O PEC –
Programa de Empobrecimento Colectivo e o bloqueio económico e político
Primeiro,
o orçamento, agora o PEC. Haverá quem ainda não tenha percebido que, há muitos
anos estamos em processo de empobrecimento, agora acelerado, a caminho do
genocídio?
Sumário
1
- Um plano de fundo
2
- As especificidades do reino socratóide
2.1 – As debilidades da inútil
burguesia portuguesa
2.2 – A História recente
3
– O famoso PEC
3.1-
O RSI ou Regime de Supressão de Indigentes
3.2-
Subsídio de desemprego
3.3-
Perseguição aos desempregados
3.4- Apoios para manutenção
do emprego ou aos desempregados
3.5- O papel do congelamento
do IAS (Indexante dos Apoios Sociais)
3.6-
O aumento da carga fiscal
3.7-
Rendimentos de gestores de empresas com prejuízos
3.8-
Pagamento de prémios a gestores
3.9 - Eliminação dos
benefícios fiscais associados a seguros de vida e acidentes pessoais
3.10 - As privatizações
3.11 - Os intocáveis na
gestão do Estado socratóide
1
- Um plano de fundo
A
globalização procurou, em traços largos, encontrar condições para uma produção
de bens transaccionáveis mais baratos a partir do aproveitamento das diferenças
planetárias entre o preço do trabalho. As condições “naturais” eram uma mão de
obra numerosa, barata, relativamente qualificada, laboriosa e enquadrada em
regimes políticos ditatoriais ou musculados, sem sindicatos ou com sindicalismo
de Estado (o que em termos práticos é o mesmo) e desprezo total por cuidados
ambientais ou normas laborais dignas para os trabalhadores. Mais, esses países
deveriam investir nas infraestruturas viárias e aero-portuárias, na habitação,
na educação, nos cuidados de saúde e fornecer aliciantes fiscais para atrair o
investimento das multinacionais. Estas, aliás nunca foram parcas em exigências.
E
a globalização encontrou esses países no Oriente, excluido o Japão; e integrou
esses países na volúpia do capital global.
A
construção naval europeia e americana esfumou-se perante a concorrência coreana
nos anos 80 e a reparação seguiu os seus passos. Os armadores marítimos deslocalizaram
o registo dos navios para lugares exóticos e encheram-nos com tripulantes
filipinos, indonésios… mais baratos, sem segurança social e pouco exigentes
quanto a horários de trabalho. Os transportes ficaram pelo preço da chuva sem
que o impacto ambiental da sua utilização irrestrita tirasse o sono aos
governos.
A
internet arrumou o fax na arqueologia – tardiamente para Mário Soares e outros
protagonistas do caso fax de Macau – e permitiu comunicações e transferências
instantâneas de dados e capitais.
A
OMC, sucessora do GATT avançou com a liberalização do comércio – com notáveis e
unilaterais excepções; a liberalização dos capitais deixou de passar pelas
burocracias dos bancos centrais (reabilitando a integração dos capitais
mafiosos); e foi criado um offshore em cada ilha.
Os
europeus encolheram os ombros. Passaram a ter electrodomésticos baratos e roupa
cujo preço não compensa a lavagem; os bancos quase obrigavam ao endividamento
para comprar casa, carro, móveis, viagens; e os transportes aéreos foram
liberalizados tornando perto e barato o acesso a cancuns repletos de
empreendimentos turísticos. Teriam, entretanto, de encerrar a metalurgia, o
têxtil ou a química e importar a comida. Paciência! O mercado, dizia-se e ainda
se diz, reconverteria a mão-de-obra disponível como havia convertido os
fabricantes de carroças em operários do automóvel e todos caminhariam felizes a
caminho do consumo infinito.
O
trabalho na produção não deslocalizável e nos serviços sentiu a pressão da
oferta de mão de obra imigrada do Leste Europeu, da África e da Ásia, de todos
os locais não erigidos como oficinas das multinacionais. As condições impostas
para a aceitação desses trabalhadores foram terríveis – precariedade de vida,
trabalho semi-escravo, salários miseráveis, ameaças de expulsão, racismo e
repressão. Essa é a parte mais visível de uma nova era de servidão que está na
agenda de Davos e Bilderberg, para quase toda a população do planeta.
O
desemprego cresceu e terão querido convencer os europeus que é possível um
progresso real para todos, com milhões de desempregados encostados nas esquinas
das ruas urbanas e das vastas periferias, mais infelizes do que os que
conseguiram o qualificado trabalho da distribuição de pizzas. Em paralelo, os
capitais deslocalizam-se em massa, sob o nome de investimento no exterior, como
se daí brotasse alguma vantagem para os trabalhadores europeus ou para os dos
países de destino.
Décadas
depois deste empobrecimento, da ruína e da deriva ambiental deste modelo
capitalista de acumulação, será altura de se perceber que, nesta lógica, o
empobrecimento dos europeus só pára quando o preço do seu trabalho ombrear com
o dos trabalhadores da Ásia que poderão, eles próprios ser, um dia,
substituidos por trabalhadores latino-americanos, africanos, etc. As
multinacionais para eternizar o seu poder farão uma roleta com os diversos
conjuntos de trabalhadores, colocando-os em concorrência uns com os outros, nos
seus cúpidos desejos, ad seculum seculorum.
Porém,
como o crescimento da riqueza útil será baixo para as necessidades globais e
irá esbarrar com uma distribuição muito inigualitária, o capitalismo já
entendeu que deve reduzir a população do planeta para sobreviver, para não ser
assaltado por revoltas, revoluções, actos de destruição criativa do seu
aparelho e custos exagerados de manutenção do sistema.
Para
o efeito, o capitalismo globalizado vem desenvolvendo uma máquina de guerra
impressionante, mormente através da NATO, (v. “Um problema mundial chamado NATO”)(1) com intuitos de disputa e
rapina de recursos, sem recuar perante uma actuação sangrenta que se vai
aproximando da conduta nazi; e, paralelamente, através do controlo biopolítico
das pessoas, da informação, da manipulação de dados pessoais, de uma calculada
securitização, (por muito que aparente ser
paranóica), avança gradualmente, para a constituição de regimes
autoritários, strictu senso, criando novas formas de fascismo.
Nessa
linha de extermínio, o capitalismo colocou os povos pouco interessantes do
ponto de vista da acumulação – africanos, latino-americanos, muçulmanos e
sul-asiáticos – abandonados à pobreza ou à doença; e vem colocando no mesmo
plano a grande massa de idosos, pensionistas, pobres, desempregados de longa
duração, trabalhadores com pouca qualificação, nos países chamados desenvolvidos.
Passou a criminalizar os trabalhadores das administrações públicas pelo simples
facto de o serem, tal como os nazis criminalizavam os judeus. E como sabem que
esta população não pode emigrar – não abundam lugares alternativos - trata de
lhes dificultar a existência, cortando no seu rendimento, no seu bem estar,
para lhes reduzir o tempo de vida. (v.
