Conclusões
- É
conhecida a articulação criminosa entre o Estado – central e local – e os
seus mandarins, com os branqueados capitais imobiliários e os bancos. Essa
triangulação constitui o nó górdio onde estão retidos os interesses da
esmagadora maioria dos portugueses;
- A
Constituição, no caso vertente, o artº 65, não está minimamente a ser
cumprida pelo partido-estado, no poder sem interrupção há mais de 30 anos
e que entregou a satisfação das necessidades de habitação à manipulação e
ao domínio do poder financeiro e do inflacionado setor imobiliário
- Não
tem havido política de habitação; tão somente mercado de habitações com
preços especulativos e com franco abuso por parte dos bancos na elaboração
dos contratos de mútuo;
- Não
está cumprido o acesso de todas as pessoas a uma habitação, mormente,
condigna;
- A
entrega da satisfação das necessidades de habitação à conivência entre os
interesses imobiliários, o sistema financeiro e os elencos (partidários)
das câmaras, promoveu o desordenamento em áreas urbanas ou rurais,
construção sem qualidade, ambientes urbanos sobrecarregados, desperdício e
dívida, muita dívida;
- Os
instrumentos de política de reabilitação não tiveram grandes efeitos
práticos; visam negócios privados que incluem formas de delegação em
privados de prerrogativas públicas;
- No
capítulo dos equipamentos sociais que devem acompanhar as implantações de
população, o partido-estado tem vindo a desmantelar a rede desses serviços
ou a transferi-los para a “iniciativa” privada, qual abutre que não
consegue existir sem o continuado abastecimento financeiro proveniente dos
impostos;
- As
receitas fiscais das câmaras tornaram-se dependentes do imobiliário e,
prefigura-se num futuro próximo um aumento – decretado pela Troika- da
carga fiscal (IMI) para garantir uma mesma estrutura mafiosa de elencos
autárquicos, a despeito do empobrecimento global e da precariedade das
vidas;
- A
ausência de política urbanística ou de habitação tem acentuado os
desequilíbrios regionais e a suburbanização das manchas urbanas, com
abandono dos centros das cidades;
- O
fomento desordenado do imobiliário conduz a um grande volume de casas
desocupadas, para aluguer ou venda, em paralelo com centenas de milhar de
fogos sobrelotados;
- Há uma
preocupação nítida de reduzir o papel do inquilino na relação mercantil
chamada arrendamento, estabelecendo-se atualizações automáticas de rendas,
recusadas para os salários e pensões, por exemplo;
- À
fácil urbanização dos solos por parte das autarquias, juntam-se
instrumentos como os PIN e, num futuro próximo, o desmantelamento de todos
os elementos de ordenamento e preservação do espaço, através de instruções
emanadas da autoridade colonial, a Troika;
- Os
orçamentos participativos têm evidente ausência ou uma parca aplicação,
mesmo como instrumento de propaganda
-------- +++ --------
Sumário
1-
Definição do jogo e dos seus intervenientes
2-
O jogo, a batota e a Constituição
2.1- Habitação e urbanismo
2.2- O direito elementar a uma habitação adequada
2.3- Papel do Estado na programação e
execução de uma (não) política de habitação
2.4- O nulo papel das autarquias na construção de habitação
social ou económica e a carga fiscal
autárquica
2.5- Os estímulos públicos à construção privada e o
acesso a habitação
2.6- O papel do sector não mercantil na questão da
habitação
2.7- Ausência de promoção
de encargos com a habitação compatíveis com o rendimento
2.8- Política de ocupação mercantil do solo
2.9- A mentira da participação da população no
planeamento urbanístico
3 – Expropriados e despejados. Propostas
de luta
1- Definição do jogo e dos seus
intervenientes
Tratar o tema em epígrafe é avaliar como se transmuta
o expresso objetivo constitucional de uma politica de habitação para a sua total
ausência; e como se passa dessa ausência para o primado absoluto do “mercado”,
da mercantilização de uma necessidade essencial da população, mormente de quem
trabalha.
Formalmente e também neste tema, a classe política,
essencialmente o partido-estado PSD/PS (ou PS/PSD conforme a conjuntura,
permite a total comutatividade), com o seu acólito PP, perante essa opção,
dir-se-á que não cumpre a Constituição e portanto, que não tem legitimidade
para governar. Nesse contexto, esses gangs deveriam ser objeto da aferição das
suas responsabilidades, não só políticas mas, sobretudo financeiras, a exigir
ressarcimento financeiro e punição criminal. Para isso seria necessário que se vivesse,
realmente, em Portugal, num “Estado de direito”, como tanto é apregoado pelo
mandarinato. O Estado de direito é uma ficção porquanto os capitalistas e os
seus mandatários políticos se isentam do cumprimento das leis que elaboram.
O abandono de uma política de habitação, tal como consignada
no artº 65 da Constituição, corresponderá a uma opção ideológica do
partido-estado, sem dúvida; mas, seguramente, compreende mais a construção de
uma política integrada de enriquecimento ilícito de uma elite de uns quantos
chamados “empresários” e políticos profisssionais. Isso evidencia que uma
ideologia constitui uma teorização que esconde interesses bem palpáveis e assaz
restritos; a crença ou a defesa de uma ideologia, sem interesses próprios por
quem a defende, é uma manifestação de ingenuidade ou estupidez.
A questão da entrega da disponibilidade de habitações
condignas ao mercado pode observar-se através de vários ângulos. Na base, pode
dizer-se que perante o abandono pelo Estado, desse vetor de satisfação de
necessidades coletivas, isso significou que surgiram capitais privados para colmatar
essa lacuna, procedendo à construção numa relação de concubinato com os bancos
financiadores[1].
Sabendo-se da tradicional permeabilidade portuguesa à corrupção, a tráficos
vários e à evasão/burla fiscal, o imobiliário em geral constitui uma forma fácil e há muito testada
para a lavagem de capitais e ganho de respeitabilidade dos mafiosos, por essa
via, transformados em “empresários”, investidores, empreendedores,
empregadores, exportadores, sempre esforçados na defesa do bem-estar pátrio nas
mais variadas vertentes.
Assim, a construção ficou por conta de investidores
imobiliários, ligados a empresas de regime ou aos bancos, em grande intimidade
com o partido-estado. No mercado da subempreitada, surgem diversos níveis
de empresas, basicamente constituídas
por trolhas reciclados, sem contar com a vasta panóplia de desenhadores,
arquitetos, engenheiros, consultores, importadores e fabricantes. O fim do
ciclo já abateu metade dos intermediários imobiliários mas, também pequenas e
médias empresas de construção civil ou mesmo, empresas produtoras de bens de
qualidade como a Valadares.
Peça essencial nesse circuito são as câmaras e a sua
burocracia, cuja intervenção as elege como reguladores da legalidade, da
fiabilidade da construção, do cumprimento de políticas urbanísticas, de
habitação ou de qualidade ambiental, papel esse que não cumprem, cumprem mal ou
falseiam, para garantirem benefícios próprios, dos seus vereadores e dos
empreendedores imobiliários que os patrocinam. Dentro desse quadro de
cumprimento formal das leis, o que surge é um disseminado grupo de autarcas que-
para proveito próprio (pessoal ou eleitoral) e dos seus partidos- cobram adequadamente
o seu quinhão em troca de alvarás, autorizações, conversões de terrenos
rústicos em urbanos, planos de urbanização, volumetrias de construção,
atropelos ambientais, etc.
A especulação comporta toda uma engrenagem de
corrupção que entrelaça os interesses de capitais mafiosos com os gangs
partidários, numa globalidade que domina totalmente a política nacional, ainda
que com o devido submissão à Troika e ao que ela representa. Como uns dependem
dos outros, a situação eterniza-se até ao atual apodrecimento, que exige
urgentemente de brigadas de desratização.
Para ganharem eleições locais e, indiretamente nacionais,
as mafias partidárias têm de fazer obra, beneficiando da filosofia popular de
respeito por quem “rouba, mas faz”. E lá têm de construir pavilhões
desportivos, as vias rápidas, circunvalações com muitas rotundas, fontes
luminosas, estátuas, na sequência da paranóia pelos palácios da justiça dos
tempos finais do fascismo. Se as escolas não são grande coisa, se não há
transportes públicos decentes, se os postos de saúde não respondem às
necessidades da plebe, pouco importa porque são responsabilidades do poder
central. Para a realização de obra pública e manutenção de um vasto staff onde cabem os filhos das famílias
de referência da terra e/ou do partido – nunca se vê um presidente que não
acompanhado de um séquito – é necessário dinheiro, E para o efeito, lá se conta
com os impostos, uma vez que o financiamento bancário foi congelado pela
troika.
Finalmente e para fechar o circuito, os bancos depois
de terem contribuído para a construção do imobiliário, mostravam-se muito
solícitos na concessão de crédito às famílias, para garantia de aplicação de
capitais em devedores de pouco risco e sem margem para discutir a alta
rendabilidade dos bancos, tal como emprestavam às câmaras, sabendo que a sua
falência não ocorreria.
E foi precisamente pela conivência entre o Estado,
com os seus mandarins e o sistema bancário e os seus afamados gestores que o
circuito entupiu; quanto aos capitais mafiosos, puseram-se ao largo, à procura
de novas oportunidades de destruição.
2- O jogo, a batota e a Constituição
2.1- Habitação
e urbanismo
Logo o próprio título do artº 65- Habitação e
urbanismo – estabelece uma coerência logo desmentida pela realidade. Faria todo
o sentido uma íntima ligação entre o urbanismo e a política de habitação; porém,
o urbanismo ficou para execução por parte dos elencos camarários, em grande parte
com dinheiros públicos, tendo por detrás a premissa da valorização de terrenos
privados e, a habitação, ficou totalmente entregue ao mercado, dominado por
interesses partidários, imobiliários e financeiros.
