domingo, 1 de janeiro de 2012


Portugal, os “mercados” e o empobrecimento generalizado

                                                                                           Sócrates & Passos,
Ao serviço dos ricaços

Sumário

1. Esperança que se some, revolta que aumenta

2. A soberania que emigrou para Bruxelas, Frankfurt, para os “mercados”

3. A delegação de poderes e a hierarquia de comando

4. O PEC III, a caminho do PEC IV, com o PEC V no horizonte. E o FMI?

5. Onde estão os ricos e quantos são?

  1. População activa e inactiva
  2. Composição da população activa
  3. Composição da população inactiva
  4. Repartição do rendimento gerado – 1
  5. Repartição do rendimento gerado - 2
  6. Desigualdades salariais


1. Esperança que se some, revolta que aumenta

Todos os dias se ouve a mesma ladainha. A de que todos nos devemos sacrificar para cumprir as metas orçamentais e, no seguimento, chovem as medidas, ao que dizem, nesse sentido.

O elenco de “medidas” é vasto, diversificado e começou por ser propalado nos media, subreptício, silencioso ou quase despercebido. Insinuaram-se regularmente, com promessas de que virão os amanhãs radiosos de sol e, porque a massa é mansa, nem usaram medidas de diversão, aproveitando-se apenas do empenhamento popular com a telenovela Queirós.

Em termos de construção mediática veja-se o Sarkozy. Porque os franceses são aguerridos nos seus protestos, entendeu aumentar a idade mínima da reforma, gradualmente até 2018, dos 60 para os 62 anos, arrecadando € 18600 M/ano com a aprovação da medida, pelos seus confrades no parlatório local, tomados como representantes da população. Só num sistema de representação tão falsificado como o vigente nos países ditos ocidentais é que os ditos representantes, se reconhecem no direito de tomar medidas como esta, meridianamente ao arrepio da vontade das pessoas, mesmo das mais canhestras.

Sarkozy, no entanto, para distrair os media, aproveitou e lançou uma medida odiosa – a expulsão dos ciganos – que repugna a muitas consciências mas, que não toca a vida pessoal dos franceses. Há muito, o designamos por Sarko(na)zy e ele ainda tem muito para revelar fazendo jus a esta corruptela do seu apelido.

Mesmo quando surgem em pacotes brutais, como recentemente, as “medidas” encontram uma cama macia, acolchoada pela exaustão de opiniões de especialistas, empresários e economistas que, por acaso foram governantes e se regalam com belíssimos salários em mescla com portentosas e diversificadas reformas; e que, também por acaso, se papagueiam uns aos outros, apenas rivalizando, no sadismo com que apregoam as suas soluções.  Tudo isso é acompanhado com a constante revelação de que nos outros países, tudo se processa do mesmo modo, que os outros povos aceitaram os sacrifícios, que os “mercados” estão mais sossegados no que lhes diz respeito. Fica assim criada, na multidão, uma base de resignação, complementada com a evidente incapacidade organizativa e de projecto existente à esquerda bem como com a crença patrioteira e ingénua de que patrões e trabalhadores se irão sacrificar, que estão todos no mesmo barco.

Porém, lá no fundo, todos se sentem revoltados. Mas esperam, não se sabe bem o quê. Eleições? Mudança de governo? Crescimento da exportação? Um brilharete da selecção de futebol para elevar o ego? O euromilhões? E esperam que alguém comece o protesto, mantendo-se no comodismo próprio dum egoismo cobarde com discurso imbecil, que desarma a auto-organização e a desobediência ao reduzido bando de facínoras que tudo decide e que rouba o que pode ou, mais propriamente, o que lhe deixam roubar.


2. A soberania que emigrou para Bruxelas, Frankfurt, para os “mercados”

Regressando à ditosa pátria amada, refira-se que o governo de encoberta coligação PS/PSD, mesmo com a encenação de crispação e divergência entre os dois sócios da firma Sócrates & Passos, vai lançando as bases acrescidas do empobrecimento dos trabalhadores e dos outros desfavorecidos na lógica do capital.

Todos sabemos que o governo não passa de uma comissão que age por delegação. Não dos eleitores portugueses, como alguns idiotas ainda acreditam mas, por procuração de Bruxelas, do BCE, dessa galáxia indefinida, fria e obscura que dá pelo nome de “mercados”.

E soa a hipocrisia para transmissão no telejornal, os arrobos patrióticos da classe política contra a perda de soberania programada, mais explicitamente agora, por Bruxelas, depois dos recados públicos encomendados pela Merkel. Os que gritam com a perda de soberania quando Bruxelas pretende definir previamente, os grandes traços do orçamento, fazem-se esquecidos de várias coisas que desde há muitos anos vêm representando precisamente perda de soberania.

Todos ficaram contentes com os fundos comunitários, acreditando que seriam de borla e até a esquerda institucional deixou de gritar contra a então CEE. O mandarinato recusou-se liminarmente a perguntar ao povo se queria perder a tal soberania através da diluição na “Europa” o que só revelou a tradicional estupidez da burguesia portuguesa; objectivamente, bastaria acenar com os fundos comunitários, para a resposta ser positiva.

Nem lhes passou pela cabeça que a multidão é assaz realista e só quer uma soberania que se traduza em melhoria consolidada de bem-estar; da mesma forma que emigram para outros países, abandonando – aí sim, é doloroso, familiares, amigos, lugares – em busca de bem-estar. De facto, para além de situações em que a soberania está (ou se julga que esteja) ligada a razões bem materiais, os delírios nacionalistas ou soberanistas só existem na cabeça de alguns privilegiados.

Recusaram-se a colocar à multidão a questão do tratado de Lisboa que, naturalmente, retira poderes à frágil e inútil burguesia portuguesa no contexto europeu.

Vão arrastando os pés dos tropas integrados em pelotões-NATO, à disposição do Pentágono, sem que previamente haja perigo para a soberania nacional ou daí resulte um seu acréscimo. E calam-se, enquanto compram submarinos e aviões em vez de uma play-station a cada general, o que seria bem mais barato.

Finalmente, se a AR, cuja soberania é muito limitada face ao governo, que quase tudo decide, sem grandes queixas dos iluminados deputados, qual a lógica de se insurgirem, só porque Bruxelas decidiu colocar a nu a ausência de soberania das instâncias políticas portuguesas?

Na realidade, se Bruxelas decidir exigir um depósito prévio de garantia contra derrapagens orçamentais descontroladas isso é uma multa que não tira o sono ao mandarinato luso, pois os responsáveis nunca pagarão nada e transitarão impunemente, do governo, para exercer as suas enormes (in)competências nos bancos, em empresas ou institutos públicos (reais ou fictícios). Porém, como a Alemanha não parece agradada com a ideia… a coisa cairá no olvido.


3. A delegação de poderes e a hierarquia de comando


No contexto do PEC II em Maio, no que respeita a Portugal, foi ordenado por Bruxelas que, no final de 2010, o famigerado deficit que nos envia insónias, se terá de cifrar em 7.3% do PIB e em 4.6% para 2011.

Foi delegado no governo, para internamente, cumprir o serviço encomendado, gerindo como entender as finanças públicas mas, satisfazendo os interesses dos “mercados”. E, nervosamente, o governo foi procurando evitar qualquer latido das agências de rating, cães de guarda dos “mercados”, que opinam apenas sobre os grandes números pois qualquer maior detalhe envolveria investimento analítico (e portanto, custos, menor rendabilidade…); o que seria demais para a relevância que Portugal tem para os ditos “mercados”. E, assim ninguém exige mais do que uma declaração das empresas de rating para empurrar um país e os seus habitantes para o plano inclinado do empobrecimento.

