quarta-feira, 14 de abril de 2021

Marcelino, pan y vino

 Sumário

1 - Os primórdios do artista

2 – A gestação dos democratas de plástico

3 – Cavaco não promoveu Marcelo

4 – Cenas do desempenho mediático de Marcelo

===== !!! =====

1 - Os primórdios do artista

O Marcelino (do filme) foi mordido no seu pé descalço por um escorpião e teve a sorte de um padre lhe ter sugado o sangue que escorria da mordedura, conseguindo, com a evidente graça de Deus que o veneno não tivesse abatido o rapazito. O Marcelo do século XXI nunca seria mordido por um escorpião porque o seu pé só se descalça para mergulhar nas águas dos estoris e, não consta que se tenha picado num peixe-aranha; ou, anos atrás, quando mergulhou nas sujas águas do Tejo, numa tentativa (falhada) para conquistar a câmara de Lisboa (1989), não consta que tenha ficado preso no lodo fedorento.

Marcelo é um artista. Só está bem no palco, na rua, numa zona de incêndios, a dar comida aos sem-abrigo, onde possa estar rodeado de fãs, basbaques ou jornaleiros, atentos às suas palavras de circunstância; ou, nas intriguinhas inventadas para desorientar a concorrência, no seio da tosca classe política da paróquia. Talvez tenha a esperança de acudir às vítimas de um terramoto ou de uma erupção vulcânica. É uma alma de socorrista que não suja as mãos.

É sabido que Marcelo nasceu em berço de ouro, no seio de uma família bem integrada no topo da oligarquia do regime fascista, protegido como um príncipe, tomado como um sucessor real; a família era rica, pertencia às estirpes mais nobres do regime e o pai Baltazar era amigo próximo do chanceler da paróquia, Caetano; e, este como padrinho do jovem, prendou-o com o seu nome próprio, cuja origem significa pequeno guerreiro.

Diz uma testemunha da época que o filho do Baltazar andava na escola (Liceu Passos Manuel, em Lisboa) de camisa verde e calça castanha, com um discreto mas revelador “S” (de Salazar) na fivela do cinto; era a farda da chamada Mocidade Portuguesa, que Salazar fundara como cópia provinciana da Hitlerjugend (Juventude Hitleriana), na gíria conhecida por “bufa”, antro de informadores e delatores do regime, desconsiderada  entre os jovens não simpatizantes do regime fascista.

Marcelo-afilhado não herdou a capacidade de construção jurídica do Marcelo-padrinho; este, enformou peças essenciais do regime fascista, da estrutura do regime, no âmbito do direito constitucional e do direito administrativo; daí que tenha sido o herdeiro do fundador do regime, Salazar. Marcelo-afilhado apenas chegou a Presidente da República, um cargo, mais simbólico do que possuidor de um poder efectivo, destinado a mandarins na procura de uma reforma dourada; e que contribui para o enchimento de uma Constituição, oligárquica, pesada, longa, quiçá ridícula e que mais parece uma sopa de letras.

Longe dessa vida boa numa forja de intelectuais e políticos fascistas e tementes a deus, a vida no Portugal dos anos 60 era uma pasmaceira pobre de onde saíram centenas de milhares de pessoas na procura de dias melhores em terras de França ou da Alemanha;

Ei-los que partem 

Novos e velhos

Buscar a sorte

Noutras paragens

Noutras aragens…                        (Manuel Freire)

e onde (outros) jovens eram conduzidos como carneiros para a guerra colonial, para a defesa da pátria, contra os “terroristas” que, imagine-se o despautério… já não queriam aceitar quase quinhentos anos de tutela portuguesa! O que sobrou dessa ocupação colonial foram terras ricas, com muitos pobres, punhados de oligarcas corruptos e, uma numerosa prole de mulatos de vários tons.

Nesse Portugal, alguns, menos pachorrentos, menos conformados fugiam para a Europa transpirenaica e outros (poucos), eram encarcerados em Caxias ou Peniche. A maioria aceitava, com bonomia e católica resignação, a mobilização para as colónias, pois o pré num país miserável podia constituir um pecúlio essencial para o casamento, no regresso à “Metrópole” “E assim vai Portugal, uns vão bem e outros mal” como na canção do Fausto.

Marcelo, jovem licenciado, entrou em concorrência com António Guterres recolhendo ambos do mentor e confessor, o padre Melícias, os convenientes ensinamentos para carreiras promissoras, no espaço que sobrava entre missas e confissões de pecados.