Como em muitas outras áreas, no capítulo da
habitação, os direitos constitucionais são letra morta. Aliás, quando uma sociedade
não se auto-organiza para construir as suas próprias leis, nem para zelar pelo
cumprimento das que são criadas pelo mandarinato, como coartar os abusos e punir
os infratores? Como se pode fazer evoluir o normativo em geral, sem essa
atuação e vigilância constantes? Torna-se, assim, natural que as leis,
sobretudo aquela que é a basilar, a fundacional, não passe de um volumoso
elenco de frases sem sentido, um punhado de intenções e nada mais; torpedeada,
interpretada, violada, por uma chusma de advogados especializados no tráfico de
influências, em conivência com os mandarins de serviço e, sob a adormecida
vigilância de uma aparelho judiciário corporativo.
As leis, em regimes cleptocráticos, são sempre a
expressão de situações de domínio da oligarquia sobre a grande maioria, mesmo
quando esta última até pode ser beneficiada por uma lei específica; neste caso,
sobretudo, quando se trata de preceitos legais sem uma relevante envolvente
financeira, como no caso da ausência da pena de morte ou da despenalização da IVG.
A expressão literal da lei, sendo uma expressão de domínio tende a representar
os interesses essenciais do bloco social hegemónico no seio do aparelho de
estado.
No caso da lei fundamental, porque a sua instituição
exige, em regra, consensos muito alargados- o referido bloco social e político hegemónico
– isso promove a utilização de uma fraseologia vaga, pesada, longa, repleta de
remissões para a lei ordinária para gestão conjuntural através do mandarinato e
da burocracia judiciária; ou, é suscetível de interpretações tão mais válidas
consoante o poder de compra do interessado para contratar um escritório de
advogados ou um constitucionalista mediático.
No caso do ordenamento constitucional português, ele
é formado por uma monstruosidade de 295 artigos, que incluem centenas de
alíneas e subalíneas, muitas vezes recheadas de prosa vaga ou redundante. É
evidente que nesse contexto, a sua leitura não é fácil para o cidadão comum e
isso é, precisamente, um dos seus truques implícitos.
Por outro lado, tendo em consideração, a escassa
participação política dos portugueses e a sua enorme despolitização[2], os
governos, por omissão das orientações constitucionais ou mesmo à sua revelia,
usam frequentemente atropelos ao texto constitucional, perante a grita e a
gesticulação da oposição, em regra, ineficaz. Aliás, essa ineficácia serve
também de encerramento e escapatória da oposição para processos e protestos inócuos,
reveladora da sua visão também demasiado estrita e estreita na utilização das
prerrogativas que lhe competiriam.
Para culminar esse bloqueio existe um órgão
denominado Tribunal Constitucional, com juristas nomeados por consenso no seio
do partido-estado que garante assim a tolerância imensa dos juizes perante as
manobras dos governos[3]. Como
está bem de ver, o poder mostra-se magnânimo[4]
Apesar de toda essa arquitetura que favorece o
desrespeito factual da constituição, a mesma já vai na quinta versão (2005) e o
governo nomeado pela Troika pretende avançar com novas alterações para que
Portugal funcione como paraíso fiscal para os capitalistas e um inferno para o
resto da população.
2.2 – O
direito elementar a uma habitação adequada
Após a introdução anterior, observe-se, passo a
passo, o que consta no Artigo 65.º da Constituição, que trata de habitação e
urbanismo;
- “1. Todos têm direito, para si e
para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de
higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade
familiar.”
Para confortar os bancos, procede-se a desalojamentos
de incumpridores de planos prestacionais, facilita-se o procedimento para os
despejos de inquilinos, precisamente numa época de crise profunda, gerando-se
assim o aumento de pessoas sem casa ou a sua partilha com familiares e amigos,
com prejuízo do conforto e da privacidade.
A palavra todos
fica assim escandalosamente negada só faltando aparecer por aí um secretário de
estado a dizer que os sem-abrigo existentes são-no por opção de vida. Não
havendo números precisos sobre os sem-abrigo, eles serão certamente muitos mais
do que os 140 em Almada, 3000 em Lisboa e 2000 no Porto[5], avaliados há pouco tempo, antes do agravar da crise;
e que promete progredir. Mais recentemente[6] a
imprensa referia a existência, na cidade do Porto, de 16000 famílias sem
eletricidade, por não poderem pagar o seu preço e com tendência crescente
reconhecida pelo Ministério da Economia. Haveremos de ver o ministro Álvaro, lá
do fundo da sua idiotia, anunciar que o acréscimo do consumo de velas está a promover
o crescimento e a exportação.
Em contrapartida, há uns anos, a imprensa[7] relatava a prática de todos os executivos da Câmara
de Lisboa entregarem, por rendas simbólicas, casas da autarquia (o maior proprietário
fundiário do país) a amigos, familiares, protegidos dos autarcas e dos seus
partidos, bem como a jornalistas que convinha prestassem bons serviços.
2.3 – Papel do Estado na programação e execução
de uma (não) política de habitação
- “2. Para assegurar o direito à habitação, incumbe ao
Estado:
a) Programar e executar uma política de
habitação inserida em planos de ordenamento geral do território e apoiada em
planos de urbanização que garantam a existência de uma rede adequada de
transportes e de equipamento social;”
Nas últimas décadas e apesar da obrigação
constitucional, o partido-estado entregou ao mercado a satisfação das
necessidades de habitação. Nem sequer procedeu às típicas formas contratuais de
delegar em empresas privadas o cumprimento de responsabilidades públicas. O
partido-estado entregou, sem contrapartidas específicas, nem assunção de
responsabilidades, a uma entidade abstrata – o mercado - a existência (ou não) de
habitações para uma população crescente.
Renunciando a assegurar o direito à habitação, o
Estado e os gangs que o têm ocupado não traçaram nada a que se possa chamar
política de habitação.
Fala-se em planos de ordenamento geral mas o que
sempre houve foi planos municipais de ordenamento. Assim, os vários triângulos pivots nas câmaras – presidente, vereadores
das finanças e do urbanismo – entendem-se com os construtores civis, com os
interesses imobiliários, para urbanizarem e permitirem certas cargas de
construção em terrenos previamente adquiridos como rústicos, valorizados pela
licença camarária. Encomendam um estudo a um consultor que tratará de proceder
ao devido enquadramento, à revelia ou em consonância com os técnicos
camarários. As contrapartidas privadas eram- e serão - repartidas entre os
patrimónios dos intervenientes autárquicos e os respetivos partidos. No
primeiro caso, pode revestir a forma de obras gratuitas nas casas dos mandarins
ou mesmo um andar na urbanização, naturalmente, em nome de um parente.
Porque esse desordenamento atingiu concelhos urbanos
(primeiras habitações, condomínios fechados) e rurais (segundas habitações e
urbanizações turísticas)[8], em toda a parte se vêem casas emparedadas, fechadas
ou arruinadas, centros históricos degradados e desertificados coexistindo com
periferias repletas de novas construções, com ruas estreitas apinhadas de
carros… pois o espaço para arruamentos tem de ser minimizado para que a venda
de lotes e fogos ofereça mais lucros.
Lançaram-se também iniciativas no sentido da
reabilitação, no âmbito das SRU (2004) e dos planos Polis (2000). No primeiro
caso, o objetivo real é o desalojamento de população pobre e envelhecida dos
centros urbanos para que a iniciativa privada, complementada por investimentos
camarários, proceda à revenda dos fogos a membros de classes média e alta, com
pretensões culturais. Como sociedades de capitais públicos contemplam ainda a
assunção de prerrogativas camarárias (como os desalojamentos) e a contratação
de empresas privadas para a intervenção em áreas limitadas das zonas
intervencionadas. No caso do Polis, recorda-se a continuidade de um aborto
urbanístico denominado Costa da Caparica, mesmo depois de serem ali gastos
muitos milhões. A crise financeira limitou estas iniciativas de que já ninguém
fala.
Alguns anos atrás, a parcela da reabilitação nos
países europeus representava 1/3 da construção enquanto em Portugal nunca
chegou aos 14%. O quadro seguinte evidencia a orgia da construção protagonizada
pela aliança entre bancos, sector da construção/imobiliário e poderes
autárquicos, com a benção do partido-estado, satisfeito com o funcionamento do
mercado.
Fonte
primária: Anuário Estatístico 2010
A importância das mafias autárquicas reflete-se na
eleição de Passos Coelho para presidente do PSD, uma vez que a sua eleição foi
conseguida pelo apoio dos numerosos autarcas do partido, contra a opinião de
barões (Marcelo, Cavaco, Ferreira Leite) conscientes das incapacidades da
pileca política para desalojar Sócrates. Uma vez mais a crise e,
particularmente, o fecho da torneira do crédito barato do BCE aos bancos,
facilitou a mudança, colocando o “pote” ao alcance de Passos.
Como criação dos interesses autárquicos do PSD,
Passos, em contrapartida, perante a pressão da Troika para um reordenamento da
estrutura administrativa autárquica, ofereceu a fusão de freguesias, com
escasso peso nas contas públicas (0.1% em 2013), deixando intocável a estrutura
municipal, para não molestar a clientela partidária, com o aplauso natural do
PS, com interesses muito semelhantes.
Esta rede de interesses partidários que se sobrepõe a
qualquer gestão autárquica decente contudo, não é privilégio do PSD. O
desordenamento urbanístico, a construção em regime de rédea solta e a quase ausência
de reabilitação varrem a generalidade dos municípios, independentemente do
descolorido da bandeira partidária. O que determina a importância desse
fenómeno é a diferença de “competitividade” para a atração do investimento,
diversa, se se trata de um pequeno e desertificado concelho do interior ou
outro, das áreas metropolitanas ou com frente de mar.
