domingo, 1 de janeiro de 2012


O  Pentágono e a NATO. Gastos militares e armamentos


Sumário

  1. Enquadramento da política belicista do Pentágono e do seu alter ego, a  NATO
  2. O volume dos gastos militares
  3. A dimensão das forças armadas
  4. O armamento dos principais paises
  5. Empresas produtoras de armamento
  6. Países vendedores de armamento
  7. Vendedores por tipo de armamento
  8. Países compradores de armamento

1 - Enquadramento da política belicista do Pentágono e do seu alter ego, a NATO

O volume dos gastos militares para a grande maioria dos países está relacionado com o grau de conflitualidade regional, tendo em conta que, nesses casos, não existem pretensões hegemónicas a nível global; ou com o poder interno das castas militares, mais ou menos extensas ou influentes no dimensionamento dos seus meios e mordomias. Em todos os países, por outro lado, existem relações mais ou menos claras, demasiadas vezes corruptas, entre os poderes civis, as castas militares, os fornecedores de armamento e discretos intermediários, que recolhem avultadas comissões. Na base estão as populações e nomeadamente a multidão de trabalhadores e ex-trabalhadores, pouco ou nada beneficiados, com essas transações e cujo papel se resume a arcar com os custos inerentes, que lhes reduz o rendimento.

Em alguns casos, a pertença a coligações de Estados envolve relações solidárias, em regra inseridas num quadro hierárquico, encimado por uma potência dominante. Nesse contexto, países pequenos, sem capacidades de desenvolverem pretensões hegemónicas a nível global ou, mesmo regional, sem ameaças descortináveis à sua segurança, são envolvidos em encargos, conflitos e guerras, resultantes dessa inserção hierárquica, por conta da satisfação de interesses de terceiros, qual tributo senhorial, injustificável para os cidadãos.

Naturalmente que a NATO é o exemplo mais completo de coligação, cuja cabeça é o Pentágono e que abarca politicamente 28 Estados, em regra, com o entusiasmo das respectivas castas militares, bem pagas e doutrinadas ideologicamente para obedecer e que constituem, no seu conjunto, um género de guarda pretoriana, com códigos de actuação e linguagem comuns. A NATO, por outro lado, é a única organização militar, eufemisticamente designada como fornecedora de um serviço de segurança colectiva e solidária entre os seus membros; e que se arroga também a actuar sobre os países não membros e contra os seus povos, no quadro de uma pretensão de intervenção planetária, perigosamente susceptível de aplicação prática, dados os meios e grau de coesão que detém. A NATO define mesmo uma escala com os vários graus de aplicação da sua estratégia:

  • Protecção preventiva (caso de sanções)
  • Gestão pró-activa das crises (tipo intervenção no Haiti)
  • Utilização da intervenção militar (Afeganistão)
  • Estabilização post-intervenção (pretensamente, o Iraque actual)
Nenhuma outra coligação formal ou informal de Estados, tem o mesmo poder de intervenção global, quer político, quer militar, alicerçado na constante existência de um poder de destruição arrasador, por sua vez, almofadado por uma apropriação francamente assimétrica dos recursos e da riqueza criada pelo Homem.

Em 2001-  e, sublinhe-se, muito antes do 11 de Setembro - sob a direcção do então vice.presidente dos EUA, Dick Cheney, foi traçada a NPE – Nova Política Energética, baseada nos seguintes pontos:

  • A segurança nacional dos EUA tem de estar assegurada, como axioma, como princípio inegociável e sagrado, devendo, para o efeito, toda a restante Humanidade estar preparada para se subordinar a tão alto desígnio;
  • A manutenção da ordem capitalista mundial, actualmente vigorando no âmbito do paradigma neoliberal (como antes sob o primado keynesiano), exige um poder militar esmagador que retire veleidades a qualquer Estado para se colocar em posição frontal de desafio face aos EUA, por um lado, e aos povos, o direito de revolução social, por outro;
  • Para que a economia norte-americana funcione, necessita de um intenso recurso a bens energéticos que, sendo essencialmente de origem fóssil, são constituidos por reservas mundiais limitadas e, portanto, objecto de disputas muito fortes;
  • A própria manutenção do aparelho militar exige um fluxo garantido e abundante de recursos energéticos que contribui, por si só, para uma pressão para o controlo desses recursos. senão das suas fontes, pelo menos dos seus canais de transporte – vias marítimas, oleodutos e gasodutos;
  • Apesar de possuir grandes recursos e de ser grande produtor de produtos energéticos, os EUA têm um volume de consumo muito superior às suas próprias capacidades domésticas. De acordo com a NPE, a situação a prazo, no capítulo do petróleo, é preocupante:
                                                             

2002
Prev 2020
Produção
8.5
7.0
Consumo
19.5
25.5
Importação
11.0
18.5
              Valores em milhões de barris por dia (Mb/d)

  • Para se mover neste complexo cenário os EUA definiram as vantagens para os seus interesses da desestabilização política e da fragmentação de Estados, como as levadas a cabo na Jugoslávia, na antiga URSS, com a autonomia curda no Iraque.
  • Mais recentemente, James Jones, comandante supremo da NATO na Europa, entre 2003 e 2006, foi designado como  assessor de segurança nacional de Obama, sabendo-se que é um firme defensor do alargamento da NATO a leste e a sul, para controlo dos recursos energéticos necessários aos EUA. Esta linha de continuidade face à administração Bush e a actuação dos EUA no apoio ao golpe de estado nas Honduras, revelam a grande unidade entre republicanos e democratas, no que se refere à extensão geográfica do seu conceito comum sobre a defesa dos interesses nacionais dos EUA. Por outro lado, o Pentágono, em ligação com o sector do petróleo e as suas multinacionais e com a indústria do armamento, goza de uma grande autonomia face à presidência, é um estado dentro do Estado. Condoleeza Rice e Dick Cheney, eram altos quadros do sector petrolífero e Robert Gates, manteve-se como responsável máximo do Pentágono, transitando do governo de Bush para o de Obama.
Para além deste painel sumário, desenham-se alguns desenvolvimentos e opções que conduzem à promoção de conflitos e outras acções levadas a cabo pelos EUA, com maior ou menor envolvimento dos seus aliados da NATO ou terceiros, circunstanciais, como a Rússia, Israel e países do Maghreb na operação Active Endeavour, os países do Golfo Pérsico do Conselho de Cooperação do Golfo, ou a Índia no patrulhamento do estreito de Malaca.

  • Para solucionar a questão energética, os EUA enquadraram a necessidade do aumento do número de fornecedores, o surgimento de novas jazidas, o recurso a fontes alternativas limpas (solar, eólica…) ou poluentes (nuclear, carvão), sabendo-se que são parcos contributos oara o problema. Existem outros grandes consumidores, nomeadamente a China, ávidos de garantir abastecimentos, imprescindíveis para o seu elevado crescimento económico e estão activos, quer em contratos de exploração noutros países, como na construção de novos canais de encaminhamento do petróleo e do gás. Por outro lado, o surgimento de grandes jazidas vai rareando e as condições de exploração (por exemplo, no mar) são cada vez mais caras. Finalmente, as renováveis têm ainda um longo caminho a percorrer para substituirem o petróleo, nomeadamente nos transportes enquanto que o nuclear não colhe grandes simpatias entre as populações;
  • As grandes reservas de petróleo e gás encontram-se na Rússia, na Ásia Central, no Médio Oriente e na Venezuela e o grande consumo situa-se nos EUA, na Europa, no Japão e na China; para além de uma longa lista de outros produtores, mormente em África ou a Noruega e outros consumidores de crescente importância como a Índia. Esta não justaposição levanta pesados problemas técnicos de logística e transporte que acentuam as disputas entre os diversos operadores mas, que lhes servem também de instrumentos, num quadro geopolítico mais alargado;
  • O controlo dos fluidos saídos dos poços e do seu encaminhamento exige o controlo político dos Estados produtores bem como de outros, relevantes para a disponibilidade energética junto dos grandes consumidores;
  • Entre outros factores pouco favoráveis aos EUA, refere-se em primeiro lugar a Rússia, que continua a ter um poder geoestratégico, não ultrapassável com sanções ou políticas de canhoneira; que tem enormes reservas; um poder político forte em torno do seu emblemático Putin que domina os recursos energéticos do país e faz deles a espinha dorsal da economia russa; que é o natural abastecedor da Europa Ocidental, directamente ou como via de passagem para as exportações do Turquemenistão e do Cazaquistão; que tem a vantagem de ter como vizinhos próximos o Japão e a China, grandes importadores;
  • Essa ligação à UE processa-se através de várias condutas que obrigatoriamente têm de atravessar a Ucrânia ou, menos problematicamente, pela Biolorússia que é um estado vassalo de Moscovo, ambos aptos a constituir matéria para dificuldades provocadas pelas agências da CIA, como na “revolução laranja” ucraniana, que parece já ter perdido a cor e o cheiro;
  • Os grandes produtores da Ásia Central, para mais enquadrados com a Rússia e a China na Organização de Cooperação de Xangai, tendem a coordenar as suas economias com os seus gigantescos vizinhos, passado um periodo de permeabilidade à adulação norte-americana e de fraqueza da Rússia de Ieltsin;
  • A Sul, as reservas do Irão são incontornáveis pela sua dimensão, tal como é intolerável o regime iraniano para qualquer administração norte-americana, seja ela fundamentalista evangélica com os republicanos, ou menos ideológica com Obama. Nesse contexto, prometem durar as manobras de intimidação e cerco, com o argumento do uso militar do nuclear; a aplicação de ineficazes sanções sob o patrocínio dessa entidade difusa denominada “comunidade internacional; e a contenção da agressividade israelita, sempre disposta a aventuras guerreiras, embora não tenha ganho nenhuma desde 1967;
  • Ainda a Sul, coloca-se o Afeganistão onde os norte-americanos tinham grandes esperanças de construir a saída do petróleo da Ásia Central para o Índico – fora da intervenção russa ou iranuana - mas que nunca se poderá realizar num quadro de guerra civil; seja como agora entre o prefeito de Kabul (Karzai) e os talibans ou, em alternativa, entre os senhores da guerra entre si pelo controlo do tráfego da droga;
  • No Golfo Pérsico, os EUA construiram uma rede de protectorados petrolíferos e bases militares – Iraque, Kuwait, Bahrein, Qatar, Oman – confrontando-se, paralelamente com a eterna suspeita de infidelidade por parte dos sauditas;
  • No Cáspio, interesses ocidentais construiram o BTC oleoduto que liga a margem oriental (Turquemenistão e Cazaquistão) à margem ocidental, restrita ao Azerbaijão da família Aliev e que daí segue pela Geórgia e pela Turauia até desembocar em Ceihan, no Mediterrâneo Oriental, próximo da fronteira síria;
  • Finalmente, a Venezuela, apesar de continuar a ser uma fonte energética importante no abastecimento dos EUA, apresenta um modelo social, cujo exemplo para outros países da América Latina é intolerável para os EUA, habituados desde sempre a monitorar a evolução das sociedades latino-americanas para que não ousem arranhar o poder imperial. E daí o reforço da presença militar na Colômbia, em Aruba e a reactivação da IV Esquadra no Atlântico sul, coincidentes com novas descobertas petrolíferas nos mares do Brasil.
Actualmente, os EUA, apesar do seu incontestável poder militar, vêm registando revezes estratégicos que se podem considerar como factores de recuo e decadência, que os obrigam, a sucessivas intervenções em outros Estados, em vez da utilização do chamado “soft power”, a um recurso crescente à disseminação da sua presença militar e à diluição da sua liderança em quadros formais e multilaterais de actução. Daí a importância da NATO no dispositivo militar estratégico do capitalismo ocidental.