A vida de Marcelo não corria mal. As sebentas do curso de direito tinham sido lambidas e, aos 22 anos, ele licenciava-se; como o seu concorrente Guterres, sentiam ambos que o poder lhes chegaria no devido tempo. E assim, como siameses, entraram na fundação do jornal Expresso, em 1973, já então um órgão de uma direita moderna, onde se poderiam treinar para futuros quadros do padrinho Caetano, na reorganização do capitalismo de lusa raiz, em parceria com estrangeiros portadores de tecnologia. Tudo isso à sombra da tutelar Inglaterra, acabadinha de entrar na CEE. E, Portugal conseguiu um acordo com a instituição e manter a deriva colonial; uma prova de natação entre duas águas. Porém, toda essa construção que no topo tinha o Marcelo senior ruiu, por duas razões. Primeiro, a reabertura do Suez inviabilizava o projeto de industrialização ancorado na petroquímica e na construção/reparação naval; e, segundo, porque a tropa não se sentia motivada para uma guerra colonial, com a derrota selada, desde o seu início. O esforço já não era compensado pelo pré, sobretudo na Guiné, onde o dispositivo militar luso se estava a afundar.

2 – A gestação dos democratas de plástico

O golpe de 25 de Abril com a concomitante queda do regime fascista apanhou o jovem Marcelo sem idade para surgir como comprometido com o regime. Um dos primeiros actos dos militares no poder – o envio de Caetano e Tomás para o Brasil – foi o sinal de que nunca haveria um julgamento do regime, dos seus homens de proa, ou mesmo da arraia miúda dos pequenos fascistas que rapidamente surgiram de cravo no peito ou se acolheram, com subtileza, na administração pública e em alguns partidos. Na política, os interesses estão sempre acima dos valores. Num país dito de católicos (?), os homens são todos irmãos em Cristo, amen!

Assim, Marcelo foi um dos fundadores do Partido Popular Democrático, em maio de 1974, duas semanas depois da queda do regime fascista. Nele pontificavam os membros da “ala liberal” (com Sá Carneiro à cabeça), antigos cooptados por Caetano no sentido de uma lenta reforma do regime; e que, durante alguns anos, enquanto deputados na Assembleia Nacional tentaram, quais missionários, a conversão democrática da ganga fascista que dominava o areópago, polarizada em torno de um grunho patriarca, o presidente Américo Thomás (assim mesmo, com h!). Guterres, esse aderiu ao PS, então na crista da onda europeia de simpatia para com le petit Portugal.

A guerra colonial e a manutenção das colónias era uma aberração política na época; como colonizador Portugal tinha pouco para oferecer, era o país mais pobre e, de mais baixos níveis educativos da Europa Ocidental (e… continua a ser). O empresariato e a classe política portuguesa quase meio-século depois da descolonização, ainda mantêm essas caraterísticas, numa árdua luta com alguns países balcânicos, na disputa do último lugar da segunda divisão europeia.

Como seria expectável os dois gemelares partidos - PS e PSD - iriam iniciar uma constante luta pelo poder, pelo preenchimento de lugares de topo, com passwords próprias e únicas para o acesso ao pote, com os restantes partidos a acompanhar, como subalternos, o batuque par(a)lamentar; ou, como tenores reivindicativos da felicidade de um povo manso, de grunhos “inconseguidos” para parafrasear uma tal Assunção, que presidiu a AR, ligada ao PSD, anos atrás.

Deputado em 1975, Marcelo foi um dos participantes na elaboração da Constituição[1] – um arrazoado enorme, palavroso, recheado de habilidades para excluir o povo de qualquer decisão, para favorecer a perenidade de uma classe política, uma nova nobreza, definida como uma elite; embora muitos sejam reles nulidades, sobredotadas apenas na capacidade de obedecer e na prática da ocultação de rendimentos.

Marcelo não foi chamado para o (VI) governo com Sá Carneiro na frente e, que se estendeu por todo o ano de 1980 até à morte do primeiro-ministro na queda do avião em que voava, na área de Camarate; nem no governo seguinte, chefiado por Balsemão (VII). Só chegou a ministro e dos burocráticos Assuntos Parlamentares em junho de 1982 e até 1983, também com Balsemão no poder (VIII governo), no que parecia o início de uma vida política auspiciosa. Porém, nunca mais pertenceu a qualquer governo apesar de então ter apenas 35 anos.