Para aqueles, pouco importa se as vítimas da punção que os irá engordar são os trabalhadores, os desempregados, os reformados ou, até mesmo a maioria dos capitalistas lusos que, para além de ignorantes e incapazes, não estão incluidos naquela galáxia dos “mercados”. Como reputados e competentes agiotas, os “mercados” e o sistema financeiro que sob aquela designação se esconde, sabem que o dinheiro não tem cor, nem cheiro, que o único certificado de origem é a designação “BCE” e a assinatura nas notas de um verme qualquer que faz parte do referido sistema.  E soam a patéticas as queixas de Sócrates de que os “mercados” são injustos face aos esforços do governo português para debelar o deficit; estará a querer condoer as bolsas e colocar lágrimas nos olhos dos banqueiros e dos especuladores?

Posto isto, os “mercados” ordenam aos mandarins nacionais, resultados; e até oferecem aos governos o seu receituário, sobejamente conhecido, como manual de instruções e adoptam a pragmática e sábia fórmula de que pouco importa a cor do gato, desde que cace os ratos. Dentro deste raciocínio, pouco importa se o governo luso é do PS ou do PSD, se é uma mancebia dos dois, com ou sem pitada de CDS, desde que a riqueza seja canalizada com o agrado dos “mercados”.

Enquanto os “mercados” esperam, impacientemente, os resultados, (“time is money!”) a batata quente fica nas mãos dos mandarins nacionais, dos  sócrates, dos passos, dos zapateros, dos papandreus. Há muito que os interesses económicos, a economia, tomou totalmente conta dos executivos nacionais ou mesmo plurinacionais, retirando qualquer possibilidade ao surgimento de protagonismos políticos autónomos.

Estão longínquos os tempos em que a esquerda tinha nas suas bandeiras a da subordinação do poder económico ao poder político; a globalização do capital e das suas instituições tornou impossível esse desiderato a nível local. Assim sendo, os mandarinatos tendem pois a ser amontoados de medíocres, corruptos em busca de enriquecimento pessoal, com uma presença muito curta em cena; mas sempre, sempre ao lado do capital, dos “mercados”.

Compete aos governos, em primeiro lugar, servir os “mercados” e depois organizar a fila que se forma sempre à porta do orçamento e do Estado. Nessa fila estão os grandes empresários do país, os banqueiros, os mais generosos financiadores do partido no poder, esperando grandes empreitadas, vultuosos empréstimos e retoques na legislação. Acotovelam-se a seguir os PME, os godinhos, à espreita de prebendas, favores, encomendas, subsídios, estudos, etc. Perfilam-se os caciques partidários que se querem aboletar, com a corrupção q.b. de permeio, em ânsias porque sabem ser curto o prazo de validade dos mandarins.  Há ainda a vasta gama de empreendedores imobiliários ou trolhas bem sucedidos, os “empresários” locais, que alimentam as redes mafiosas que enleiam as autarquias, É preciso manter com ração de qualidade, o pessoal das fardas, militares, polícias, juízes. E não esquecer o municiamento dos canais próprios com os media para a defesa da bondade das medidas que são tomam, para procedimentos laudatórios, mistificatórios ou caluniosos, de acordo com as circunstâncias da pressão e da temperatura conjuntural e ainda para colaborarem na promoção da mansidão da plebe. É obra! E por isso eles, os mandarins, ganham rapidamente cabelos brancos!

Posto isto, o que sobra? A multidão, a plebe, os trabalhadores em geral, os funcionários públicos, os desempregados, os jovens sem futuro, os reformados, os velhos, os doentes, os pobres, os indigentes, a ralé dos sem trabalho nem direitos. Os que sobram. Como se vê, são quase todos.

É sobre esses que o PS/PSD faz incidir as suas medidas, aproveitando-se da ineficácia dos sindicatos e dos partidos de esquerda e do tradicional deficit de auto-organização, autonomia e auto-confiança da multidão, convencida da necessidade de hierarquia, burocracia e de chefes que pensem por si.

Os recados do FMI e da OCDE são conhecidos e pouco inovadores; menos Estado por axioma, dez anos de cortes nos salários e congelamento do SMN, aumento do IVA e redução os benefícios de IRS de modo sensível para quem tem baixos rendimentos, menos impostos para as empresas, degradação do acesso à saúde e da qualidade do ensino e muita flexibilidade na legislação laboral, com despedimentos mais facilitados, perseguição a desempregados e indigentes… Tudo isto sempre com o aplauso “técnico” dos economistas de referência, como o trauliteiro Carreira, os PSD Catroga ou Duque, os punhos de renda António de Sousa ou Artur Santos Silva, ou o pouco recomendável Nogueira Leite. Nas suas palavras prepondera a ausência de análise crítica sob a forma daquele conformismo sádico típico dos ricos quando se referem aos problemas dos pobres. As suas atitudes são particularmente odiosas quando sublinham que “temos que cortar” “que vivemos acima das nossas possibilidades” como se a esmagadora da população tivesse algo de comum com eles ou, se lhes pudesse equiparar em rendimento e património, para se justificar a utilização de uma primeira pessoa do plural.

Para converteram as almas simples em crentes da bondade daquele receituário, os governantes mostram-se muito rigorosos no controlo das migalhas, das pequenas fugas e fraudes dos desvalidos da sorte, propagam cruzamentos de dados à procura de acções e imobiliário … em candidatos ao RSI. E sempre de cenho fechado ou arreganhado para mostrar rigor, autoridade, todos sabendo que é só fachada pois o peixe grosso escapa pela malha da rede, a rir às gargalhadas, como nos casos BPN, BPP, Face Oculta, Duarte Lima e outros mais antigos como os da UGT ou do Carrapatoso, para os quais os rigores da lei se equiparam a um frio da praia, em Agosto, às duas da tarde.


4. O PEC III a caminho do PEC IV, com o PEC V no horizonte. E o FMI?

Antes, de se explicitarem as medidas transmitidas ao governo para aplicação, nada melhor do que compreender o que são os “mercados” através de uma parábola da mitologia judaica, numa das suas muitas versões.

Um rabino, a partir de um pedaço de argila construiu um golem, um ser antropomórfico animado, para o ajudar nas suas tarefas domésticas; como ele crescia dia a dia, o rabino, para que ele ficasse controlável passou a reduzi-lo diariamente ao estado de argila e repetir depois o acto da criação. Um dia esqueceu-se de realizar a primeira operação e o golem tornou-se num enorme e desmesurado ser; quando, finalmente, teve oportunidade de o transformar em argila, a massa do golem era tão grande que envolveu o rabino e asfixiou-o.

O golem dos tempos que correm poderá ter adoptado a designação de “mercados”. Ou a multidão domina os “mercados” para construir o seu bem-estar ou os “mercados” devoram-nos a (quase) todos.

Observem-se, em seguida as medidas emanadas do governo luso, para inclusão no OE - 2011, com as estimativas dos valores associados, para melhor se aquilatar quem são as suas vítimas e, por exclusão, os beneficiários ou os isentos daqueles rigores. Este é o resultado de o golem andar por aí, à solta.

Reduções de despesa (2% do PIB -  € 3300 M)

  • Cortes nas remunerações superiores a € 1500 mensais, pagas pelo Estado (abrangendo cerca de 450000 pessoas);
  • Congelamento de promoções entre os trabalhadores da administração pública;
  • Congelamento de admissões e redução do pessoal contratado;
  • Redução de ajudas de custo, horas extraordinárias e da acumulação de salários na administração pública com pensões da CGA;
  • Redução de despesas com a frota automóvel do Estado.

As duas últimas servem essencialmente de propaganda e a referência a este tipo de medidas é usual em tempos de crise, desde há décadas, sem quaisquer efeitos reais. Ninguém verá os ministros a andar de metro. Irão reduzir as acções da ASAE, das condições de trabalho e as fiscalizações a contribuintes que sempre foram premeditadamente ineficazes ou insuficientes?

Por seu turno a redução de contratados vai aumentar o desemprego e, nada se refere sobre a contratação de empresas de consultadoria, muitas delas instaladas nos próprios serviços públicos.