  • Os pontos fortes que os EUA têm neste largo tabuleiro são vários. Um é a Turquia, que domina historicamente os estreitos entre o mar Negro e o Egeu mas, que vem procurando manter uma grande autonomia estratégia onde as relações e o armamento norte-americano ou a amizade com Israel são temperados pela boa relação com o Irão e a recusa no apoio aos EUA na invasão do Iraque;
  • Outro é a fortaleza israelita cuja relevância no policiamento do Médio Oriente obriga os EUA a tolerar o genocídio palestiniano, ganhando em contrapartida, o anti-americanismo da “rua árabe”; a mostrar-se distraido com a proliferação nuclear protagonizda por Israel; a englobar este último em projectos alternativos de condução do petróleo de Ceihan até Eilath, porto israelita no mar Vermelho, evitando assim o Suez para a ligação entre o Índico e o Mediterrâneo;
  • O poder militar dá aos EUA e à NATO grandes vantagens no domínio aero-naval à escala global, com um sistema logístico em fase de adaptação, no sentido da maior mobilidade, com a utilização de uma vasta rede de bases, onde estacionam soldados e equipamentos em estado de elevada prontidão e maleabilidade táctica;
  • Do ponto de vista estritamente político-ideológico, a administração Obama abandonou as teses xenófobas de Huntington sobre os choques de civilizações, onde o inimigo se centrava no mundo islâmico e nos países de cultura cristã ortodoxa. Vem-se assistindo, por um lado, a tentativas várias de cooptação da Rússia para a estratégia ocidental, com o abandono da construção do escudo de mísseis na Europa de Leste, o envolvimento no isolamento do Irão, no patrulhamento dos mares da Somália, o que é susceptível de agradar à UE, pouco interessada em crispações com o seu grande fornecedor de energia. E, simultaneamente, dividir a OCX que congrega a Rússia, a China, os países da Ásia Central e que tem como observadores interessados a Índia e o Irão. Por outro lado, procura-se estabelecer uma dicotomia entre os muçulmanos moderados e os jihadistas, os terroristas, os fundamentalistas, com óbvios propósitos de aliciamento de uns contra os outros, mesmo que não sejam claras as fronteiras entre ambos os segmentos;
  • Grande parte do comércio mundial circula pelo Índico e liga a Ásia Oriental (Japão, China…) à Europa – sem referir origens/destinos intermédios como a África do Norte e a Oriental ou a Ásia do Sul - através de um conjunto de fieiras ou, de modo mais explícito, por estreitos. Do mesmo modo e apesar da crescente existência de alternativas, o petróleo do Médio Oriente é encaminhado para o Extremo Oriente e para a Europa através dos mesmos estreitos, que se tornam portanto fulcrais, pontos de potenciais estrangulamentos. Sucede, que essas vias são vitais para a Europa, para a Ásia Oriental e mesmo do Sul (caso da Índia), com fortes relações comerciais entre si e como se disse, devido ao abastecimento de energia. Porém, não o são tanto para os EUA que, assumindo o seu controlo, detêm em permanência, instrumentos determinantes para a (des)estabilização económica de aliados, amigos e menos amigos. O interesse nacional dos EUA é quem mais ordena;
  • De facto, as ligações entre os EUA e o Extremo Oriente, como com a Europa, não passam pelo Índico e, por outro lado, o país, no capítulo do petróleo tem vindo a aumentar a parcela de proveniências situadas na costa atlântica de África para além da Venezuela e México, no continente americano, reduzindo, portanto, a dependência do Médio Oriente;
  • O controlo do Índico e dos seus estreitos é vital para todo o sistema global de transportes marítimos. Em 1510, Afonso de Albuquerque, segundo vice-rei português da Índia, tentou controlar a navegação no Índico – a expensas de turcos, persas e indianos -  conquistando Ormuz (entrada do Golfo Pérsico), Malaca (entrada no respectivo estreito) faltando-lhe a tomada de Aden para dominar a entrada no mar Vermelho (Bab el Mandeb). Mais tarde, os ingleses conseguiram esse desiderato, que durou até à descolonização;
  • Actualmente, o dispositivo militar norte-americano no que se refere ao Bab el Mandeb, está presente no Djibouti podendo evoluir para uma instalação no Yémen a partir do conflito interno existente neste país; e patrulha o mar contíguo, a pretexto dos denominados “piratas somalis”, em parceria com outros países, da NATO ou não. Nas imediações do estreito de Ormuz, os EUA detêm o Kuwait onde mantêm grande número de instalações, têm o exército fortemente presente no Iraque e no Afeganistão, bases militares na Arábia Saudita (Dharam, que, por coincidência se situa muito próxima do importante terminal petrolífero de Ras Tanura), Bahrein, Qatar (al-Ubaid) e Oman. Finalmente, o estreito de Malaca dada a vulnerabilidade morfológica e a existência de piratas menos mediatizados é patrulhado pela marinha americana em parceria com a Índia, e o forte apoio logístico de Singapura. Para se aquilatar a fragilidade de todo este sistema, poder-se-á imaginar o impacto no bloqueio do estreito de Malaca, susceptivel de aumentar 10/12 dias a viagem de um navio vindo do Índico para o Japão.
Quais cerejas a encimar este bolo, refiram-se a V Esquadra e a base estratégica de Diego Garcia, bem plantada no centro do oceano Índico e de onde foi expulsa a população, nos anos 70;

·        Há, naturalmente e em crescimento, fraquezas estratégicas para o Pentágono e os seus aliados da NATO. O objectivo de isolamento da Rússia, proposto durante a administração Bush, falhou, apesar da absorção da Europa de Leste pela NATO, do desmembramento da Jugoslávia, da “independência” do Kosovo (inventada para albergar a grande base de Bolsdteel, a “pequena Guantanamo”, para controlo dos Balcãs) e das “revoluções laranja” na Ucrânia e na Geórgia. A Rússia continua a fornecer a Europa de energia, vem diversificando esses canais com ligações directas através do Báltico e de Murmansk, evitando a Ucrânia; garantiu a utilização dos seus oleodutos para os hidrocarbonetos cazaques e turcomenos; participa numa aliança económico-militar – a OCX – que engloba uma enorme massa geográfica, rica em petróleo e gás, que inclui o dinamismo chinês, os capitais chineses e russos, o maior exército do mundo e o arsenal nuclear russo;

·      As invasões do Iraque e do Afeganistão estão longe de serem casos de sucesso para os EUA. No Iraque, a invasão, embora tenha facilitado a entrega da exploração do petróleo iraquiano às multinacionais ocidentais (1) não garantiu a estabilidade da região, aumentou as tensões internas, no Iraque, entre curdos, sunitas e xiitas e o oráculo parece pouco optimista quanto depois da saida do exército americano e dos seus mercenários. A intervenção no Afeganistão, por seu turno, não tem produzido impactos economicamente úteis para os seus promotores, se se excluirem os fornecedores de armas; e a construção de oleodutos através do território afegão para conduzir o petróleo da Ásia central para o Índico, para a Índia e o Paquistão, sem passagens por território iraniano é, cada vez mais uma miragem;

·       Mantém-se a solidez e a estabilidade do Irão que, em vez de isolado, intensifica relações de colaboração com os seus vizinhos. O Irão vai construir um gazoduto para abastecer o Paquistão e porventura a Índia (2) e estabeleceu recentemente uma ligação com o sistema de transporte turcomeno(3). Em paralelo, importa gás turcomeno para consumo próprio e para abastecimento da Turquia e tornou-se importador de gás azeri, num jogo de compensações que minimiza o transporte de um produto homogéneo, promovendo as suas exportações por mar;

·         A China estabeleceu ligações de abastecimento de gás e petróleo com a Rússia, o Cazaquistão e o Turcomenistão, por via terrestre e vai abrir-se uma nova oportunidade com a exportação russa pelo porto de Nakhodka, no Extremo Oriente russo e da Sakalina que também poderá tornar o Japão menos dependente dos petroleiros vindos do sul. Por seu turno, o mesmo Turquemenistão, que detém as quartas maiores reservas mundiais de gás dedicou as suas exportações à Rússia, à China e ao Irão. Em contrapartida, os EUA dedicam à China a atenção necessária para qualquer bloqueio naval, mantendo 100000 soldados no Japão e na Coreia do Sul, a VII Esquadra, Okinawa e Singapura, garantido que está o apoio de Taiwan, estudando ainda a possibilidade de retornar a Cam Rahn, no Vietnam que tão más recordações lhes trarão;

·         Finalmente, o deficit orçamental norte-americano é enorme e redunda num endividamento que, só perante a China e o Japão, orça os $1,5 biliões, a que se devem somar juros anuais de $ 250000 M. Para tal contribui devidamente o orçamento militar que é de $ 1bilião onde sobressaem $ 880000 M para o Pentágono mas, que exclui os programas militares secretos ($ 70000 M), a ajuda militar ao estrangeiro, nomeadamente ao Egipto, a Israel e ao Paquistão, a contratação de 225 000 elementos a empresas de serviços militares, os custos com os veteranos e os $ 75000 M com os 16 serviços de informações. Só as guerras no Iraque e no Afeganistão custarão em 2010 $ 200/250000 M, enquanto o recente reforço de 30000 homens decretado por Obama para o Afeganistão, constituirá um esforço financeiro superior a todo o orçamento de defesa de um país como a Alemanha (4).

Um balanço entre esta síntese de pontos fortes e pontos fracos do Pentágono, da NATO e da estratégia de domínio norte-americano no mundo, centrado nos aspectos geopolíticos e militares não é nem nunca seria satisfatório para os seus promotores. As dificuldades económicas e financeiras dos EUA e dos países chamados desenvolvidos, a braços com graves problemas de desemprego, incremento da pobreza, desvalorização do trabalho, deficits e estagnação, aliados à ausência de credibilidade do sistema político e dos seus mandarins, não favorecem a resolução dos problemas globais de acordo com as suas messiânicas expectativas.

A substituição do postulado do choque de civilizações por um outro, mais subtil “choque de valores” (5), não altera os objectivos de domínio da Humanidade e de apropriação dos recursos do planeta. Julgavam os ingénuos que a tecla dos direitos humanos tocada por Reagan tinha ficado enferrujada com os escândalos de Abu Ghraib, Guantanamo, Kunduz, etc e por isso, soa a falso e ofensivo que os governos dos EUA e dos seus ajudantes falem ao mundo de valores.

As dificuldades estratégicas dos EUA, do Pentágono e da NATO não farão recuar – antes pelo contrário - os seus responsáveis perante o recurso à guerra, à tortura, à pulverização de cidades e aldeias, ao desalojamento de populações, ao onerar inaudito dos cidadãos europeus e norte-americanos com os custos e os riscos inerentes à tal guerra infinita, decretada por Bush, qual animal enraivecido, perante os fumos das Torres Gêmeas. Somente a luta dos trabalhadores, a sua interacção e organização contra a guerra, o militarismo e os sistemas militares-industriais pode travar a deriva guerreira; e isso só pode ser definido como um objectivo humanitário se enquadrado na luta pela democracia e pelo extirpar do capitalismo.