Entretanto, Mário Soares coligou-se com o PSD (Mota Pinto) no âmbito do chamado Bloco Central (IX governo) para a gestão de um período economicamente calamitoso para o povo, com Marcelo na oposição, no leque mais direitista do PSD, na companhia de Durão Barroso, Santana Lopes e Miguel Júdice - o grupo designava-se por Ala Nova Esperança - dirigindo o reacionário "Semanário” (1983/87) a par com Proença de Carvalho, todos cotados como advogados ou juristas, conhecidos pelo seu reacionarismo.

O hirto e distanciado Cavaco Silva soubera gerar um mito de competência no governo de Sá Carneiro (o VI, 1980); a morte daquele e a fragilidade política de Balsemão (primeiro–ministro no VII/VIII governos) criaram em Cavaco Silva escassa disposição para arcar com os efeitos da funda crise económica de 1981/83, cujos ónus vieram a recair na coligação PS/PSD, o referido Bloco Central. O mesmo grupo de duros da direita onde Marcelo se inseria, constituiu um núcleo patrocinador da eleição de Cavaco Silva a presidente do PSD, o que veio a acontecer no conhecido congresso da Figueira da Foz, em 1985.

Entretanto, o Bloco Central reduziu os efeitos da crise, beneficiando das ajudas de pré-adesão na então CEE, do significado estrutural da negociação da adesão e, sobretudo, do caudal de dinheiro que viria da Europa comunitária. Porém, passados 35 anos dessa adesão, a classe política portuguesa mostra, à saciedade, as inconveniências da sua incapacidade política e do desbarato de fundos que mantêm o país na cauda dos indicadores económicos, sociais e educativos da Europa; mas, com muitos nomes sonantes da classe política transformados em ricos ”empresários”.

3 – Cavaco não promoveu Marcelo

Cavaco ganhou três eleições seguidas, conseguindo três mandatos como primeiro-ministro no período 1985/95; na primeira (1985), venceu o PS, onde Almeida Santos substituíra Mário Soares como chefe do PS, beneficiando do epifenómeno PRD que tinha um “íman escondido”, o presidente Eanes, representado à luz dos holofotes pela sua mulher, Manuela Eanes, com propósitos governamentais.

Em 1987, Cavaco obtém a maioria absoluta nas eleições contra o seu colega Constâncio, elevado a chefe do PS, com derrotas marcantes do PRD de Eanes e do PCP. A dupla Cavaco/Constâncio logo se harmonizou para a privatização de empresas públicas para reduzir o deficit; porém, mesmo com a entrada de fundos comunitários, a médio prazo, os grandes deficits iriam voltar. O plano dos tecnocratas revelou-se um fracasso, com o patriarca Soares a assistir, benevolente, como residente do Palácio de Belém. Em 1991, perante uma oposição débil e a mansidão da plebe, tradicionalmente embebida em tv, de novo Cavaco consegue maioria absoluta nas eleições, nesta feita tendo Jorge Sampaio como líder do PS e presidente da Cãmara de Lisboa, (1990/95), a ganhar fôlego para voos mais altos.

Em todo o período de Cavaco como primeiro-ministro, Marcelo nunca chegou a ter cargos governamentais, apesar do apoio prévio dado ao inculto mas manhoso economicista, chefe do seu partido. Assim, nas eleições autárquicas de 1990, Marcelo ganhou um lugar na vereação da câmara de Lisboa (1990/93), vendo a presidência da autarquia ficar nas mãos do presidente do PS, Jorge Sampaio. Em termos autárquicos Marcelo especializou-se nas árduas tarefas de presidente de Assembleias Municipais (Cascais, 1979/1982 e Celorico de Basto, 1997-2009) como complemento da atividade de professor da Faculdade de Direito de Lisboa onde, ao que sabemos, teve um desempenho do agrado dos alunos.

Vendo que dentro do partido não lhe atribuíam a notoriedade associada ao seu perfil académico, nem ao pedigree político familiar, Marcelo - que sempre terá gostado de vastas e atentas plateias - tornou-se comentador político. Primeiro, na rádio (TSF, 1993/96), passando em 2000 às televisões onde se veio a especializar num curioso hibridismo entre o comentário político e a promoção da venda de livros; uma atividade que mereceu, num programa humorístico na radio pública, a referência de Marcelo a um formidável álbum com fotos de… caroços de nêspera!

Em 1991, Mário Soares entra no seu segundo mandato como presidente, sem concorrência de qualquer candidato do PSD; isto é, uma forma implícita de união do eleitorado afeto ao bloco central (PS/PSD). Suceder-lhe-á Jorge Sampaio, no período 1996/2006.