“A pulsão
genocida da burguesia portuguesa. A actuação da máfia socratóide” (2), “O novo fascismo que está em marcha” (3) e “A resposta capitalista que estão a preparar para a crise”(4))
Esta
é a lógica geral da globalização, do capitalismo. Subvertê-la, é preciso e
urgente; outras crises se preparam, mais profundas, mais prolongadas, mais
agressivas. E isso, não se consegue, decerto, com a visão e actuação das
esquerdas institucionais europeias, - crentes no retorno messiânico ao “modelo
social europeu” - sociais-democratas e ecologistas, de inserção complacente nos
jogos viciados da democracia de mercado.
2
- As especificidades do reino socratóide
2.1
– As debilidades da inútil burguesia portuguesa
As
fraquezas da burguesia portuguesa revelam-se, historicamente,
- no seu carácter bizarro de potência colonizadora intermediária, sem capacidade de gerar um modelo de desenvolvimento industrial com as riquezas e o trabalho dos colonizados;
- na geminação com o Estado, durante a monarquia, a primeira república, como no tempo do fascismo, ou da república cleptocrática em vigor;
- numa estrutura económica desajustada da inserção europeia.
Tudo
isso revela que o quadro da globalização só poderia vir a acelerar o seu
processo de falência (“Para que serve a
burguesia portuguesa?”)(5).
O
empresariato português
ainda hoje tem uma característica estrutural terrivelmente negativa para
qualquer processo de desenvolvimento capitalista; é que tem qualificações
técnicas e educacionais inferiores aos assalariados que explora.
2006 (%)
Empregados
|
Patrões
|
|||||
Grau de instrução
|
Portugal
|
Espanha
|
UE-27
|
Portugal
|
Espanha
|
UE-27
|
Superior
|
14
|
34
|
26
|
10
|
29
|
32
|
Secund sup e pré-universitário
|
15
|
23
|
49
|
14
|
23
|
44
|
Primário e secund inferior
|
71
|
43
|
25
|
76
|
48
|
24
|
Fonte:
INE, Península Ibérica em Numeros - 2007
Estes
elementos, só excepcionalmente foram divulgados pelo INE, na edição de 2007,
acima referida. E percebe-se porquê. Não convém que se saiba que o patrão
médio, além de ter uma qualificação muito inferior à da “concorrência”
espanhola e europeia, tem um perfil culturalmente mais baixo do que os trabalhadores
por conta de outrém.
Como
os ditos empresários são, mediaticamente, sempre apresentados com auras de
superioridade, como entes eleitos recheados de valias merecedoras de atenções
especiais e de todas as mordomias, não cai bem a evidência dessa lacuna enorme
para o desenvolvimento, a revelação que o rei vai nu. Dito de outro modo, os
cerca de cinco milhões de trabalhadores portugueses vendem a sua força de
trabalho a um conjunto de iletrados biltres, composto por 287,2 milhares de
indivíduos.
Por
outro lado, o mandarinato ajuda a essa mistificação, esfalfando-se em ostentar
a baixa produtividade como culpa dos trabalhadores portugueses; ou, não fosse
grande a osmose entre mandarins e o mundo empresarial.
A
necessidade do aumento das qualificações
e formação dos trabalhadores é um elemento constante, indiscutível, um factor
natural e desejável na evolução de qualquer sociedade. O mandarinato esconde
que a baixa produtividade se prende, essencialmente, com a especialização
produtiva desajustada construida por uma burguesia frágil e ignorante, no
quadro de uma posição subalterna na hierarquia do capital global.
O
empresariato luso sempre foi avesso ao investimento produtivo nas empresas,
preferindo a aposta em mão de obra barata, a compra de carros de alta
cilindrada, sendo comum a coexistência de empresas falidas e endividadas, com
patrimónios pessoais avultados, dos seus donos. Nesse contexto, o trabalho
qualificado em Portugal é mal pago, porque o nível salarial global é baixo; e
assiste-se ao escandaloso desperdício de jovens qualificados serem obrigados,
para subsistir, a exercer funções cuja realização está longe de exigir a sua
qualificação, recebendo por isso, um salário miserável, com todo o impacto na
motivação e no desempenho.
Na
realidade, o “empreendorismo” dos empresários portugueses só sobrevive à custa
dos impostos pagos, essencialmente pelos trabalhadores (v. “Capitalismo e Estado: a mesma luta”)(6), à total promiscuidade com
o aparelho de Estado, à persistência do modelo de baixos salários e muito menos
às capacidades realizadoras da burguesia.
Essa
mesma ignara burguesia não sente particularmente a necessidade de uma forte
elevação do padrão de qualificações dos trabalhadores e da população em geral:
- Primeiro, porque não quer ser suplantada pelos seus assalariados e nunca apostou verdadeiramente na educação, travestindo-a com resultados feitos à medida do encaixe nas estatísticas do Eurostat, através de curricula desajustados e avaliações facilitadas; e, nesse contexto, perante o descalabro, geram a ideia fácil de que o problema está nos professores. Contudo, o culto do “dr.” gera a pândega das habilitações de Sócrates e os cursinhos de economia, tipo farinha Amparo, do Passos Coelho;
- Depois, porque na sua impotência sistémica, não percebe que a estrutura produtiva estiola, por desajustamento técnico, pela reduzida dimensão numa economia globalizada e por insuficiência de um mercado interno viabilizador, procurando sobreviver por conta do apoio estatal e com os baixos custos da mão de obra
- Finalmente, porque consegue retirar rendimentos fáceis do imobiliário, da especulação bolsista, do rentismo mais parasitário, evitando o tal risco inerente a um verdadeiro empreendorismo.
2.2
– A História recente
Toda
a exposição anterior serve para oferecer uma justificação parcial para o
sistemático atraso da adaptação da especialização portuguesa na divisão
internacional do trabalho, no quadro mais alargado e intensivo criado pela
globalização neoliberal.
Até
à descolonização de 1975, as colónias foram sempre a jóia mais valiosa para a
burguesia portuguesa, desde o tempo da monarquia. A sua existência permitiu um
intermediarismo estagnante próprio das “burguesias compradoras” que, no caso
lusitano, se habituou a uma dependência total do Estado, garante da ausência da
concorrência externa e do baixo preço do trabalho. Nos anos 60, o verdadeiro
início da entrada de capitais externos compensou os meios em que o Estado se
esvaia nas guerras coloniais, permitindo o arrastar da reconversão produtiva,
bem evidente na fuga de muitos milhares de trabalhadores que, transformando a
fronteira em verdadeiro passador, procuravam na Europa Ocidental trabalho e bem
estar.