2 - O volume dos gastos militares

O volume dos gastos militares é um indicador elementar mas, bastante esclarecedor dos ónus que os povos suportam com os respectivos dispositivos militares. O Quadro I, adiante exposto, contempla o custo dos gastos militares por habitante, em comparação com a contribuição média de cada cidadão para a formação da riqueza, para os anos de 1998 e 2008. Essa análise inclui todos os países da NATO, os países neutrais da Europa e Israel, tendo em conta a total integração deste último no dispositivo militar-estratégico ocidental.

           Quadro I – Gastos per capita com a defesa e capitação do PIB ($ de 2005)

1998
2008
Defesa/PIB (%)
Defesa
PIB
Defesa
PIB
1998
2008
Albânia
19
3.767
62
7.160
0,51
0,87
Alemanha
499
29.074
451
33.714
1,72
1,34
Áustria    *
340
29.721
336
36.037
1,14
0,93
Belgica
447
28.411
415
33.605
1,57
1,23
Bulgária
65
6.319
93
11.239
1,02
0,83
Canadá
369
29.902
494
36.077
1,23
1,37
Chipre     *
844
21.101
486
26.453
4,00
1,84
Croácia
411
11.951
204
17.520
3,44
1,16
Dinamarca
698
30.016
651
34.140
2,33
1,91
Eslováquia
138
12.538
168
20.518
1,10
0,82
Eslovénia
198
17.990
337
27.188
1,10
1,24
Espanha
263
23.148
332
28.313
1,13
1,17
Estonia
62
9.956
273
18.882
0,62
1,45
EUA
1.162
37.238
1.771
43.671
3,12
4,05
Finlândia    *
472
25.073
527
33.596
1,88
1,57
França
833
26.704
827
30.624
3,12
2,70
Grã-Bretanha
813
27.714
941
34.061
2,93
2,76
Grécia
724
19.134
871
27.124
3,78
3,21
Holanda
576
31.402
601
38.078
1,84
1,58
Hungria
119
12.563
135
17.997
0,94
0,75
Irlanda     *
283
27.354
275
39.115
1,03
0,70
Israel
1.543
21.535
1.752
25.353
7,17
6,91
Islândia
0
28.251
0
36.209
0,00
0,00
Italia
535
26.360
545
28.272
2,03
1,93
Letónia
23
7.607
176
15.597
0,31
1,13
Lituânia
59
9.188
153
17.571
0,65
0,87
Malta     *
100
18.000
96
22.426
0,56
0,43
Noruega
1.010
41.979
1.026
49.072
2,41
2,09
Polónia
132
10.833
195
16.440
1,22
1,18
Portugal
317
19.086
355
21.194
1,66
1,67
Rep Checa
182
16.042
199
23.211
1,13
0,86
Roménia
85
6.792
102
11.704
1,25
0,87
Suécia     *
672
26.599
571
33.610
2,53
1,70
Turquia
225
9.702
156
12.408
2,32
1,26


Crescimento

Decrescimento
           * Paises da UE não pertencentes à NATO                        
                                             Fonte: SIPRI - Stockholm International Peace Research Institute

Sublinhe-se, em primeiro lugar, que a Islândia é o único destes países sem forças armadas formais, desde 1859, embora pertença à NATO e mantenha acordos de segurança com países daquela organização, como os EUA, a Dinamarca e a Noruega, entre outros. A base de Keflavik esteve na posse dos EUA em 1951-2006 onde estava aquartelado o Icelandic Defense Force; essa base é agora mantida pela Agência de Defesa Islandesa.

Os países onde os gastos militares por habitante são mais elevados – EUA, Israel e Noruega - são os mesmos nos dois anos considerados. Os EUA, como consequência do aumento de 52.3% relacionado com a ocupação do Médio Oriente, ultrapassaram em 2008, Israel, no primeiro lugar, apesar de este último ser, em permanência, uma entidade em guerra.

Outros casos de grande crescimento da capitação dos gastos militares são os países do Báltico e do leste europeu, antes integrados no Pacto de Varsóvia e que hoje, rearmam as suas forças armadas, nomeadamente, substituindo armamento da antiga URSS, por armas fabricadas nos países ocidentais, no âmbito da sua recente inserção no quadro da NATO.

Embora nenhum país tenha reduzido o valor da capitação do PIB – dados de 2009 retirarão cabimento a esta afirmação como resultado da crise – o volume das despesas militares por habitante regrediu em onze países. São eles – Alemanha, Áustria, Bélgica, Chipre, Croácia, Dinamarca, França, Irlanda, Malta, Suécia e Turquia.

Para tal facto, contribuem distintos elementos justificativos. No Norte da Europa, a deslocação do eixo de conflitualidade da NATO para sul, para o Mediterrâneo e a contestação dos activos movimentos pacifistas e anti-militaristas ali existentes motivaram essa evolução; no caso da Croácia trata-se do fim da guerra nos Balcãs; na Turquia, as causas revelam-se na redução do tradicional papel das forças armadas enquanto tutelares do poder, na menor conflitualidade no Curdistão e na forte presença militar dos EUA que, assim, substituem, parcialmente, o gasto turco com a defesa; finalmente, no caso de Chipre, estando integrado na UE e embora não pertença à NATO, sentir-se-á mais seguro, nomeadamente face a uma ameaça turca que, por sua vez estará mitigada pelo desejo turco de integração na UE.

A parcela do produto de cada país destinado à defesa é mais elevada em Israel, com 7.17% em 1998, decaindo ligeiramente para 6.91% em 2008. Em segundo lugar, posicionam-se os EUA cuja mobilização de recursos cresceu em 2008, quase um ponto percentual relativamente a dez anos antes. E, em terceiro lugar, posiciona-se a Grécia com 3.21% em 2008, o que, legitimamente, coloca a questão do contributo de continuados e astronómicos gastos militares, para as actuais dificuldades financeiras do Estado grego.

Registou-se uma redução do peso dos gastos militares na capitação do PIB em 24 países, sendo mais notáveis os decréscimos observados na Croácia, em Chipre e na Turquia, pelas razões já atrás expressas. Desse total de 24 países existem 11 onde o facto é concomitante com a redução do próprio gasto militar por habitante, independentemente da consideração do PIB. Nos restantes, o peso da despesa militar no PIB reduz-se, a despeito do aumento, em alguns casos substancial, da parcela que onera cada cidadão.

Em nove paises – Albânia, Canadá, Eslovénia, Espanha, Estónia, EUA, Letónia, Lituânia e Portugal – aumenta, no periodo, o encargo com a defesa no total do PIB, ainda que marginalmente, no caso dos dois países ibéricos.

Se nos outros casos, as razões já foram referidas, em Portugal e Espanha, tendo em conta a ausência de conflitos na sua zona geográfica, tudo indica que se esteja em periodo de acréscimo de militarização da sociedade, de recuperação do “prestígio” das forças armadas. De facto, após a queda das ditaduras, ficou a nu a actuação criminosa das forças armadas peninsulares no apoio ao fascismo e, no caso português, no envolvimento nas guerras coloniais. Está-se actualmente, com a consolidação da direita no poder, numa fase de relegitimação das forças armadas, aproveitando-se o final do serviço militar obrigatório para reafirmar o seu carácter de casta e a postura mais agressiva do Pentágono, em busca de aliados firmes e dóceis. Por outro lado, a enorme taxa de desemprego entre os jovens, cria uma larga base social de recrutamento para esse mercenariato que, contudo não deixa de estar marcado pela precariedade. No caso da Espanha e, tendo em conta a extensão da sua costa e águas territoriais no Mediterrâneo, a grande proximidade física com a África e as fortes relações com o Magreb, a questão do rearmamento e do reforço dos militares tem, no contexto militarista, mais justificação do que no periférico Portugal.

Entre todos os países incluidos, existem seis em que o crescimento da capitação dos gastos militares é superior à do aumento do PIB por habitante, no periodo 1998/2008:

                                                                                    variação em %

Gastos militares
 PIB
Canadá
33.8
20.7
Eslovénia
69.8
51.1
EUA
52.3
17.3
Letónia
654.8
105.0
Lituânia
157.2
91.2
Portugal
11.9
11.0

Os gastos militares globais dos EUA são da ordem de 1 bilião de dólares e  correspondem a metade da despesa mundial nessa área; se se juntarem os seus aliados da NATO e o Japão, a participação no total, desse conjunto aumenta para 75%. Somente as guerras no Iraque e no Afeganistão, no tempo de Bush, para além do endividamento que as tornou possíveis, envolveram um custo de  $ 25000 a cada família norte-americana (4)(6).


3 - A dimensão das forças armadas

Nem sempre se conhecem com rigor os números dos elementos das forças armadas, havendo várias razões para esse efeito. O primeiro é o sigilo que os Estados gostam de manter sobre esse tema, bem no cerne do seu ADN, considerado elemento garante da soberania. Em segundo lugar, há várias concepções que podem ou não envolver os elementos na reserva, corpos paramilitares, guardas pretorianas dos regimes, que podem volumes muito significativos. Essas situações colocam várias reservas às comparações internacionais, avolumadas com as diferenças, por vezes de vários anos, das datas a que os dados se referem.

A título de exemplo, no que se refere a elementos paramilitares, cima dos 400 mil em 2008, registavam-se seis países, no caso do principal – o Irão – com números impressionantes (7):
                                                                                                                     1000
Irão
11 390 
Venezuela
600
China
3 969 
EUA
453
Índia
1 293
Egipto
405
                             
Cruzando várias fontes de informação (8), construiu-se o quadro II que inclui o número de militares no activo, na generalidade, em 2008, indicadores como o número de militares no activo por 1000 habitantes ou, o gasto por cada militar no activo, no mesmo ano, com a comparação dos elementos relativos aos países da NATO, aos da UE que não pertencem aquela organização militar e um conjunto de outros países com forças armadas de grande dimensão.

Quadro II - Número de militares no activo (aprox. 2008)


Nº Militares (1000)
Nº militares/1000 hab
Gasto militar/militar ($ 2005)


Mundo  (estim)
19.669
-
-

Albânia
10
3,1
20

Alemanha
285
3,4
131

Áustria
35
4,1
81

Bélgica
39
3,8
110

Bulgaria
39
5,1
18

Canadá
62
1,9
257

Chipre
10
11,7
42

Croácia
20
4,4
46

Dinamarca
23
4,2
155

Eslováquia
26
4,9
35

Eslovénia
9
4,5
75

Espanha
177
4,0
83

Estónia
5
3,7
73

EUA
1.474
4,8
372

Finlândia
32
6,0
87

França
225
3,5
234

GB
195
3,2
294

Grécia
177
15,9
55

Holanda
53
3,2
186

Hungria
33
3,3
41

Irlanda
10
2,4
113

Itália
240
4,1
134

Letónia
6
2,4
73

Lituânia
14
4,0
38

Luxemburgo
1
1,9
352

Malta
2
5,3
18

Noruega
28
5,9
175

Polónia
155
4,1
48

Portugal
45
4,2
84

Rep Checa
57
5,6
35

Roménia
90
4,2
24

Suécia
34
3,7
154

Turquia
514
6,9
23

Brasil
287
1,5
54

China
2.255
1,7
28

Coreia do Sul
687
14,2
35

Egipto
450
6,0
6

Índia
1.325
1,1
19

Irão
545
7,7
11

Israel
187
27,0
65

Japão
239
1,9
179

Paquistão
650
4,0
6

Russia
1.245
8,7
31

Ucrânia
149
3,2
22

Vietnam
484
5,5
3

Restantes (estim)
7.042
-
-


Calcula-se que na totalidade, o número de militares das forças armadas no activo se situe entre 19/20 milhões de elementos. Nesse total, os quatro países com mais de um milhão de soldados  – China, EUA, Rússia e Índia – representam perto de um terço (32%) dos efectivos.