O peso de toda essa maquinaria fiscal, burocrática e
de faces ocultas não tem um preço dispiciendo. No momento da compra de uma
habitação, uma família sabe que vai ser onerada por dezenas de anos com a
prestação do empréstimo e que deixará aos herdeiros também o IMI; e, logo ali,
para além das escrituras, pagará o IMT. No preço de venda da habitação está
incluida a especulação dos vários intervenientes, 15% correspondente à
burocracia camarária e uma carga fiscal diversificada (IVA maioritariamente)
inerente à construção, num total da ordem dos 25%, de acordo com a AICE -
Associação dos Industriais da Construção de Edifícios [9].
Não sendo o capitalismo um sistema organizado,
racional, geram-se, para além do conflito essencial e mais geral
trabalho/capital, divergências de interesses entre os vários grupos e
atividades e, é evidente que cada associação patronal defende zelosamente pelos
seus específicos interesses. Assim, a AICE defende isenções de IMI e IMT, como
a dedução em IRS dos juros pagos na compra de uma casa para arrendar; sempre,
naturalmente apelando ao apoio do Estado[10].
Mais espantosa é a recorrente e despudorada reivindicação da Associação Portuguesa
de Hotelaria, Restauração e Turismo (APHORT)[11] ao clamar pela dedução em IRS das despesas de
alojamento e refeições gastas em férias… embora isso seja a prática dos
“empresários”, que colocam as faturas nas contas das empresas.
Uma política de habitação não pode estar desligada da
existência de uma rede de transportes, de equipamentos sociais, de serviços de saúde,
educativos, de justiça, todos eles sob responsabilidade pública por
representarem a satisfação de necessidades essenciais, comuns a todos; e não
equiparados a serviços de cabeleireiro ou à produção de batatas fritas.
Uma premissa incumprida contida na lei fundamental prende-se
com a rede de transportes. Quando existe um real planeamento urbanístico,
constroem-se primeiro as vias de comunicação, estuda-se a rede de transportes
públicos, mormente pesados, desenhando-se a partir daí as áreas urbanizadas, as
áreas de habitação, de comércio, de serviços sociais, etc. O que prolifera é a
cessação de transportes públicos em muitas áreas, sobretudo nas mais pobres ou
desertificadas, para as quais as garantias de transporte público se restringem
ao táxi. Nas grandes áreas urbanas observa-se a barafunda dos cartões, dos
passes, da falta de ligações multimodais e de estacionamento, da proliferação de
empresas rodoviárias de vão de escada, sobrando a confusa e cara utilização da
bilhética e umas coisas chamadas Autoridades Metropolitanas de Transportes de
Lisboa e Porto cuja ação ninguém conhece.
Por seu turno, a construção do Metro Sul do Tejo, de
superfície, fez-se à custa da segurança da circulação pedonal em Almada e a
câmara de Oeiras, de um eterno apresentador de recursos judiciais chamado
Isaltino, inventou o SATU- um veículo monocarril que funciona quase sem
passageiros - em parceria com a Teixeira
Duarte.
O texto constitucional refere ainda a garantia de uma
rede adequada de equipamentos sociais. Porém, também aqui o partido-estado
incumpriu, levando a cabo um cuidado plano de abandono de infraestruturas
(escolas) ou da transferência de responsabilidades públicas para operadores
privados (saúde), não por acaso, pertencentes aos bancos. Tomamos aqui os
exemplos da educação e da saúde, não detalhando outras áreas, embora não deva
ser esquecida a ação do escuteiro Mota Soares, a “reforma estrutural” que
consiste em transferir a ação social para entidades privadas (na sua larga
maioria ligadas à Igreja Católica) ocultando que o financiamento continuará a ser
público!
No caso das escolas do 1º ciclo, foram encerradas
2500 durante o consulado de Lurdes Rodrigues (2005/2009) que, entretanto havia
determinado o fecho das escolas com menos de dez alunos. Em 2010 fecharam mais
701 porque foi decretado o alargamento do fecho a escolas com menos de 21
crianças: e, para 2012, Crato apontava o fecho de mais 297[12], no seguimento do anunciado pela sua antecessora, em
março de 2011[13].
O texto constitucional existente, para os mandarins,
no seio do partido-estado é papel de embrulho, sempre que se trata de causar prejuizos
para a multidão, de transferir rendimento ou desvalorizar património público a
favor do “empreendorismo” privado. Uma reportagem recente[14] evidencia a grande unidade no seio do partido-estado
e, enuncia como nasce o espírito empreendedor e a adrenalina do risco no
empresariato[15].
Em resumo, para o ano letivo de 2005/06 o número de
escolas do 1º Ciclo disponível era de 6050 que, cinco anos depois estavam
reduzidas a 2569[16], não se incluindo, naturalmente, as malfeitorias do
iluminado Crato, como acima se referiu.
No capítulo dos mais notórios equipamentos de saúde –
os hospitais – a evolução no periodo 1990/2009 revela a sua redução em 22.5%.
Porém, enquanto os número de hospitais públicos de reduz 40.7%, os privados,
depois de alguma estagnação, parece tornarem-se atrativos para o sistema
financeiro que vem construindo as mais recentes unidades, no âmbito daquelas
fórmulas engenhosas de ausência de riscos empresariais, uma vez que por detrás
está o erário público para garantir a rendabilidade do negócio privado.
Fonte
primária: Anuário Estatístico 2010
Os centros de saúde e as suas extensões constituem a
rede capilar, de proximidade, de acesso a cuidados de saúde, para toda a
população, para efeitos de prevenção, diagnóstico, medicina familiar,
enfermagem… ainda que nunca tenham funcionado com todas as suas valências,
nomeadamente, consultas de especialidade ou as vulgares análises de sangue e
urina. Sabe-se que estas foram deslocalizadas para a medicina privada e centros
de enfermagem, naturalmente com financiamento público através do SNS, da ADSE,
etc.
As extensões de saúde, 1962 em 2000 ainda eram 1930
em 2005. Porém a partir daí, a ala menos à direita do partido-estado (o PS)
iniciou um assalto frontal ao SNS iniciado com aquele tipo de metástase
denominado Correia de Campos, célebre pela sua sanha contra as maternidades,
atualmente em estágio de esquecimento no Parlamento Europeu. Em 2009 já eram
apenas 1318, refletindo uma quebra de 644 unidades em nove anos, para
satisfazer uma população crescente, mais velha e mais pobre.
2.4 – O nulo papel das autarquias na construção
de habitação social ou económica
- “2. Para assegurar o direito à habitação, incumbe ao Estado:
b) Promover, em colaboração com as regiões autónomas e com as autarquias
locais, a construção de habitações económicas e sociais;”
O censo realizado
em 2011 oferece indicadores atualizados sobre os resultados do cumprimento da
promoção constitucional de habitações económicas e sociais por parte do
partido-estado, no poder, sem interrupção, desde 1980. Num total nacional de
787 mil casas arrendadas, são referenciadas 64651 com renda social ou apoiada,
não se relevando o que sejam habitações económicas.
De facto, o
partido-estado, nem sequer quis imitar os seus salazarentos antecessores que
souberam criar a Encarnação, Olivais ou o Alvito, no caso de Lisboa, ao mesmo
tempo que, congelando as rendas, contribuiam, nas cidades para a vigência de salários baixos, típicos do regime fascista,
como do atual; e isso, em detrimento dos proprietários rentistas que, só
recentemente encontraram “compreensão” por parte do poder, que se tem colocado,
por sistema, contra os inquilinos.
O mesmo PSD/PS recusou-se a apostar na habitação
económica como objeto de aplicação financeira dos recursos da Segurança Social o
que tenderia a sustar a alta dos preços do “mercado” e a evitar a quase
obrigatoriedade do recurso à compra de habitação, por muitas das pessoas de
rendimentos demasiado baixos ou, vulneráveis a situações de desemprego, como se
está a assistir.
O regime ceptocrático vigente preferiu aplicar os
excedentes da Segurança Social nos mercados financeiros, na compra de títulos
de dívida pública que as empresas de “rating” consideram lixo. Para qualquer
gestor financeiro profissional isso seria impensável uma vez que o seu objetivo
é, naturalmente, a rendabilidade, sem descurar o risco. Mas, como se trata de
dinheiro dos trabalhadores portugueses…
Isso – e muitas outras formas de descapitalização da
Segurança Social[17]- tem sido
possível porque a descapitalização da instituição faz parte da política global que
o capital financeiro encarrega o partido-estado de cumprir, gradual e
sistematicamente. Isso, com o aval silencioso da esquerda institucional- não
sabemos se por ignorância ou se, devido ao seu inveterado estatismo – que nem
consegue admitir que a Segurança Social não deve amalgamar as suas contas com o
Estado central, regional ou local.
As barracas, que caraterizaram a periferia interior de
Lisboa, durante décadas, foram reduzidas na sua expressão, talvez não tanto por
razões de política social mas, porque os terrenos em que se encontravam eram
cobiçados pelos empreendedores imobiliários com influência dentro do
partido-estado ou de Abecasis, do CDS. A Picheleira passou a chamar-se Olaias e
a Musgueira deu origem à Quinta do Lambert, pois não se podia imaginar vender
andares em locais com nomes de baixa reputação, pouco dignos de morada para
gente da pretensa classe média. As pessoas foram empurradas para guetos, como
Chelas, Brandoa, Pedreira dos Húngaros, Quinta de Santa Filomena, Quinta da
Fonte Santa[18]
e outros, cujos nomes não se encontram facilmente na toponímia da cidade
ou nos destinos fixados nos autocarros. Note-se a separação entre esses dois
mundos que é particularmente visível na barreira que a linha férrea estabelece entre
Olivais e o Parque das Nações, como que a preparar a freguesia do Oriente,
limpa de gente pobre.