Para
sair desse impasse e atrelar-se ao combóio do enriquecimento global que então se
observava na Europa Ocidental, os mais lúcidos dos capitalistas lusos
aproveitaram o descontentamento dos militares com a duração e o desfecho das
guerras, para mudar o regime político e acabar de vez com a intermediação
colonial.
Porém,
decididamente, a burguesia portuguesa teve dois azares:
- Um, foi o movimento popular de conquista de direitos e contestação do capitalismo que provocou ano e meio de recuos e desorientação ao estimado patronato, habituado ao sossego nas fábricas e nas ruas como ao zelo da pide.
- O outro azar ainda foi pior; quando se preparava, ansiosa, para a integração europeia, encontrou o fim dos trinta gloriosos anos de crescimento capitalista, iniciados no pós-guerra.
O
sector nacionalizado poderia ter sido uma alavanca poderosa no desenvolvimento
capitalista se, constituido duas décadas atrás e inserido numa política
económica semelhante à dos “tigres asiáticos”; isto é, regimes mais ou menos
autoritários, forte investimento e financiamento público, proteccionismo feroz,
em contraponto com forte apoio à exportação. Num congresso dos economistas nos
anos 80, quem ouviu o então primeiro-ministro Balsemão referir que Portugal
teria de seguir o exemplo da Holanda ou da Coreia do Sul, percebeu que o homem
não percebia nada de geografia e estava desfasado no tempo.
A
inevitável integração europeia no quadro do neoliberalismo, promoveu
transformações que só vieram a adiar os problemas actuais:
- Os fundos comunitários não foram investidos de modo semelhante ao observado nos “tigres asiáticos”, na criação de actividades produtivas e infraestruturais, como alicerce de exportação. Foram desbaratados em bolsos privados, bastas vezes de modo fraudulento, em falsa formação profissional ou em infraestruturas em áreas em desertificação, não acompanhadas da renovação do tecido produtivo que permitisse o seu cabal aproveitamento. A proliferação de parques industriais, repletos de simples armazéns está no terreno, bem à vista;
- A exportação concentrou-se em bens de consumo de baixo valor, no quadro de uma divisão interna do trabalho na CEE onde a produção de bens de capital é liderada pela Alemanha; e, nesse contexto, desapareceu a indústria pesada metalúrgica ou quimica, simbolicamente afundadas com o molhe de Sines. O aprofundamento da globalização neoliberal abriu gradualmente, as portas da CEE à livre importação de bens de consumo baratos, inviabilizando, de facto, muitas empresas portuguesas, sem canais próprios de exportação, apesar dos baixos salários;
- A privatização das empresas nacionalizadas – previamente recapitalizadas com o dinheiro dos impostos – redundou na reconstituição de um sector financeiro concentrado e hipertrofiado, com forte penetração de capitais espanhóis. E como as empresas, em geral, não tinham grande atração para o apoio bancário, os bancos descobriram o maná dos empréstimos eternos e seguros para financiamento de casa própria pelas famílias;
- O investimento estrangeiro, teve um efeito estruturante com a Autoeuropa - a par com o fracasso da Renault em Setúbal - cujas virtualidades se poderão esgotar em 2014, como previsto no âmbito da Operação Integrada de Desenvolvimento (OID) de Setúbal, lançada em grande parte para enquadrar os apoios públicos ao empreendimento. Fora isso, privilegia o turismo-imobiliário e o comércio externo, actividades pouco geradoras de competências técnicas elevadas e, para mais, muito concentradas em termos geográficos
- Manteve-se
o quadro da elevada injecção directa ou indirecta de recursos públicos nas
empresas, criando-se a base para o subinvestimento em serviços à
população, para o laxismo fiscal, para a sucessão crónica de deficits e de
acumulação de dívida pública, para uma promiscuidade corrupta entre o
mandarinato do arco governativo e o patronato;
- Reduziu-se gradualmente a margem de autonomia em termos da política económica, desaparecendo a possibilidade de utilização dos instrumentos monetários e da taxa de juro, do proteccionismo alfandegário, do livre jogo dos instrumentos orçamentais, sendo tudo isso determinado do exterior através das instituições comunitárias ou do “mercado”. Tudo isso, a despeito das enormes diferenças entre os vários países que integram a UE que aconselhariam a diferenciações de acordo com o grau de desenvolvimento de cada país. Porém, a UE não é um espaço de desenvolvimento harmónico e solidário mas, um quadro de partilha entre várias hegemonias, no qual Portugal tenderá a ser encarado como mais uma autonomia espanhola.
3
– O famoso PEC
Os
dois últimos anos têm sido férteis na demonstração do fracasso das várias formas
de regulação global e das atitudes voluntaristas de aprofundamento de uma
mítica UE, à revelia dos povos europeus.
- Os Estados apoiaram o sistema financeiro e para mais este infectou a economia, cujo crescimento já era anémico. Passado um ano continuam a ser os “mercados” financeiros a jogar com as chamadas dívidas soberanas (dos Estados), através das empresas de rating, cujas afirmações passaram a ter o impacto das antigas bulas papais. Exactamente as mesmas empresas de rating que falharam redondamente nas suas previsões antes da crise financeira e que, estupidamente continuam a ser consideradas, como oráculos do funcionamento dos “mercados”, na ausência de uma instância institucional europeia. Aliás, essas empresas apenas olham para a área financeira e acessoriamente para a economia real; esta, as pessoas, os milhões de pessoas são meros instrumentos da rendabilidade dos capitais especulativos.
- Por outro lado, a situação actual vem demonstrar a falência da UE como quadro integrado de actuação concertada; nomeadamente no caso da zona euro e do seu impagável BCE, a maior concentração europeia de tacanhos. Quando numa região que se pretende pioneira de um processo acelerado de integração económica e política se admite recorrer a uma instância internacional – o FMI – dominado pelos EUA e pelo neoliberalismo mais agressivo, para resolver uma questão interna, com maior acuidade na orla sul da UE, para além da Irlanda, isso revela a total inexistência de coerência. Para os entusiastas do Tratado de Lisboa, do aprofundamento anti-social, este desconcerto devería provocar focinhos vermelhos de vergonha;
- Como na UE não há regulação dos mercados financeiros, não há autoridade monetária real – o BCE só olha para a inflação – os capitais circulam por aí à procura de aplicações, sem ónus nem pagamento de impostos, traficando nos offshores, sem rei nem roque. E assim vigora a lei mais sagrada do neoliberalismo – a ditadura dos mercados.
É,
neste contexto que, na paróquia lusa, se iniciou com o milénio, um longo
periodo de estagnação, desemprego, dívida, perda de poder de compra,
empobrecimento e acréscimo das desigualdades, tudo condimentado com a
mediatização de casos judiciais que só evidenciam quem manuseia o aparelho
judiciário e o incremento da ausência de uma real democracia. Uma década de
recessão já está garantida e várias safras se preparam nos próximos anos.