Quanto às forças armadas dos EUA há a destacar que, além da natural presença no seu próprio território, estão disseminadas por 750 bases militares espalhadas por cinquenta países. Este aparelho logístico, esta rede integrada e gerida pelo Pentágono, dota este de um poder estratégico e táctico que é único no mundo e que torna todos os seres humanos e o ambiente global dependentes da sua permanente ameaça de destruição.

O segundo corpo militar mais numeroso da NATO pertence à Turquia, cujo efectivo apresenta uma dimensão que se situa num mesmo patamar da Coreia do Sul e do Paquistão (quinto e sexto, respectivamente, na hierarquia mundial) e do Irão, logo seguidos pelo Vietnam e pelo Egipto.

Nos restantes países da NATO a dimensão das forças armadas é muito heterogénea, nem sempre apresentando uma grande proporcionalidade com a população do país. Os casos mais assombrosos são Israel (aqui equiparado a membro da NATO) e caso único de verdadeira ordem militar, bem como a Grécia, com um enorme efectivo militar, cujo volume não parece ter sido posto em causa pelos guardiães dos “mercados”, muito mais motivados para sacrificar trabalhadores e pobres.

Quando se avalia o numero de militares por cada 1000 habitantes, para além dos referidos atrás, Israel e Grécia, sobressaem ainda a Coreia do Sul e Chipre, todos com mais de 1% da população nas fileiras. Em Israel chegam mesmo a 2.7% o que, na realidade será mais se se atender a que a população árabe, constitui um grande segmento populacional, afastado da participação nas forças armadas da entidade sionista e de uma integral cidadania.

Entre os países da NATO ou europeus neutrais destacam-se pelos seus elevados ratios (> 5.0, isto é > 0.5% da população) - Turquia, Finlândia, Noruega, República Checa, Malta e Bulgária. O mesmo sucedendo a outros, como a Rússia (herdeira da superpotência URSS), o Irão e o Egipto, bem inseridos no arco de instabilidade que atravessa o Médio Oriente, no centro da encarniçada disputa pelo domínio dos combustíveis fósseis.

Entre os países da NATO ou neutrais da UE as situações de menor peso relativo do corpo militar, no conjunto da população, registam-se no Canadá e no Luxemburgo (1.9). Note-se que esses indicadores são mesmo menores em países de grande população como a Índia (1.1), o Brasil, a China e o Japão.

O custo unitário de cada militar é particularmente elevado nos EUA, que possuem as forças militares mais poderosas do planeta, largamente munidas de meios tecnológicos de fazer a guerra. Nesse capítulo da tecnologia, note-se o papel que vai sendo atribuido aos “drones”, aviões sem piloto, telecomandados de terra, por civis contratados pelo Estado norte-americano. Também o Luxemburgo, Estado minúsculo mas cofre-forte de grande relevância para o sistema financeiro, apresenta um elevado custo unitário por cada militar.

Num segundo plano, posicionam-se a Grã-Bretanha e a França, subimperialismos, ex-potências coloniais e detentoras de armas nucleares. Todos os países mais desenvolvidos têm um custo elevado por militar superior a $-100, exceptuando a Áustria e a Finlândia que não são membros da NATO.

Entre os países com forças armadas acima dos 100 mil efectivos, somente os EUA, a França, a Grã-Bretanha, a Itália e o Japão têm custos unitários por militar acima dos $ 100. Por seu turno, fora do quadro da NATO, apenas o Japão, a Suécia e a Irlanda ultrapassam aquele valor, sublinhando-se que, os dois últimos são os únicos com menos de dez milhões de habitantes.

Inversamente, os mais baixos custos por militar observam-se particularmente entre as forças armadas de grande dimensão e simultaneamente de menor riqueza, indiciando a sua dificuldade em adquirir os caros equipamentos que estão disponíveis para os países ricos. Por outro lado, sendo a mão de obra abundante e barata e o subemprego elevado, é conveniente a manutenção de grandes exércitos para ocupação de gente. Do ponto de vista estritamente económico, tem mais impacto no PIB o incentivo ao consumo interno com o pagamento de salários aos militares, do que importar equipamentos caríssimos (com a saída de divisas) e fazer aumentar o desemprego nem ganhar competências técnicas. O problema surge quando existe um conflito aberto que obriga à aquisição desses equipamentos sem a redução dois efectivos,

Quer nos países com forças armadas numerosas e baixo índice de incorporação tecnológica, quer naqueles onde se observa a situação inversa, há sempre uma casta militar que pode dominar a vida política ou constituir-se como verdadeiro estado dentro do Estado, como nos casos do Paquistão, de Israel ou dos EUA, onde a autonomia do Pentágono é tal que impõe ao presidente as suas próprias escolhas na liderança.

A dimensão humana de um exército não é determinante numa época em que a tecnologia aplicada ao armamento é, em regra, objecto de especiais atenções no capítulo da inovação e para a qual os Estados não regateiam financiamentos. São conhecidos os casos em que certas inovações tecnológicas começaram por ter, na base e no objectivo, uma aplicação militar, antes da sua utilização pelo mundo em geral, sendo a internet o caso mais conhecido. Nesse contexto, a dimensão em termos humanos de umas forças armadas, dentro de determinadas proporções, pouco informa sobre o potencial destrutivo, a mobilidade e o grau de prontidão desse efectivo militar. Como se sabe, o exercito iraquiano, quando da invasão norte-americana, em 2003, tinha um efectivo humano muito superior ao dos “aliados” e isso foi manifestamente insuficiente para fazer frente ao poder de fogo e de uso da tecnologia das hordas do Pentágono.

Se um efectivo militar pertence a um país desenvolvido, a priori estará munido de equipamentos sofisticados e caros, com utilizadores bem industriados e com elevada capacidade técnica para manejar equipamentos complexos. Essa elevada componente técnica é uma das razões para se irem extinguindo os regimes de recrutamento baseados no serviço militar obrigatório (SMO), por lapsos de tempo curtos (até dois anos), insusceptíveis de gerar experiências acumuladas no manejo desses equipamentos. Aliás, mesmo no tempo do SMO, certas especialidades, mormente na marinha e na aviação, eram objecto de um recrutamento específico, com horizontes largos de permanência e por – entre outras - razões técnicas. Por outro lado, é do interesse dos governos e do poder capitalista, a existência de uma casta militar estável e fiável que, em articulação com as polícias proceda à mescla de funções necessária ao controlo biopolítico da multidão.

Essa fusão de funções militares e policiais está bem expressa na doutrina da NATO, com a validação aprazada do seu novo catecismo – Novo Conceito Estratégico – para Novembro próximo, em Lisboa. Quando se incluem nas preocupações da NATO problemas de migrações clandestinas, exige-se uma integração com as polícias de fronteira; quando a organização pretende incluir nos seus objectivos o crime organizado, o narcotráfego ou a actuação dos “hackers”, obriga-se a exercer actividades de polícia criminal.

Neste contexto, a defesa de um retorno ao SMO é uma sementeira de ilusões. Primeiro, porque a actual forma de domínio biopolítico das sociedades faz da integração entre polícias e militares uma das questões essenciais para o prolongamento da vida do capitalismo e a defesa do SMO, tem algo de paralelo, com a criação da Icaria, no século XIX. Por outro lado, mesmo os exércitos baseados no SMO, só raras vezes foram protagonistas de intervenções progressistas na vida dos povos; a estrutura hierárquica e o autoritarismo existente nas fileiras não favorece a colocação dos soldados ao lado do povo, sem um apoio significativo da oficialidade. Como se sabe, o 25 de Abril português foi determinado pela baixa oficialidade, naturalmente, com a adesão entusiástica dos soldados. Em regra, as transformações sociais profundas passam pelo desmantelamento dos exércitos; ainda que, lastimavelmente, com a edificação de outros, que se lhe substituem, com o mesmo espírito e vícios de casta.

Por outro lado, em contexto de globalização, de fronteiras abertas, de integração económica e política dos países em grupos geoestratégicos de geometria variável, do domínio das multinacionais, de aposta deliberada no “mercado global”, nas exportações, a defesa do mercado interno – a nação - como coutada defendida por guerreiros devotados e patriotas, acabou. As burguesias nacionais acham-se desarmadas para a defesa da “coesão nacional” como justificação para as suas forças armadas, uma vez que o poder, no essencial, cabe a instituições regionalizadas ou mundializadas.

Nesse sentido, as forças armadas, como factores dessa coesão nacional já não são necessárias, subalternizado que está o conceito de pátria perante a integração regional ou dos mercados, se se preferir. Para as populações, contudo, ainda se brande a carta nacionalista e uma tradição de defesa da pátria, cada vez mais descabida e em contradição com a grande interconectividade entre os povos, com as viagens frequentes, os fluxos migratórios, as trocas de informação na internet, etc.

Mais do que nunca é clara a partição social entre uma classe mundial dos capitalistas, com múltiplas instâncias de coordenação nos campos político, económico, financeiro… e militar; e a esmagadora maioria da Humanidade que é pretendida como laboriosa, qualificada e, através do controlo biopolítico global, mansa e resignada, mesmo quando os níveis de subsistência baixam ao ponto da inclusão em programas implícitos de genocídio.

O capitalismo globalizado precisa, portanto, de uma força militar também globalizada, hierarquizada e hierarquizante para estabelecer a autoridade do capital perante os desmandos da sua existência – conflitos internacionais, crises sociais, “terrorismo”, migrações clandestinas, cibercrime, “pirataria”, problemas ambientais, segurança das vias de comunicação, crime organizado, narcotráfego e outros negócios afins, defesa da “democracia”, etc. Essa força, que está em edificação e reforço doutrinário, dos meios disponíveis e de organização, está também em fase de construção de novas formas de instalação e actuação a nivel territorial.

Esse poder militar global precisa de centuriões nas fronteiras e de agentes regionais e locais, da mesma forma que a existência de um comando distrital da polícia não dispensa a existência de esquadras de bairro para garantia da lei e da ordem. Por isso, num plano global, o capitalismo exige a presença de castas militares localizadas mas, integradas e mobilizáveis no seio de uma NATO reformulada, às ordens de um poder unificador, o Pentágono; o Novo Conceito Estratégico é a forma dessa reformulação.

4 - O armamento dos principais paises

Mantém-se neste capítulo a ausência de dados sistematizados sobre o armamento das forças armadas, naturalmente, fazendo parte das políticas de sigilo levadas a cabo pelos Estados. Esse sigilo, de facto, deve dirigir-se aos povos, uma vez que os serviços secretos fornecerão aos estados-maiores as informações necessárias sobre os potenciais inimigos e rivais, para efeito de dimensionamento dos seus recursos humanos, materiais e logísticos, de planeamento operacional e de aquisições. Convém recordar que é bastante comum, nas aquisições, a corrupção das altas patentes, a ligação interessada destas aos grandes grupos fornecedores; e, estes, raramente regateiam essas comissões dada a concorrência e o elevado valor das encomendas. O episódio que relaciona a Ferrostaal, o cônsul de Portugal em Munique e os submarinos é ilustrativo… e ainda se não conhecem muitos dos pormenores e intervenientes.

