O Estado vai
passar a cobrar as dívidas aos concessionários privados das portagens. Que
significa isto e a quem serve?
1 - A
parceria público-privada entre a DGCI e as concessionárias de autoestradas
2
– Os tribunais de Pequenas Instâncias
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Notícia
recente refere um Acordo entre o InIR e a Direcção Geral dos
Impostos, cujo texto integral reproduzimos mais abaixo (1) com sublinhados
nossos. Destacamos alguns aspectos sobre o tema e outros com o mesmo
relacionados.
1 - A
parceria público-privada entre a DGCI e as concessionárias de autoestradas
A
DGCI vai proceder à cobrança coerciva das dívidas dos utentes que não procedem
ao pagamento das taxas de portagem nas infra-estruturas rodoviárias. Está claro
que pretendem jugular os legítimos actos de desobediência que se vêm
verificando por parte dos utilizadores das antigas SCUT, vítimas de espoliação
dos seus direitos de circulação em vias construidas com fundos públicos, a
favor de empresas parasitárias.
Para
além das fundadas razões para a legitimidade do não pagamento, essas dívidas
são constituidas perante as concessionárias e que têm como partes, condutores
de veículos e as referidas concessionárias, todas estas, empresas privadas. Não
se percebe muito bem porque se transita o instituto da contra-ordenação aplicável
às SCUT, enquanto com gestão pública para a nova situação, de gestão privada e agora estendidas a todas as autoestradas e
pontes.
Neste
novo modelo, qualquer grupo económico, qualquer cambão empresarial ou sectorial
poderá encomendar ao seu “regulador” o envolvimento da máquina fiscal para a
cobrança das suas dívidas, por questões óbvias de maior operacionalidade
(relativa) face ao aparelho judicial. Nessa óptica, se alguém sair do
restaurante sem pagar ou, se o patrão não pagar o salário devido a um
trabalhador, também os credores poderão solicitar a intervenção do Estado, a aplicação
de contra-ordenaçãoes, pelas dívidas constituidas?
“Anteriormente,
a cobrança era efectuada através da instauração de acção executiva nos
Tribunais Comuns” com os inconvenientes que todos conhecemos relativos ao
funcionamento dos tribunais. Tenderá a vocacionar-se os tribunais para todos os
casos que envolvem gente sem poder mas, que pouco contam para o regime cleptocrático
(por ex; prestações de alimentos) ou com muito poder (casos de submarinos,
Portucale, Face Oculta…) para descansarem em paz.
Nesta
senda, qualquer devedor poderá contratar a DGCI para intervir e promover a
execução e obviar à programada lentidão dos tribunais que tanto interessa aos
vigaristas? Será que a DGCI entra no mercado da cobrança de dívidas e passa a
actuar como um “cobrador de fraque” ao serviço de interesses privados?
Equipara-se
uma dívida entre entidades privadas a uma dívida ao Estado que tem
prerrogativas próprias nesse campo, atribuindo-se através de um instituto
público, um tal InIR (2) – mais uma inutilidade cara, decerto bem recheada de
mandarins – a capacidade de utilização de meios físicos, técnicos e jurídicos a
favor de interesses privados. E iriamos jurar que os concessionários, que
encomendaram ao InIR este acordo, habitualmente tão defensores dos valores da
livre iniciativa privada, do “menos Estado”, vão sobrecarregar organismos do
Estado com problemas seus e cuja resolução a mais ninguém cabe. Aproveitam
agora porque o erário público está a saque.
Por
outro lado, não cremos que a fuga ao pagamento de portagens seja um gerador de
tão elevadas dívidas que justifiquem a utilização de maquinaria administrativa
e coerciva pesada como as penhoras, nomeadamente a capacidade de apreensão de
automóveis, por dívidas de poucos euros. Será que este problema se tornou um
problema de carácter “nacional” (3), incluido como adenda secreta no
receituário da “troika”?
