A coisa está preta. Os gregos decidiram que não estão dispostos a
arcar com a salvação dos bancos… a não ser que a Alemanha pague o preço. Já que
os querem remeter para um terceiro mundo pouco lhes importa se usarão o euro ou
voltarão à velha dracma. Uma coisa já sabem, que não há solidariedade com a
Grécia, apenas com os bancos.
Se a Alemanha não pagar o preço da salvação da Grécia para salvar
os bancos estoira com o mercado de proximidade que viabiliza as suas
exportações e verá novas grécias a surgirem – Itália, Espanha e a Bélgica surge
claramente no horizonte, para além da pasmaceira lusitana; e com eles novas
saídas do euro, se este não sair sozinho de cena, como que em jogada de
antecipação.
A solução deste imbróglio idiota é assumir-se que tem de haver
falências bancárias, fusões de bancos, limpeza dos seus activos tóxicos e
incobráveis com ajustarmento do balanço global do sector bancário. Assumir
fortes perdas para accionistas e detentores especulativos de títulos, mais ou
menos fictícios, como os tais derivados e CDS’s. O capital financeiro em
circulação, contabilizado em valores astronómicos e portanto, profundamente
artificial, tem de se adaptar à economia real, à formação de poupanças. É o modelo
neoliberal dos mercados financeiros de “alavancagem” da economia, a espiral do
crédito e do consumo inveterado que, para além do mais, destrói o ambiente, é
um modelo demente de civilização que está em causa.
Essas perdas atingirão fortemente os fundos de pensões, cujas
receitas dependem das valorizações constantes dos títulos onde aplicam os
descontos dos segurados e da distribuição de lucros baseados na artificialidade
daquelas valorizações. É todo o sistema de segurança na velhice e na doença que
rebenta, colocando bem claro que o modelo neoliberal de capitalização da
segurança social tem pés de barro e vai falir.
A ligação entre o capital financeiro e os Estados, sempre abertos a
salvar o sistema revela que tão capitalista é a finança como os Estados.
Apoiam-se mutuamente e as classes políticas estão bem por dentro desse filme e
pretendem salvar o sistema (e a sua folgada existência) à custa das populações,
tornadas excedentárias, como o revelou recentemente o secretário Mestre, ao
incentivar os jovens a emigrar. É que o idiota ainda não percebeu que a
globalização unificou o mundo e que não há planeta alternativo.
Na Lusolândia, o Passos estará agora ao telefone com o Ricardo
Salgado enquanto o cego tecnocrata Gaspar prepara novos cortes em contato com
os ex-colegas do BCE e o Cavaco prepara um novo discurso moralista depois de
reunir um tal conselho de Estado. A chamada esquerda mantém-se no seu ritmo de
sempre, na sua visão nacionalista, com procissões na avenida e um pontapé para
a frente com uma greve geral, sem perspectivas de mobilização transformadora. E
desejará um feliz natal ao povinho, prometendo “novas” lutas lá para fevereiro,
como é norma.
Os gregos, para obrigar o governo a recorrer a um referendo lutaram
valentemente, com mais uma dezena de greves, centenas de manifestações e
concentrações, confrontos com a polícia e sofrimento. Aqui, numa situação
inusitada de desastre, o ritmo e a intensidade dos protestos mantém-se dentro
da rotina. O importante parece ser mesmo os jogos de futebol desta semana…
De há um ano atrás, essa esquerda de esferovite ficou unidinha
atrás de biombo da CGTP e, agora, com propostas tão conciliadoras como a
renegociação da dívida, cuja tradução deverá ser; “nós pagamos a salvação dos
bancos mas… em prestações suaves”. E, portanto, apontam para uma auditoria à
dívida sem quererem assumir a sua vontade de manter o sistema de oleamento do
capital financeiro a partir da punção fiscal e do papel cleptocrático do
Estado. Fingem que não sabem que todo o funcionamento do Estado neoliberal está
montado para aquele oleamento; e que mesmo que fizessem uma auditoria à divida
existente no dia X, passado um ano de trabalho, nova dívida teria sido gerada
porque os agentes do oleamento do sistema financeiro e do sector privado
continuariam em cena.
Qualquer transformação séria em Portugal o que exige transformações democráticas de
fundo, uma mobilização de massa para transformar as coisas; exige que se olhe
para o sistema e se não fique pasmado a olhar para a crise que aquele provoca.
Este e outros textos em:
31/10/2011
Sem comentários:
Enviar um comentário