Tudo isto é computado em 0.6% do PIB em 2011 - € 983 M

  • Congelamento de todas as pensões (abrangendo 1850000 pessoas);
  • Redução de 20% no RSI (abrangendo perto de 500000 pessoas);
  • Restrições no direito ao abono de família  (afecta as famílias de 1383000 crianças e jovens);
  • Redução de encargos com a ADSE.

Conjugando o congelamento das pensões, nomeadamente as mais baixas, com o aumento do IVA e as restrições no capítulo do SNS, a conclusão a que se chega é que os mais carenciados devem ter alguém que os apoie ou, se não tiverem, que devem morrer depressa, para aliviar as contas públicas.

No caso do RSI, as alterações introduzidas recentemente, vêm materializar as intenções de redução já definidas no PEC- I (1).

Quanto ao abono de família, as restrições correspondem a € 250 M e revelam a estratégia europeia de redução da população (em Portugal todos os cenários do INE para 2025 contemplam uma redução da população actual, que poderá então atingir cerca de 1,2 M habitantes a menos do que hoje).

Tudo isto é computado em 0.6% do PIB em 2011 - € 983 M

·         Redução das despesas com o SNS.

Como é sabido, tal redução afecta os escalões mais desfavorecidos da população, os que não podem pagar serviços médicos privados nem pagar seguros de saúde. Representa muito bem a hipocrisia de Sócrates quando se afirmou arcanjo defensor do SNS ao mesmo tempo que gera parcerias com grupos privados e assiste serenamente à saída de médicos para os mesmos.

Paralelamente, alimentam-se esses grupos financeiros e as seguradoras com comparticipações públicas chorudas nos actos médicos de beneficiários do SNS/ADSE, favorece-se o recurso a seguros de saúde,  transformando o SNS num serviço residual, mal dotado de meios, destinado a pobres. Em suma, é uma peça central da pulsão genocida da burguesia portuguesa (2)

Computado em 0.3% do PIB em 2011 - € 492 M

·         Corte nas transferências para autarquias e fundos autónomos.

Computado em 0.2% do PIB em 2011 - € 328 M

·         Corte em despesas do PIDDAC.

Computado em 0.2% do PIB em 2011 - € 328 M

·         Redução de indemnizações compensatórias e subsídios às empresas.
·         Extinção e fusão de organismos do Estado.
·         Plano de emergência para reorganização do SEE.

A primeira medida deverá manifestar-se no encarecimento ou deterioração dos serviços de transportes públicos, por exemplo.

As duas seguintes terão um efeito muito limitado, dada a necessidade de manutenção de cargos para os membros do partido nacional, socialista e das coortes dos seus subservientes. Ainda em 2006 se procedeu a um PRACE, com escassos resultados financeiros, pois da extinção de serviços típicos de administração pública resultaram institutos públicos a abarrotar de mandarins e emplumados jotinhas bem pagos.

Estas medidas computam-se em 0.1% do PIB em 2011 - €164 M

Aumentos de receita (1% do PIB -  € 1639 M)

  • Revisão do sistema de deduções e benefícios em sede de IRS;
  • Revisão dos benefícios fiscais para pessoas colectivas;
  • Convergência da tributação do regime dos reformados com o dos trabalhadores por conta de outrém.

As alterações contempladas e já anunciadas no PEC  I, de Maio e consensualizado no âmbito do PS/PSD, englobam aumentos das taxas de IRS em cerca de € 210/pessoa/ano e cortes nas deduções e benefícios de € 180/pessoa/ano.

A terceira medida representa uma igualização de condições fiscais para trabalhadores activos ou ex-trabalhadores, reduzindo-se assim as condições de excepção para quem vive de pensão de reforma, nomeadamente no capítulo da saúde. É nesta linha que se consideram os doentes de Alzheimer (153000) como não crónicos e, portanto, sem direito a isenção de pagamento de medicamentos. A lógica presente é conhecida: quem não produz, quem constitui irremediável fonte de gasto e para mais tem escassas possibilidades de contestação é para desaparecer o mais rápido possível, através de dificuldades económicas acrescidas – o genocídio em câmara lenta.

Estas medidas computam-se em 0.4% do PIB em 2011 - €656 M

  • Aumento da taxa normal de IVA de 21 para 23%;
  • Revisão das tabelas anexas ao IVA;
  • Imposição de uma contribuição ao ssitema ficanceiro.

Como é sabido, o aumento da carga fiscal de IVA recai quase totalmente nos consumidores e pesa sobremaneira entre quem tem mais baixos rendimentos – trabalhadores, desempregados, reformados e pobres em geral. Tendo em conta que a taxa de poupança de toda essa gente é nula (quando não negativa), o aumento do IVA corresponde a uma redução equivalente no rendimento. Por outro lado, sendo a economia paralela florescente, fica dado um sinal incentivador da fuga fiscal que tanto interessa ao prestador de serviçoes que esconde facturação, como o comprador que se furta ao pagamento da taxa; e, como é conhecida a conivência sistémica com a economia paralela e a ineficácia programada das fiscalizações, aumentam os factores de desigualdade entre a população, entre os que podem furtar-se e os que não podem, ao pagamento de IVA.

Quanto à tributação adicional da banca aguarda-se a sua definição, sabendo-se à partida que são os bancos que mais influem na configuração da política economica e do sistema fiscal e que não serão, marginal certamente,

Estas medidas computam-se em 0.6% do PIB em 2011 - €983 M


Os “mercados” não ficarão contentes com estas medidas. Através das frequentes emissões de dívida soberana portuguesa com taxas de juro a 6,5%, Portugal atrai capitais (especulativos) como poucos países o conseguem, actualmente. O risco deles é mínimo pois trata-se de um país onde corre o euro e que tem por detrás o BCE e a UE; e a taxa é suculenta. Os “mercados” lambem-se de prazer, batem palmas e gritam para Sócrates; bis!, bis!

Entretanto, Portugal, no capítulo das altas taxas de juro que paga, vai superando a concorrência espanhola, italiana, irlandesa, só perdendo a medalha de ouro para a Grécia (… como no futebol, em 2004…). Aos países do norte da Europa, com a Alemanha à cabeça, pouco lhes importa pois pagaram antecipadamente, em fundos comunitários. E a Comissão Europeia sempre tão atenta aos factores desviantes da concorrência também pouco se importa que os PIIGS paguem os capitais a uma taxa três vezes superior à paga pela Frau Merkel.

Esta situação agrada aos “mercados” e, se necessário pedirão a ajuda do famigerado FMI para que a teta continue a gotejar o doce leite da mãe pátria dos portugueses. E o mandarinato luso também lhe não desagrada essa ameaça pois, serve às mil maravilhas para atemorizar a multidão, para esta aceitar complacente o roubo das calças na esperança de poder conservar a tanga (vocábulo introduzido pelo célebre Poltrão Tramposo, em 2003)

À semelhança do que ocorreu, nomeadamente, em 1983/85, o FMI pode intervir mais directamente em Portugal deixando a nu o papel do PS/PSD como marionetes. Como é natural, os burocratas do FMI, não tendo família em Portugal, ou responsabilidades políticas - não concorreriam a eleições, nem têm clientelas espalhadas por aí - agiriam no pleno gozo do seu carácter anti-social, descomplexadamente, com total ortodoxia, na aplicação do seu cardápio, como fiéis intérpretes dos interesses dos “mercados”.

Não se divisa na intervenção directa e aberta do FMI em Portugal, benefícios para a multidão. Apenas um. O de demonstrar a inutilidade da burguesia portuguesa e o total descrédito dos mandarins, seus apêndices. Esse descrédito poderia vir a conduzir a uma recomposição do espectro político, nomeadamente com o esfrangalhamento do PS/PSD, verdadeira súmula de tudo o que é merda em Portugal.