O quadro seguinte (Quadro III) evidencia, quantificando, os principais elementos dos arsenais guerreiros dos principais países do planeta e apurando, em particular, o poder destrutivo da NATO. A especificação é feita para aviões, helicópteros, tanques, navios e submarinos (9).

                    Quadro III - Meios militares dos principais países        periodo 2001-2008
        
Aviões
Helicópteros
Tanques
Navios
Submarinos
Alemanha
350
748
5.699
130
13
Canadá
399
168
2.194
34
4
Dinamarca
161
40
nd
51
4
Espanha
691
311
2.869
90
8
EUA
18.169
4.593
29.920
1.559
75
França
1.023
892
8.536
134
10
Grã-Bretanha
1.891
779
5.121
139
17
Grécia
847
218
4.403
118
8
Italia
1.594
716
3.355
107
7
Noruega
141
66
nd
45
6
Polónia
807
291
nd
87
4
Suécia   
744
150
540
77
9
Turquia
1.199
336
6.672
182
13
Brasil
1.272
372
1.676
89
5
China
1.900
491
31.300
760
68
Coreia do Sul
538
502
8.325
85
20
Egipto
1.230
243
9.357
93
4
Índia
1.007
240
10.340
143
18
Irão
84
84
5.449
65
3
Israel
1.230
386
14.200
18
3
Japão
1.957
745
2.040
147
18
Paquistão
710
198
3.919
33
11
Russia
3.888
2.625
79.985
526
61
Ucrânia
2.451
743
nd
46
1

NATO
27.272
9.158
68.769
2.676
169
Restantes
17.011
6.779
167.131
2.082
221
                                                                                                                
Entre as forças aéreas presentes no quadro a dimensão das flotilhas dos países da NATO é muito superior à dos restantes países que, para mais não pertencem a um mesmo bloco militar, nem podem tirar as vantagens da homogeneidade do equipamento. E, neste campo, essa supremacia numérica é mais elevada do que nos outros tipos de máquinas de guerra.

A força aérea dos EUA, isolada, sem a consideração dos outros aliados da NATO é superior à soma dos outros países considerados, não aderentes à NATO. Essa superioridade aérea é possível por várias razões. Primeiro, pelo domínio da tecnologia, mormente detida por três empresas – Boeing, Lockheed-Martin e Northrop Grumman; depois, pela constante pesquisa e inovação, sob encomenda do Pentágono, que tem uma imensa autonomia no seio da administração norte-americana, a qual não lhe regateia verbas orçamentais; pela existência de uma economia poderosa mantida pela facilidade de recurso ao crédito (emissão de dólares) que mais nenhum país detém; finalmente, pela determinação em manter uma hegemonia militar a nível mundial que obriga os EUA a considerar o resto do planeta como existentes para a satisfação “dos interesses nacionais dos EUA”, nomeadamente no campo energético.

A força aérea dos EUA, pela sua dimensão, a sua mobilidade, os vários pontos de apoio espalhados pelo mundo é o principal instrumento da hegemonia norte-americana a nível planetário.

Nos outros lugares do pódio no que respeita à aviação situam-se a Rússia e a Ucrânia, embora no caso desta última, o equipamento deva ser antigo e as dificuldades económicas do país não permitirem a sua renovação.

Num mesmo patamar quantitativo, encontram-se o Japão, a China, a Grã-Bretanha e a Itália, havendo ainda mais seis Estados com mais de mil aviões de guerra. A frota israelita, enorme para a sua dimensão territorial e humana revela o seu papel de fortaleza, de ameaça permanente a todos os povos do Médio Oriente e do Mediterrâneo Oriental; e que lhe permite ter bombardeado sem punição, nos anos 80, a central nuclear iraquiana de Osirak e ansiar pela autorização dos EUA para fazer o mesmo no Irão, com consequências desastrosas para a região e nos preços da energia… o que não conviria em tempos de recessão.

No que se refere aos helicópteros, a superioridade dos países da NATO é também elevada, embora menor do que nos aviões de combate. Sendo o helicóptero uma arma táctica, desempenha uma função mais localizada e, portanto, não é um elemento de domínio estratégico.

Note-se que os EUA, detendo de longe o principal efectivo de helicópteros, detêm nos aviões uma superioridade que, em relação à Rússia é de 4.7/1, a qual se reduz para 1.8/1 nos helicópteros. Num patamar bem mais baixo do que o das superpotências militares, com 700/800 aparelhos, destacam-se a Grã-Bretanha, a Alemanha, o Japão, a Ucrânia e a Itália. Provavelmente, a posição da Ucrânia tenderá a baixar, na hierarquia das máquinas de guerra, à medida que se vá diluindo a herança soviética.

É bem patente nos dados apresentados, relativos a 2006, a relevância dos meios aéreos do Irão, bem longe do que sobressai da propaganda norte-americana que, perante os factos, revela que a “ameaça” iraniana dá pelo nome de recursos energéticos, há mais de trinta anos cobiçados pelo Pentágono.

Já no que se refere aos tanques, a NATO não dispõe da superioridade observada atrás, detendo com os restantes países uma relação de 4/10, devendo-se isso aos grandes parques que, particularmente, a Rússia e a China detêm. Estes, tratando-se de países com carácter continental, com longas e remotas fronteiras, e algumas disputas fronteiriças (caso da China com a Índia e a questão de Taiwan), supostamente, tenderão a exigir um elemento dissuassor adequado para os seus exércitos.

Também no âmbito da NATO, os EUA deixam de ter a maioria absoluta destes veículos mas, mesmo assim, com um volume superior à soma dos maiores detentores seguintes – França, Turquia, Alemanha e Grã-Bretanha.

Uma vez mais, Israel surge em grande destaque, situando-se no quarto posto da hierarquia mundial, muito acima dos restantes países e, porventura apresentando a maior densidade de tanques por quilómetro quadrado.

No quadro do latente conflito regional entre a Índia e o Paquistão, já protagonistas de várias guerras, a superioridade indiana é patente.

A marinha de guerra, tal como a aviação, constitui um outro instrumento essencial de domínio global, tendo em conta a sua mobilidade e capacidade de destruição. E aí, de novo a NATO surge com uma evidente superioridade relativamente ao conjunto dos restantes países do mundo, embora o seu papel seja reduzido no apoio às tentativas de implantação estratégica dos EUA na Ásia Central; ao contrário da aviação que pode operar sem limitações geográficas, em terra e no mar.

A superioridade naval da NATO, não tendo em consideração a diversidade da composição e a autonomia das frotas, pode aferir-se a partir do facto de que o número de navios da organização superar os pertencentes ao resto do mundo, em 29%.

Por outro lado, os meios navais dos EUA suplantam de modo esmagador os detidos por qualquer outro país e mesmo, quer a soma dos navios russos e chineses, ou o conjunto de todos os aliados da NATO; os EUA detêm 58% das marinhas de guerra do total dos principais países da NATO.

Note-se que marinhas de guerra, historicamente importantes e até dominadoras – caso da Grã-Bretanha, da Alemanha, da França e do Japão – não representam, cada uma delas 9% dos efectivos norte-americanos.

Convirá ainda sublinhar, neste contexto, a enorme concentração de meios navais no Mediterrâneo/Egeu pertencentes à Turquia e à Grécia. Os turcos detêm a quarta maior frota de guerra mundial e a Grécia a décima primeira, estando, decerto, luxos desta natureza presentes nas dificuldades financeiras deste país. Dentro da lógica prevalecente no jogo de espelhos constituido pelo BCE, pelo FMI, pela Comissão Europeia e os obscuros “mercados”, para o combate ao deficit grego, prefere-se reduzir salários e criminalizar os funcionários públicos.

Acredita-se que os almirantes lusos se devem roer de inveja face aos seus congéneres gregos e aguardam ansiosos os submarinos que os farão ultrapassar o patamar de guardas costeiros onde o seu desempenho não tem constituido um caso de sucesso. Ressalva-se o seu valente desempenho no combate às pequenas lanchas, com meia dúzia de homens (“piratas” somalis) para defesa do saque do atum por pesqueiros espanhóis, entre outros. Recorde-se que o almirantado lusitano não frequentava águas do Índico desde a gloriosa fuga, dentro do porto de Pangim, do “Afonso de Albuquerque” - entre navios mercantes ancorados, até encalhar em terra – perante a marinha indiana, no fim da colonização portuguesa de Goa (1961).

Finalmente, o último vector de máquinas de guerra aqui considerado é o dos submarinos. Aqui, a supremacia da NATO é relativa, uma vez que o conjunto das outras frotas supera o total dos submersíveis pertencentes aos países da organização.

Os EUA detêm o maior efectivo de submarinos, seguidos, relativamente de perto, pela China e pela Rússia. No contexto da NATO, os EUA têm apenas 44% dos submersíveis.

Todos os outros Estados possuem 20 ou menos embarcações, com algum destaque para a Coreia do Sul, a Índia, o Japão e a Grã-Bretanha. Uma vez mais se destaca o relevo da Grécia, com um número de unidades pouco consonante com a dimensão económica e populacional do país e cuja integridade não é disputada por nenhum outro Estado.


5 - Empresas produtoras de armamento

O Quadro IV hierarquiza as dez principais empresas mundiais no âmbito do armamento, de acordo com a dimensão das suas vendas nesse sector; e evidencia também, o grau de dependência relativamente às encomendas militares, a rendabilidade do negócio, o volume do emprego e os tipos de equipamentos que produzem.

    Quadro – IV - As principais empresas produtoras de armamento (2007)*

Empresa
País
Vendas de armas
Taxa de lucro (%)
Emprego
Área de produção
$ milhões
% no total da empresa
1
Boeing
EUA
30.480
46
13,4
159.300
1,3,4,9
2
BAE Systems
Grã-Bretanha
29.850
95
6,0
97.500
1,2,3,4,5,6,8
3
Lockheed Martin
EUA
29.400
70
10,3
140.000
1,3,4,9
4
Northrop Grumman
EUA
24.600
77
7,3
122.000
1,3,4,7,8,9
5
General Dynamics
EUA
21.520
79
9,7
83.500
2,3,5,7
6
Raytheon
EUA
19.540
92
7,5
72.100
3,4
7
BAE Systems **
EUA
14.910
100
9,9
51.300
2,3,5,6
8
EADS
UE
13.100
24
(4,7)
116.490
1,3,4,9
9
L-3 Communications
EUA
11.240
81
6,7
64.600
3,7
10
Finmeccanica
Itália
9.850
54
7,2
60.750
1,2,3,4,5,6
11
Thales
França
9.350
56
13,0
61.200
3,4,6
    * Exclui China      ** Subsidiária da BAE Systems (Grã-Bretanha)                            Fonte: SIPRI
                       
                          1 – Aviões                      4 – Mísseis                                             7 - Serviços
                          2 – Artilharia                  5 - Veículos militares                           8 - Navios
                          3 – Electronica              6 - Pequenas armas e munições      9 - Aerospacial

Como se pode verificar, os EUA detêm um grande domínio entre as principais empresas produtoras. A procura de uma posição hegemónica no planeta conduz à manutenção de umas forças armadas poderosíssimas, em regra envolvidas directamente em guerras ou, promovendo-as através de terceiros. Esse facto obriga à existência de um sector doméstico de armamento, garantidamente viabilizado economicamente pelas encomendas do Pentágono, de países subsidiários ou de gangs partidários no poder; e, para o efeito, é alimentada uma vasta rede de recolha de informações, de angariação de agentes, de promoção de actividades corruptas de “procurement” ou “lobbying” no sentido da venda de equipamentos ao exterior e assim garantir a rendabilidade dos capitais investidos. Tudo isto, como exemplo típico do que é o capitalismo real, em nada semelhante ao lirismo do mercado livre, cantado pelos menetréis do neoliberalismo.

