dos
gregos. E tudo indica que, gasta essa solução, os helenos terão de fazer tantas
eleições quantas as necessárias até que os “mercados” se acalmem. Recordam-se
dos dois referendos irlandeses?
Em Portugal, a situação grega é incómoda para a direita e para a chamada
esquerda. A direita governamental tem estado muito confiante e confortada no
regaço da Merkel, mantendo Portugal na tradição do bom aluno da UE, avançando
com medidas mais gravosas que as definidas no memorando da troika.
Entretanto, tem vindo a aumentar o coro dos que, mesmo tecnicamente,
apontam para o facto de não haver retoma europeia com sucessivas e maciças
doses de austeridade e de empobrecimento. A eleição de Hollande vai nesse
sentido, embora seja conveniente não encarar a França como o arcanjo libertador
dos PIIGS das garras do dragão. Hollande irá receber uma economia francesa estagnada,
uma dívida elevada e grande envolvimento dos seus bancos em títulos da dívida
italiana e por esse motivo também não quererá a manutenção da situação actual.
Para o efeito e perante a subalternidade de Sarkozy face ao protagonismo
alemão, Hollande entoa tiradas patrióticas que caem bem no nacionalismo gaulês,
sempre muito reativo face aos germânicos que humilharam a França em três
guerras historicamente recentes – 1870, 1914 e 1940.
Neste contexto, a direita portuguesa, espera para ver o que dará a
pressão de Hollande - mesmo antes de tomar posse - e em que desembocam as
eleições gregas, desdobrando-se em afirmações cautelosas. O PS aliás,
apressou-se a dizer que é fiel aos compromissos com a troika, demarcando-se do
patriarca Soares. Imagine-se um governo grego com a agenda proposta pelo
Syriza, mesmo que suavizada e como isso desarmaria a atuação do governo Passos
de alcatifar o caminho dos capitalistas lusos, à sombra das exigências da
troika.
Para a ala esquerda do pentapartido luso, não há nada melhor que um
gradualismo de introdução de medidas keynesianas para temperar a austeridade e
a recomposição do capital a que se assiste; uma mansa inclusão na turma do
Hollande. Esse gradualismo permite-lhes a continuidade do sistema político e
económico vigentes, uma oposição de discursos na AR que não acrescentam
empregos nem maiores salários, a renegociação da dívida ao sabor da vontade da
direita e dos bancos, as procissões à sombra dos andores rituais da CGTP, a dolce vita dos burocratas sindicais, a retoma
do diálogo na concertação social, as pazes com o Proença e a brutalidade policial
nas costas da contestação de esquerda. Enfim, a estabilidade política que tanto
ajudará o investimento, como também promete o patronato e a direita … para
qualquer dia.
As eleições na Grécia tornam evidente para todos que há alternativas; e o
resultado das eleições gregas foi o resultado de anos de lutas na rua, contra a
polícia e as milícias fascistas ou do KKE e não o produto do esclarecimento
eleitoral na tv, protagonizado por peralvilhos engravatados.
[i] Revolta na grécia, modorra em Portugal
[ii] SYNASPISMOS
(P.I.E.) / AKOA : Esquerda Comunista Renovadora e Ecologista (P.I.E.) / DEA:
Esquerda Internacionalista de Trabalhadores (ISO) / Kokkino (4a Internacional)
/ Ksekinima (CWI) / Rosa / KEDA : Movimento para a Unidade e a Ação Comum da
Esquerda / Energoi Polites: - Cidadãos Activistas/ Ecosocialistas da Grécia
(Rede Internacional de Ecosocialistas) / DIKKI :Movimento Democrático Social
(neste
último, imagens do PAME atacando a multidão para defender o parlamento onde se
iria votar o reforço da austeridade)
[iv] Esta “esquerda” é a tranquilidade da
direita
[vi]
PASOK was returned to office in 1985, but the party
lost its parliamentary majority in the June 1989 legislative election, in which
New Democracy emerged as the largest single party but fell six seats short of
an absolute majority. Despite being on opposite sides of the political
spectrum, ND and the Communist Party-led Coalition of the Left and Progress
(SYN) - which held the balance of power in Parliament - set aside their
ideological differences and formed an interim coalition government headed by
Tzanis Tzannetakis, a New Democracy backbencher. However, a fresh
parliamentary election held the following November brought few changes: once
more, New Democracy fell short of an overall majority, this time by three
seats. Consequently, Greece's political leaders agreed to the formation of
an all-party government. The interim administration, headed by Xenophon
Zolotas, a former governor of the Bank of Greece, ruled the country until April
1990, when ND won exactly half the Vouli seats in the third legislative election
held in less than one year. Following the election, New Democracy party leader
Constantinos Mitsotakis formed a government with the help of a center-right
parliamentarian who subsequently joined the ruling party. (sublinhados nossos)
[vii] O blog “Resistir”, ligado ao PC, apresenta
o comunicado do KKE divulgado no próprio dia das eleições onde o partido se
mostra contra a direita (apelando no entanto, às suas bases) e o Syriza que
apelida de nova social-democracia. Deliciosa é mesmo o aprofundamento
ideológico introduzido pelo blog ao emendar num quadro a qualificação política
do Syriza para “aliança de forças oportunistas e forças do PASOK”. A dor de
cotovelo dói mesmo!
[viii] Sobre o referendo da Grécia e o que virá
a seguir
Este e outros textos em:
http://pt.scribd.com/people/documents/2821310?page=1
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
http://grazia-tanta.blogspot.com/
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