As barracas, como fruto da estratégia de
empobrecimento coletivo a que se assiste, voltam a aumentar a sua presença em
Lisboa, mormente em Marvila, Ajuda e Olivais. Constituem uma das faces mais
negras dos efeitos do memorando da Troika. O censo de 2011 refere, para todo o
país, a existência (ainda) de 77000 habitações sem casa de banho, 18000 sem
escoamento de resíduos líquidos e 23600 sem água canalizada; em 2021,
certamente que esta nódoa sobressairá ainda mais nos fatos de bom corte que
caraterizam os mandarins.
Em meados de 2012, a Câmara de Lisboa detinha 24327 fogos,
em muitos casos num estado deplorável de conservação e conforto, Daquele total,
estão arrendados 23356 e, entre estes, um terço paga uma renda técnica que em
média se cifra em € 340, pressupondo-se que cerca de perto de 16000 estejam
afetos a um arrendamento social ou de renda apoiada, cujos valores são da ordem
dos € 74 e € 57, respetivamente[19],
sabendo-se ainda de um significativo número de situações em que há
rendas em atraso. Que a Câmara de Lisboa não tem capacidade para resolver a
procura de habitação social nota-se quando se sabe existirem, em outubro último,
3000 pedidos para habitação social[20]
Pouco empenhada em termos de reabilitação urbana, de
habitação económica ou social, a autarquia lisboeta mostrou-se muito mais lesta
em promover o imobiliário para classes médias e superiores, como no Parque das
Nações e na Alta de Lisboa.
Se isto se passa na autarquia mais rica do país – com
cerca da 15% do total das receitas fiscais autárquicas- e onde se encontra mais
de um terço das casas com renda apoiada ou social, não é difícil admitir que o
Estado, em todas as suas vertentes – central, regional ou local – se manteve
distanciado da construção ou disponibilização de habitação com renda económica.
O comprometimento das autarquias com a expansão do
imobiliário e com as transações do mesmo é evidente com o ordenamento fiscal
criado em 1989 por Cavaco e pelo seu ministro das finanças Cadilhe, que se
baseou na ligação direta entre aquelas realidades e as receitas fiscais
autárquicas. À criação da contribuição autárquica, da sisa e do imposto
municipal de veículos sucede-se, em sua substituição, pela mão de Ferreira
Leite, em 2004, o imposto municipal sobre imóveis (IMI), o imposto municipal
sobre as transações imobiliárias (IMT) e, mais recentemente, o imposto único de
circulação (IUC).
Já atrás referimos que a simbiose entre os
“empresários” do imobiliário e as autarquias tem uma face oculta, constituída,
por um lado, pela lavagem de dinheiros obtidos na corrupção, em tráficos
diversos ou, na fuga/fraude fiscal; e, por outro, pelo interesse das câmaras em
financiar os seus projetos e, em muitos casos o financiamento de autarcas e dos
seus partidos. Assumindo a continuidade do carrossel imobiliário, as câmaras
procederam a investimentos, crentes na continuidade da evolução das receitas
fiscais das autarquias, no saque sem fim do bolso dos seus munícipes e no
crédito fácil obtido junto dos bancos.
Tomando como base o ano de 2003, pode observar-se
como o poder autárquico soube onerar a multidão com impostos. Enquanto o PIB e
o volume dos rendimentos do trabalho cresceram pouco mais de 20% no periodo
2003/10, o conjunto das receitas fiscais autárquicas alçou-se a um crescimento
de 29.6%, sob o impulso da evolução do IMI e do IMV. Por seu turno, o IMT
decresce acentuadamente a partir de 2008 evidenciando o fim da euforia
imobiliária; e a derrama, cobrada em função dos resultados das empresas, em
alguns municípios, termina o período com um montante de cobrança equivalente ao
de 2003.
Todas as câmaras
|
|||||||
PIB
|
Rend. trabalho
|
Rec fiscais autárquicas
|
IMI
|
IMT
|
IMV
|
Derrama
|
|
2003
|
100
|
100
|
100
|
100
|
100
|
100
|
100
|
2004
|
104,1
|
103,4
|
112,3
|
90,8
|
77,0
|
106,8
|
140,6
|
2005
|
107,5
|
108,6
|
118,6
|
106,0
|
98,5
|
119,7
|
106,3
|
2006
|
112,1
|
111,9
|
123,1
|
122,9
|
109,4
|
122,3
|
103,3
|
2007
|
118,0
|
116,3
|
142,7
|
138,9
|
147,7
|
127,5
|
113,6
|
2008
|
119,9
|
120,3
|
139,5
|
158,6
|
133,0
|
130,5
|
92,9
|
2009
|
117,4
|
120,6
|
131,8
|
153,2
|
105,4
|
150,2
|
118,6
|
2010
|
120,4
|
121,8
|
129,6
|
159,5
|
101,7
|
158,9
|
99,2
|
Fontes
primárias: DGAL e OTOC
|
Visto de outro modo, através do peso do IMI, do IMT e
dos restos dos impostos que vieram substituir (contribuição autárquica e sisa)
nas receitas fiscais do conjunto das autarquias, pode analisar-se a dependência
das mesmas face à política de imobiliário, forma com que o mandarinato
adulterou o que deveria ter sido uma política de habitação.
Os impostos autárquicos não têm sido utilizados na
concretização de qualquer política de habitação, muito menos económica ou
social mas, essencialmente numa burocracia imensa, na adjudicação de serviços
externos, tal como acontece na administração central. Há ainda a considerar impostos
indiretos e taxas cuja maior incidência recai sobre loteamentos e obras (que na
periferia de Lisboa podem equivaler à receita de IMT) e o produto de vendas de
bens e serviços correntes como seja o de fornecimento de água, aluguer de
espaços, saneamento, resíduos sólidos, quando não são fornecidos por empresas
municipais ou privadas, com funções, reputação ou desempenho discutíveis.
Assim sendo, as pessoas que compraram casa e arcam
com o IMI, que pagaram o IMT, para além do IUC anual, são sobrecarregadas com
impostos e castigadas, sem terem beneficiado de uma política pública de
habitação, por serem vítimas de uma política de satisfação dos intervenientes
no mercado imobiliário que têm vindo a constituir a trave mestra da política em
Portugal. E, à sombra da Troika, a multidão vai ver ainda o seu empobrecimento
agravado para os próximos anos, neste capítulo, para alimentar o partido-estado
e a sua clientela que, dada a estagnação ou retrocesso do IMT que onera as
reduzidas transações de imóveis, procura compensar-se à custa da subida do IMI.
Concretizando melhor. Tendo em consideração essa
estagnação, a Troika (5ª atualização do memorando, com data de 14 de outubro e
ainda não traduzida para conhecimento público) inclui, para o terceiro
trimestre de 2013, um aumento da carga fiscal incidente no IMI, em detrimento
do IMT, considerando, numa atitude tocante, uma especial atenção para os …
“socialmente vulneráveis”. Mais recentemente e no âmbito da nova lei das
Finanças Locais, o governo promete para Janeiro de 2016 a extinção do IMT, após
gradual aumento do IMI até 2015[21]. A Troika e o
seu mordomo Gaspar, têm sempre surpresas desagradáveis à espreita.
Para os que vêm sendo expropriados das suas casas em
benefício dos bancos credores, mais
aqueles que nunca poderão comprar casa e se vêem submetidos a uma lei do
arrendamento que trata os inquilinos como indiciados criminosos e ainda os que terão de se refugiar nos novos
bairros de barracas, há uma boa notícia; … escaparão ao pagamento do IMI, por
especial deferência dos administradores coloniais.
2.5 – Os
estímulos públicos à construção privada e o acesso a habitação
·
“2. Para assegurar o direito à
habitação, incumbe ao Estado:
c) Estimular a construção privada, com
subordinação ao interesse geral, e o acesso à habitação própria ou arrendada;”
Este preceito constitucional tem sido cumprido
digamos que … com excesso de zelo no que respeita ao estímulo da construção
privada. Em contrapartida, não tem havido construção pública e, muito menos, de
conteúdo económico ou social, como se disse atrás.
Subordinação é o que tem havido, sem dúvida, ao
interesse privado, à rede mafiosa que une o mandarinato aos interesses do
imobiliário e à banca. Aliás, a maneira rápida e profunda como se têm agravado
os desequilíbrios litoral/interior, ou o modo como a atividade económica e a
habitação se têm concentrado na faixa Viana do Castelo/Setúbal, a que se deve
somar o Algarve e a Madeira, não permitem que se possa afirmar qualquer lógica
de primado pelo interesse coletivo, de desenvolvimento ordenado e sustentado.
Essa subordinação, não ao interesse geral mas ao
privado, pode também observar-se na suburbanização das manchas urbanas, com
abandono dos seus centros, transformados em locais onde se acumulam empresas de
serviços, sedes de instituições financeiras e o comércio de luxo; em paralelo,
a poucos quarteirões de diferença, situam-se bairros degradados, prédios
emparedados ou abandonados, quando não em ruina. As cidades portuguesas tendem
a ser, do ponto de vista da habitação, duais; por um lado, a construção nova,
dos últimos vinte anos e uma outra, distanciada geograficamente, degradada.