Em
2008, a crise financeira constituiu a cereja no bolo da festa neoliberal que
tem Sócrates e o PS/PSD como faxinas em permanência, na ocidental praia lusitana.
Salvo o sistema financeiro, sobram, aumentados, o deficit e a dívida, o
desemprego e a contração do poder de compra, a deterioração das condições de
vida.
Sem
a imprevisibilidade da mosca no prato da sopa, ressurge o PEC que dá pelo nome
ridículo de Programa de Estabilidade e Crescimento quando deveria representar
um Programa de Empobrecimento Colectivo. Da sua análise redunda o que se
poderia considerar um programa de total estupidez; se não fosse uma acção
criminosa.
- Ao apontar para um aumento da carga fiscal para pagamento de dívida do Estado aos bancos, promove uma espiral que vai, por fases, da redução do poder de compra, às dificuldades das empresas dependentes do mercado interno, ao desemprego, à redução da receita fiscal a suprir por novo endividamento… É recessivo.
- O
Estado capitalista torna-se assim um intermediário entre rendimentos que
desaparecem da população para a pança insaciável dos bancos; e nessa
volúpia queimam-se as empresas e serviços públicos que restam, nada
resolvendo do essencial que é uma população com empregos e bem-estar, com
dinheiro para pagar impostos;
- Sacrificam-se os investimentos públicos, os apoios sociais, comprimem-se os outros gastos públicos confiando nos “empresários” para promover com os seus investimentos o crescimento. A fé, nestas coisas não ajuda muito, quando se sabe que os capitalistas se divertem muito mais com a especulação financeira;
- Aumenta-se a idade da reforma aumentando o tempo de vida activa e de descontos para a aposentação; reduzem-se os rendimentos dos aposentados ao mesmo tempo que se descapitaliza a segurança social uma vez que o recurso a fórmulas privadas de constituição de poupanças para a reforma é incentivado. E, simultaneamente, impede-se a natural renovação das gerações nos locais de trabalho, sacrificando os jovens com salários baixos, precariedade e desemprego;
- Finalmente, refere-se que a fé no incremento da exportação (reduziu-se 18% em 2009) é completamente idiota uma vez que os consumidores externos, também eles a braços com o quadro atrás descrito, não se encontram com grande vocação para animar as exportações de quem quer que seja. Portugal, para mais, tem um elevado índice de concentração das exportações na Europa e, na Espanha em particular.
Neste
quadro não é difícil que se vá manter a recessão bem para além de 2013, data a
partir da qual o PEC é estritamente omisso. Por um lado, a recessão ou o baixo nível de crescimento na
Europa impedem que a economia portuguesa reanime – aliás ela tem-se mantido
pouco dinâmica mesmo quando, neste século, a Europa apresentava taxas de
crescimento menos miseráveis que agora. Por outro, as debilidades estruturais
de Portugal – situação periférica, desajustada especialização produtiva, mais
sentida concorrência dos países com baixos salários – interagem com a crise
económica europeia e ampliam as dificuldades portuguesas.
Um
elemento pouco referido cujos efeitos se irão fazer sentir a partir de 2014 é o
fim do QREN cuja substituição por qualquer outro pacote de apoios comunitários,
não corresponderá ao volume dos financiamentos registados com o QREN; pese
embora a descolagem de Portugal na hierarquia das capitações do rendimento que
balizam o patamar desses apoios financeiros. Ora, se no QREN o nível dos fundos
comunitários distribuidos representa 1.8/1.9 do PIB, qualquer redução desse
indicador, num contexto de crise, contribuirá decerto para a complicação da
situação económica global.
Sublinham-se,
em seguida, as principais malfeitorias do PEC, inspiradas pelas instâncias do
“mercado” e passadas a texto pelos assessores do sádico Teixeira dos Santos;
que nem sequer obteve o aplauso de algumas figuras gradas do seu próprio gang.
3.1- O RSI ou Regime de
Supressão de Indigentes
O
RSI nunca foi do agrado da direita para a qual a pobreza não é produto das
desigualdades sistémicas mas, resultado da preguiça, defendendo para tanto que
acabem essas ajudas públicas para que os pobres sejam obrigados a trabalhar. É
óbvio, que criando-se condições para a aceitação de salários como esmolas
concedidas por magnânimos “empregadores”, aposta-se deliberadamente num
rebaixamento global do preço do trabalho.
Há
hoje, quem procure trabalho na restauração, a troco de € 200 mais comida o que
faz crer que a CIP teria razão ao considerar exorbitante a subida do SMN para €
475, tendo em conta o trabalho semi-escravo que se vem estendendo por aí.
Recorda-se que já se abordaram (v. “O
novo valor do salário mínimo nacional é um logro”)(7) os benefícios colaterais
- pouco divulgados - sobre as finanças
dos partidos representados na AR.
Por
outro lado, muitos dos beneficiários do RSI não são facilmente integráveis no
mundo do trabalho por razões de idade (crianças e velhos), de doença ou
qualificação. Recorde-se que o xenófobo Paulo Portas, defendeu, demagogicamente,
a distribuição do dinheiro afecto ao RSI pelos reformados, durante as últimas
eleições.
A
evolução para a despesa com o RSI, real e prevista no PEC é, em milhões de
euros):
2009 – 507.8
2010 – 495.2
2011 – 400.0
2012 – 370.0
2013 – 370.0
Sabendo-se
que havia recentemente 404 mil beneficiários, a capitação em 2009 teria sido
próxima de €1257 por ano ou, cerca de € 100 por mês, o que naturalmente terá
provocado um esgotamento do caviar nas prateleiras dos supermercados.
Ao
indicadores que adiante se descrevem permitem alguns exercícios sobre o projecto
da santa aliança PS/PSD/CDS para uma população que actualmente representa perto
de 4% do total.
% Variação
2008
|
2009
|
2010
|
2011
|
2012
|
2013
|
|
PIB
|
0.0
|
-2.7
|
0.7
|
0.9
|
1.3
|
1.7
|
Consumo privado
|
1.7
|
-0.8
|
1.0
|
0.8
|
0.9
|
1.0
|
Desemprego (%)
|
7.6
|
9.5
|
9.8
|
9.8
|
9.5
|
9.3
|
Fonte: PEC
- A redução das verbas de RSI, para sacrifício no altar da dívida, permite que se explore uma exercício que consiste em apurar o número de beneficiários em 2013 com a manutenção do valor monetário actual do apoio. Se se mantiver a média anual de apoio por beneficiário (€ 1257) eles reduzir-se-ão para 394 milhares no ano em curso e para 294 mil em 2012, quantitativo muito inferior ao de qualquer ano desde que o RMG/RSI foi criado (1998)!
- Ora, como se consegue reduzir os casos mais graves de pobreza em mais de 100 mil pessoas com o crescimento anémico previsto e com a quase estagnação da taxa de desemprego prevista? Não consegue, naturalmente.
