Eleições europeias 2009 – limitações
e oportunidades
Mais uma
volta, mais uma viagem
Mais uma
volta para ganhar coragem
(Sérgio Godinho)
A - Panorama global
As
eleições para o Parlamento Europeu de domingo 7 de Junho não revelaram nada
sobre o interesse dos portugueses sobre os assuntos europeus. Nem foram,
particularmente, colocadas questões estruturantes como:
·
A dos poucos
poderes efectivos do próprio PE no controlo da Comissão Europeia;
·
A ausência de
democracia na escolha dos membros daquela ou do BCE;
·
A nocividade do
tratado de Lisboa e os golpes baixos para o impor às populações, sem qualquer
consulta;
·
O atavismo
calculado das instâncias comunitárias no encarar da crise, sobretudo no seu
impacto sobre os níveis de desemprego, na insipiência das políticas sociais
levadas a cabo ou na reparação dos desvarios financeiros;
·
A xenofobia
imanente no que concerne aos imigrantes;
·
A fixação doentia
com o PEC, apesar de flexibilizada temporariamente a sua aplicação, etc
Nos
outros países europeus a situação não foi muito distinta. Os níveis de
abstenção foram também elevados só sobrando 9 países onde se situou abaixo dos
50% e onde se contam casos de voto obrigatório; e apuraram-se 6 países com
níveis de abstenção superiores a 70%, todos a leste, recém-incorporados na UE,
o que não parece evidenciar muito entusiasmo por parte dos seus povos. Estes
níveis de abstenção revelam o desencanto face ao momento actual da integração,
a falta de esperança nas capacidades das chefias aos vários níveis, a escassa
atração da oferta eleitoral.
O
mapa político no PE sofreu alterações menores do ponto de vista do capital,
como aliás estava programado ou, quanto às vantagens para os trabalhadores
europeus, mormente os desempregados e os excluidos. Mais PPE e menos PSE não é
mudança. Mais ecologistas e fascistas não altera o conluio PPE/PSE que domina o
PE.
Um
caso curioso de deturpação introduzida pelos media é o que foi por aí dito
sobre as eleições na Alemanha.
Disseram
os media que Merkel ganhou as eleições com o recuo do SPD, incluindo-se a
Alemanha no pacote dos países onde a “esquerda” foi penalizada,
posicionando-se, portanto, Merkel como uma triunfadora, imune à crise social e
económica, para os eleitores, que assim teriam mostrado a sua gratidão pelas
acertadas medidas da chanceler. Acontece que o CDU/CSU a formação de Merkel, já
em 2004 tivera uma votação muito superior ao SPD, não havendo aí qualquer
novidade. Não disseram, porém, os mesmos media, na sua trivial superficialidade
que, num contexto de taxa de abstenção idêntica à observada em 2004,
·
O CDU/CSU de
Merkel teve quase 10 M de votos mas… menos 1.5 M do que em 2004;
·
O SPD teve perto
de 5.5 M e perdeu apenas 100 mil votos;
·
O conjunto Die
Linke/Verdes/Piratas tiveram 5.5 M de votos (pouco mais que o SPD) e aumentaram
em quase 750 mil a fasquia de 2004 (os Piratas não existiam, então)
Posto
isto torna-se mais esclarecedor saber quem ganhou e quem perdeu, não?