Desse descrédito e desse desmoronar o que surgiria? O surgimento de um forte movimento autónomo de contestação ao FMI, de desobediência ao statu quo cleptocrático? A marginalização ou enfraquecimento do actual protagonismo asfixiante e pouco enriquecedor dos partidos políticos? Maior capacidade de imposição de um largo cabaz de medidas de defesa dos direitos da multidão como o por nós definido em 2009 (3)? Ou, essa recomposição do espectro político conduziria a uma italianização, com um bloco bem à direita, fascizante, e um alter ego que se afirmaria de esquerda, envergonhadamente, somente  para se apresentar como alternativa?


5. Onde estão os ricos e quantos são?

Traçou-se no ponto anterior um elenco genérico e incompleto dos malefícios tradicionalmente preparados pelos governos com destino à multidão. Em seguida procede-se a um exercício de medida do número dos prejudicados e dos beneficiados com a actuação do PS/PSD nos últimos anos, mormente desde 2002, quando a “austeridade” e “crise” se tornaram endémicos nos discursos dos mandarins portugueses.

Implicitamente, pretende-se também desmontar o discurso patrioteiro utilizado pelo poder, tal como por alguma esquerda, que gostam de frisar a importância do sacrifício de todos, o imperativo nacional ou o carácter anti-nacional das medidas do governo. Como se ricos e pobres pagassem proporcionalmente a crise, como se os diversos grupos sociais estivessem ao mesmo nível nas escolhas políticas definidas. Por outras palavras, como se tivessem deixado de haver trabalhadores e capitalistas, havendo apenas cidadãos “nacionais” irmanados num mesmo objectivo patriótico de combater a crise.

Que saibamos, continua a haver despedimentos e essa decisão não é democrática nem se adorna com veludos patrióticos. Os precários arrastam essa situação por imposição e ambicionam ter um projecto de vida decente e não ouvir ladainhas às dificuldades dos “empresários”. Qualquer trabalhador ou ex-trabalhador, ao passar pelas ruas e contemplar à sua volta a riqueza que cria ou criou com o seu trabalho, perguntará porque razão a pátria lhes dá salários ou reformas de miséria e mantém acantonados na Quinta da Marinha ou em condomínios de luxo, uns escassos milhares de entes que se apossaram do que sai ou  saiu das suas mãos?

Vamos desenvolver raciocínios quantificados baseados em elementos disponibilizados publicamente pelo INE, na sua grande maioria.


  1. População activa e inactiva

No periodo 1998/2009 as estimativas do INE davam conta de um aumento populacional de 4.8%, com parte substancial desse acréscimo resultante da entrada de imigrantes, fenómeno que se vem esbatendo mais recentemente.
             Quadro 1





milhares
 População
1998
2008
2009
      residente
10.149
100,0
10.627
100,0
10.638
100.0
      activa
5.096
50,2
5.625
52,9
5.583
52.5
      inactiva
5.020
49,5
4.998
47,0
5.056
47.5
                Nota: a soma da população activa e inactiva evidencia uma diferença
                                face à população residente cuja origem o INE saberá explicar

Se a população activa cresce 9.6% isso corresponde a um acréscimo de gente (487 milhares) no exercício de funções laborais ou outras e, significa um aumento do potencial produtivo, gerador de riqueza, e rendimento da sociedade. Inversamente, a população inactiva, conjunto heterogéneo de pessoas que não exercem actividade também cresce, ainda que marginalmente (0.7%).

Neste contexto, em 1998, havia 99 inactivos por cada 100 activos, passando essa relação para 91/100, registando-se, portanto, mais gente em actividade para a manutenção da população inactiva; por aqui, concluir-se-ia que as condições para um progresso social estariam criadas. Sublinhe-se, porém, a degradação da situação em 2009, fruto do conhecido encadeamento “mercados”-Bruxelas-PS/PSD.

Ora, se há mais gente activa e se a situação económica da maioria se degrada, para onde vai o produto do trabalho? Onde é que ele aflui? Onde se concentra?


  1. Composição da população activa

Entre 1998 e 2009 a composição da população activa teve alterações significativas.

A mais relevante consiste no brutal crescimento de 109.9% do desemprego que, como se sabe, continuou no presente ano e que, tudo indica, prosseguirá ascendente, devido às imposições dos “mercados”, traduzidas em Bruxelas e que têm em Portugal como submissos executores, Sócrates e Passos, a amálgama PS/PSD. E isso, a despeito do teatro de marionetes que vão desenvolvendo, para empurrarem, de um para o outro, o odioso do papel que ambos desempenham.

O desemprego, para além dos sofrimentos individuais, dos distúrbios emocionais que provoca é, do ponto de vista sistémico, uma estupidez. Se existem necessidades evidentes na população portuguesa e no mundo em geral, que sistema irracional é este que permite o não aproveitamento de tão enorme massa de capacidade de trabalho, para a produção de bens e serviços?

A população empregada cresce numericamente apenas 4.3% no periodo considerado, nomeadamente após a quebra do último ano, revelando mais um aspecto da entropia social e produtiva que se assiste  há algum tempo.

Quadro 2






milhares

1998
2008
2009
var %
população activa
5.096
100,0
5.625
100,0
5.583
100,0
9,6








empregados
4.844
95,1
5.198
92,4
5.054
90,5
4,3
    Trab. c/outrem
3.453
71,3
3.950
76,0
3.856
76,3
11,7
         (dos quais, contrato sem termo)
(2859)
(82,8%)
(3047)
(73,4%)
(3007)
(78,0%)
(5,2)
    Trab. c/própria
1.245
25,7
1.198
23,0
1.154
22,8
-7,3
    Familiares não remunerados e outros
146
3,0
50
1,0
44
0,9
-69,9








desempregados
252
4,9
427
7,6
529
9,5
109,9

Os trabalhadores por conta de outrém, os assalariados, aumentam o seu volume em 11.7% apesar da quebra de 94 000 elementos em 2009. Cabe perguntar porque razão o aumento significativo da força de trabalho, da acção produtiva do conjunto dos trabalhadores residentes em Portugal, não se manifesta em geração do rendimento ao seu dispor, de bem-estar e de aumento de direitos. Existem duas razões; uma, é a degradação do nível médio das remunerações reais e por outro o aumento da parcela do rendimento ao dispor dos capitalistas, globais e nacionais, directamente ou, através de distribuição protagonizada pelo Estado.

Entre os assalariados que, como se disse atrás, acresceram o seu número em 11.7%, destoa um acréscimo de apenas 5,2% para o quantitativo dos trabalhadores com contrato sem termo, evidenciando a gula do empresariato por contratos a prazo e pelo culto da precariedade. Em termos comparativos, a redução do número destes trabalhadores no activo, em 2009 face a 2008, é bem menor do que a observada para os outros trabalhadores por conta de outrém:
     
                  Quadro 3 - Variação de efectivos entre 2008 e 2009

nº (1000)
%
TCO - total
- 94
- 2.38
TCO - contrato sem termo
- 40
- 1.31
TCO – outros vínculos
- 54
- 5.98

Perante a crise, o empresariato luso, mais facilmente se descarta de trabalhadores com vínculos precários (cerca de 6% dos que trabalhavam em 2008 foram dispensados no ano passado) do que de assalariados com contrato sem termo. O que não surpreenderá ninguém, naturalmente.

Os trabalhadores por conta própria reduzem-se em 91 000 elementos (-7.3%) no periodo 1998/2009. Isso revela o crescimento do salariato em Portugal, a dificuldade de se exercer uma actividade com independência, sem um vínculo hierárquico fixo, fora da subordinação a uma empresa. O capitalismo é invasivo, concentracionário e tende a não permitir grandes autonomias.

Demonstra também a escassa concretização na realidade do neologismo “empreendorismo”, tão propalado pelos mandarins, pelos arautos do neoliberalismo, pelos propagandistas do sucesso individual, da concorrência, em detrimento do trabalho colectivo e da solidariedade. Quantos jovens no desemprego ou na precariedade ficam inebriados a sonhar com uma carreira como trabalhadores independentes?