O volume de vendas, muito próximo, entre as três primeiras empresas, distancia-se das distantes, apresentando-se a última empresa da lista incluida no Quadro IV, com menos de um terço da facturação dos primeiros: o que revela um elevado grau de concentração do sector a nível mundial.

Todas as empresas cimeiras têm um elevado número de trabalhadores e uma taxa de lucro bastante aceitável. Como se trata de encomendas públicas, em grande parte provenientes dos próprios países em que estão inseridas, a pressão para a baixa de preços não é a que se verifica em outros sectores de actividade. Os Estados sempre foram menos exigentes nos preços que pagam a empresas dos seus respectivos complexos militares-industriais do que com os trabalhadores que nelas trabalham.

Quanto à diversidade da produção, a mais abrangente é a inglesa BAE Systems, com mais uma valência que a norte–americana Northrop Grumman ou a italiana Finmeccanica. Por seu turno, a Raytheon e a L-3 Communications, ambas dos EUA, têm uma actividade concentrada em apenas dois segmentos.

Na lista divulgada pelo SIPRI (10), constam 117 empresas, cujo agrupamento por nacionalidade produz o seguinte resultado:

Alemanha
5
Israel
3
Austrália
2
Itália
9
Canadá
1
Japão
4
Coreia do Sul
6
Noruega
1
Espanha
4
Rússia
7
EUA
48
Singapura
1
Finlândia
1
Suécia
1
França
8
Suiça
1
Grã-Bretanha
11
UE
1
Índia
3
Total
117

Nesse total, 75% estão localizadas em países da NATO e, entre estes, os EUA contribuem com 41%, a que se seguem, a grande distância a Grã-Bretanha, a Itália e a França. O domínio mundial dos EUA na produção de armamentos mantém-se muito marcado, mesmo quando se alarga a listagem a empresas com um volume de vendas na ordem dos $ 500 mil, em 2007.

Em Portugal também existe um conjunto de empresas vocacionadas para, pelo menos parcialmente, exercerem actividade na área da defesa e que se  encontram-se englobadas numa sociedade holding denominada Empordef – Empresa Portuguesa de Defesa, SGPS, SA. Esta empresa, com um capital social de € 141.9 M tem prejuizos acumulados de € 66.2 M, em 2008.

As suas participadas constam do seguinte Quadro V (11):

    Quadro V                                                                                                                                2008

participação (%)
Actividade
Vendas  (M €)
Resultados liquidos do ano(M €)
Arsenal do Alfeite
100
reparação naval
nd
nd
Estal. Nav. Viana Castelo
100
construção naval
129,6
(12,100)
Navalrocha
45
reparação naval
6,2
0,700
IDD
100
desmilitarização de materiais de defesa
2,1
0,25
OGMA
35
manutenção e reparação de aviões
141,5
5,6
Edisoft
30
software
6,1
0,300
EID
31,8
sistemas de comunicação
19,5
1,100
ETI
100
software de simulação
1,9
(0,170)
Portugal Space
83,75
tecnologia espacial
0
(0,010)
Defloc
81
locação
15,0
(0,050)
Defaerloc
100
locação de aviões
0
0,000
OGMA Imobiliária
100
imobiliária
0
(1,350)
Ribeira d'Atalaia
56,58
construção civil
0
(0,700)

Enquanto sector de defesa, este conjunto de empresas apresenta várias características que o debilitam. Algumas das empresas relevantes estão dominadas por interesses privados (e até estrangeiros como no caso da OGMA) que dificilmente se integrarão numa lógica dominada por interesses militares portugueses. Só de modo muito episódico poderão ser produzidos equipamentos militares, não passando algumas empresas de actividades de apoio ou de prestação de serviços. Por outro lado, engloba empresas secundárias num complexo militar, nomeadamente as locadoras e as da área imobiliária ou de construção. Finalmente, poucas valias têm oferecido em fórmulas de contrapartidas na aquisição de equipamentos militares no estrangeiro.

Neste contexto, não é estranho que nas vendas, as de carácter militar apenas representem cerca de 1/3 da facturação global e que a exportação, neste contexto, participe apenas com 54.5%, em 2008.

Facturação em 2008


M €
%
Militar
98,8
32,1
    nacional
45,0
45,5
    exportação
53,8
54,5
Civil
208,9
67,9
    nacional
43,9
21,0
    exportação
165,1
79,0
Total
307,7
100,0
    nacional
88,9
28,9
    exportação
218,9
71,1

E, para finalizar, torna-se compreensível que Portugal não tenha uma só empresa na lista das 117 maiores empresas da área militar e que, portanto seja um importador líquido de equipamentos, como adiante se verá.

6 - Países vendedores de armamento

Segundo o SIPRI, as exportações de armamento acumuladas nos vinte anos que terminaram em 2009 corresponderam a $ 468199 M, a preços constantes de 1990, numa média anual de $ 23410 M e que corresponde a cerca de $78 por ser humano actualmente existente.

Poderá parecer irrisório esse custo para a Humanidade. Porém, convirá sublinhar que se trata de um cômputo que avalia apenas as transações internacionais dos vários componentes dos arsenais dos países, não considerando, portanto, a produção que se destina às forças armadas dos próprios paises produtores. De facto, se os países pobres, desprovidos de relevantes fábricas de armamento, recorrem essencialmente à importação para equipar minimamente os seus muitos e mal pagos soldados, o mesmo não se passa com os países ricos e poderosos que, têm os maiores orçamentos militares, as grandes fábricas de equipamentos sofisticados, como também apresentam forças armadas munidas com alta tecnologia e quadros bem pagos.

Assim, uma enorme proporção da produção de armamento dos países produtores não é objecto de inclusão no comércio internacional, porquanto é absorvida pelos suas forças armadas domésticas, que contribuem largamente para a sua viabilidade económica. Por outro lado, serão consideradas nos valores das transações internacionais, as vendas de equipamentos em segunda mão, que não são protagonizadas pelos fabricantes mas, antes objecto de negócios envolvendo componentes financeiras e políticas nem sempre claros. Para actualizarem e modernizarem as suas forças armadas, os Estados procuram, ao procederem à encomenda de novos equipamentos, colocar os meios obsoletos ao dispor de países com menos suporte financeiro ou interesse em se posicionarem na vanguarda das tecnologias existentes.

Poderá, contudo e para se aquilatar a distância que vai entre a produção mundial de armas e a exportação de armamento, avaliar-se a fatia que é absorvida pelos próprios países produtores. Um exercício aproximativo, dadas as diversas unidades de medida, consegue-se comparando o comércio de armamento em 2007 - $ 25443 M (preços de 1990) com os $ 213 840 M das vendas das onze maiores aglomerados referidos acima (Quadro V) em 2007 (preços correntes).

Neste campo podem-se fazer algumas comparações interessantes com os $ 213 840 M daquelas vendas:

  • PIB em 2007: da Tailândia - $ 245384 M (população 63.9 M); da Venezuela - $ 233450 M (população 27.7 M); de Portugal - $ 219499 (população 10.5 M)
  • Sensívelmente, aquele valor de vendas de armas teria permitido duplicar o rendimento dos 320 M de habitantes de 25 países da África oriental e central cujo PIB conjunto foi $ 244032 M em 200
O imediato periodo que se seguiu ao final da guerra fria e o subsequente desmembramento da URSS trouxe um periodo de redução das transacções internacionais de equipamentos, com a geração de fundas preocupações entre os fabricantes de armamento e os estados-maiores, por motivos diferentes mas, coincidentes quanto à forma de superar essa crise da procura.

Os produtores de armas queriam, naturalmente que houvesse mais guerras e tensões para manter activas as suas linhas de produção e cheios os bolsos dos seus accionistas. Os generais e almirantes, para justificar as suas profícuas existências precisavam de ser criativos para justificar o rearmamento junto dos governos e da população.

Essa criatividade é bem patente quando a NATO, depois de uma primeira fase de confusão, perante a desaparição do inimigo que justificava a sua existência, inventou uma vasta panóplia de ameaças, umas mais difusas ou etéreas e outras, francamente perigosas, pois vieram a conduzir a teatros reais de guerra - sem figurantes, como nas tradicionais manobras - com destruição de vidas e bens, num contexto geograficamente alargado (6).

Essa falta de concretização das ameaças e dos inimigos não resulta da falta de massa cinzenta dos militares e dos seus consultores mas, de um propósito deliberado de deixar vago o campo de aplicação das intervenções militares, contrariamente ao que sucedia no tempo da guerra fria, em que o espaço e os motivos da guerra eram calculados ao milímetro.

As compras de armamento pelos países obedecem a planeamentos efectuados a médio prazo, sobretudo quando se trata de aquisições de equipamentos novos, em que é preciso considerar as disponibilidades das linhas de montagem dos fabricantes, assegurar financiamentos e prazos de pagamento . E cada país tem os seus próprios planos e calendários, pelo que a soma das transações internacionais têm variações que não se justapõem exactamente aos periodos de crises e guerras ou ausência delas. Por outro lado, os prazos de validade dos equipamentos militares são limitados, como acontece com qualquer outro equipamento, mesmo os socialmente úteis.

Depois da quebra observada no gráfico seguinte, para o primeiro lustro dos anos 90, 1997/98 é um periodo de recrudescimento com responsabilidades repartidas por vários compradores – Grécia, Israel, Japão, Malásia, Arábia Saudita, e Turquia, casos em que o principal fornecedor foram os EUA; a Índia, abastecida pela Rússia; e ainda Taiwan, pelos EUA e pela França.


O periodo 2000/2005 mostra-se relativamente pouco activo no que se refere às transações internacionais de armamento. E isso, a despeito do medo inculcado na multidão face à ameaça terrorista após o 11 de Setembro e as invasões norte-americanas e seus sequazes, do Afeganistão e do Iraque.



Em 2006/2007 assiste-se a um novo aumento das compras de armamento, sendo esse incremento resultante de um naipe de países compradores e fornecedores mais alargado do que cerca de dez anos antes. Entre os fornecidos pelos EUA salienta-se a Coreia do Sul, o Canadá, o Kuwait e o Japão; os clientes da Rússia são a Índia e a Argélia; a Holanda abasteceu a Noruega, o Chile e a Alemanha; e a Alemanha procedeu a grandes vendas à Itália, posicionando-se como grande fornecedor da Grécia (em parceria com a França) e da Malásia aqui, juntamente com a Rússia.

A distribuição das vendas de armamento no periodo 1990/2009 por grandes grupos de fornecedores apresenta-se de acordo com o gráfico que abaixo se segue.

Para todo o periodo considerado (1990/2009), em resumo, os países da NATO procedem a cerca de 2/3 das vendas mundiais de armamento, contra 21.2% do conjunto China-Rússia-Ucrânia, enquanto os paises neutros da Europa (Suécia e Suiça) se quedam pelos 2.4% e o resto do mundo em 9.3%.