B - A mistificação da integração europeia por conveniência do PS/PSD
Já
antes da absorção (há quem lhe chame… adesão) do país à então CEE (1986) o
PS/PSD no poder sempre pretendeu que a multidão tivesse sobre a integração
europeia, as seguintes ideias:
·
Elemento
inevitável, qual força centrífuga que atrai tudo na periferia ou, se se
preferir, buraco negro cujo conteúdo ninguém verdadeiramente parece capaz de
modelar;
·
Elemento
inelutável, imposto por determinação divina que, por esse motivo deve afastar a
plebe de qualquer exercício de compreensão, dado o carácter insondável dos
desígnios do deus Mercado;
·
Factor de
modernidade associado a autoestradas, circos eleitorais, investimento
estrangeiro, flexibilidade nas leis laborais, empreendorismo, exportação a todo
o custo e reformas, reformas a granel, sempre por acabar mas, por acaso, sempre
lesivas dos assalariados e dos pobres;
·
Factor de
prosperidade, sobretudo pelo muito, muito dinheiro de transferências de
Bruxelas que os países ricos, condoídos com o atraso português têm mandado para
remissão dos seus pecados… com fim anunciado para 2013;
·
Coisa complexa
demais para as capacidades da plebe e que só o mandarinato, em seu alto saber e
elevado espírito de sacrifício consegue perceber, descodificar e negociar a
favor do povo, após duros combates com as instâncias comunitárias;
·
Sendo ignaro o
povo, seria perigoso para o mesmo, perguntar-lhe, na sua infantilidade ou
atraso mental, se queria aderir à CEE, adoptar o Schengen, criminalizar os
imigrantes, aceitar o euro, opinar sobre o tratado de Lisboa, balizar a vida
pelo PEC e pelos ditames do BCE; já Salazar, ascendente directo do PS/PSD,
dizia não estarem os portugueses preparados para o exercício da democracia;
·
Como a crise num
país pequeno e atrasado é endémica, os portugueses foram conduzidos à aceitação
da desestruturação da economia, ao roubo levado a cabo por empresários e
mandarins aos cofres dos fundos europeus e dos impostos domésticos, sob o nome
de investimento e inovação, liberalização e modernização;
·
A própria
imprensa pouco relevo tem dado à questões europeias e, tal como os assuntos
internacionais ou globais, têm menos notoriedade que um jogo do Ronaldo ou as
fotos da Carla Bruni. Por seu turno, os deputados europeus têm-se mantido
ignorados, na exacta medida em que também pouco se esforçam para ter visibilidade.
Recorde-se, que recentemente a lei do controlo da internet (lei Hadopi) só
surgiu na imprensa paroquial, em vésperas da sua votação no PE e semanas depois
do assunto andar a circular por blogs e emails.
Neste
contexto, eleições europeias servem, basicamente, para a multidão se
manifestar:
·
Sobre os efeitos
presentes da actuação da classe política em geral e do governo Sócrates em
particular, sobre as suas condições laborais, nível de vida e perspectivas de
futuro, num momento de expressão colectiva de azedume, rancor, desilusão,
apreensão e pouca esperança:
·
Através de níveis
brutais de abstenção, a sua incompreensão e distanciamento do processo de
integração, como que cumprindo o que lhe foi destinado pelo mandarinato, cuja
preocupação revelada com a abstenção é hipócrita uma vez que coloca sempre os
seus membros no PE, com qualquer nível de participação eleitoral.
A
imagem que, em Portugal, se tem da Europa é a dos países ricos da faixa
ocidental, embora as clivagens sociais e as bolsas de pobreza aí existentes se
tenham agravado ao ponto de o tal “modelo social europeu” estar em cacos, para
se ser benevolente e, irreversivelmente morto, para se ser realista. Essa
imagem de prosperidade e bem-estar tornou os portugueses europeístas, mais por
intermédio dos mitos criados pela sua situação periférica, do que alicerçada em
factos concretos; nomeadamente, quando o novo século vem mostrando, ano após
ano, um afastamento gradual face à média europeia e à ultrapassagem nos vários
“rankings” pela Grécia, República Checa, Chipre, Eslovénia, para não falar da
vizinha Espanha, que há muito se distanciou.
O
mandarinato mantém esse mito aceso, insistindo na lógica do sacrifício
virtuoso, das perdas temporárias, do deficit que é preciso combater, do
relançamento sempre adiado para o ano seguinte do ano que há-de vir. E, em
paralelo, a multidão assiste diariamente, do fundo das suas dificuldades, ao
desvendar da estrutura mafiosa do poder, repartido entre o PS/PSD e os
segmentos cimeiros do empresariato e da finança, com enriquecimentos súbitos e
escandalosos.
C - Exercícios de aritmética eleitoral
- Número de inscritos
A
forma como o Estado e os governos tratam desta questão é reveladora do respeito
que têm para com a democracia de mercado que montaram e que apregoam como
exemplar. Com os meios técnicos existentes e com o afamado Simplex, ainda não
conseguiram uma forma de manter o recenseamento actualizado. Percebe-se porquê:
os mandarins não deixam de ser eleitos e os subsídios aos partidos são pagos
pelo número de votos conseguidos, sendo irrelevante, para esse efeito, a taxa
de participação dos inscritos e a presença, entre estes, de muitos milhares de
pessoas já falecidas.