- Pode também observar-se uma opção que é considerar, de modo mais plausível uma continuidade do número de beneficiários em cerca de 400 mil e verificar que em 2013, cada um terá de viver com € 916 ou com € 76 por mês… o que decerto, continuará a não permitir que o pó assente nas embalagens de caviar nos supermercados.
Na
continuidade da lógica da direita de criminalização da pobreza, o PEC contempla
lógicas persecutórias de efeitos muito limitados mas que, a serem concretizados
envolvem custos de pesquiza e fiscalização pouco enquadrados numa análise
custos-benefícios. Assim, irão reforçar fiscalizações domiciliárias,
verificações semestrais dos rendimentos, proceder a cruzamentos de dados,
procurando… património e rendimentos de capitais.
Os
nazis davam-se ao trabalho de pegar em judeus, ciganos, comunistas e
anarquistas, encerrá-los em campos de concentração e abrir as torneiras do gás.
Os genocidas PS/PSD, mais económicos, fecham as torneiras da subsistência
física a 4% da população e permitem que morram por aí; outros estratos da
população seguem dentro de momentos.
3.2- Subsídio de
desemprego
Actualmente,
o subsídio diário de desemprego corresponde a 65% da remuneração de referência
e é calculado como 1/360 do rendimento recebido no último ano. Porém, não pode
ser inferior ao IAS – Indexante dos Apoios Sociais ( €
419,22 em 2010) e que o governo já congelou até 2013; não pode ser
superior a 3 IAS (€ 1257,66); nem poderá superar o valor líquido da remuneração
de referência. Engenhoso, tem a marca do Pedrinho Marques, socratóide de estado
da Segurança Social, genocida da cantera PS, menino formado na London School of
Economics.
Assim,
o PEC ordena:
- Revisão da relação entre o subsídio e a remuneração líquida do trabalhador, quando activo, sabendo nós todos em que sentido;
- Redução dos níveis salariais oferecidos e que obrigam à aceitação do novo emprego para que o desempregado se sinta incentivado (cremos que houve um erro de tradução pois no original deveria constar obrigado) a encontrar emprego. Nesse capítulo, o trabalhador terá de aceitar emprego quando a remuneração seja superior a 1.25 do subsídio de desemprego (nos primeiros seis meses) ou a 1.1 a partir do sétimo mês;
- Assim, um trabalhador que tivesse auferido uma média mensal de € 1000 no trabalho, irá receber cerca de € 650 de subsídio e terá de aceitar um emprego por € 812,50 nos primeiros seis meses de desemprego ou por € 715 depois desse prazo.
Felizes
dos cidadãos que têm um governo tão incentivador do emprego! O desemprego em
massa sempre foi um factor de redução de salários, em todas as latitudes e
todas as épocas, por parte dos capitalistas e o governo socratóide, por
consequência, não fomenta o emprego, criando obrigações nesse sentido às
empresas que contrata, que subsidia e que apoia de várias formas.
Pelo
contrário, à tensão e ansiedade de quem perdeu o emprego, acrescenta a
penalização de obrigar à aceitação de um rendimento mais reduzido, definido
pelo Estado e que, naturalmente os “empregadores” vão considerar como
referência, rebaixando os níveis salariais globais. E, por outro lado, o PEC
não investe no combate à precariedade, mesmo nas empresas que têm contratos ou
fornecem o Estado, as autarquias, etc.
O
rebaixamento dos salários em Portugal, o seu nivelamento por baixo, pode ser
observado pela parcela de trabalhadores que são abrangidos pelo SMN, que
duplicou em três anos; nada indicando, os órgãos do Estado, sobre o trabalho
com paga inferior ao SMN, na restauração e no comércio a retalho, por exemplo.
%
2006
|
2007
|
2008
|
2009
|
|||
Abril
|
Outubro
|
Abril
|
Outubro
|
Abril
|
Outubro
|
Abril
|
4.0
|
4.5
|
5.5
|
6.0
|
6.8
|
7.4
|
8.2
|
Fonte: MTSS, Boletim Estatístico,
Jan/Fev 2010
3.3- Perseguição aos
desempregados
Já
aqui se disse (v. “Capitalistas e Estado:
a mesma luta”) (6) que, no contexto da profunda injustiça que se vive em
Portugal, criminalizar os pobres que enganam o Estado socratóide é apoiar o
rebaixamento do nível salarial global e subscrever o pendor genocida da mafia
PS/PSD. Por isso, saúda-se a criatividade, a capacidade de sobrevivência dos
pobres em geral e em nada se condena a sua habilidade em subtrair, ao Estado
cleptocrático, rendimentos que, de outro modo lhe são recusados.
Ao
que parece, haverá milhares de queixas junto do IEFP, de empresas que não
conseguem recrutar trabalhadores para certas funções, num total de 10/12000
apetecíveis empregos, na concepção demasiado parcial dos indómitos
“empresários” queixosos (8).
Esta
questão exige algumas reflexões:
- Se um empresário apresenta condições salariais para um posto de trabalho e não encontra interessados, a lei do mercado diz que só lhe resta aumentar o preço (neste caso, salário). E como não estão dispostos a aplicar as regras do mercado que tanto defendem noutras ocasiões, os cúpidos “empreendedores” fazem queixinhas ao governo. O mundo ideal dos capitalistas é cobrar para terem trabalhadores ao ser serviço;
- Existem propostas de emprego fora da área de residência de um desempregado e que este recusa, pois o salário oferecido não lhe permite pagar alojamento e, para mais, existe uma enorme probabilidade de ser uma oferta de trabalho em regime de precariedade, temporário;
- Em outros casos, são os custos de transporte, os passes, a ausência de transportes públicos que inviabilizam a aceitação dessas magnânimas ofertas empresariais;
- Sendo as ofertas salariais muito baixas – caso do têxtil ou do calçado, os campeões da exportação – pode tornar-se mais económico para uma família, retirar filhos do infantário, tomar conta de idosos ou outros biscates, do que aceitar trabalhar para um desses negreiros e pagar transportes, infantário, etc;
- E, obviamente, quem estiver inscrito no IEFP, a receber um subsídio miserável e conseguir, à sucapa ou em biscates, um rendimento adicional vai, justamente mandar às urtigas as ofertas dos tais negreiros tão avaros quanto bufos do Estado cleptocrático;
- Tecnocratas neoliberais do Banco de Portugal referem que o subsídio de desemprego médio (€ 520) torna pouco atraente a aceitação de salários mínimos de € 475. Quem, por exemplo, estiver a receber o subsídio pelo valor mínimo (€ 419.22, o valor do IAS) ou, de modo anualizado, € 481 por mês, pelas razões acima aduzidas, não tem nada a ganhar com as ofertas de trabalho naquelas condições. Desconhecem que existe um forte incumprimento do salário mínimo, fora do controlo estatal e que muitas vezes só nesse âmbito se encontra ocupação? Desconhecem que a oferta de trabalho a tempo parcial é vasta e que a barriga não funciona a meio tempo?