Nos dois primeiros anos utilizados existe um problema de classificação, uma vez que não se conhecendo dados para a Rússia e a Ucrânia, não é possível separá-los dos restantes países do mundo, o que, envieza ligeiramente o valor acumulado para as duas décadas.

Com a ressalva anterior, na década de 90, os países da NATO (onde se inclui Israel, por motivos já referidos) ultrapassam sempre os 70% do total das vendas, chegando mesmo a 84.6% em 2008, patamares que nunca mais foram atingidos.



O triângulo China-Rússia-Ucrânia estabelece, no periodo 1999/2004, uma consolidação da sua posição num patamar bem mais elevado que anteriormente e que chega aos 37.6% da procura mundial, em 2001, parecendo vir a estabilizar para quotas de mercado entre 25 e 30%.

No que se refere aos países da UE que são da NATO, observa-se que no periodo 1994/2000 o seu peso no total das vendas de armamento cifrou-se um pouco acima de 1/4 do total e, nos últimos cinco anos mantém-se com uma quota tendencialmente acima dos 30% atingindo 35.1% em 2007.

Quanto aos países neutros da Europa, mantêm uma posição firme que subiu, claramente, a partir de 1999, chegando ao máximo de 5.4% em 2001.

Em suma, estas tendências mostram uma repartição relativamente igualitária entre a UE, o binómio EUA-Israel e o conjunto China-Rússia-Ucrânia.

Entre os principais países europeus, verifica-se uma tendência para o crescimento da quota de mercado de todos eles, particularmente no último lustro, com a excepção da Grã-Bretanha.

                      Quota média por periodo (%)

1990/1994
1995/1999
2000/2004
2005/2009
1990/2009
Alemanha
7,6
6,2
6,5
10,6
7,7
Espanha
0,5
0,8
0,4
2,5
1,1
França
3,9
8,4
7,4
8,0
6,9
GB
5,6
6,5
5,8
4,1
5,5
Holanda
1,8
1,9
1,4
3,6
2,2
Itália
1,0
1,6
1,4
2,6
1,6
Total
20,4
25,3
22,9
31,4
25,0

Os EUA, abarcando quase metade das vendas mundiais de armamento na década de 90, recuam para menos de 1/3 na primeira década do século XXI. Isto sucede, precisamente, quando após o bombardeamento da Jugoslávia, os EUA acentuam a sua crispação, as suas pretensões a uma hegemonia absoluta e marcam de acções guerreiras a sua intervenção, com o tenebroso “diktat” vomitado por G W Bush “Quem não estiver conosco, está com o terrorismo”, bem dentro do maniqueismo típico dos fundamentalistas cristãos. Na realidade, os desejos de domínio planetário dos EUA esbarram, para além das resistências mais explícitas ou mais surdas dos povos e dos Estados, com uma fragilidade económica evidente que se manifesta, neste caso concreto, na perda de importância relativa no comércio de armamento.

                                  Quota média por periodo (%)
1990/1994
1995/1999
2000/2004
2005/2009
1990/2009
49,2
49,5
32,1
29,8
40,9

Contudo, a grande valia dos EUA, no contexto mundial, no contexto económico é essencialmente, a capacidade de emissão ilimitada de títulos (moeda e dívida pública), transferindo para os seus credores a responsabilidade pela sua potencial insolvência. Em termos da produção de bens e serviços, estratégicamente e para além dos vectores ligados ao complexo militar (aviação, comunicações, software…), são de nomear, a produção cinematográfica e de conteúdos (com o papel ideológico inerente) e a produção (altamente subsidiada) de cereais.

No âmbito do conjunto China-Rússia-Ucrânia observa-se, no periodo observado – do qual se excluiu o periodo 1990/94 por razões já expostas – uma estabilização dos pesos relativos da China e da Ucrânia, com representatividades globais modestas e evidenciando-se a Rússia, como a segunda potência exportadora mundial, apesar da quebra na última metade da última década.

                                   Quota média por periodo (%)

1995/1999
2000/2004
2005/2009
1990/2009
China
2,4
2,3
2,4
2,8
Russia
13,3
28,7
23,6
16,8
Ucrania
1,9
1,9
1,8
1,5
total
17,6
33,0
27,7
21,2

Numa referência a Portugal, as exportações do país, reportadas na base de dados do SIPRI situam-se apenas em 2008 e 2009 e computam-se em $ 87 M e $ 40 M (preços de 1990), respectivamente (0.38% e 0.18% do comércio mundial). Recorda-se que, no relatório da Empordef, atrás referido, as exportações militares em 2008 se cifram em € 53.8 M, onde se incluirão, porventura, exportações de serviços, que não estão contemplados nos dados coligidos neste capítulo.

As exportações portuguesas de armamento em 2008 destinaram-se ao Uruguai e ao Chile e, em 2009, à Bélgica.


7 – Vendedores por tipo de armamento

Viu-se no ponto anterior a distribuição das vendas de armamento por grupos de países, procedendo-se agora à sua avaliação por tipo de equipamentos.

A preponderância do conjunto dos países da NATO (onde se inclui Israel) observa-se em todos os segmentos de equipamentos, numa média global que corresponde a cerca de 2/3 das vendas mundiais. Abaixo daquele patamar somente se verifica o caso dos tanques (54.9%), sendo muito superior a supremacia no que se refere ao fornecimento de satélites e “outros”: quanto a máquinas e sensores, o peso das vendas dos países da NATO situa-se em cerca 3/4 do total mundial.

No caso dos aviões, o binómio EUA-Israel, nomeadamente os EUA detêm a maioria das vendas mundiais, seguindo-se o conjunto China-Rússia-Ucrânia a grande distância, sendo modesta a participação dos países europeus da NATO.



Quanto aos sistemas antiaéreos e tanques a participação da NATO-Europa e da China-Rússia-Ucrânia aproxima-se de 1/4 das vendas mundiais, atrás da posição de EUA-Israel, mais baixa no contexto dos tanques, ainda que em ambos os casos detenham a maior fatia do mercado. No que se refere aos tanques, observa-se a maior participação dos restantes países (18.2%).

Nas vendas de artilharia, a posição dominante pertence à NATO-Europa, seguida de muito perto pela participação dos EUA-Israel. Os restantes países têm um peso superior ao do conjunto China-Rússia-Ucrânia.

No caso das máquinas, o predomínio dos EUA-Israel é elevado, ocupando a NATO-Europa que responde por 1/3 das vendas, enquanto o conjunto China-Rússia-Ucrânia e os restantes têm pesos aproximados.

No capítulo dos mísseis, de novo surge o domínio dos EUA-Israel, com a China-Rússia-Ucrânia a ocupar perto de 1/4 do total, muito acima da posição da NATO-Europa que, pelos dados do SIPRI, é o único vendedor de satélites.

Nos “outros equipamentos” a parcela dos países da NATO é muito grande, como aliás, nos sensores, onde é notória a relevância dos países neutrais da Europa, a Suécia e a Suiça.

Quanto à venda de navios de guerra, a NATO-Europa domina as vendas mundiais com 55.7% do total no conjunto das duas décadas, assinalando-se o terceiro lugar dos EUA-Israel, atrás da China-Rússia-Ucrânia.

O perfil exportador de cada grupo de países, de acordo com o tipo de equipamentos militares, consolidado nas últimas duas décadas, apresenta diferenças claras, como se pode observar no quadro seguinte.

                                                                                                                                     (%)

NATO-Europa
EUA-Israel
Paises neutrais - Europa
China-Rússia-Ucrânia
Restantes
Mundo
Aviões
26,6
55,6
24,6
49,3
40,7
44,9
Sistemas anti-aéreos
3,7
3,6
7,2
4,3
0,7
3,6
Tanques
10,9
9,2
11,7
14,0
23,6
12,1
Artilharia
2,7
1,5
1,7
1,2
3,3
1,9
Máquinas
3,4
2,7
0,4
1,4
2,8
2,6
Mísseis
9,8
15,8
9,0
15,3
12,8
13,8
Outros
0,7
0,6
0,0
0,0
0,7
0,5
Satélites
0,0
0,0
0,0
0,0
0,0
0,0
Sensores
7,4
4,9
28,3
1,8
1,5
5,1
Navios
34,8
6,0
17,2
12,6
14,0
15,6
                                             Fonte: SIPRI - Stockholm International Peace Research Institute

A exportação a nível mundial  é dominada pelo elevado valor dos aviões, seguidos num mesmo patamar pelos navios, os mísseis e os tanques.

No que concerne aos países europeus da NATO, os dois principais vectores são as vendas de navios e aviões. No âmbito de cada um dos países, há diferenças assinaláveis de especalização; na Alemanha os navios e os tanques têm um grande predomínio, a Espanha reparte as suas exportações por navios e aviões, na França e na Grã-Bretanha preponderam as vendas de aviões e navios, a Holanda centra-se em navios e sensores enquanto a Itália fornece particularmente, navios, aviões e sensores.

Os EUA exportam essencialmente aviões, seguindo-se a grande distância a venda de mísseis e, por seu turno, Israel centra as suas vendas em mísseis e sensores.

Entre os países da Europa não integrantes da NATO – Suécia e Suiça - existem diferenças nítidas. A Suécia tem um perfil variado das suas exportações de armamento, com predomínio dos navios mas, com grande relevo para sensores, aviões, mísseis e tanques. A Suiça, pelo seu lado, concentra-se na venda de sensores e aviões.

O perfil exportador do conjunto China-Rússia-Ucrânia é muito semelhante ao dos EUA mas, com um relevo um pouco inferior no caso dos aviões, compensado pela maior relevância das vendas de navios e tanques. No caso da Rússia, o perfil exportador é ainda mais próximo do dos EUA, com maior afastamento quanto a navios, pouco representados nas exportações norte-americanas. A China centra as suas vendas ao exterior em aviões e navios, enquanto a Ucrânia baseia as suas exportações em aviões e tanques.

Para os restantes países do mundo, o maior valor exportado provém das vendas de aviões e tanques.

Finalmente, no caso português, as exportações nas últimas duas décadas - $ 128 M (valores de 1990) – sem qualquer relevância no contexto global,  repartem-se quase igualmente entre aviões e navios. Note-se que no que se refere ao que jocosamente se poderá chamar de sector de defesa português, as competências técnicas estão concentradas na OGMA e nos estaleiros (EN Viana do Castelo e Navalrocha).


8 - Países compradores de armamento

Novamente segundo os dados do SIPRI, para o periodo 2005/2009, o comércio mundial de armamento cifrou-se em $ 115934 M a preços constantes de 1990.

Com importações superiores a $ 100 M, apuraram-se 65 países que representam 96.3% do valor global referido no parágrafo anterior. Aqueles que importaram mais de $ 3000 M são apenas 16, absorvem 53.2% do total mundial e são os indicados no gráfico seguinte.



Os dois principais importadores – China e Índia – detêm em conjunto perto de 40% da população mundial, e não detêm empresas de armamento com tecnologia suficiente para prescindirem de tão elevado volume de importações. A Índia está representada na lista (10) com três empresas – Hindustan Aeronautics (43ª da lista) com $ 1670 M de facturação em 2007, a India Ordnance Factories (50ª) e a Bharat Electronics (63ª) – não estando a China incluida na elaboração da lista do SIPRI.