1999
|
2004
|
2009
|
||||
nº
|
%
|
nº
|
%
|
nº
|
%
|
|
INSCRITOS
|
8.695.600
|
8.748.600
|
9.491.492
|
|||
VOTANTES
|
3.480.948
|
40,03
|
3.394.356
|
38,80
|
3.555.088
|
37,46
|
Votos
expressos
|
||||||
BRANCOS
|
63.573
|
1,83
|
87.193
|
2,57
|
164.815
|
4,64
|
NULOS
|
53.245
|
1,53
|
47.344
|
1,39
|
71.103
|
2,00
|
DIRIGIDOS
|
3.364.130
|
96,64
|
3.259.819
|
96,04
|
3.318.980
|
93,36
|
Como
se explica que entre 1999 e 2004 o número de inscritos residentes tenha
aumentado 53 mil e, de 2004 para hoje, tenha crescido quase 743 mil? Como é
óbvio, isto adultera o cálculo da taxa de abstenção e justifica que o acréscimo
do número de votantes (cerca de 160 mil) não tenha impedido a taxa de abstenção
de aumentar (61.2% em 2004 para 62.5% no dia 7).
Não
se consegue entender, face às dinâmicas populacionais, porque cresce 19% o
eleitorado açoriano e mais de 12% em Aveiro, Braga, Leiria, Madeira, Viana do
Castelo e Vila Real e apenas 5% em Lisboa ou 7% em Setúbal.
Ainda
no capítulo dos inscritos e, não incluidos nos números atrás referidos, há a
registar a passagem de quase 20 mil para 168 milhares, do número de eleitores
na emigração; e isto, porque se lembraram de colocar os residentes fora da
Europa com possibilidades de voto nas eleições europeias, com resultados
decepcionantes, como se esperava. Muitos nem saberão que existem eleições
europeias ou, estar-se-ão nas tintas para um país que os obrigou a zarpar, por
não lhes dar uma vida digna.
A
questão dos emigrantes é interessantemente enganadora pois a sua grande
maioria, mesmo na Europa, não está inscrita como potencial votante. Na Bélgica,
por exemplo, em cerca de 40 mil emigrantes portugueses, os inscritos são apenas
2600, na sua maioria funcionários da UE ou da Nato, cujas tendências de voto
não devem ser muito distintas das de quem os nomeou… E, desses inscritos,
quantos votam?
Se
nas eleições europeias esse número de votos é irrelevante para o total, convém
não esquecer que há deputados à AR eleitos pelos emigrantes ou melhor, pelos
pouquíssimos que votam entre os poucos que estão inscritos… Esses deputados
mais parecem nomeados que eleitos e, invariavelmente são… do PS/PSD, a tal
mafia bicéfala.
Os
nossos democratas de papelão passariam a ter maior credibilidade se dessem o
direito de voto aos imigrantes que vivem e trabalham em Portugal, isto é, no
território da UE. Para além de salários mais baixos e precariedade agravada
enquanto estrangeiros, nem sequer lhes dão o direito de participar na vida
colectiva, como factor de integração; é que, objectivamente o mandarinato não
quer, por ordem do patronato, mais interessado na existência de uma reserva de
mão de obra desprovida de direitos e, portanto de baixo preço.
Ao
preferir dar o direito de voto aos emigrantes e recusar o mesmo direito aos
imigrantes em solo europeu, a burguesia portuguesa despreza o chamado “jus
solis” e prefere o “jus sanguinis” baseada na “raça” que Cavaco terá comemorado
dias atrás.
- Número de votantes
Menos
virtual é o número dos votantes, que cresceu 4,7% em relação a 2004 mas, apenas
2.1% face a 1999 (primeira eleição para o PE), o que permite se afirme haver
uma relativa estabilidade na afluência às urnas.
Essa
evolução dos votantes face a 2004 foi, contudo, diferenciada, sendo superior a
10% em Viseu (13%), Braga, Faro e Leiria e negativa nos Açores (-16%), Beja e
Portalegre, situando-se em Lisboa um crescimento de 2.1% nos votantes.
Que
os partidos apelem ao voto ou tentem aliciar os simpatizantes uns dos outros
faz parte das regras, tal como é aceitável e democrático que alguém defenda e
proponha a abstenção, o voto nulo ou em branco.