- Estas situações abrem a porta e a janela para o trabalho informal, tal como o recurso a imigrantes, de preferência “sem papéis”; fazem parte das políticas de rebaixamento efectivo do salário mínimo de aceitação obrigatória de trabalho, com impactos evidentes nos níveis gerais das remunerações.
Posto
isto, o governo socratóide, à sombra do PEC e sempre solícito para com os
dinâmicos “empresários” promete através da bruxa Helena André, cortes na
prestação e condições mais duras ao acesso, já para o ano em curso. Disse Jorge
Sampaio (22/3/2010) que “Portugal tem uma fraca iniciativa privada”; perante
estas atitudes conclui-se que afinal ao empresariato luso e aos seus
mandatários… não falta espírito de iniciativa.
Voltando
à já referida bruxa, o cinismo não poderia ser maior quando afirma que “todas
as medidas que permitam apoiar os desempregados a voltar ao mercado de trabalho
são, para o Governo, um objectivo prioritário". A utilização do verbo
apoiar oculta os seus obscuros desígnios; ela pensa em “obrigar”, herdeira da
lógica esclavagista que, no passado, colocou Portugal na História mundial.
De
acordo com o texto do PEC o acréscimo das prestações com o subsídio de
desemprego e o apoio ao emprego foi de 0.3% do PIB entre 2008 e 2009; o que
está longe de contribuir especialmente para o deficit e o descalabro da
economia portuguesa.
3.4- Apoios para
manutenção do emprego ou aos desempregados
A
Iniciativa Emprego-2009 abrangeu 310864 pessoas, contra os previstos 533418
enquanto que o prolongamento do subsídio social de desemprego, de 12 para 18
meses, só beneficiou 44730 pessoas para uma previsão de 50000 (9).
A
propaganda socratóide pretende beneficiar em 2010, com a mesma Iniciativa,
760115 pessoas, afectando-lhe um orçamento de € 490 M, contra € 580 M em 2009,
de onde resulta um apoio médio, por pessoa, substancialmente mais reduzido:
2009 - € 1087
2010 - € 645
Perdida
nas entrelinhas das boas intenções do governo ficou uma redução de 3% das
contribuições patronais para pequenas empresas, com trabalhadores com mais de
45 anos e que abrangeu 194529 trabalhadores,
quando se previa meio milhão.
3.5-O papel do
congelamento do IAS (Indexante dos Apoios Sociais)
O
salário mínimo tem servido como elemento de nivelamento por baixo das
remunerações do trabalho; e isso, porque de facto, não constitui um limite
mínimo dado o enorme volume de trabalhadores cuja remuneração fica aquém desse
valor pois, trabalham a tempo parcial ou, são obrigados a aceitar pagamentos
inferiores, para sobreviverem.
O
IAS, por seu turno é uma referência para a fixação de pensões e outras
prestações sociais. Trata-se de uma criação socratóide, em 2006, com a
assinatura do plasmódio Vieira da Silva, agora ministro da Economia (ou dos
apoios aos “empresários”, se se preferir).
O
IAS foi criado com um valor de € 397.86 para 2007 e está, de 2009 a 2013,
fixado em € 419.22; os seus valores tão pouco arredondados e só revelam o
carácter tecnocrático e fomenica dos seus patrocinadores, incapazes de proceder
a simples arredondamentos. Porém, mais importante neste IAS, é que se projecta
para um periodo de sete anos um aumento estagnado de cerca de € 21, uma
verdadeira fortuna que, na linguagem corrente dos mafiosos, convém manter para
incentivar os seus beneficiários a encontrar emprego.
A
partir de 2014 o IAS irá substituir o SMN como elemento de referência para os
níveis de dedução em sede de IRS, ficando entretanto o SMN também congelado até
lá. Hoje, a dedução em IRS inerente a uma criança com menos de quatro anos
corresponde a 80% do SMN (€ 380) e como ninguém acredita que em 2014 o IAS
atinja o valor actual do SMN (€ 475), é óbvio que só lá para 2016/17 a dedução
para a criança-tipo definida atingirá o valor de hoje. Entretanto, as famílias
pagarão mais caro por creches e infantários que o PS/PSD não cria, o custo de
vida aumentará, os salários (para quem os tiver) pouco progredirão, os juros
irão aumentar… Está à vista toda a estratégia de redução do preço da força de
trabalho em geral, de empobrecimemto colectivo e fomento da miséria. Para além
disso, neste exemplo concreto, o apoio público à natalidade irá descer e isso,
é uma parte da estratégia global do capital para reduzir a população mundial.
3.6- O aumento da carga
fiscal
O
sistema fiscal português é um emaranhado onde se congregam taxas de imposto,
benefícios, deduções, isenções, reduções, valores máximos ou mínimos,
condições. Tudo isso se torna nebuloso para a população em geral, criando-se a
ideia da existência de uma (pouca) progressividade dos impostos directos para
disfarçar que os indirectos, com relevo para o IVA, são socialmente regressivos
e arrastam essa característica para todo o sistema.
É
essa complexidade socialmente inigualitária que permite ao dueto
Sócrates-Teixeira dos Santos afirmar, capciosamente, que os impostos não sobem,
só porque as taxas de referência dos impostos não têm alterações. Quando
reduzem a vasta gama de benefícios, deduções, etc. aumentam, naturalmente o que
para os cidadãos são custos fiscais; e, como os rendimentos estão em contração…
é evidente que aumenta a carga fiscal da maioria.
O
aumento da carga fiscal em 2012 (10) será de 2.2% do PIB (e ficará pelo patamar
dos 34.8% do produto), só ultrapassada pela Grécia (+4.6%) e a Espanha (+3%);
no caso específico da tributação indirecta, o o ministro das Finanças
manifesta-se como o campeão europeu (+1.7%), ocupando a Bélgica e a Espanha os
outros lugares do pódio. Ele, como se vê, é um ás em impostos indirectos… e
ainda tem o aumento do IVA na manga.