A China vai-se assumindo como principal potência exportadora mundial e como o mais importante Estado do Oriente, em concorrência com o Japão e em tensão geoestratégica com os EUA. A China mantém áreas de potencial conflito com Taiwan (que aliás é território chinês) e que funciona como porta-aviões dos EUA; com os países ribeirinhos do mar da China do Sul, pelo controlo das ilhas Spratley, Paracels e outras que, embora pequenas permitem o controlo de enorme área de águas territoriais, com razoáveis reservas de hidrocarbonetos nos fundos marinhos; com a Índia, em várias zonas dos Himalaias, nomeadamente na região de Aksai Chin e na fronteira entre o Tibete e o Assam. A China tem também um conflito interno com os separatistas uighurs no Xinkiang, etnia que também está presente (cerca de 300 mil pessoas) nas repúblicas da Ásia Central. A Rússia é, de longe o principal fornecedor da China com 88.6% das compras deste país, no periodo 2005/2009, no conjunto de um restrito grupo de seis países fornecedores.

As importações indianas provêm de dez países, entre os quais domina a Rússia com 76.9% no conjunto dos últimos cinco anos. Para além dos diferendos com a China atrás referidos, a Índia tem um conflito com o Paquistão a propósito de Caxemira que mobiliza também tensões por vezes sangrentas entre muçulmanos e hindus, susceptíveis de provocar guerra com o Paquistão. A Índia, para satisfazer as suas pretensões de hegemonia regional, já interveio na guerra civil no Sri Lanka, participa com os EUA no patrulhamento do estreito de Malaca e com outros países, no mar da Somália.

A Coreia do Sul é o terceiro importador e faz parte do dispositivo norte-americano no Oriente e que lá tem instaladas tropas e bases militares há mais de cinquenta anos. Esse dispositivo participa no cerco e intimidação da China e de vigilância da Coreia do Norte face a uma quimérica invasão norte-coreana; e também visa o Extremo Oriente russo, onde se situa a base naval e o terminal petrolífero de Nakhodka e a ilha Sakalina onde também se extrai petróleo, bem perto de ávidos consumidores como a China, o Japão e a própria Coreia do Sul.

A Coreia do Sul tem forças armadas poderosas e uma das economias mais dinâmicas do planeta. Sendo militarmente tutelada pelos EUA é natural que 65.9% das suas importações de armamento em 2005/2009 venham da superpotência, a grande distância do segundo fornecedor, a Alemanha (19.6%), num total de seis fornecedores.

Em quarto lugar surgem os Emiratos Árabes Unidos pertencem ao Conselho de Cooperação do Golfo, tendo como parceiros o Kuwait e os EUA que, naturalmente, ao oferecer-lhes “protecção” (Saddam abriu essa possibilidade quando invadiu o Kuwait) cobra, em contrapartida, o direito de se instalar no seu território para controlar o Golfo Pérsico e o tráfego marítimo que o envolve. Assim e apesar da presença militar dos EUA, os Emiratos ainda importam armamento da França (40.5%) e dos EUA (27.6%), num total de treze fornecedores no periodo 2005/2009.

A Grécia, de modo algo paranóico, é o quinto maior importador de armamento no periodo 2005/2009. É certo que há um conflito latente com a Turquia, na fronteira desenhada nas águas do Egeu e a propósito de Chipre, onde a Turquia patrocina uma denominada República Turca do Norte de Chipre. Porém, sendo a Turquia parceira da Grécia da NATO, não é crível um conflito aberto, sobretudo quando a primeira se mantém interessada em integrar a UE. Por outro lado, apesar da proximidade cultural grega com a maioria da população cipriota, Chipre pertence à UE e ninguém acredita que os turcos se metam em aventuras militares no sul da ilha de Chipre.

A instabilidade e as guerras, do outro lado da fronteira grega no norte, não parece venham a ameaçar verdadeiramente a Grécia. Os maníacos da Grande Albânia não devem estar autorizados a desestabilizar o Epiro através de uma pequena minoria albanesa (?100000 pessoas), como fizeram na Macedónia. A presença dos destacamentos europeus no Kosovo e a constituição deste como protetorado norte-americano, em torno da grande base de Boldsteel, serve para manter uma certa ordem nos Balcãs.

Já se disse atrás que os “mercados” financeiros nunca investigaram o desperdício grego com tão avultadas compras de equipamento militar pois isso forneceria bons lucros aos produtores. Esses fornecedores, num total de onze, são dominados pela Alemanha (34.9%), os EUA (26.3%) e a França (23.1%) que se mostraram menos colaborantes e prestáveis quando a crise financeira grega estalou.

Israel, já se referiu, é uma entidade militarizada, grande importador de armamento, quase todo proveniente dos EUA (98.1% em 2005/2009), no âmbito da relação privilegiada entre ambos os países e do apoio financeiro e militar que os EUA fornecem há dezenas de anos.

Singapura é, desde a sua criação pelos ingleses, a chave da passagem entre o Índico e o Oriente. Essa posição estratégica e a sua composição étnica e linguística (3/4 da população é de origem chinesa) diferencia Singapura da Malásia e da Indonésia. Durante a guerra do Vietnam estabeleceu uma relação estreita com os EUA, procedendo à manutenção dos navios da marinha dos EUA. Na região, é o principal interessado na segurança do estreito de Malaca, cuja circulação marítima é a base da sua prosperidade, que poderá sofrer um abalo se os interesses da China e do Japão impuzerem a construção de um canal no istmo de Kra ou, mais inesperadamente, se algum navio-tanque carregado sofrer um atentado que bloqueie a circulação marítima. Os principais fornecedores de armamento a Singapura em 2005/2009 são a França (51.3%) e os EUA (37.1%), num total de oito.

Os EUA estão em sétimo lugar na importação de armamentos, a despeito da sua capacidade como produtor; as parcerias produtivas, a segmentação de especializações, questões financeiras, como contrapartidas assim o exigem. Num conjunto de treze fornecedores no periodo 2005/2009, destacam-se a Grã-Bretanha (32.1%), o Canadá (21.1%) e a Suiça (18.4%).

A Argélia mantém no seu interior a insurreição salafita que desafia directamente as forças armadas argelinas, numa guerra larvar e com contornos pouco dignos no campo dos direitos humanos. No exterior há um conflito latente com Marrocos, acentuado pela presença desde 1975, de milhares de refugiados sahrauis no seu território. Tem, entre 2005 e 2009, oito fornecedores de armamento, com especial relevo para a Rússia (91.9% do total).

O Paquistão, mantém, como se disse acima, uma conflitualidade acentuada com a Índia que já conduziu a várias guerras entre os dois países. Mais recentemente, o Paquistão viu-se envolvido na guerra do Afeganistão, conduzida pelos EUA e pela NATO uma vez que o afluxo de refugiados afegãos encontra no Paquistão um acolhimento solidário no Nordeste e no Waziristão, onde preponderam tribos pashtun, tal como no Afeganistão. Por outro lado, a miséria da população, contrastando com a forte corrupção e o poder dos militares e do ISI, o tentacular serviço secreto, provoca contestação social e política, nomeadamente alicerçada nas mesquitas. A intervenção dos EUA na política interna paquistanesa, incentivando o exército a exercer acções militares nas chamadas regiões tribais e a intervenção directa dos meios bélicos norte-americanos tendem a integrar numa guerra comum o Afeganistão e o Afeganistão.

A Turquia constitui a ligação entre a Europa, o Médio Oriente e a Ásia Central e é uma peça essencial na estratégia do Pentágono no encapsulamento da Rússia, tal como no século XIX. O país é atravessado pela ligação entre o Mediterâneo e o Mar Negro, aloja as nascentes do Tigre e do Eufrates, rios essenciais para a Síria e o Iraque, tem uma relação próxima com Israel e um problema interno com a grande minoria curda. Com a Europa, mantém pontos de tensão com a Grécia e em Chipre, para além de, sob o engodo dos fundos comunitários, ter sido obrigada a aligeirar o autoritarismo do seu poder político tradicional, centrado nas forças armadas. Representa também um canal importante para a estratégia norte-americana de fazer correr o petróleo da Ásia Central, sem a intervenção de russos e iranianos (o oleoduto BTC), alberga importantes bases dos EUA perto da fronteira da Síria, deixando este país entalado, com Israel do outro lado; e, em contrapartida, recusou a utilização do seu espaço para os EUA invadirem o Iraque e tem boas relações com o Irão.

A Turquia detém o segundo maior elenco de forças armadas da NATO e o oitavo posto no mundo, enquanto a sua  marinha é a quarta do planeta. As suas aquisições de armamento repartem-se, nos últimos cinco anos, por dez países, com a predominância da Alemanha (53.2%, Israel (16.1%) e os EUA (12.6%).

A Malásia encontra-se na mesma região de Singapura e parcialmente o seu enquadramento geoestratégico é semelhante. Porém, o país tem mais um elemento de potencial conflito que é a disputada divisão de áreas do mar da China Meridional, ricas em petróleo, com a China, a Indonésia e as Filipinas. Entre os treze fornecedores de armamento à Malásia, em 2005/2009, destacam-se a Rússia (43.1%) e a Alemanha (21.1%).

Finalmente e à margem do gráfico cujos significados se vêm descrevendo, refere-se a situação para Portugal. Nos últimos vinte anos, Portugal importou $ 3044 M (preços de 1990) em armamento, com $ 999 concentrados nos últimos cinco anos, em contraste com um total de $ 165 M no conjunto dos anos 1995/2004, precisamente o periodo em que a conjuntura económica foi mais favorável. Em franco contra-ciclo, os governos PS/PSD sobrecarregam o orçamento com gastos militares, precisamente nos periodos de dificuldades sociais e financeiras, evidenciando não só a sua incompetência técnica e política de gestão dos gastos públicos, como também a sua insensibilidade social.


1991/1994
1995/2004
2005/2009
Crescimento médio do PIB (%)
1.8
2.6
0.3
Gasto militar médio anual ($ 1990)
450
16.5
200
                                                                               Fontes: Pordata (PIB) e SIPRI

Em todo o periodo observado registam-se onze fornecedores com maior relevância para os EUA (37.5%), Alemanha (30.9%) e Holanda (14.4%). Se a observação se centrar nos cinco anos mais recentes, os principais fornecedores são a Holanda (35.6%), os EUA (32%) e a Espanha (11.8%).


Notas

(1)    O jazigo de Rumaila foi entregue a um consórcio constituido pela BP e pela CNPC (China) (Democracy Now 3/11/2009)


(3)     M. K. Bhadrakumar, “Le Turkménistan réserve ses fournitures de gaz à la Chine,  la Russie et l’Iran. La géopolitique des pipelines à un tournant capital”, Asia Times Online (Chine), citado em Voltairenet

(4)    Eric Margolis, Toronto Sun, citado em Esquerda.net 26/2/2010)

(5)    Joe Biden, Fevereiro/2009

(6)     “Um problema mundial chamado NATO”,
                  http://www.scribd.com/doc/20691174/Nato e neste blog

(7)     http://www.globalfirepower.com/active-paramilitary-manpower.asp

(8)      http://www.nationmaster.com/


(10)            The SIPRI top 100 arms-producing companies in the world excluding   China http://www.sipri.org/research/armaments/production/Top100/Top1002007/arms_prod_companies

(11)Relatório de actividades em 2008


Abril 2010

Sem comentários:

Enviar um comentário