A
abstenção é uma opção legítima como qualquer outra, seja porque há quem se não
reveja na oferta eleitoral, porque prefere ir para a praia ou ficar em casa. E,
não acreditamos que seja uma opção mais irresponsável do que escolher alguém em
função da imagem, da publicidade ou por fidelidade à opção de voto anterior.
Mas
o mandarinato gosta de vilipendiar os abstencionistas que, para mais, não estão
organizados, não têm “aparatchiks” ou porta-vozes que os defendam, nem tempo de
antena. Assim, todos gostam de bater, cobardemente, nos abstencionistas,
aproveitando a atomização e incapacidade de resposta dos mesmos. Mas, eppur si
muove; e todos conhecemos pessoas que não votaram neste ou naquele acto
eleitoral ou em nenhum, por considerarem putrefacta a cleptocracia que nos vão
impondo.
Cavaco
é dos que não pensa assim. Em pleno periodo de reflexão(?) apelou ao voto,
excepcionando-se assim, como “supremo magistrado da nação” às obrigações de
toda a gente, considerando que a abstenção é acto condenável e que o
“eleitorado” é um terreno de caça, livre até ao momento do voto. Depois disso,
o cidadão votante é (e sabe que é), naturalmente esquecido nas suas
perspectivas e no seu direito de exigir, a qualquer momento, responsabilidades
a quem elegeu. E não esqueçamos que a augusta figura não discerniu que marcar
eleições para um domingo de início de uma semana de feriados não seria a melhor
forma de favorecer a afluência. Ai aquela cabecinha…
Uma
vez que os cidadãos se vêm mostrando cada vez menos atraídos pelo
partido-Estado PS/PSD, começam neste, a ficar preocupados com o seu próprio
descrédito. Se os eleitores se abstêm em massa e como o PS/PSD, por axioma, tem
sempre razão, quem está errado são os seis milhões de cidadãos que não votaram.
Portanto, Carlos César, o kaiser dos Açores alvitrou o voto obrigatório! Irão
inventar uma coima? Mandam a polícia lá a casa com a urna? E, se aparecerem
muitos votos em branco ou nulos instalam uma câmara de filmar para punirem os
desobedientes? Orwell, “1984”.
Votar
ou não votar são actos que têm por detrás cálculos e reflexões múltiplas e
diferenciadas. E nenhuma dessas opções deverá ser considerada como vaca
sagrada. O exercício da democracia vai muito para além do voto, contrariamente
ao que propõe o mandarinato que só desce às ruas, às feiras e mercados, de vez
em quando, rodeado de poluição sonora e papelada, de convivas sorridentes e
seguranças de óculos escuros. E, mesmo para quem despreze a cleptocracia e o
folclore eleitoral, sabendo que nunca a revolução e a democracia foram
instaladas sem a destruição da ordem estabelecida (Allende já cá não está para
o confirmar…), votar não é acto vergonhoso mas, um acto de intervenção
possível, limitado, a utilizar quando útil e conveniente e nada mais do que
isso.
- Votos brancos e nulos
O
significado dos votos brancos ou nulos no total dos votos entrados nas urnas é
conhecido e representa atitudes de rejeição mais genéricas no primeiro caso,
mais expressivas no segundo, embora aqui também se registem casos de erro
técnico de preenchimento do boletim de voto.
No
conjunto, o número de votos brancos ou nulos (quase 235 mil) em 2009 duplicou
relativamente a 1999 e aumentou 100 mil comparativamente a 2004, correspondendo
a 6.4% dos votos expressos, espelhando a relativa eficácia da campanha feita
por correio electrónico e SMS, nesse sentido. No caso dos votos brancos, o seu
número aumentou 89% e o dos nulos em 50.2%, entre 2004 e 2009.
O
maior peso dos votos em branco verifica-se em Leiria (7.8%), no centro de uma
mancha territorial de maior incidência deste tipo de votação, que se estende de
Aveiro a Santarém e, onde se inclui também Faro. Os casos de menor relevância
do voto em branco registam-se na Madeira e em Trás-os-Montes.
No
capítulo dos votos nulos, de novo se destaca Leiria onde o conjunto dos votos
em branco ou nulos atinge 10.8% dos votos expressos.