Finalmente, existe uma política de privatização dos
solos que favorece o pousio especulativo dos terrenos, por tempo indefinido e,
sem qualquer penalização; uma política que não incentiva minimamente a ocupação
ou reabilitação dos prédios desabitados ou degradados, e que recusa exercer o
direito camarário de expropriação mediante um plano simples de reutilização
desses espaços. No casco mais antigo ou degradado das cidades, qualquer projeto
da sacrossanta iniciativa privada visa apenas o aumento da área de utilização
ou a reconversão, digamos, de uma habitação numa área comercial. Como exemplo, refira-se
a abundância de fachadas de prédios que ocultam terrenos de construção urbana
transformados em parques de estacionamento, à espera que o mercado torne
apetecível a sua re-transformação em imóvel.
Também não se pode dizer que o preceito
constitucional não foi cumprido no capítulo do estímulo à habitação própria.
Foi, não como produto de uma política de habitação ou sequer de alargamento de
uma classe média de pequenos proprietários mas, como forma de drenar o
imobiliário- previamente encarecido pela especulação e pelo financiamento
partidário - a famílias necessitadas de uma casa para habitar. De outro modo, esse
estímulo fez-se na sequência das necessidades de escoamento de uma mercadoria
produzida pelos interesses privados com predomínio no poder político e, só
acessoriamente, visando satisfazer uma necessidade coletiva, no capítulo de uma
política de habitação subsidiária.
O texto constitucional veio a coincidir –
ocasionalmente, porque o mandarinato pouca preocupação tem com o cumprimento da
Constituição – com os interesses da rede mafiosa não se tendo curado de avaliar
o grau de endividamento das famílias, a taxa de esforço para a aquisição de
casa própria, sobretudo quando o preço era fortemente onerado com a
especulação, as comissões partidárias, a burocracia autárquica e, sabendo-se
das fragilidades produtivas da economia portuguesa, muito dependente de uma
Europa em fase de esgotamento do modelo de organização política e económica.
Para as famílias serem aliciadas para a compra, o
Estado estabeleceu bonificações de juros para o crédito à habitação e deduções
em sede de IRS que, veio a anular, anos
atrás, no caso das primeiras e tornando as segundas, já no governo
Gaspar/Passos, meramente residuais. Os bancos, naturalmente agradeciam esse
financiamento público que incentivava o seu negócio e que faria, aliás, parte
do seu caderno reivindicativo apresentado junto do governo que as introduziu;
uma vez o negócio concluído pouco importa aos bancos a existência ou não de
bonificações e deduções.
Ao fim de poucos anos, os interesses imobiliários e a
banca descobriram um novo filão, que havia uma faixa da população com
rendimento e apetência para se comprometerem com empréstimos para terem um
apartamento junto à praia ou uma casa de campo algures. Com a proliferação de
autoestradas tudo facilitava o seu acesso.
Já em 2008 o responsável do InCI, I.P- Instituto da
Construção e do Imobiliário referia que “foram construídas e postas à venda
mais 70 mil casas do que o bom senso aconselhava” e que a construção de
condomínios nem sempre correspondia a edifícios de alta qualidade; dizia ainda
que “atingimos números impensáveis: 120 mil habitações por ano, quando
deveríamos estar nas 50 mil" e que "a banca e as seguradoras (que
também têm financiamentos) têm uma responsabilidade efectiva na situação e os
governos também".[22] A crise estava à vista e anunciada.
Comecemos por observar as diferenças entre as
variações da população e das residências habituais, de acordo com os elementos
fornecidos pelos censos. É verificável a correspondência na década de 70 entre
o acréscimo populacional – chegada dos retornados – e o aumento das habitações,
dinâmica essa também associada à desmobilização dos soldados, com o fim da
guerra colonial, ao aumento do poder de compra e a mudanças nos comportamentos.
Nas décadas seguintes surgiram novas modificações estruturais na composição dos
agregados familiares – menos filhos e mais gente a viver só – e a chegada de
500000 imigrantes. Em 1970 havia 3.8 pessoas por residência, decrescendo nos
decénios seguintes até atingir 2.7 pessoas em 2011. Outros indicadores revelam
que em 2011 o número de alojamentos superava em 45% o número de famílias
(contra 16% em 1981), isto é, mais 1.8 M de casas.
A questão não é as residências habituais, a sua
melhoria relativa nas últimas décadas, caso contrário estaríamos a aceitar levianamente
a lógica do “vivemos acima das nossas possibilidades”.
As questões reais são outras. Uma, é a forma de
acesso a habitação própria, que, na ausência de uma política de habitação,
conduziu a um forte endividamento das famílias. A segunda é a euforia das
segundas habitações e, a terceira é a existência de um volume enorme de casas
vagas, sem utilização.
Uma vez que já falámos acima e anteriormente[23] sobre a questão
do endividamento, passamos à questão das segundas habitações, embora se saiba
que, em muitos casos, há casas de aldeia herdadas de pais ou avós, para além
daquelas que por aí se vêem arruinadas ou abandonadas. Os governos, por ordem
do sistema financeiro que os domina, abandonando qualquer vestígio de política
de habitação também não trataram de medir os impactos urbanísticos e
paisagísticos dos muitos empreendimentos com apartamentos vocacionados para
segundas habitações e, menos ainda, de avaliar os efeitos de uma crise que
haveria de chegar e, a que estamos assistindo, com efeitos arrasadores.
Facilitando, ou não tendo atitudes cautelares sobre o impacto de uma supérflua
segunda habitação e do correspondente endividamento sobre os orçamentos
familiares, foi o partido-estado que fomentou “vidas acima das suas próprias
possibilidades”.
O quadro seguinte mostra que em quarenta anos se
passou de 8.8 casas secundárias por 1000 habitantes para mais de uma por cada
dez pessoas em 2011, o que representa
uma evolução meteórica. Se se juntarem as casas vagas a estas habitações
secundárias, com uma parca ou pontual utilização, conclui-se que 31.9% do total
dos alojamentos não têm uma utilização continuada. Nada mais contrastante com
esse facto, é o de se saber que 11% das residências habituais se consideram
como sobrelotadas.
Casas/1000
hab
|
||
Secundárias
|
Residências
Habituais
|
|
1970
|
8,8
|
261,6
|
1981
|
18,7
|
281,6
|
1991
|
38,3
|
309,7
|
2001
|
89,3
|
342,9
|
2011
|
107,3
|
377,9
|
A terceira situação, revela-se nos 735,1 mil
alojamentos familiares clássicos vagos em 2011 (12.6% do total), uma proporção
que vai crescendo e parece querer voltar aos valores de 1970 – 13.8% (374 mil
casas)- e das quais, metade é de construção recente, posterior a 2001, inserida
na orgia imobiliária dos últimos anos.
Nesse total, o volume de casas para venda passa de
uns residuais 12.3 mil, em 1970, correspondentes a um tempo em que a habitação
própria não era a regra, para 164.7 milhares em 2011, com um aumento de quase
60 mil relativamente a dez anos antes. Refira-se que as casas para venda estariam
longe de satisfazer as necessidades de quem vive em mais de 400000 residências
habituais com sobrelotação. Uma vez mais se verifica a incapacidade dos
mecanismos de mercado para resolver problemas sociais, com o desconforto daí
decorrente para muitos milhares de pessoas e a inutilidade dos capitais investidos
em alojamentos sem procura efetiva.
No que se refere aos fogos para aluguer, o volume
recente (110.2 mil) aproxima-se do registado em 1970. Esse número depois de ter
atingido um mínimo de 43 mil no censo de
1981 cresce ligeiramente uma década depois e mais rapidamente em 2001 quando já
se cifrava em 80 mil casas disponíveis. Existe certamente um volume
considerável de pessoas, nomeadamente quem vive em casas sobrelotadas e outras
que gostariam de ter mais conforto, para as quais o recurso ao arrendamento não
é viável, tal como não é compaginável a compra de casa.
Em 2011, havia umas 275 mil habitações disponíveis
para venda ou arrendamento e, portanto, tendo proprietários que os desejam
colocar sem encontrarem essa oportunidade. Dez anos antes eram 185.5 milhares,
revelando esta evolução, uma vez mais a incapacidades do mercado como forma de
resolver algo tão elementar como estabelecer uma relação numérica próxima entre
o volume de casas existentes e os agregados familiares. Se há procura, perante
tanta oferta, seria natural uma queda dos preços, quer de venda como do aluguer,
o que não acontece em Portugal mas, que se verifica em Espanha ou na Irlanda.
Por outro lado, a precarização da vida e os baixos salários impedem as pessoas,
mormente os jovens, de encontrar casa para viver.
Mantém-se nos últimos vinte anos um conjunto de
habitações vagas por motivos distintos da intenção de venda ou aluguer, na
ordem dos 7 a 8% do total dos alojamentos familiares (460,1 mil casas em 2011).
O seu volume teve uma baixa acentuada durante a década de 70 pelas razões
demográficas já referidas e reduziram este tipo residual de habitações vagas a
uns 3.3% do total, em 1981. Como se costuma dizer, tanta gente sem casa e tanta
casa sem gente.
O estímulo constitucional ao acesso a casa arrendada
processa-se em condições expressas no Novo Regime do Arrendamento Urbano, que
entrou em vigor a 12 de novembro último. Aí se consubstancia que o direito à
habitação é reduzido a uma relação mercantil entre senhorios e inquilinos, tal
como se em regra, se aponta que o direito ao trabalho se reduz a um contrato entre
patrões e assalariados, individualmente considerados. Subjaz a esta filosofia
uma escandalosamente falsa ideia de que nesses contratos há igualdade de poder entre
as partes, que ambas estão numa mesma situação de necessidade e de urgência.