Os
elementos fornecidos pelo palhaço Teixeira dos Santos (excepto a última coluna,
por nós calculada) (11) são reveladores dos níveis actuais dos benefícios em
sede de IRS:
Escalão de rendimento (€)
|
Benefícios (€)
|
% do total *
|
Até
4639
|
37
|
0,85
|
4640 –
7017
|
328
|
5,63
|
7018 -
17 401
|
788
|
6,45
|
17 402 -
40 020
|
1165
|
4,06
|
40 021 -
58 000
|
1397
|
2,85
|
58 001 -
62 564
|
1484
|
2,46
|
Mais de 62 564
|
1623
|
2,50
|
* Em regra, valor médio do intervalo
·
Os
agregados (muitos serão famílias, não podendo saber-se por má concepção das
bases de dados fiscais, o número de pessoas associadas a escalões de
contribuintes) de mais baixo rendimento têm direito ao desmedido benefício de €
37, (0.85%) do seu “enorme” rendimento. De facto, como não terão capacidade
para comprar casa, ter doenças e médicos privados, seguros, filhos em colégios
ou energias renováveis, não beneficiam de coisa alguma das deduções previstas
em sede de IRS;
·
O
primeiro escalão, objectivamente, só deve incluir rendimentos entre € 4104 e os
referidos € 4639 uma vez que os 700000 contribuintes que têm rendimentos
inferiores ao primeiro valor, são dispensados da entrega de declaração de IRS (12).
São as pessoas que maior miséria sofrem e que, naturalmente, não têm deduções,
nem IRS, muitos dos felizes cidadãos que, para o sádico Teixeira dos Santos,
estão incluidos nos 4.6 M de agregados que não vão sofrer redução nas deduções;
·
De
outro modo, diz o sacripanta, somente a partir de rendimentos superiores a €
11354 anuais (€ 811 mensais, incluidos os subsídios) as deduções serão
reduzidas (1.1 M de agregados). Isto é, os ricos (?);
·
No
quadro acima facilmente se vê a regressividade do IRS pois o nível das deduções
aumenta, em valor absoluto, com o escalão de rendimento, pois o Estado utiliza
esse mecanismo para subsidiar o ensino privado, os seguros de saúde e a
medicina privada. Melhor seria que investisse na saúde e na educação públicas,
melhorando a sua qualidade, tornando-as acessíveis a todos;
·
Os
mais endinheirados, vão passar a poder abater apenas 57% das deduções actuais;
passarão a deduzir € 925 em vez dos €1623 actuais, o que para rendimentos
superiores a € 62 564, não constituirá um grande sacrifício.
Para
além do IRS, existe uma outra forma fácil e eficiente de exercer a pulsão
fiscal sobre os trabalhadores e os pobres em geral – o IVA.
O
pateta do Teixeira, em 2008, reduziu o IVA de 21 para 20% para aumentar
encapotadamente as receitas das empresas dependentes do mercado interno, (v. “Aumento dos preços dos bens alimentares e redução
do IVA para 20%”), quando já se via o fumo da catástrofe financeira. E
talvez nisso, para se não ver a sua estupidez, esteja uma das causas para não
aumentar o IVA… para já, embora o retorno aos 21% pudesse render € 1500 M até
2013. E não está sozinho, tem ao seu lado, o balofo Proença, semovente acampado
numa coisa vagamente sindical chamada UGT.
Isso
provavelmente acontecerá em 2011 quando se verificar que o crescimento não se
verificou, que o deficit marcou passo, que as empresas de rating e o “mercado”
apertam, que o Almunia e o BCE torcem o nariz. Por outro lado, a própria taxa
reduzida do IVA (5%) que somente onera os bens essenciais vendidos no mercado
interno, não prejudica a competitividade das empresas; e a competitividade é o
fetiche em torno do qual se colocaram as vidas dos 10.6 M de residentes em
Portugal.
Por
outro lado, aumentos da taxa de IVA em Espanha tenderão a facilitar as
exportações portuguesas e a retirar margem de manobra para os produtores
espanhóis, nas suas vendas para Portugal.
3.7-Rendimentos de
gestores de empresas com prejuízos
É,
naturalmente, uma “medida”, não uma medida. Cosmética pura para confortar a ala
menos à direita do PS e gente idiotizada pelos telejornais. Por um lado, atinge
muito poucos e por outro, o que vier a ser arrecadado por esta via, não dará
para fornecer um prato de tremoços a cada um dos ministros.
Dentro
de “determinados limites” os salários de administradores, sócios ou gerentes de
empresas com prejuizos serão tributados autonomamente. Acha-se curiosa essa
indeterminação quando a mafia se mostra particularmente atenta, precisa,
detalhada e persecutória para com os funcionários públicos, os pobres, os
desempregados.
Essa
indeterminação poderá conduzir a um esquecimento na sua precisão e, por outro
lado, os visados saberão como evitar essa “tributação autónoma” com serviços e
bens pessoais pagos pelas empresas e que o habitual laxismo fiscal não deixará
de permitir.
3.8-Pagamento de prémios a
gestores
O
governo decidiu cancelar os bónus de gestores de todas as empresas públicas,
maioritariamente detidas ou participadas pelo Estado, a pagar em 2010 e 2011
mas, exceptuando aqueles que já os receberam ou decidiram proceder ao seu
pagamento. Criam-se assim dois grupos de gestores, os que recebem e os que não
recebem essas prebendas. Nas empresas meramente participadas mantém-se uma
mesma dicotomia, pois os gestores nomeados por privados podem levar o óbulo
para casa.
Entretanto,
ainda não se sabe se o famoso José Penedos, arguido na “Face Oculta” vai
receber o prémio relativo à sua rigorosa gestão em 2009; por seu turno, o
menino prodígio Rui Pedro Soares foi para casa com um milhão de euros. Empresas
onde os contratos de gestão prevêm esses prémios ameaçam com o tribunal que,
certamente, neste caso será mais lesto que na Casa Pia, dado estarem em jogo os
interesses da pátria. Os media vão ter matéria de entretenimento durante algum
tempo.
Os
serviços socratóides de propaganda são uma verdadeira lástima. Nem com truques
de moralização sabem arquitectar uma campanha de convencimento da plebe.
3.9 - Eliminação dos
benefícios fiscais associados a seguros de vida e acidentes pessoais
Na
sua maioria, estes seguros têm como beneficiários condutores de veículos e devedores
de empréstimos para habitação. No primeiro caso, o valor é baixo mas, no
segundo, é significativo, proporcional ao volume da dívida, à idade e estado de
saúde dos segurados. Para tudo isso, o benefício em sede de IRS não vai, hoje,
além dos € 128 anuais.
No
caso do seguro de vida associado aos empréstimos para habitação, trata-se de
obrigações impostas pelos bancos, para além das hipotecas dos imoveis. Portanto,
o fim da dedução, em nada prejudica as seguradoras, não vai condoer os bancos e
irá corresponder a um acréscimo real de encargos para as famílias pois, fora
desses casos, somente pessoas com maiores rendimentos têm seguros de vida.
No
capítulo dos seguros de vida, em 2007, as deduções em IRS valiam 71 M, valor
aproximado do que vai ser subtraido ao rendimento das famílias portuguesas,
para queima no altar do deficit a partir da declaração de IRS a entregar em
2011.
3.10 - As privatizações
“… e, já agora,
privatize-se também a puta que os pariu a todos.”