O
governo que permite (ou incentiva) acordos destes permite que se lhe façam
estes reparos:
- Tem capacidade disponível nos serviços executivos da DGCI e portanto precisa de entreter os seus funcionários?
- Ainda há um ano a DGCI abriu um concurso para 350 licenciados em direito e previa-se a saída de 500 trabalhadores até ao fim de 2010 (4);
- Afinal pelos termos do acordo com o InIR, a DGCI vem revelar que o mesmo a fará ganhar eficiência e aproveitamento da infraestrutura tecnológica (1);
Essas
evidências arrastam outras, bem mais pesadas e revelam o carácter do Estado
português, pasto para gangs de mandarins, banqueiros e de empresários manhosos e incapazes. Vejamos
algumas:
Tem-se
pretendido, historicamente, um desempenho sofrível da máquina fiscal que, se
mantenha ao lado da enorme fuga e fraude fiscais que todos conhecemos (24% do
PIB). Ao Estado português interessa que a DGCI seja um passador por onde foge o
peixe grosso e uma rede fina que apanhe peixinhos de aquário.
“Entre
2008 e 2010 o número de devedores incumpridores diminuiu cerca de 43 por cento”
dizia o sonolento Azevedo Pereira, mandarim-mor da DGCI (5). O homem deveria
querer apresentar trabalho a uma imprensa servil porque a realidade desmente-o:
Receitas fiscais por cobrar(valores em
milhões de euros)
Impostos
|
2008
|
2010
|
variação
|
Diretos
|
2845,7
|
4823,9
|
1978,2
|
Indiretos
|
3948,8
|
4486,6
|
537,8
|
Soma
|
6794,5
|
9310,5
|
2516,0
|
Contas Gerais do Estado
sem
contar com as prescrições e anulações de dívida ou com um volume enorme da considerada
“suspensa” por imperativos de uma lei que corresponde ao laxismo pretendido.
Comentários
para quê?
Quem
ouvir o Portas dos submarinos falar, percebe. Ele fala sempre das empresas, da
prioridade à resolução dos seus problemas e, acessoriamente, refere os
trabalhadores; no seu bem claro discurso ideológico, os trabalhadores só têm
sentido e direitos subordinados aos das empresas. E como as empresas e os seus
brilhantes empresários não são capazes de gerar emprego, os potenciais
trabalhadores não têm direitos, são inúteis e devem desaparecer pois constituem
custos que não facilitam o combate ao deficit e a canalização de dinheiro
público para as empresas. Sobre este tema, pde-se consultar os nossos textos já
publicados anteriormente (6). Na realidade o Portas dos submarinos é também um
submarino que abre portas aos chamados “empresários”.
Assim
a DGCI vai aquecer os seus trabalhadores, com notificações postais,
notificações mediadas pelas polícias, penhoras, para apanhar, por exemplo,
€1.45 dum não pagamento de uma passagem na ponte 25 de Abril a uma empresas
privada. Como se disse atrás, a DGCI procurará apanhar peixes de aquário pois o
peixe grosso… como o Dias Loureiro só deixou aí umas escamas (depósitos de
poucos euros) para não frustrar por completo os juizes.
Ao
que se sabe, compete à DGCI a cobrança de impostos e contribuições devidas ao
Estado (7) e não o envolvimento na cobrança de receitas destinadas a empresas
privadas.
2
– Os tribunais de Pequenas Instâncias
A
propósito, vamos tecer algumas considerações sobre os referidos tribunais e alguns
dos principais beneficiários com a sua existência, os chamados operadores de
telecomunicações e entretenimento, as petês, as zon’s e o cambão das
comunicações móveis.
São muitas as queixas das pessoas relativamente aos serviços das operadoras de telecomunicações e por diversas razões. Nuns casos, as operadoras facilitam a ativação de chamadas, eufemisticamente denominadas “de valor acrescentado” quando, de facto, essa ativação deveria apenas ser feita a pedido expresso do detentor do telemóvel. Quando o incauto que não indicou à operadora a sua não abertura a tais chamadas, é objeto do assalto ao saldo disponível no telemóvel ou contas desajustadas a pagar. Noutras situações, há processos ativados a partir de incumprimentos das operadoras, por exemplo, quando não fornecem minimamente o sinal de internet contratado.