Entre os trabalhadores por conta própria, pouco menos de 1/4 do total têm trabalhadores ao seu serviço, no entanto, não existem grandes diferenças nos ritmos de redução do seu volume, comparativamente ao dos trabalhadores isolados, trabalhando por conta própria.

Há uma situação concreta, que conhecemos, onde são protagonistas trabalhadores independentes, com ou recurso a terceiros, assalariados, muitas vezes amigos ou familiares. Quem instalou linha telefónica, ou teve dificuldades e avarias com as mesmas ou com a internet, já deparou com trabalhadores enviados pelos operadores daqueles serviços; esses trabalhadores não são quadros dessas grandes empresas mas, contratados à peça pelas mesmas.

Em que condições? Esses trabalhadores têm de assegurar o transporte e as deslocações em veículo próprio e recebem cerca de € 9 por cada local que visitam, qualquer que seja o problema e é-lhes dada uma carga diária de uns 15 serviços. São monitorados constantemente por telefone pelas operadoras (muitos destes trabalhadores prestam serviços a todas elas) que avaliam o desempenho; se as coisas correm bem, entregam-lhes mais uns serviços e, se correm mal eles têm de alongar o dia de trabalho ou podem até transitar trabalho para o dia seguinte.

No caso de uma avaria reparada, o trabalhador voltará ao local, sem pagamento adicional, quer seja uma reincidência do mesmo problema ou seja outro, durante os dois meses que se seguem ao primeiro serviço; tal discricionariedade ilustra bem o carácter independente deste tipo de trabalho. Na realidade, trata-se de trabalhadores dependentes, com uma pluralidade de patrões, eles sim independentes mas, conluiados o suficiente para o explorar.

Vejamos; em média realizam uma receita diária de € 135, a repartir por dois (o trabalhador contratado e o seu ajudante), com os se terá de pagar a amortização e a manutenção do veículo e dar o incontornável contributo ao Teixeira dos Santos. Nesse mesmo dia, um Bava qualquer arrotará lagosta paga com cartão de crédito da empresa, fará contas aos milhões de salário e prémios e assinará mais umas ordens de despedimento ou recrutamento de precários com o salário mínimo. É bom viver do trabalho em Portugal!

Finalmente, refira-se a drástica redução do número de trabalhadores familiares sem remuneração ou outros. Essa redução resulta, também da expansão do salariato e da maior dependência do núcleo familiar, relativamente ao trabalho desempenhado fora de casa; da maior separação entre economia doméstica e negócio próprio; de uma transição para situações enquadráveis na economia informal ou, estatisticamente consideradas como de inactividade.


  1. Composição da população inactiva

Como atrás se observou, a população inactiva tem estagnado, numericamente, ao contrário da população activa, mostrando-se assim que a sociedade portuguesa, tem aumentado a sua capacidade de prover à manutenção dos inactivos, nomeadamente reformados, crianças e jovens. Se, em termos de rendimento, o PS/PSD, açulado por Bruxelas e pelos “mercados” vêm contrariando a manifestação dessa maior capacidade global é porque os recursos vêm sendo desviados para os bolsos dos “mercados” (sistema bancário e especuladores) ou das  empresas e “empresários” lusos de referência (Mota-Engil, Brisa, EDP, telecoms e umas quantas mais); nesse processo, os gangs PS/PSD, não recuam mesmo em promover um verdadeiro genocídio dirigido a pobres, desempregados e idosos (2) (4)

Quadro 4






milhares

1998
2008
2009
var %
população inactiva
5.020
100,0
4.998
100,0
5.056
100,0
0,7
crianças, < 15 anos
1.673
33,3
1.625
32,5
1.615
31,9
-3,5
reformados  
1.434
28,6
1.759
35,2
1.831
36,2
27,7
domésticos 
763
15,2
544
10,9
509
10,1
-33,3
estudantes > 15 anos
1.150
22,9
744
14,9
779
15,4
-4,3
outros inactivos
326
6,5
321
6,3

O número de crianças vem perdendo peso porque a natalidade é muito baixa. E esta, é baixa pois o tempo de preparação para a entrada na vida activa é mais longo que antes, o controlo da procriação é mais efectivo, a precariedade e a ameaça de despedimento coarctam as intenções de gerar descendência, a instabilidade social e a ausência de um quadro tranquilizador de segurança social torna o futuro nebuloso, o PS/PSD não promovem um sistema público de creches e escolas ou de saúde pública gratuitos (apesar do aumento da carga fiscal) e porque uma mulher grávida é recusada ou expulsa do emprego. Em suma, são as condições geradas pelo capitalismo e pelos mandarins que provocam a baixa natalidade.

Se a longevidade aumenta é natural que seja acrescida a população retirada da vida activa, como fruto da constante renovação das gerações responsáveis pela produção de bens e serviços. O aumento da idade da reforma vai dificultar essa renovação, com prejuizo para jovens que atrasam a sua entrada na vida produtiva e para os mais velhos, muitos dos quais padecerão de problemas de saúde e de menos incentivos para adoptar tecnologias e incorporar inovações.

Por outro lado, mandarins, instituições como a UE, OCDE, etc devidamente copiadas pela prostituição jornalística e pelos analistas do costume, apregoam a necessidade de aumento da vida activa para sustentar o pagamento futuro das reformas. Se se pensar no incentivo à entrega de poupanças junto das seguradoras (PPR…), com o consequente desvio de recursos financeiros do sistema público; e se se atender ao enorme aumento da produtividade havido nas últimas décadas, na realidade o que se verificou foi a retenção dos frutos desse aumento, pelos capitalistas, em detrimento da prevenção, da acumulação de recursos para assegurar rendimentos após a saída da vida activa. (5)

Bem prevenidos andam, sem dúvida, os mandarins que, sem grandes alardes públicos, recolhem pensões em idade activa e com elas constituem verdadeiros “bouquets” com que amaciam o resto da vida. Sacrifícios nessa área, nem pensar; e, não deixa de ser pornográfico ouvir gordos beneficiários de várias reformas exigir reduções de salários e aumentos da idade da reforma aos outros, com o aplauso subserviente dos media.

Em onze anos, aumentou em cerca de 400 000 a população de reformados, o que não espanta ninguém, pois qualquer vulgar projecção demográfica o faria prever e exigiria as medidas adequadas para o efeito, o que o PS/PSD não fez. Pelo contrário, a direita facilitou a reestruturação das empresas, aceitando reformas antecipadas às catadupas para as aliviar dos custos respectivos e não impondo tectos às pensões faraónicas que se conhecem, a favor de mandarins.

Quanto aos domésticos, onde preponderam mulheres, a redução do seu número tem a ver com a forçosa maior integração no trabalho fora de casa, das mulheres de gerações mais recentes e com o estiolar da cultura tradicional da mulher confinada ao mundo limitado do lar e das imbecilidades televisivas, destinada aos trabalhos domésticos.

Finalmente, observa-se uma compensação entre o aumento dos estudantes maiores de 15 anos e a redução dos outros inactivos, mantendo-se o conjunto com pouca alteração, no periodo considerado.


  1. Repartição do rendimento gerado - 1

Uma leitura ligeira do quadro abaixo permitiria que se afirmasse ter aumentado, nesta distribuição primária do produto social, em cerca de 1% do PIB, a parcela de cada trabalhador, no rendimento global, em detrimento do valor à disposição dos capitalistas (excedente bruto) e do seu Estado (impostos). Absolutamente errado.