Assim, direitos constitucionais essenciais cujo cumprimento é entregue para o
livre jogo das forças de mercado, vêem este reforçado, quer pela legislação,
quer pela intervenção do poder coercivo do Estado, quer pelo fomento da ideia
segregacionista de que inquilinos ou trabalhadores tendem a ser malandros. O
partido-estado renuncia, de facto, a considerar a habitação como um direito
universal, torna-o submetido a leis mercantis, conduzindo o Estado para uma
posição de repressor e falso regulador, sempre que necessário. Nesse âmbito há
uma atualização especial para rendas inferiores a 1990 (250000 famílias) cujo
impacto será reduzido para quem demonstrar ser indigente.
Nada de novo, uma vez que esse menosprezo, esse
pendor agressivo face a inquilinos, trabalhadores, desempregados ou reformados
e pobres em geral, faz parte do figurino ideológico neoliberal que se pretende
incutir como fazendo parte do senso comum, para manter a multidão submisssa e
tolerante com a ordem “natural” das coisas.
E para melhor isso se demonstrar, no caso do
arrendamento, está como peça central o estabelecimento legal, como regra, de um
mecanismo especial de actualização de rendas que se torna mais benévolo para
quem tiver mais de 65 anos. O mesmo
Estado que cria o mecanismo de atualização para as rendas é o mesmo que
criminaliza referências a atualização de salários ou pensões; e que recusa
instintivamente qualquer atualização para trabalhadores e pensionistas. O
argumento de que é preciso acudir ao pagamento da dívida de acordo com o
memorando da Troika… “todos temos de nos sacrificar” … obriga trabalhadores e
pensionistas mas, isenta rentistas.
Porém, atenção. É adoptado um esquema de atualização
automática mas, “democrático” pois o inquilino tem de ser notificado, pode apresentar
contraproposta ao senhorio, havendo mais uns daqueles detalhes processuais com
que a legislação portuguesa nos enreda para salvar as aparências, para esconder
de que a lei defende essencialmente os rendimentos dos lucros, dos juros ou das
rendas, em detrimento dos do trabalho.
Se um inquilino cair no desemprego, não existe nenhum
mecanismo de salvaguarda ao exercício do direito à habitação porque, no âmbito
de uma relação mercantil, a garantia daquele direito não compete ao senhorio.
Pode o inquilino recorrer a apoios sociais mas, nada o livra do despejo se
aquele não for concedido; e, para mais, terá de pagar as rendas em atraso e os
respetivos juros de mora. Para que a relação mercantil se exerça na sua
plenitude, para que os interesses do senhorio sejam garantidos com presteza foi previsto, até final de 2012, um Balcão
Nacional do Arrendamento para agilizar a execução dos despejos.
Toda a política de endividamento forçado promove um
encargo mensal médio de €400 com a prestação ao banco a que se deve juntar o
célebre IMI. Se se considerar uma família – casal empregado com a média (geral)
de € 1600 de rendimento bruto- a consideração da quotização para a segurança
social (€ 176) e a retenção do IRS para 2013 vai reduzir aquele valor a uns € 968,
onde o banco retém, regularmente os referidos € 400 mensais. Sobram, portanto €
568 que terão de ser suficientes para alimentação, pagamento da eletricidade,
gás e água- onde também os aumentos irão acontecer em breve- bem como os
transportes, o IMI, eventualmente aumentado, sem esquecer o impacto dos cortes
do Gaspar; e isso, admitindo não haver crianças, idosos a cargo, nem veículo
próprio. Claro, que estamos a considerar
uma família vivendo “acima das suas possibilidades” e, coisa que vai rareando,
sem desemprego à mesa do jantar.
2.6- O papel do sector não mercantil na questão
da habitação
·
“2. Para assegurar o direito à
habitação, incumbe ao Estado:
d) Incentivar e apoiar as iniciativas das
comunidades locais e das populações, tendentes a resolver os respectivos
problemas habitacionais e a fomentar a criação de cooperativas de habitação e a
autoconstrução”
No seguimento da descompressão social e política
incluída na continuidade do 25 de Abril, registaram-se, no capítulo da
habitação, vários movimentos populares.
Um, foi o de ocupação de casas vazias, com reflexos
na redução dos fogos nessas condições, em 1981 (190 mil), número correspondente
a metade do observado dez anos antes e de que o caso mais notório talvez seja o
da enorme urbanização em Almada, hoje conhecida por Pica-Pau Amarelo.
O outro, com uma continuidade enquadrada depois da
“normalização” de novembro de 1975, refere-se às cooperativas de habitação. No
final do fascismo havia 40 cooperativas de habitação num total de 950; em 1995,
eram 447 em 2949, que chegam a 565 num total de 3121[24] em 2002,
mostrando algum interesse pelo cooperativismo por parte do governo Guterres,
depois de dez anos de hostilidade cavaquista. Em 2009, já só havia 395 cooperativas
de habitação e construção num universo de 2390 [25]. Porém, por essa
época, o sítio da FENACHE, federação do setor referia abranger 72 das “cerca de
100 cooperativas de habitação com actividade de promoção regular”.
De acordo com Guilherme Vilaverde, da direcção da
FENACHE “não estando o Estado, ao nível central e local, na presente
conjuntura, em condições de apoiar financeiramente os promotores sociais e as
famílias carenciadas na promoção e aquisição das habitações que até aqui temos
produzido, assistimos hoje e vamos observar cada vez mais nos próximos anos a
uma redução substancial, se não mesmo uma quase estagnação, da actividade…”[26]. Curiosamente, o
governo declarara 2008 “o ano das Cooperativas de Habitação”… revelando, sem
dúvida, alguma descoordenação dos serviços socratóides de propaganda.
Assim sendo, estará perto da estagnação, o número de
160 mil habitações e de 600 mil beneficiários do cooperativismo de habitação
referido em 2008 no sítio da FENACHE. Há, visivelmente, um abandono de qualquer
apoio ou incentivo a esse setor, que se não insere totalmente na lógica
mercantil que se pretende expandir ad infinitum
e ad eternum.
2.7- Promoção
de encargos com a habitação compatíveis com o rendimento
·
“3. O Estado adoptará uma política
tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o rendimento familiar
e de acesso à habitação própria”
A extensão leviana do endividamento para a compra de
casa, em paralelo com a existência de preços do aluguer pouco atraentes, tem
visado, como se disse atrás, servir os interesses imobiliários, dos bancos e do
mandarinato autárquico. E por isso a constitucional compatibilidade não se
verificou, de modo algum, apesar da relativa estagnação da dívida média das
família aos bancos, entre € 48000 e € 49000, nos ultimos anos[27], quando
começaram as dificuldades da banca, a subida do desemprego e as medidas para
sanear as contas do Estado, com o aumento do IVA e os pacotes PEC.
Dívida média dos
particulares (€)
Habitação
|
Outros
fins
|
|
03-2009
|
48513
|
8862
|
12-2009
|
48850
|
8902
|
12-2010
|
48898
|
8724
|
12-2011
|
48542
|
8138
|
06-2012
|
48356
|
7812
|
Fonte primária: Banco de Portugal
Mais claramente as coisas se tornam visíveis quando
se observa que, entre 1979 e 2011, os rendimentos do trabalho cresceram apenas
24.7 vezes e a dívida para a compra de habitação 389.5 vezes[28].
Crescimento da dívida dos
particulares (1979=100)
Total
|
Habitação
|
Outros fins
|
|
1986
|
8.5 vezes
|
10.4 vezes
|
5.1 vezes
|
1998
|
100.9 vezes
|
113.0 vezes
|
78.3 vezes
|
2001
|
172.2 vezes
|
199.9 vezes
|
120.7 vezes
|
2011
|
310.8 vezes
|
389.5 vezes
|
164.2 vezes
|
Fonte primária: Banco
de Portugal
Essa disparidade entre o crescimento da dívida e o
dos rendimentos do trabalho mostrou-se absolutamente compatível aos olhos dos
patibulares membros do partido-estado, no poder durante todos esses anos.
Deixaram o “mercado” funcionar livremente, não intervindo como fez Cavaco, em
1987 provocou a queda da bolsa alertando “que se estava a vender gato por
lebre”; e compreende-se essa diferença de comportamente pois então, o aviso
destinava-se a “investidores” enquanto o endividamento bancário das famílias se
prende com a canalha. Aparentemente, ninguém terá feito a sua leitura à luz da
compatibilidade imposta pela Constituição, nem sequer a plateia de encartados
constitucionalistas, sempre prontos a arrotar, com posturas de infalibilidade
todas as opiniões possiveis sobre qualquer assunto constitucional.
2.8- Política de ocupação mercantil do solo
·
“4. O Estado, as regiões autónomas e as
autarquias locais definem as regras de ocupação, uso e transformação dos solos
urbanos, designadamente através de instrumentos de planeamento, no quadro das
leis respeitantes ao ordenamento do território e ao urbanismo, e procedem às
expropriações dos solos que se revelem necessárias à satisfação de fins de
utilidade pública urbanística.”
Como temos vindo a referir, na prática, cada mandarim
autárquico rege o seu quintal em alegre confraternização com os interesses
imobiliários da zona, no capítulo da habitação ou dos imóveis para comércio e
serviços, sendo particularmente apetecíveis as “superfícies comerciais”, isto é
centros comerciais e supermercados.
Há, porém, projetos de gabarito tal que são decididos
por instâncias governamentais, como os célebres PIN- Projectos de Interesse
Nacional, que foram uma das primeiras preocupações de Sócrates. Tomou posse em
março de 2005 e, dois meses depois, já o seu governo e o ministro Manuel Pinho
(do BES) aprovavam os PIN, em nome do qual se poderia expropriar, construir
barragens em zonas protegidas, ocupar orlas marítimas com empreendimentos
turísticos, enfim tudo o que pudesse alegrar os “investidores”.