- Votos dirigidos a partidos
Os
partidos que se submeteram ao sufrágio são aqui agrupados em três grupos –
esquerda (institucional), direita vulgar (separando o conjunto PS/PSD dos
restantes) e direita xenófoba ou fascista.
Votos dirigidos
|
||||||
1999
|
2004
|
2009
|
||||
nº
|
%
|
nº
|
%
|
nº
|
%
|
|
Esquerda
|
||||||
BE
|
62.067
|
1,84
|
167.039
|
5,12
|
381.638
|
11,50
|
CDU
|
358.404
|
10,65
|
308.873
|
9,48
|
379.001
|
11,42
|
MRPP
|
30.515
|
0,91
|
36.000
|
1,10
|
43.091
|
1,30
|
POUS
|
5.560
|
0,17
|
4.279
|
0,13
|
5.093
|
0,15
|
total
|
456.546
|
13,57
|
516.191
|
15,83
|
808.823
|
24,37
|
Direita
|
||||||
Bloco central
|
||||||
PPD/PSD*
|
1.081.298
|
32,14
|
892.961
|
27,39
|
1.126.033
|
33,93
|
PS
|
1.498.820
|
44,55
|
1.511.214
|
46,36
|
944.958
|
28,47
|
subtotal
|
2.580.118
|
76,69
|
2.404.175
|
73,75
|
2.070.991
|
62,40
|
Outros
|
||||||
MD
|
13.685
|
0,42
|
||||
MEP
|
52.731
|
1,59
|
||||
MMS
|
21.621
|
0,65
|
||||
MPT
|
13.964
|
0,42
|
13.500
|
0,41
|
23.355
|
0,70
|
PH
|
13.200
|
0,40
|
16.942
|
0,51
|
||
PPM
|
16.219
|
0,48
|
15.466
|
0,47
|
13.756
|
0,41
|
PSN
|
8.810
|
0,26
|
||||
subtotal
|
38.993
|
1,16
|
55.851
|
1,71
|
128.405
|
3,87
|
total
|
2.619.111
|
77,85
|
2.460.026
|
75,47
|
2.199.396
|
66,27
|
Direita xenófoba
|
||||||
CDS-PP*
|
283.397
|
8,42
|
236.111
|
7,24
|
297.739
|
8,97
|
PDA
|
5.076
|
0,15
|
5.417
|
0,17
|
||
PND
|
33.968
|
1,04
|
||||
PNR
|
8.106
|
0,25
|
13.022
|
0,39
|
||
total
|
288.473
|
8,57
|
283.602
|
8,70
|
310.761
|
9,36
|
*Em 2004 PSD e CDS coligaram-se pelo que
a individualização efectuada se baseia na proporção 3.8/1 entre ambos,
observada em 1999 e 2009, quando concorreram isolados
Independentemente
da distribuição dos votos em forças políticas, observa-se para os três actos
eleitorais uma grande estabilidade na votação global (em milhares):
1999 –
3364 2004 - 3260
2009 – 3319
Tendo
em conta o natural crescimento dos inscritos devido ao aumento populacional e
ao envelhecimento da população, é evidente que a representatividade dos
partidos, em geral, se vem reduzindo, no que concerne à escolha dos deputados
europeus, reduzindo consequentemente a força da sua representatividade.
a) Esquerda
É
notório o crescimento da votação na esquerda institucional no seu conjunto, que
passa de 13.6% em 1999 para 24.4% do total, em 2009 e que permitiu a passagem
de 2 para 5 deputados, com todo o acréscimo a favor do BE.
De
facto, em dez anos a CDU mantém a sua votação num mesmo patamar, recuperando no
dia 7 as perdas de 2004 enquanto que o BE, sextuplicando a sua votação desde
1999, consegue alcandorar-se à posição de
principal força eleitoral na esquerda institucional.
A
CDU coloca-se à frente do BE no Alentejo, na Madeira, em Setúbal e em Lisboa
mas, aqui ambos estão praticamente em igualdade. Naqueles distritos, a CDU
obtém 56.4% dos seus votos contra 40.7% no caso do BE que, portanto tem uma
implantação eleitoral mais homogénea que a CDU, mais confinada ao sul.