Quadro 5 - Repartição do rendimento gerado




1998
2008
variação
M euros
%
M euros
%
%
Remunerações do trabalho
52.348
49,2
83.498
50,2
59,5
Excedente bruto de exploração
40.992
38,5
61.277
36,8
49,5
Impostos
13.158
12,4
21.658
13,0
64,6
Total (PIB pm)
106.498
100,0
166.438
100,0
56,3

Em 1998, o número daqueles que tiveram remunerações pelo trabalho (trabalhadores por conta de outrém ou de conta própria) foi de 4698 milhares, volume que passou a 5148 milhares em 2008 (ver quadro 2). Assim, as remunerações do trabalho a dividir pelo número daqueles que o receberam, conduz a um valor médio anual de:

1998 - € 11143
2008 - € 16220

Como o crescimento dessa remuneração média é apenas de 45.6%, situa-se aquém do aumento da massa global das remunerações do trabalho, que foi de 59.5% naquele periodo e que se deve essencialmenta a um aumento de 450000 trabalhadores.

A mesma questão pode ser colocada de outro modo. Admita-se que o volume de trabalhadores em 1998 (4698 milhares) se teria mantido o mesmo em 2008 e que teriam beneficiado do aumento de 59.5% nos dez anos considerados, tal como registado para o total das remunerações do trabalho. Nesse caso, a sua remuneração anual média teria evoluido do seguinte modo:

1998 - € 11143
2008 - € 17772

Se assim tivesse sido, os 450000 trabalhadores que o INE considera como terem acrescido ao volume da população com prestação remunerada de trabalho, teriam trabalhado… sem remuneração. Em síntese, houve uma redução efectiva da remuneração média dos trabalhadores residentes em Portugal.

Proceda-se ainda a uma terceira abordagem. Suponha-se que em 2008 a parcela das remunerações do trabalho e aqueles que as receberam constituiam um volume igual às observadas em 1998. Se assim tivesse sido, o total das remunerações do trabalho teria sido, em 2008, da ordem dos € 81888 M, aquém, portanto do valor calculado pelo INE, considerado no quadro 5.

Se assim tivesse sido, cada trabalhador teria auferido anualmente, cerca de € 17430, o que não é verdade, como acima se anotou. À entrada dos já referidos 450000 trabalhadores adicionais podem associar-se apenas € 1611 M (€ 83498 M - € 81888 M), isto é, apenas € 3579, por ano. Isto não corresponde à realidade mas, constitui um exercício demonstrativo da efectiva perda de peso das remunerações do trabalho no total do PIB.

E para terminar a exploração destes dados do INE, recorda-se o atrás referido, que a remuneração anual média por trabalhador passou, no periodo 1998/2008, de € 11143 para € 16220 (+45.6%).

Não seria nada do outro mundo, nem de afrontoso para os incansáveis “empresários” que os rendimentos de cada trabalhador, no mesmo periodo tivessem crescido tanto quanto o PIB, isto é 56.3%. Se assim tivesse sido aquela remuneração média em 1998 (€ 11143/ano) ter-se-ia transformado em € 17416, dez anos depois e, tendo em conta o aumento do número de trabalhadores, a massa monetária de remunerações do trabalho seria de € 89657 M em 2008.

Como, segundo o INE a globalidade de remunerações do trabalho, em 2008, apenas foi de € 83498 M, há uma diferença de € 6159 M que constitui uma acrescida transferência do colectivo dos trabalhadores em 2008, a favor do capitalismo global, da burguesia portuguesa, do seu Estado, incluindo nessa difusa amálgama, os estimados mandarins.

Em resumo, cada trabalhador português procedeu, em 2008, a uma entrega aos capitalistas de € 1196, só por conta do não reflexo na sua remuneração, do crescimento observado para o PIB no mesmo ano. O que representa 7,4% da remuneração média efectivamente auferida em 2008 (€16220)


  1. Repartição do rendimento gerado - 2

Tomando agora a população com mais de 15 anos, a sua segmentação, em 2008, de acordo com a principal fonte de rendimento é a seguinte:

            Quadro 6

Total
Empregados
Empregados/total
1000
(%)
1000
(%)
(%)
Total
8.998
100,0
5.198
100,0
57,8
Salário/vencimento
4.257
47,3
4.257
81,9
100,0
Reforma/pensão
2.304
25,6
322
6,2
14,0
Subsídio de desemprego
203
2,3
11
0,2
5,2
Lucros/dividendos/juros/rendas
441
4,9
410
7,9
93,0
Trabalho em espécie
54
0,6
54
1,0
100,0
Trabalho sem remun. p/familiar
11
0,1
11
0,2
100,0
Outros casos
1.728
19,2
134
2,6
7,7

O quadro acima exposto revela que no total dos residentes com mais de 15 anos, quase metade (47.3%) tem como principal e única fonte de rendimento o trabalho. Mostra que 1/4 daquela população vive da pensão de reforma e que uma parcela desses (14%) ainda trabalha, sem que o trabalho constitua a fatia principal do seu rendimento. Haverá 2.3% da população com o rendimento centrado no subsídio de desemprego e, entre esses, 5.2% estão empregados. Aqueles que vivem dos rendimentos do capital, representam 4.9% dos residentes com mais de 15 anos e 93% do seu total estão empregados, recebendo, subsidiariamente, rendimentos como tal. Finalmente refira-se que a linha residual com “outros casos” se refere essencialmente a estudantes e domésticos, entre os quais 7.7% exerce funções laborais, sem que elas constituam o seu principal rendimento.

Entre os empregados, aqueles que, na sua esmagadora maioria, recebem uma contrapartida salarial, destacam-se os que têm aí o seu exclusivo rendimento (81.9%), trabalhadores por conta de outrém ou por conta própria. Entre os que detêm remuneração do trabalho, secundária, em relação a outros rendimentos, têm expressão os que vivem principalmente de lucros, juros e rendas (7.9% dos empregados) e os reformados que representam 6.2% de quantos recebem um salário.

Entre os que vivem principalmente de lucros, juros e rendas e, simultaneamente, auferem rendimentos como salário (trabalhem muito, pouco ou nada) encontra-se, decerto, uma enorme fatia das mais altas remunerações e, por isso, na consideração dos dados utilizados no ponto anterior os resultados encontram-se inflaccionados por este tipo de situações: altos salários recebidos por indivíduos para quem aquele rendimento é acessório.

Quem vive exclusivamente dos rendimentos do trabalho ou, essencialmente deles ou ainda, de um rendimento deduzido do seu salário durante dezenas de anos - os pensionistas - o seu poder de compra, o seu nível de vida depende desse rendimento, cada vez mais precário e incerto, dadas as arbitrariedades patronais, os despedimentos, a precariedade e os cortes impostos pelo governo.

Em contrapartida, os referidos como vivendo de lucros, juros e rendas, com ou sem complemento salarial, podem dispor dos € 61277 M (36.8% do PIB, em 2008) definidos como excedente bruto de exploração, colhendo daí parte para rendimento pessoal, deixando outra parte nas empresas para futura aplicação nestas (e como viveiro de futuros lucros) ou, mantendo a conveniente liquidez aplicada no sistema financeiro, nas operações especulativas, como se viu no episódio BPP onde entre os seus grandes “investidores” se contava Balsemão, Vaz Guedes, Saviotti.

Poder-se-ia pensar que aquele excedente tenderia a ser aplicado no investimento produtivo oferecendo assim a concretização do que é tão mediatizado pelos plumitivos do regime cleptocrático, catedráticos arautos do neoliberalismo e mandarins – o empreendorismo dos capitalistas, portugueses em particular, aqueles por onde passa toda a criação de riqueza e que os trabalhadores não deixarão de se recordar, agradecidos, quando comem a sopa.

Aquele excedente bruto de exploração registado pelo INE como criado em 2008 (€ 61277 M) pode ser comparado com o investimento efectuado naquele ano (€ 36079 M), francamente inferior ao novo capital colocado à disposição da burguesia portuguesa. Enquanto, como se viu atrás (quadro 5) o PIB cresceu, no periodo 1998/2008, 56.3%, o investimento efectuado pelos indómitos capitalistas portugueses e pelos investidores estrangeiros cresceu apenas 27.7%, sofrendo um retrocesso de 13.6% em 2009, comparativamente ao ano anterior.