Em 1995 Guterres, secretário-geral do PS desde 1992, ganha as eleições (1/10) e o governo, já com Cavaco fora de cena, é substituído por Fernando Nogueira, como presidente do PSD em 1995/96. Nogueira pouco depois, cedeu o seu lugar a Marcelo, a quem caberia como obrigação essencial, a crítica do seu ex-companheiro de sacristia, Guterres; recordemos que ambos haviam sido ouvintes atentos dos conselhos do padre Melícias, perceptor de ambos, uns vinte anos atrás. Guterres será primeiro-ministro durante sete anos (1995/2002) deixando então, de ser secretário-geral do PS, para se dedicar a outras funções, de caráter internacional. Guterres bateu Marcelo com larga margem em notoriedade, não sendo comparáveis as respetivas carreiras políticas. Entretanto, Marcelo, enquanto presidente do PSD (1996/99) viabilizou três orçamentos propostos por Guterres, em minoria na AR; do mesmo modo que promoveu a reconciliação do PSD com o PCP, após vinte anos de relações cortadas.

Nesse período (1997/99), Marcelo foi também deputado europeu e vice-presidente do PPE, depois do seu PSD ter saído da Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa, para o mais reacionário PPE, ao lado do PSD; em qualquer dos casos, nem com microscópio eletrónico se consegue ver algo de social-democracia no atual PSD.

Marcelo, em 1998, teve a iniciativa de referendar a despenalização do aborto,  a qual só foi aceite num segundo referendo, em 2007. Negando esse direito às mulheres, revelou aí o seu catolicismo ultramontano que suplanta o seu perfil de jurista e de (pretenso) defensor dos direitos individuais; evidenciando, também a sua misoginia.

A zanga com Paulo Portas surgida, em 1999, no âmbito do envolvimento daquele num caso de burla na “Universidade Moderna” terá durado anos; e, inviabilizou a presença de Marcelo numa aliança PSD/CDS que só se viria formalizar entre Durão Barroso e Paulo Portas, em 2002, com o primeiro a mostrar-se pouco exigente face a Portas, tendo em conta o caso dos submarinos; um estranho processo de corrupção em que foram condenados, na Alemanha os corruptores, sem que se tenham apurado corruptos… A habitual estranheza da justiça made in Portugal, recentemente confirmada no caso “Sócrates”…

Guterres que havia perdido as eleições autárquicas em 2001, demite-se, ficando Ferro Rodrigues na liderança do PS (2002/04), que não conseguiu evitar a vitória eleitoral de Durão, que forma governo com o CDS. Na sequência da saída de Durão para a Comissão Europeia (2004), Sampaio recusa-se a nomear Ferro Rodrigues, apontado como envolvido no escândalo Casa Pia e que se demitiu de secretário-geral do PS. Sampaio nomeia um governo PSD/CDS, chefiado por um incapaz, Santana Lopes, herdeiro de Durão mas, acolitado por Portas. Perante a fragilidade política de Ferro e Santana, Sampaio “criou” um José Sócrates que veio a ganhar as eleições de 2005 e, com maioria absoluta, perante um PSD que tinha na liderança o bon vivant Santana.

Marcelo voltaria ao comentário político e à promoção de livros até à sua candidatura a PR em 2016, capitalizando simpatias que lhe permitiram suceder a Cavaco, contra um candidato do PS – Sampaio da Nóvoa – inventado para a contenda. Em 2021, Marcelo aumentou as vantagens para a reeleição, perante a falta de comparência oficial do PS, sem um candidato a que tivesse dado o aval e o rótulo; demonstrando assim, uma aceitação passiva da reeleição de Marcelo, o seu implícito campeão.

4 – Cenas do desempenho mediático de Marcelo

Por outro lado e, sobretudo como professor de direito, Marcelo comete um erro imenso quando, na pele de PR, se mostrou, vergado perante o Papa, num acto formal de beija-mão, de implícita subordinação do estado português - do qual é o “mais alto magistrado”, na gíria formal vigente na paróquia - ao chefe de um estado estrangeiro, o Vaticano. Num país a sério deveria ter sido compelido a demitir-se, depois desse acto, para então poder beijar quantas vezes quisesse o anel ou a mão do Papa, num acto pessoal, como católico. Haverá nele uma nostalgia monárquica, da prática do beija-mão real… 

  

Como indivíduo cultor da formalidade atribuível a um senador do reino, Marcelo surgiu como membro do Conselho de Estado em 2000/01, no tempo de Jorge Sampaio como PR: e, em 2006/2016, como conselheiro de Cavaco Silva prosseguindo, naturalmente, já como PR, a reunir os convivas, depois da sua recente eleição. Recorde-se que esse Conselho é um repositório de chefes dos principais gangs partidários, amalgamados  com as altas estirpes da juizaria, antigos presidentes e, uma ou outra figura de prestígio como, recentemente, António Damásio e a escritora Lídia Jorge.