No
caso do BE o crescimento mais acentuado relativamente a 2004 observa-se na
faixa territorial interior de Évora para norte e em Braga onde a votação mais
que triplicou; o crescimento mais baixo registou-se em Lisboa e na Madeira
(contudo, acima de 70%) mostrando que o episódio Sá Fernandes está esquecido).
Por seu turno, o maior crescimento da CDU observa-se em Viseu (+83%) e o mais
modesto em Setúbal (7%). Parece claro que as elevadas taxas de crescimento
nestas votações correspondem a ex-votantes do PS ou novos eleitores.
A
margem de atração do BE junto de anteriores votantes no PS é maior que para a
CDU, pela imagem de dinamismo e inovação mais evidente no BE e que contrasta
com uma CDU portadora de uma imagem fechada e das recordações de autoritarismo
que ficaram do periodo 1974/75. Porque se trata de formações organizativa e
sociologicamente distintas, não são significativas as transferências internas
entre o BE e a CDU, para além de alguns sectores dos “renovadores” do PCP, em
trânsito para o BE; isso, apesar de projectos políticos muito aproximados,
posicionamentos concretos muitas vezes idênticos e de ambos terem mais ou menos
subjacente um cadavérico “modelo social europeu” que o neoliberalismo e os
partidos confederados no PPE/PSE já inviabilizaram.
Este
crescimento da esquerda institucional, mormente do BE, levanta várias questões:
·
Um rápido
crescimento eleitoral, para se consolidar, exige um enorme esforço de
organização, de envolvimento de militantes, iniciativas e, essa consolidação a
nível social constitui tarefa impossível no quadro estrito de organizações
partidárias. A História mostra suficientes casos, para que se não saiba que a
movimentação social só existe se, livremente expressa na sua diversidade e
iniciativa, onde naturalmente, cabem também os contributos das organizações
partidárias. A revolução russa de 1917 e a espanhola de 1936/39 mostram bem que
o seu fracasso foi trazido, em parte, por grupos restritos de pretensos
iluminados, desejosos de controlar a luta de massas;
·
Estará a esquerda
institucional com disposição para colaborar, numa base igualitária, com
organizações e militantes sociais autónomos, tendo presente que a principal
riqueza da multidão é a sua diversidade e não o seu confinamento em estruturas
com programas e práticas muito específicas? Será a esquerda institucional capaz
de aceitar a autonomia de todos os componentes da rede de relações e
contestações que se geram na dinâmica social? A luta contra o capitalismo, o
autoritarismo e os seus agentes, nas suas múltiplas formas não terá futuro se
concebida para ser levada a cabo com vanguardismos, por uma elite de ungidos.
Vencer o capitalismo é bem mais difícil que vencer uma qualquer eleição; é obra
de massas, em toda a sua diversidade e mobilidade de pensar e agir;
·
É óbvio que o
crescimento da esquerda nas urnas reflecte o repúdio do governo, do seu odioso
chefe, da escumalha que o compõe e a continuidade de Sócrates é um bónus que o
PS vem oferecendo. Para mais, o aldrabão polarizou tudo em seu torno, no
governo e no partido, afastando potenciais críticos (Ferro, Carrilho,
Cravinho), secando tudo à sua volta, só mantendo as pilecas políticas
conhecidas pelo seu ridículo uns, (Pino&Lino), pelo seu pendor fascizante
(Correia de Campos e Milu) ou nulidades como o transgénico Jaime e o comissário
do ambiente. Portanto, até às próximas eleições, a alternativa a Sócrates é
Sócrates.
·
Entre vários
cenários pós-eleitorais possíveis, um é o de Sócrates desaparecer como
“furher”, mantendo-se o PS no poder e outro, é o primeiro-ministro ser uma
figura do PSD, tipo Balela FL. No primeiro caso, muitos dos que agora votaram à
esquerda, contra o PS poderão voltar a encostar-se a essa formação de direita,
cheios de esperança numa mudança; no segundo caso, muitos ficarão convencidos
que os problemas resultarão da presença do PSD, eventualmente com Paulo Portas
atrelado, no governo e voltarão ao PS que, com nova cara falará grosso contra o
governo. É o ritual da alternância, a execução do bipartidarismo, em que
muitos, por ignorância, displicência ou catequizados pelos media, acreditam.