Parece que há por aí um “regulador”, uma tal Anacom onde acampam vários mandarins, de vários patamares hierárquicos dos gangs partidários e que para mais não serve; e que se descarta olimpicamente perante qualquer reclamação das pessoas. E, daí, a conflitualidade e milhares de processos de pouco montante relativo mas, com relevância para a economia dos burlados que, em regra não têm advogado, nem dinheiro para tal. Do outro lado, as majestáticas empresas que constituem o cambão das telecomunicações.
Os tais tribunais de Pequenas Instâncias agilizam a resolução destes conflitos, naturalmente, a favor das operadoras pois em cada passo processual, exigem às pessoas o pagamento de uma “taxa de justiça”, e tempo disponível para arrastar os pés no solar das togas; o que funciona como tentativa de, através da oneração do processo burocrático, incentivar o burlado a desistir, a ceder.
Do lado do poder, das operadoras de telecomunicações estão escritórios de pequenos e médios advogados contratados para tratar de pacotes destes processos, advogados de atacado que, por sua vez, distribuem os processos por dezenas de estagiários mal pagos (“quinhentizados”) ou mesmo, não pagos; processos de treta, sem gabarito profissional, nem complexidade. E, claro, tendo em conta a concorrência existente neste vector de advocacia de terceira categoria, não parece que os custos para as operadoras de telecomunicações sejam proporcionalmente muito elevados.
Por sua vez, os tais tribunais de Pequenas Instâncias mais parecem fábricas de chouriços, dada a repetitividade dos processos e a sua natureza, pouco incentivadora para os juizes envolvidos.
Em suma, mais um caso em que os tribunais foram criados para favorecer os interesses dos poderosos; e, neste caso, a Anacom nem sequer intervém, ao contrário da seu irmão, o tal InIR, como se observou no caso acima, sobre as portagens.
PS
– É como nota de rodapé que referimos a eleição do novo secretário-geral do PS,
o Seguro. Um só comentário: até na voz se confunde com o PPC.
NOTAS
(1)
Acordo entre o InIR e a Direcção Geral dos Impostos
22-07-2011
A
partir de hoje, a Direcção-Geral de Impostos (DGCI) vai passar a efectuar
a cobrança coerciva das dívidas dos utentes que não procedem ao pagamento
das taxas de portagem nas infra-estruturas rodoviárias. Esta sinergia entre
os dois organismos significa uma poupança significativa de encargos
para o erário público.
A
partir de hoje a Direcção-Geral dos Impostos (DGCI) vai passar a efectuar a
cobrança coerciva das dívidas dos utentes que não procedem ao pagamento das
taxas de portagem nas infra-estruturas rodoviárias.
Sempre
que um utente passe numa portagem sem proceder ao pagamento da respectiva taxa,
incorre numa infracção que, não sendo regularizada após notificação das
concessionárias rodoviárias, dá origem à instauração de um processo de
contra-ordenação.
O InIR
é o instituto público com a competência para proferir decisões administrativas
em processos de contra-ordenação desta natureza. Se o infractor não proceder ao
pagamento da contra-ordenação, o InIR instaura o respectivo processo de
execução de dívida.
Anteriormente,
a cobrança era efectuada através da instauração de acção executiva nos
Tribunais Comuns, com as condicionantes inerentes ao processo judicial. A partir desta data, a cobrança coerciva
destas dívidas - taxa de portagem, coimas e custos administrativos - passa a
ser efectuada pela DGCI, através dos seus Serviços de Finanças e do sistema
de cobrança coerciva, nomeadamente o sistema de penhoras e o sistema de leilão
electrónico dos bens penhorados. O novo sistema funcionará em resultado de
um protocolo hoje assinado entre a DGCI, a DGITA e o Instituto de Infra-Estruturas
Rodoviárias (InIR), tendo já sido carregados no sistema de cobrança coerciva da
DGCI os primeiros processos.