Vale a pena observar o que é preciso a um investidor
para obter a aprovação de um PIN:
o O investimento
global tem de ser superior a 25 M de euros. O tão cantado empreendorismo e o auto-emprego
só têm acesso a um PIN se se juntarem a poupanças daquele quilate;
o
Tem de estar
garantido um impacte positivo em, pelo menos, quatro dos seguintes domínios:
o Produção de bens e serviços transacionáveis, de caráter
inovador e em mercados com potencial de crescimento, o que qualquer consultor
credenciado produz, a partir de um modelo estandardizado de relatório,
incluindo as previsões de mercado adequadas ao efeito pretendido;
o Efeitos de arrastamento em actividades a montante ou
a jusante, particularmente nas pequenas e médias empresas, o que pode ser
considerado no relatório anterior, com uma fácil criatividade;
o Interação e cooperação com entidades do sistema
científico e tecnológico. Esta condição cai bem e era muito cara ao amor de
Sócrates pela tecnologia, se nos recordarmos do Magalhães e do apoio financeiro
às renováveis;
o Criação e/ou qualificação de emprego. Como é sabido,
sempre que é anunciado um investimento salta sempre um número infindável de “postos
de trabalho direto e indireto” na boca dos mandarins; no entanto, a realidade
apresenta mais de um milhão de pessoas sem emprego e dezenas de milhar,
qualificados, que emigraram;
o Inserção em estratégias de desenvolvimento regional
ou contribuição para a dinamização económica de regiões com menor grau de
desenvolvimento. Na verdade, as desigualdades inter-regionais não param de
aumentar, os serviços à população do interior são fechados ou, as empresas
sairam de Portugal à procura de salários mais baixos (Lear ou Delphi, por
exemplo) tremendo os governos pela emigração da Auto-Europa, pelos seus efeitos
devastadores;
o Balanço económico externo. Poderá ser cosmética como
a exportação da Swatch que não produz em Portugal um ponteiro de relógio que
seja mas, como está registada no offshore da Madeira...[29] Ao que sabemos,
a redução recente do deficit comercial deve-se muito mais à redução das
importações, induzida da enorme quebra do consumo e, menos à exportação, se
exceptuarmos uma venda extraordinária da Galp e a drenagem de ouro (recolhido
em pequenas lojas de supermercado) para o exterior;
o Eficiência energética e ou favorecimento de fontes de
energia renováveis. Também caía bem, no pendor para a tecnologia de Sócrates e
de Zorrinho, além de gerar fortes apoios do erário público, agora refletidos
nas faturas da EDP.
o Podem, ainda,
ser reconhecidos como PIN, projectos de valor igual ou inferior a 25 milhões de
euros desde que tenham uma forte componente de investigação e desenvolvimento
(I&D), de inovação aplicada ou de manifesto interesse ambiental e que se
integrem nos domínios acima definidos.
A recentemente anunciada extinção da Reserva
Ecológica Nacional[30] bem como uma
nova Lei dos Solos “no sentido do aumento e facilitação do estabelecimento de
investidores e ao mesmo tempo limitar o crescimento urbano”, estão ambas
estatuídas na 5ª atualização do memorando, com data de 14 de outubro e ainda
não traduzida para conhecimento público[31]. Para completar
a liberalização total do território aos “investidores”, é preciso mercantilizar
o espaço sem qualquer restrição, eliminando as limitações ambientais,
culturais, arquitetónicas ou paisagísticas, a
la carte. Por seu turno, o ministro Álvaro[32] avisou que é
preciso re-industrializar a Europa… para aumentar as exportações, procurando-se
que a prazo a Europa do Sul esteja em condições de competir com os preços
asiáticos. Para ajudar à agilização dos processos a mesma 5ª atualização do
memorando considera alterações aos estudos de impacto ambiental para os tornar
mais céleres e com menores custos para os sagrados investidores.
Nesse contexto, os governos têm de ter maleabilidade
para gerir a ocupação de um espaço em função das necessidades do investidor, das
vantagens competitivas e dos ganhos na exportação. Haverá espaços para
indústrias poluentes desde que os cuidados ambientais não prejudiquem a
competitividade do negócio. Por outro lado, na reiterada aposta na exportação,
cabe o turismo e, para este, nada melhor em projetos competitivos que áreas
preservadas em termos ambientais e paisagísticos, sem classificações
limitadoras e apriorísticas. Depois do Allgarve teremos um PortugALL.
2.9- A
mentira da participação da população no planeamento urbanístico
·
“5. É garantida a participação dos
interessados na elaboração dos instrumentos de planeamento urbanístico e de
quaisquer outros instrumentos de planeamento físico do território.”
Na realidade, nem nesta questão nem em alguma outra é
fomentada a participação dos interessados. Na aprovação dos PDM fazem-se
algumas reuniões públicas pouco participadas e sem qualquer poder decisório, sendo
apresentadas como uma mercê, que o partido local concede à plebe; como uma
esmola do senhor feudal aos seus servos.
Em Lisboa, o orçamento participativo é uma fonte de
propaganda do PS. De acordo com recolha contida no blog Casa das Aranhas[33] a “Câmara de
Lisboa reduziu de cinco milhões para 2,5 milhões de euros a verba destinada ao
Orçamento Participativo (OP) e reduziu, de dois anos para 12 ou 18 meses, o
prazo de concretização das propostas escolhidas pelos cidadãos”. Tomando em
consideração que as receitas da CML em 2011 foram próximas de € 470 M, é fácil
ver que, naquele ano o cauteloso Costa reservou para os projetos apresentados
pelos moradores (e selecionados pela CML) cerca de 1% da sua receita, cabendo
os restantes 99% ao mandarinato.
Dados apresentados no recente I Encontro Ibérico de Orçamentos Participativos[34] realizado em novembro último, referem apenas 16 freguesias em 2012 com
orçamentos participativos, referindo-se ainda que em 88% dos casos, não havia verbas
afetas; o que é demonstrativo do seu caráter cosmético. Em todos esses casos trata-se
de autarquias geridas pelo partido-estado uma vez que o PC, dado o seu pendor
hierárquico e autoritário, nem sequer concebe veleidades de participação à
plebe. Nesse contexto, o site da câmara de Palmela (maioria PC) indica – há
anos- uma ligação para um orçamento participativo que não existe[35], ao que sabemos, por ordem do omnisciente comité central, que travou a
iniciativa dos eleitos locais.
3 – Expropriados e despejados.
Propostas de luta
Em outubro de 2008, pelo menos 23 mil famílias
portuguesas não conseguem pagar à banca os empréstimos à habitação, um aumento
de 24% em relação ao mesmo período do ano passado[36].
Ainda a crise era uma criança com o governo a anunciar que o “subprime” não
chegaria a Portugal.
Em 14 de março último já se falava em 140000 famílias
que incorrem atualmente em processos de incumprimento por ausência de pagamento
do crédito à habitação. Nessa ocasião, na AR, o BE não conseguia, “uma moratória,
total ou parcial, das prestações a reembolsar ao banco, por um período até 24
meses”[37]
Interessante é também ver, em março de 2012, Fernando
Ulrich, do BPI, salientar que em Portugal "é baixo" o nível de incumprimento
no crédito à habitação e que "não existe nenhuma guilhotina" sobre as
pessoas que têm dificuldades em pagar os empréstimos bancários”[38]
Sem dúvida que na leitura das estatísticas esse nível
é baixo, uma vez que o nível do crédito malparado registado pelos bancos e
relacionado com crédito à habitação passou de 1.85% do total em fim de 2011,
para 2.02% em outubro de 2012. Tendo em consideração a dívida média de cada
família - € 48356 (ver em 2.7) - essa variação corresponde a um aumento de
43400 para 46100 famílias no mesmo lapso de tempo. Porém, as estatísticas estão
cheias de gente, de carne e osso, com sérias dificuldades para contribuir no
pagamento da dívida assumida pelo governo para ajudar ao financiamento do BPI;
talvez não exista uma guilhotina mas há, sem duvida, outra coisa bem cortante
que dilacera a vida de milhares de pessoas.
Segundo a poderosa APB – Associação Portuguesa de
Bancos, no periodo 2008-junho/2012 já haviam sido entregues aos bancos, como
dação em pagamento, 19500 casas[39] e, em
2011 foram espoliadas pelos bancos 11000 habitações[40] (mais
1000 que no ano anterior). Em outubro noticiava-se que eram penhoradas em
Portugal 80 casas por dia, certamente não todas tendo, diretamente relação com
o não pagamento de prestações relacionadas com a habitação[41]! O
pior estará para vir, pois de acordo com a mesma fonte da APB, 54% das famílias
portuguesas com endividamento bancário relativo à habitação (mais de 2.5 M de agregados
familiares) têm um rendimento total de € 914 mensais.
Em Espanha o problema tem uma outra dimensão dado que
a bolha imobiliária atingiu uma escala inimaginável; já foram executadas mais
de 350000 famílias em dificuldades, que ficaram sem as suas casas. Essa dimensão
afeta pesadamente os indicadores bancários e por isso, esses “ativos tóxicos”
estão a transitar para um “bad bank” (na realidade, uma entidade
contabilística) denominado SAREB, após a funda intervenção do Estado espanhol
em termos de reorganização do setor bancário e da sua recapitalização à conta
do erário público, como está na cartilha neoliberal. Espera-se que muitos
desses imóveis acabem por ser demolidos, tal como aconteceu na Irlanda; e,
enquanto o não forem, funcionarão no âmbito do fundo de casas para desalojados,
já anunciado e a pagar pelo Estado espanhol.