·
Esses possíveis
retornos ao voto PS, para serem minorados exigem uma trabalho muito pesado e
credível por parte da esquerda, como o envolvimento dos descontentes em
iniciativas de luta, de perspectivação para a criação de dificuldades à gestão
capitalista, combate aos despedimentos, à redução dos padrões de vida da
multidão, à delapidação territorial e ambiental com os PIN, etc. Estará a
esquerda institucional com vontade e capacidade para enveredar por esse
caminho? Ou prefere, como na Itália, suicidar-se politicamente aos pés de
Berlusconi, incapaz de gerar alternativas e promover luta acirrada ao burlão?
·
As cisões que se
foram verificando historicamente, no PS, nunca enfraqueceram consistentemente a
agremiação, nem fortaleceram as forças políticas de esquerda, por diversas
razões. Primeira, porque entre os militantes do PS houve sempre mais candidatos
a um tacho do que gente de esquerda; depois, porque o PS nunca foi um partido
de esquerda, mesmo quando berrava nas ruas, em 1975, “partido socialista,
partido marxista!” perante o ar sorridente do seu mentor Carlucci, embaixador
americano; ainda porque o PS nunca foi um partido de massas, com um passado de
luta antifascista e implantação sindical, como o PSOE espanhol; finalmente,
porque Manuel Alegre é uma figura tíbia, palavrosa e sem projecto político
palpável que interesse à multidão, sem capacidade de avançar para roturas como
Oskar Lafontaine ou Jean-Luc Mélachton.
Em suma, alimentar esperanças de roturas importantes no PS é o fomento do
sebastianismo e, colocar fora dos movimentos de contestação ao governo e ao
capitalismo, o factor decisivo para o seu fortalecimento.
·
Os recentes
resultados eleitorais, com grandes perdas para a direita, na sua mais vasta
acepção, só terão valido alguma coisa se conduzirem a um maior fôlego
militante, à preparação dos trabalhadores para a luta, para a resistência, para
iniciativas contra o poder PS/PSD. Se tudo se reconduzir depois dos próximos
actos eleitorais ao voyeurismo dos debates na AR e a uma maior presença nos
órgãos autárquicos, o balão tenderá a esvaziar-se.
b) Direita comum
O
conjunto formado pelas Torres Gêmeas (PS/PSD) e pelas pequenas formações
conservadoras que vão surgindo nessa área ideológica, baseadas na aceitação do
capitalismo e da democracia de mercado, apresenta uma queda continuada quer no
que se refere à percentagem de votantes, quer ao seu número físico.
1999
- 2619 mil votantes representando 77.9% do
total
2009 - 2199 mil
votantes representando 66.3% do total
o
que representa uma quebra de 420 mil votantes e de 11.6% na sua representatividade
no total daqueles. Esta evolução terá decerto, uma forte relação com o acentuar
das desigualdades, a grande polarização entre muito ricos e a imensa maioria de
pobres e remediados, com o esfarelamento duma pouco numerosa classe média.
Eleitoralmente, o voto conservador vai muito para além das camadas sociais
intermédias, atraindo também muitos trabalhadores e pobres, ideologicamente
colonizados pelos interesses dominantes. Este facto, não é específico de
Portugal, é típico de todas as sociedades actuais onde a ideologia dominante
cava fundo no seio daqueles cujos interesses objectivos seriam o de desapossar
as camadas possidentes.
A
quebra da direita comum manifesta-se, em 2009, em todos os distritos,
comparativamente a 2004. Neste último ano, a direita comum era maioritária em
todos os distritos, obtendo os seus mais baixos resultados em Setúbal (58.7%) e
Beja (59%) mas ultrapassando 83% em 9 distritos. No dia 7 de Maio último, a
direita comum ficou aquém de 50% em três distritos (Beja, Évora e Setúbal) e,
somente nos Açores passou dos 80% e por escassa margem. Em termos relativos, as
perdas ultrapassam os 10 pontos percentuais em sete distritos, onde sobressai
Faro (-15,2 pp); as menores perdas verificaram-se na Madeira, onde reina o
impune “democrata” Alberto João.
É
o conjunto das pequenos partidos que atenuam as perdas da direita comum, uma
vez que os seus votantes triplicaram nos últimos dez anos, em grande parte
devido ao desempenho do novo MEP. Em 1999 representavam 1.2% dos votantes e
recentemente 3.9%.