Marcelo, em 1998, enquanto chefe do PSD, gerou um referendo sobre a regionalização administrativa para formalizar o que toda a classe política pretendia…que não houvesse uma verdadeira regionalização; e que, claro, continua a não existir. É confortável para qualquer governo central, articular-se com municípios e não com entidades eleitas de regiões, um degrau entre o poder central e os municípios. Qualquer classe política incorpora no seu código genético a vontade de controlar e decidir a aplicação dos impostos cobrados à população. O demagogo António Costa veio a chamar regionalização a uma distribuição regional dos poderes do governo central para a colocação de ex-autarcas, burocratas, ou mandarins de segunda linha, no âmbito de responsabilidades que continuam centralizadas. Já anteriormente o governo Passos actuara no mesmo sentido.

Na continuidade da falência do BPN segue-se o enorme aumento do deficit, inserido nas sequelas da falência do Lehman Brothers, de onde resultou a demissão do governo Sócrates por ordem do sistema financeiro, a que se seguiu a intervenção da troika, que exigiu a venda de participações públicas em empresas emblemáticas. Foi um novo surto de vendas de bens públicos como o registado durante o consulado de Cavaco, como primeiro-ministro e, também com o objetivo da redução do deficit; um objetivo sempre falhado, a médio prazo. Com o governo Passos/Portas o programa da troika foi cumprido com fidelidade canina, com custos e sacrifícios enormes da população trabalhadora; a que se seguiu a explosão do BES em 2014 com sequelas que ainda perduram e, perante a subserviência dos governos envolvidos, de Passos ou, de Costa.

Costa só conseguiu formar governo (2015/19) com o suporte da chamada esquerda (BE/PCP) naquilo a que se veio a chamar “geringonça”; e que, conduzindo a ganhos eleitorais do PS, reduziu a relevância da “esquerda” na AR depois das eleições de 2019. É nesse período que Marcelo abandona a recomendação de livros na TV para se candidatar a PR (2016/21), numa serena harmonia com o governo.

Como se tornou habitual, os presidentes da república cumprem os dois mandatos possíveis, de acordo com a Constituição; e, Marcelo não fugiu à regra. Assim, em 2021 surge como grande vencedor, perante a ausência formal do PS que assim, claramente, demonstrou apoiar Marcelo. Uma vez mais, a amálgama PS/PSD, suplantou a concorrência de Ana Gomes que sorveu parte do eleitorado PS e do BE; e da apresentada pelo ventureco que recolheu o apoio de fascistas ou seus próximos, na área do PSD ou do moribundo CDS.

De Gaulle propunha uma dissuasão nuclear a todos os azimutes. Marcelo propõe-se atingir todos os azimutes para a unanimidade do aplauso, mesmo com parca obra feita. Em todas as chancelarias foi evidente o desagrado para com a figura de Bolsonaro e, poucos representantes nacionais estiveram na posse do sacripanta, futuro criador da “gripezinha”. Entre esses poucos, esteve Marcelo. "Foi uma reunião entre irmãos" dizia o DN.

Marcelo esteve presente na oferta de conforto às vítimas dos incêndios, destroçadas pelas suas perdas. Mas, por outro lado, deslocou-se ao Afeganistão para confraternizar com os mercenários ao serviço da NATO de origem portuguesa. E não podia dispensar… a selfie!

Marcelo, ao contrário do seu grunho antecessor presidencial que viajava pouco e falava ainda menos, é um rei do verbo e protagonista da presença mais inesperada para pasmar os paisanos com o seu falar fácil e de circunstância, mesmo sem pompa; gosta de ser vedeta, de se rodear de microfones e câmaras, dando o seu contributo de entertainer para a vacuidade habitual da imprensa e o aplauso dos circunstantes.

Marcelo também gosta de ir a lugares remotos, como um extraterrestre ou uma réplica engravatada da Sra. de Fátima; e encontrar-se com uma trabalhadora, no desempenho das suas tarefas num campo de tomateiros, na zona de Vila Franca de Xira; e. certamente avisado para ter cuidado com os tomates. Não sabemos se a trabalhadora teve direito a ficar em selfie.

Finalmente, a melhor imagem de Marcelo, a imprevisibilidade e a inconstância do vento…

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