Após a
instauração dos processos de execução pelo InIR, a DGCI procede à citação dos
devedores e à penhora de bens, nomeadamente a penhora electrónica de veículos
automóveis que, após o registo, passarão imediatamente para a fase da apreensão
e da venda.
Logo
que penhorados os veículos, estes são carregados por via electrónica na rede
informática da PSP e da GNR para apreensão, mediante um interface electrónico
que foi recentemente implementado, em resultado de um protocolo celebrado entre
a DGCI e as forças policiais. Uma vez apreendidos os veículos, serão removidos
do local onde forem encontrados pelas forças policiais para depósitos das entidades
que procederão ao seu leilão e venda.
Como
em todos os processos que tramita, a DGCI dará sempre prioridade ao pagamento
voluntário das dívidas pelos devedores, seguindo uma estratégia de gradualismo
e de prudência. Apesar da rapidez com que o processo decorrerá, a DGCI
privilegiará a informação dos devedores, como faz actualmente, de modo a que
estes sejam sempre conhecedores da evolução dos processos e das diligências que
neles se efectuarão.
Esta
iniciativa traz benefícios concretos ao nível de recursos públicos, ao
permitir uma poupança significativa de investimento em meios materiais e
humanos, evitando a duplicação de custos para o erário público. Do ponto de
vista operacional, vem gerar ganhos de eficiência no curto prazo,
provenientes do aproveitamento da infra-estrutura tecnológica e da experiência
da DGCI em matéria de cobrança coerciva, aliada às competências do InIR em
processos de contra-ordenações em matéria rodoviária.
rodoviária.
(2) “O InIR,
I.P. tem como principal missão fiscalizar e supervisionar a gestão e exploração
da rede rodoviária, controlando o cumprimento das leis e regulamentos e dos
contratos de concessão e subconcessão, de modo a assegurar a realização do
Plano Rodoviário Nacional e a garantir a eficiência, equidade, qualidade
e a segurança das infra-estruturas, bem como os direitos dos utentes”.
(3) Ministério confirma 55 mil notificações devido a portagens não
pagas (15 JAN 11 às 10:44)
O Ministério das Obras Públicas confirmou à agência Lusa mais
de 55 mil notificações para multas relativas a portagens não pagas nas antigas
SCUT. Desde o anúncio da cobrança destas portagens, foram vendidos
mais de 222 mil identificadores.
http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Portugal/Interior.aspx?content_id=1758086
(6) http://www.slideshare.net/durgarrai/a-pulso-genocida-da-burguesia-portuguesa-a-actuao-da-mfia-socratide ou neste blog
(7) Missão e atribuições da DGCI
1 - A Direcção-Geral dos Impostos, abreviadamente designada por DGCI, tem por missão administrar os impostos sobre o rendimento, sobre o património e sobre o consumo, bem como administrar outros tributos que lhe sejam atribuídos por lei, de acordo com as políticas definidas pelo Governo em matéria tributária.
2 - A DGCI prossegue as seguintes atribuições:
a) Assegurar a liquidação e cobrança dos impostos e outros tributos que lhe incumbe administrar;
b) Exercer a acção de inspecção tributária, prevenindo e combatendo a fraude e evasão fiscais;
c) Exercer a acção de justiça tributária e assegurar a representação da Fazenda Pública junto dos órgãos judiciais;
d) Executar acordos e convenções internacionais em matéria tributária, nomeadamente os destinados a evitar a dupla tributação, cooperar com as administrações tributárias de outros Estados;
e) Informar os particulares sobre as respectivas obrigações fiscais e apoiá-los no cumprimento das mesmas;
f) Promover a correcta aplicação da legislação e das decisões administrativas relacionadas com as atribuições que prossegue e contribuir para a melhoria da eficácia do sistema fiscal, propondo as medidas de carácter normativo, técnico e organizacional que se revelem adequadas.
julho 2011
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