Sabe-se que uma economia só cresce de modo equilibrado se houver uma poupança em nível adequado aplicada em investimento, o que, como se disse, não acontece. Pior que isso é que, desse excedente ou de capitais acumulados em Portugal, sairam para “paraísos fiscais” em 2008 € 8700 M, isto é 14.2% do excedente bruto de exploração gerado em 2008.

Como dissemos no início deste texto, os mandarins gostam de referir a nossa identidade como portugueses para nos responsabilizar a todos pelos sacrifícios que nos pretendem impor. Isso seria apenas mais uma expressão de propaganda se não calasse fundo junto da multidão, entre a qual existem muitos trabalhadores e pobres desejando, credulamente, no esforço colectivo, para resolver a grave situação que se vive em Portugal. Os primeiros a não cumprir esse dever “patriótico” são os ricos, os que vivem dos rendimentos do capital, os tais que vivem essencialmente de lucros, juros e rendas, os que decidem sobre o destino do excedente bruto de exploração. São esses que têm recursos financeiros e a quem é possível escolher entre a exportação de capital e investimentos na sua ditosa pátria.

Quanto aos trabalhadores, aos desempregados, aos reformados, a opção não existe, pois para muitos, a poupança é nula, o rendimento é, quando possível, aumentado apenas com biscates para permitir uma vida melhor e, quando conseguem gerar algum excedente é para investir na habitação; arcando, em contrapartida, com um endividamento para toda a vida, submetidos à lotaria da euribor, dos “spreads”, das comissões provenientes dos bancos, dignos representantes dos “mercados”. Na economia lusa, a sua burguesia para além de investir pouco, de se evadir fiscalmente muito beneficiando da sacrossanta liberdade de movimentos dos capitais, coloca na população trabalhadora a responsabilidade da concretização do investimento global, através da compra de habitação. Trata-se de um mecanismo algo escabroso mas, isso fica para outra ocasião.

Por outro lado, os impostos primariamente arrecadados pelo Estado e que representam 13% do PIB (quadro 5) constituem também um conjunto de recursos cuja utilização cabe aos mesmos beneficiários de rendimentos de capital, directamente ou através dos mandarins, nomeadamente do PS/PSD, que têm ao seu serviço.

E, para terminar este ponto, refiram-se as fracas capacidades técnicas e culturais da burguesia portuguesa e as distorções daí resultantes que conduzem à histórica dependência de Portugal face às metrópoles imperiais e ao débil grau de desenvolvimento do país. Abordámos já essa questão (6) como factor de estrangulamento do bem-estar dos trabalhadores em Portugal e a necessidade estratégica da redução do seu poder, da redução do seu número, da sua extinção a longo prazo, com a do próprio capitalismo.

De elementos extraídos do último recenseamento da população (2001) havia, podem observar-se os graus de qualificação dos extractos residentes com maiores responsabilidades de gestão e decisão na sociedade portuguesa.

Quadro 7 - População activa e qualificações
2001

Residentes
% do total
Qualif.(1) (%)
Total
4 990 255


Empresários
 61 891
1,24
16,4
Pequenos patrões
 379 609
7,61
6,4
Profissionais independentes
 27 608
0,55
44,1
Quadros
 780 623
15,64
47,0
Outros
3 740 524
74,96
-
(1) Qualificados com profissões intelectuais, científicas e técnicas 

Tendo embora a distância temporal, nada indica que tenha havido uma revolução na qualificação dos empresários portugueses, de 2001 para cá.

Assim, é em absoluto negativo que uma franca minoria da população activa – os empresários – detenha tanto poder com tão escassa qualificação, na sua larga maioria e, com a conhecida ausência de responsabilidade social.

Quanto aos pequenos patrões não é de admirar que o seu nível de qualificações seja inferior, dado o predomínio de pequenos logistas, proprietários de cafés e restaurantes ou de negócios de construção civil. A sua sobrevivência baseia-se numa combinação de factores: recurso a trabalhadores imigrantes, com salários miseráveis, sobretrabalho dos próprios e acentuada fuga fiscal (em sede de IVA, ocultação de facturação, inclusão de despesas domésticas na contabilidade da empresa).

Quanto aos profissionais independentes, o nível elevado de qualificações resulta do elevado peso que alguns segmentos – médicos, advogados, arquitectos… ainda representam, a despeito da sua crescente apresentação sob a forma empresarial.

É certo que entre os quadros – assalariados, na sua maioria que trabalham em empresas e no Estado - essas qualificações estão presentes em perto de metade do total. E isso levanta várias questões.

Uma, é a grande parcela que trabalha no Estado pois, os ditos empresários, não sentem a sua necessidade, não a querem sentir ou andam à procura de galinha gorda por pouco dinheiro. Por outro lado, até que ponto a incapacidade ou o interesse atávico do empresário não coarcta a criatividade dos quadros ao seu serviço? Se estes se sentem travados por um empresário ignorante, qual o seu incentivo para aplicar os seus conhecimentos? O mesmo é válido na administração pública, onde proliferam chefias ignaras ou subservientes, nomeadas pelo PS/PSD. Em terceiro lugar, as funções essenciais na empresa, o que de facto, as coloca a produzir e a inovar, a sua organização, está nas mãos dos quadros, em sintonia com os demais trabalhadores.

Mesmo quando se está na presença de um empresário qualificado, inteligente e com boa capacidade de gestão, essas qualidades raras vezes se prolongam por mais de duas gerações, falindo nuns casos, a empresa, com a morte do seu promotor ou, sendo incorporada em outra empresa ou ainda, comprada por terceiros. Esta posse privada dos meios de produção, com o desapossar ab initio dos seus trabalhadores, é um factor de instabilidade e desperdício de capital, de desemprego ou despedimentos, de perturbação social inerente ao capitalismo, sobretudo nesta actual moda neoliberal.

Contudo, o mais relevante a deter é a inutilidade do capitalista e do modelo económico de apropriação privada dos meios de produção e dos frutos do trabalho humano. Já abordamos especificamente essa questão em (7) e (8)


  1. Desigualdades salariais

Na massa global das remunerações incluem-se as que cabem a gerentes e administradores de empresas, nomeadamente das tais empresas de referência, das cotadas na bolsa, dos bancos e que englobam os modestos proventos dos mediáticos mexias e ruipedrosoares, em salários e prémios.

O quadro 8 revela a estratificação existente nas remunerações salariais dos trabalhadores por conta de outrém e evidencia a grande concentração de trabalhadores nos escalões com salários inferiores a € 900 (€12600 por ano). Se se excluirem os trabalhadores com escalão não definido (NS/NR), aqueles escalões abrangem 78.3% do total em 2006 e ainda 74.6% no ano transacto.

Os escalões intermédios do quadro - salários entre €900 e €1800 mensais (€12600 e €25200 em termos anuais - representam 18 e 21.1% em 2006 e 2009, respectivamente. E os salários superiores representam apenas 4.3% do total em 2009, contra 3.7% três anos antes, se se excluirem as respostas inconclusivas (NS/NR), como já se referiu.

                     Quadro 8 - Escalão de rendimento salarial dos TCO

2006
2009

1000
(%)
1000
(%)
Total
3 898,1
 100,0
3 855,7
 100,0
< € 310
 140,5
3,6
 135,1
3,5
€ 310 a < € 600
1 680,6
43,1
1 385,6
35,9
€ 600 a < € 900
 951,3
24,4
1 049,5
27,2
€ 900 a < € 1200
 355,6
9,1
 389,6
10,1
 € 1200 a < € 1800
 280,7
7,2
 337,6
8,8
€ 1800 a < € 2500
 84,8
2,2
 99,8
2,6
€ 2500 a < € 3000
 21,9
0,6
 23,2
0,6
>= € 3000
 24,8
0,6
 24,0
0,6
NS/NR
 357,9
9,2
411,3
10,7
                                                                                                              INE

Há algumas relações curiosas que pretendemos sublinhar.