Em Portugal, são discretas entidades dessas – “bad
banks” - a Parvaloren, a Parups e Parparticipadas, criadas para despejar o lixo
do BPN, depois de isentados de responsabilidades, a SLN e os criminosos do PSD
que se locupletaram com o dinheiro desaparecido, travestindo-se depois em
empresários ou investidores. Essas perdas dos bancos transferidas para esses
“bad banks” terminarão transformadas em… dívida pública. E assim desaparecem.
O governo espanhol aprovou uma suspensão dos despejos
das famílias mais vulneráveis, por dois anos (que irá abranger pouca gente) e a
criação de um fundo de casas destinadas a desalojados. Como é evidente, essas
medidas não contemplam a entrega do imóvel para pagamento da dívida
remanescente, quando esta seja superior ao produto da venda da casa, mantendo-se
em vigor a lei segundo a qual, ao devedor hipotecário cabe responder pela
dívida com todos os seus bens, presentes e futuros; no atual contexto de desemprego
e empobrecimento acelerado isso significa a perpetuidade da dívida para salvaguarda
de valorização da parcela de títulos hipotecários nos ativos dos bancos
espanhóis, profundamente descapitalizados. Quanto ao fundo de casas, para além
de se não saber quando estará disponível, isso irá constituir uma forma dos
bancos utilizarem algum do muito património de que dispõem, obtido através da
espoliação de famílias em dificuldades, recolhendo rendas pagas pelo Estado.
Os bancos, em geral, argumentam que ninguém foi
obrigado a comprar casa e a aceitar um crédito hipotecário, competindo aos
devedores cumprir as suas obrigações. Na realidade, a ausência de uma política
de habitação económica ou social, com a concomitante entrega da satisfação das
necessidades de um teto ao funcionamento do “mercado”, bem como a ausência de
casas para alugar com rendas compatíveis, constituiram fatores para o
endividamento das famílias. E esse endividamento não foi para comprar pipocas
mas, para terem algo de basilar, uma casa onde viver.
Os bancos foram a parte mais responsável na situação
atual no que respeita ao endividamento das famílias e têm tido o apoio dos
Estados que oneram toda a população com as sequelas do endividamento público,
aumentado brutalmente para salvar os bancos da falência. O mesmo Estado e a sua
classe política, colocam-se fora de qualquer responsabilidade pela inexistência
de política de habitação, resumem-se à ação legislativa e à atuação do aparelho
coercivo para proceder aos despejos.
Nos contratos típicos de concessão de crédito para
habitação, entre uma família e um banco, são cláusulas leoninas as que
concernem às hipotecas e aos seguros de vida, obrigatórios a favor do credor. Por
outro lado, se o financiamento da compra de habitação estava (e está)
concentrada em cinco bancos privados (a CGD sempre se comportou como tal) as
famílias encontram pela frente um cartel, um mercado sob a forma de oligopólio.
Há, portanto, uma situação de abuso de posição dominante, ilegítima.
À profunda crise económica que se atravessa em
Portugal e em vários países europeus - e cujo agravamento é inquestionável - corresponde
uma contestação basicamente cordata, institucional e, portanto, ineficaz. Por
outro lado, a esquerda institucional, viciada no jogo par(a)lamentar, também não
irá dar um passo no incentivo de ações de desobediência de massa susceptíveis
de afetar o regime e o sistema político e económico; porque vivem nele e dele.
A política de despolitização[42]
conduzida para com a multidão desde 1975 afunilou as decisão sobre os assuntos
sociais numa classe política apropriada pelo sistema financeiro, muito reduzida
numericamente e com fracas capacidades intelectuais para encontrar soluções
criativas ou sequer compreensão para entender os problemas. Isso significa que
a multidão de trabalhadores, desempregados, reformados, desalojados e pobres em
geral, só pode contar consigo para transformar a crise económica numa crise
política com forte conteúdo anti-capitalista. E isso só se consegue com luta em
todas as frentes, com a discussão das suas formas, com o envolvimento de
milhares de coletivos autónomos, funcionando com uma coordenação em rede e com
o ativo repúdio de manobras dos caciques partidários, dos iluminados condutores
dos trabalhadores, em regra à espera de tacho e mordomias. Essa rede não se
poderá restringir ao espaço nacional uma vez que o capitalismo é global e
porque todos temos a ganhar com as experiências e a solidariedade de todos.
No capítulo da luta contra os despejos, de imediato e
no contexto do atual ordenamento político, há a considerar um princípio básico:
A prevalência das pessoas e do seu direito à
habitação,
sobre o mercado e o poder do sistema financeiro
e ideias, como as seguintes:
- Auto-organização
numa rede de coletivos de ameaçados de despejo, para a luta pelo seu
direito à habitação, fora da interferência dos “jonets” partidários;
- Solidariedade
ativa de todos com os ameaçados de despejo, contra o sistema financeiro e
os seus mandatários da classe política;
- Suspensão
de todos os processos executivos de expropriação por não pagamento de
prestações, bem como das vendas em leilão de primeiras habitações
familiares;
- Essa
suspensão pode ser extensiva a imóveis onde se desenvolva a atividade de
trabalhadores independentes ou pequenas empresas;
- Moratória
de três anos no pagamento das prestações para os casos onde se comprove o
seu pagamento ponha em causa a subsistência de uma família no capítulo da
alimentação, energia e água e encargos com saúde e educação; moratória que
poderá ser prorrogada. Durante o periodo da moratória o spread é reduzido a metade e o
pagamento do IMI é suspenso;
- Nos
casos em que haja acordo para a dação em pagamento da habitação objeto de
um contrato de mútuo incumprido, esse ato anulará o débito se o valor de
venda for inferior ao montante da dívida remanescente, certamente afetada
pela conjuntura especulativa vigente no momento da sua constituição;
- Possibilidade
de transformação do contrato de mútuo em contrato de arrendamento, com o
pagamento ao titular do empréstimo do valor atualizado já pago ao banco
que, assim poderia assumir a propriedade do imóvel; ou com a sua
transformação em meses de renda;
- A haver
venda de casas em âmbito contencioso, esta pode ser feita
preferencialmente à Segurança Social que incluirá a habitação no âmbito de
um Fundo de Habitação destinado à oferta de casas de renda económica ou
social, com a manutenção ou não da mesma família nesse fogo;
- Alteração
da lei do arrendamento com retorno aos contratos por tempo indeterminado,
só resolúveis por decisão do inquilino ou pelo senhorio nos casos de não
pagamento das rendas em que o inquilino não tenha solicitado o recurso à
Segurança Social para efeitos de habitação social
(em breve, a 2ª parte deste documento)
Este
e outros textos em:
[1] Leonor Coutinho, antiga governante do PS e dirigente da
SEFIN - Associação Portuguesa dos Utilizadores e Consumidores de Serviços e
Produtos Financeiros refere que “Todo o negócio do imobiliário foi também muito
incentivado pela banca"
[3]
http://grazia-tanta.blogspot.pt/2012/07/o-tribunal-constitucional-e-o-roubo-dos.html
[4]
http://www.jn.pt/Opiniao/default.aspx?content_id=2853273&opiniao=Ant%F3nio%20Marinho%20Pinto
http://www.esquerda.net/artigo/ongs-alertam-para-subida-do-n%C3%BAmero-de-sem-abrigo-em-portugal
[8] Paulo Morais é um profundo conhecedor do tema. Veja-se, por exemplo
http://noticias.sapo.pt/lusa/artigo/b84f5fdcef89627fec3611.html
[10]
http://www.slideshare.net/durgarrai/capitalistas-e-estado-a-mesma-luta
[11]
http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/economia/irs-defendida-deducao-de-despesas-com-ferias
[14] http://www.tvi24.iol.pt/aa---videos---sociedade/reporter-tvi-ana-leal-grupo-gps-dinheiros-publicos-vicios-privados-tvi24/1398555-5795.html
[15]
http://www.scribd.com/doc/22311099/Empresarios-portugueses-incapazes-inuteis-nocivos-e-batoteiros
http://pt.scribd.com/doc/76808101/Seguranca-Social-%E2%80%93-processos-de-descapitalizacao-1
[18]
http://pt.scribd.com/doc/5571236/os-guetos-em-tempo-de-pobreza
[22] http://www.jn.pt/paginainicial/interior.aspx?content_id=1022987
[23]
http://grazia-tanta.blogspot.pt/2012/05/divida-portuguesa-total-canibalizacao.html
[25]
Lurdes Barata, “Os Números do
Cooperativismo em Portugal”, 1912
[26] In
Relatório de 2008 da Fenache
[27] http://grazia-tanta.blogspot.pt/2012/05/divida-portuguesa-total-canibalizacao.html
[28] http://grazia-tanta.blogspot.pt/2012/05/divida-portuguesa-total-canibalizacao.html
[29] Ver detalhes em “Suite 605” de João Pedro Martins
[30] http://rr.sapo.pt/informacao_detalhe.aspx?fid=25&did=89028
[31]
http://memorandosdatroika.wordpress.com/
[32]
http://www.publico.pt/economia/noticia/alvaro-santos-pereira-europa-precisa-de-mudar-de-rumo-1577196
[33] http://casadasaranhas.wordpress.com/category/politica/
[34]
http://www.op-portugal.org/actividades.php?id=1001
[35]
http://www.cm-palmela.pt/pt/conteudos/areas+de+intervencao/orcamento+participativo/
[40]
http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Economia/Interior.aspx?content_id=2382142&page=-1
[41]
http://blog.opovo.com.br/portugalsempassaporte/crise-portuguesa-por-dia-sao-colocadas-a-venda-80-casas-penhoradas/
[42] http://grazia-tanta.blogspot.pt/2012/10/a-despolitizacao-o-controlo-social-e-as.html
Sem comentários:
Enviar um comentário