O
crescimento dos resultados dos pequenos partidos da direita comum revela uma
erosão crescente do PS/PSD e que existe uma parte do eleitorado do chamado
bloco central que se não desloca nem para a esquerda, nem se refugia na direita
xenófoba, antes procura novos caminhos, dentro da mesma área politica, ainda
que sem resultados em termos práticos até agora. Definem-se estes movimentos
por apelos à ética, ao ambiente, ao mérito ou mesmo… ao regresso à monarquia.
O
PS/PSD tem uma evolução que merece especial destaque dado o seu carácter de
partido-Estado, com duas facções que se digladiam, para encenar divergências
programáticas pouco relevantes:
·
O PS/PSD perdeu
mais de meio milhão de votantes em dez anos de eleições para o PE,
independentemente da distribuição dos resultados no seu interior;
·
Em dez anos o
PS/PSD deixa de ultrapassar os 3/4 dos votantes para ficar claramente abaixo
dos 2/3;
·
O PS perde em
2009 quase 18% e 565 mil votos face a
2004 situando-se 5.4% aquém do irmão gêmeo, quando detinha mais 19% do
eleitorado do que o PSD, há cinco anos;
·
O PSD, apesar do
esforço do gordinho Rangel, limita-se, praticamente, a recuperar os votos
perdidos em 2004, relativamente a 1999, pelo que os ganhos do gang são
escassos, só ganhando relevância por comparação com as perdas socratóides.
Pensando bem, a contratação de Obélix por Olívia Palito, teve um sucesso
oferecido por Sócrates;
·
O governo
anti-social e genocida de Sócrates é o grande perdedor no âmbito do chamado
bloco central e, transparece que muitos votantes descobriram o logro da
alternância entre o PS e o PSD, preferindo desviar o seu sentido de voto para a
esquerda ou para a abstenção, uma vez que a atração exercida pela direita
xenófoba, foi marginal.
Comparativamente a 2004 o PS/PSD perde votos em todos
os distritos, mais acentuadamente nos Açores e em Beja, conseguindo o menor
desequilíbrio em Viseu e Vila Real. Tal como os resultados eleitorais
distribuidos pelas duas formações, grosso modo se inverteram, o PS evidencia as
suas perdas em todo o território, enquanto o PSD melhora significativamente os
seus resultados em quase todos os distritos.
Essa inversão é a forma por que se pretende exprimir o
rotativismo empobrecedor em que as mudanças no poder se restringem às moscas
mas, criando a ilusão junto da multidão que essa alternância é virtuosa e
prenhe de benefícios; ou, gerando o conformismo de que nada há que possa evitar
a pestilência e as moscas. Contudo, a efectiva penalização do PS/PSD e a subida
das simpatias pela esquerda são sinais claramente positivos .
c) Direita xenófoba ou fascista
A
direita xenófoba (CDS+PNR) agarrada aos seus temas caros, a segurança, a
criminalidade e a imigração, também saiu beneficiada das eleições, aumentando
27000 votos e 0.66% no total dos votantes. Beneficiada mas, com um brilho muito
menos intenso que o reflexo da dentadura de Paulo Portas.
Os
ganhos do CDS repartem-se em duas fatias quase iguais. Uma, correspondente à
recuperação dos seus eleitores desavindos que haviam apoiado Manuel Monteiro em
2004; e, a outra, por captação de novos apoiantes. Em relação a 1999,
ultrapassado o episódio PND, o CDS pouco evoluiu; passou de 8.4% para 9% do
total dos votantes, captando apenas mais 14000 novos apoiantes.
Os
melhores resultados relativos do CDS verificaram-se em Aveiro (11.5%), Viana do
Castelo, Viseu e Braga, num quadro de relativa homogeneidade onde destoam as
votações no Alentejo e Setúbal.
Por
seu turno, a votação nos fascistas do PNR aumentou substancialmente mas,
continuam marginal eleitoralmente. Sublinha-se que 53.8% dos seus eleitores se
situam em Lisboa, Setúbal ou Faro, distritos com forte população imigrante e
guetos como a Bela Vista e a Fonte Santa e onde tiveram percentagens da ordem
dos 0.6/0.7%. Com a devida atenção e para os devidos efeitos.
Mais uma
volta, mais uma viagem
Mais uma
volta para ganhar coragem
(Sérgio Godinho)
Junho 2009
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