O volume dos abrangidos nos dois escalões mais altos de rendimentos, é ridiculamente baixo e, no mais elevado deles, até decresce o número dos englobados nesse escalão.

Para isso há várias justificações. Uma, o modelo de tratamento da amostra utilizado pelo INE é pouco sensível para categorias de dados menos representativos e merece melhor apuro. Outra, os empresários apertaram nos salários dos seus quadros mais qualificados e nos seus próprios, para fazer face à crise mas, isso só será explicação no país das maravilhas visitado pela célebre Alice. Finalmente, perante o laxismo fiscal, os trabalhadores dos escalões mais elevados aumentam os seus rendimentos em espécie (carros, cartões de crédito, seguros, viagens) ou dinheiro vivo não contabilizado como salários, para se incluirem num nível com mais baixa taxa de incidência de IRS e se furtarem, paralelamente, a maiores contribuições para a Segurança Social.

Dados publicados pela DGCI sobre as declarações de IRS para 2007/2008 evidenciam claramente aquelas últimas práticas. Observem-se pois, elementos sobre os declarantes de rendimentos brutos superiores a  € 250000.

                Quadro 9 – Rendimentos superiores a € 250000

Nº de agre- gados (IRS)
Rendimento bruto
Média/
agregado
2007
4055
 €  1845 M
€ 484994
2008
4051
 €  1772 M
€ 437423
   
Por coincidência, os rendimentos declarados pelos cerca de 4000 agregados mais ricos (a DGCI, ao que se sabe, não previu a possibilidade de avaliação do número de pessoas) têm um montante aproximado ao declarado pelos agregados com rendimentos brutos inferiores a € 5000, como adiante se evidencia, no quadro 10.

           Quadro 10 – Rendimentos inferiores a € 5000

Nº de agre- gados (IRS)
Rendimento bruto
Média/
agregado
2007
672465
€  1912 M
€ 2843
2008
634836
€  1782 M
€ 2807

No entanto, estes últimos serão as vítimas mais atingidas pela pulsão genocida do PS/PSD conduzida pelo governo Sócrates. São estes para quem mais duro será arcar com o aumento do IVA, os maiores encargos com a saúde, a perseguição dos fiscais do RSI ou do desemprego e muitos dos que têm animado as filas junto dos balcões da Segurança Social para fazer provas de rendimento.

O cotejo entre ambas as realidades revela que há, em Portugal um punhado das pessoas mais ricas (incluidas em 4051 agregados fiscais) que têm um rendimento semelhante ao dos 634836 agregados mais pobres em 2008.

As profundas desigualdades existentes em Portugal revelam, sensivelmente, que cada um dos poucos milhares de pessoas insertas nos agregados mais ricos tem um rendimento 156 vezes superior a cada um dos mais pobres. Se se reduzir o consumo alimentar a leite fresco, uma família pobre poderá gastar todo o seu rendimento em 9.7 litros diários e uma família rica pode mergulhar em cerca de 1500 litros, por dia, como a faustosa Cleópatra, rainha do Egipto antigo.  

Os enfatuados comemorantes dos 100 anos da extinção da monarquia esqueceram-se de apontar para estas realidades, que evidenciam nada haver de res publica. Não há república nem democracia, apenas cleptocracia.

A partir do acima incluido quadro 8 e tendo em conta o salário mínimoem 2006 e 2009, é possível avaliar quanto o salário mínimo é realmente praticado.

           Quadro 11

2006
2009
Salário mínimo nacional
€ 385.9
€ 450.0
Total população 1ª escalão
140,5
135,1
Total população 2ª escalão
1680,6
1385,6
% do 2º escalão < SMN (estimativa)
26,2
48,3
População 2ª escalão < SMN (estimativa)
439,9
668,9
Total população estimada < SMN
 580,4
 804,0
População com trabalho tempo parcial
582,4
588,3
População tempo parcial/ total pop < SMN
1,004
0,732

Em três anos, o volume de trabalhadores por conta de outrém com remuneração inferior ao salário mínimo cresceu 38.5% cifrando-se em 804000, enquanto o valor legal daquele apenas cresceu 16.6%; o que é francamente negativo e revela a enorme pressão que o governo e o patronato exercem para a redução real das remunerações do trabalho. Para essa pressão têm contribuido decisivamente a perseguição e o anátema que se vem lançando sobre os trabalhadores desempregados, as restrições para o exercício do direito a subsídio, a permanente ameaça de despedimento e a precariedade galopante a que se assiste.

Por seu turno, a dimensão do conjunto de trabalhadores a tempo parcial mantém-se estável quando se comparam os dados de 2006 com os de 2009. E, se em 2006 havia uma equiparação entre o volume dos trabalhadores a tempo parcial e aqueles que recebiam menos que o salário mínimo, em 2009 estes últimos superam largamente os primeiros, em mais de 200000 trabalhadores.

Esta situação revela a premeditada inoperância da fiscalização das condições de trabalho, a conivência entre o Estado e os capitalistas de todas as dimensões para o rebaixamento do preço do trabalho, para o favorecimento da “competitividade” das empresas. Não se revela assim, nada estranho, o aumento da acumulação de rendimento naqueles que auferem, principalmente, rendimentos de lucros, juros e rendas.

O que funciona sem falhas é a utilização do valor do salário mínimo para o cálculo das subvenções públicas aos partidos com assento na AR, conforme por nós já se havia observado em Dezembro de 2006 (9).

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Nota solta sobre a Segurança Social

A “sindicalista” promovida a ministra do Trabalho afirma que até final do ano corrente vai recuperar € 400 M de divida à Segurança Social, que penhorou 24000 contas bancárias e outras maravilhas da sua gestão.

Trata-se de um exercício de propaganda. Se existisse uma imprensa menos servil e mais dada ao estudo, a referida nacional, socialista não se teria atrevido a representar aquele número. (10)

Demonstrámos recentemente muitas das grosseiras falsidades do governo socratóide (11)

Quem consultar este último trabalho ou a Conta da Segurança Social incluída nos relatórios das Contas do Estado verificará que o saldo em dívida dos contribuintes aumentou mais de € 1000 M em 2008 e nada indicia que esse acréscimo se tenha reduzido em posteriormente.

Ora se a dita ministra conseguir os referidos € 400 M só terá recuperado 40% do dinheiro retido por empresários relapsos em 2008, o que é pouco. E, pior que isso, a falsária não diz quanto daquele valor corresponde a dívida muito recente, gerada já este ano e paga com poucos meses de atraso. Também ninguém lhe pergunta a quanto remontam as dívidas prescritas e consideradas incobráveis, cujo montante corresponde, exactamente a capital de que a Segurança Social prescindiu a favor de empresas e empresários vigaristas. A socratóide Helena dedica-se a contabilizar os trocos que consegue detectar nas pequenas aldrabices dos pobres e financia, com o dinheiro que pertence aos trabalhadores, para as suas reformas, capitalistas parasitários.

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Notas ao texto


(1)               O PEC – Programa de Empobrecimento Colectivo e o bloqueio económico e político

(2)               A pulsão genocida da burguesia portuguesa, a actuação da mafia socratóide


(3)               Para um programa de medidas favoráveis aos trabalhadores


(4)               O novo fascismo que está em marcha


(5)               Estratégia para um sistema de segurança social favorável à multidão de trabalhadores e ex trabalhadores,


(6)               Empresários portugueses incapazes, inúteis, nocivos e batoteiros


(7)               Afinal qual a função social do capitalista


(8)               Os empresários e a inovação; evidências de um casamento não consumado


(9)               O novo valor do salário mínimo nacional é um logro



(11)           Capitalistas e estado, a mesma luta

ou neste blog



Este e outros textos em:


outubro 2010

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