(José Saramago -
Cadernos de Lanzarote - Diário III - pag. 148)
Não
há um sector nacionalizado em Portugal, com coerência e potenciador de
desenvolvimento ou promoção do bem-estar da multidão. Há apenas empresas mais
ou menos dominadas pelo Estado, num conjunto que se pretende desconexo e
interpenetrado com interesses privados, que contribuem para essa incoerência
estratégica e que dela beneficiam.
A
existência de empresas nacionalizadas ou participadas constitui forma, entre
outras, de gestão capitalista, em qualquer latitude, seja em regimes políticos
de “democracia (liberal) de mercado”, de capitalismo de Estado ou híbridos como
a China. E, nesse contexto, têm vários objectivos, raramente virtuosos do ponto
de vista dos cidadãos, da multidão (v. “Nacionalização da banca - piada ou
mistificação” (14) e “Para um programa de medidas favoráveis aos trabalhadores”
(15)).
Entendemos
que o poder alternativo ao capitalismo contempla a existência – não de empresas
estatais, nacionalizadas ou geridas por mandarins, mais ou menos autoritários, corruptos
e defensores encapotados do capitalismo – mas, pelos seus próprios
trabalhadores, em auto-gestão e com a divisão do trabalho consensualizada entre
si, depois de extirpados accionistas, patrões, seus mandarins e mandaretes.
A
história recente das privatizações demonstra que não tiveram impacto nenhum no
deficit, desde que se iniciaram depois do acordo Cavaco/Constâncio, nos anos
80.
Dívida
directa do Estado (média do período)
|
% PIB
|
||||
1980/84
|
1985/89
|
1990/94
|
1995/99
|
2000/04
|
2005/09
|
40,5
|
55,4
|
55,4
|
58,1
|
58,4
|
71,9
|
Fonte:
Pordata
Assim,
cada um se pode interrogar sobre o que fez o PS/PSD e os seus estimados
“empresários” com o produto da venda de bancos, seguradoras, transportadoras,
cimentos, telecomunicações, energia… para não referir as muitas dezenas de
milhões de fundos comunitários. Cada um se pode interrogar, no contexto atrás
exposto, para que vão servir as privatizações anunciadas pelo dueto
Sócrates-Teixeira dos Santos. E colocar uma terceira questão, a de que irão os
mandarins vender para aplacar a gula do capital financeiro e ajudar os
capitalistas nacionais? Expropriar as nossas casas para pagamento do deficit, tal
como foi proposta a venda de ilhas do Egeu a milionários, para redução do
deficit grego?
Numa
lógica estritamente económica, sendo as antigas empresas nacionalizadas
“activos”, a sua venda só faria sentido se o produto fosse investido em outros
activos mais rentáveis. Uma empresa que vende activos para financiar fundo de
maneio tem a falência à porta, tal como quem vender o prédio da herança para
gastar o dinheiro em viagens e carros caros, tem a ruina anunciada. No entanto,
é esse o caminho imposto ao PS/PSD, assumidamente aceite.
Os
Estados não são empresas, pois têm o poder de cobrar compulsivamente rendimento
dos cidadãos. Quando alguém paga impostos, o dinheiro não é consignado a fins
específicos, tanto podendo ser utilizado na compra de submarinos, na construção
de uma escola, como num subsídio a uma empresa do regime. Considera-se que as
pessoas são simples “obrigados fiscais”, servos sem direito de escolha sobre a
aplicação do seu dinheiro. E, mesmo a posteriori, são afastados de qualquer
controlo sobre a forma como o seu dinheiro foi utilizado.
Entre
as empresas, há as que se têm de desenvencilhar com os seus próprios meios e
algumas que recebem fundos do Estado ou mordomias à custa do dinheiro dos cidadãos, numa relação de
difusa promiscuidade financeira e de direitos com o (seu) Estado.
As
privatizações constituem formas de apropriação barata de bens públicos por
empresas e “empresários” que, esses sim, sabem bem o que fazer com elas –
“criar valor para os accionistas” (engordá-los) - pretendendo com essa
afirmação convencer os incautos que isso é sinónimo de criar valor social. As
privatizações colocam-se na mesma lógica das concessões de estradas e serviços
médicos, do recurso permanente a contratações de empresas para o desempenho de
funções públicas, como das parcerias público-privadas. Também se lhes pode
chamar saque.
As
privatizações anunciadas no PEC não obedecem a qualquer avaliação seguida de uma
planificação. Trata-se de uma listagem elaborada à pressa para apresentar em
Bruxelas, apaziguar as empresas de “rating” e os tais “mercados” que naquelas
têm os olhos. E essa precipitação, esse improviso, a par com a pública aflição
do Estado é bem acompanhada pelo sobrevoo dos abutres que assim saberão propor
preços de saldo pelas empresas à venda e que ainda ficarão mais rentáveis
depois do posterior “downsizing”, à custa de despedimentos e da degradação da
prestação dos seus serviços. Prevê-se a criação de muito valor … para os
accionistas.
Por
outro lado, os lucros das grandes empresas não cresceram em 2009, a facturação
também não, a turbulência da finança internacional não está ultrapassada, as
exportações dificilmente crescem e o consumo interno degrada-se; e é preciso
encontrar uma boa justificação para as ajudar nesta má conjuntura. O deficit é
essa recorrente justificação para animar a iniciativa privada.
E,
em 2013, já com pouco para privatizar ainda haverá deficit, qual ogre
ameaçador, a exigir mais impostos para alimentar a burguesia portuguesa e pagar
juros à finança. Não é este o cenário já traçado pelo PS/PSD e pelos seus
donos?
O
capital, apesar da crise económica internacional e do definhamento da economia
portuguesa não deixa, contudo, de acumular o capital necessário para o assalto,
para a época de saldos que o combate ao deficit vai abrir. Assim, em 2009:
- As 15 principais empresas presentes na bolsa, pertencentes ao PSI-20, tiveram um lucro de € 3858 M (+0.57% que em 2008) (16) embora tenham facturado menos 7,5% que em 2008). Isto significa que a taxa de lucro por unidade de facturação aumentou: passou de 6.75% em 2008 para 7.35% no ano passado. Como é evidente, a crise deles é bastante relativa!
- Os quatro maiores bancos privados actuando em Portugal (BES, BCP, BPI e Santander), por seu turno, apresentaram lucros de €1445 M (+13.8% do que em 2008), acréscimo de remuneração que muito poucos trabalhadores poderão apresentar;
- Personalizando esta acumulação, a lista das altas remunerações dos gestores auferidas em Portugal é encimada por um tal António Mexia (EDP) com € 1.3 M de salários e €1.8 M de prémio.
Este facto permite-nos
enunciar algumas questões:
Diz a prostituição mediática
que, se não se pagar estes valores aos altos gestores, eles vão para o
estrangeiro. Não é bem assim pois só nos lembramos do António Borges saído recentemente
da famosa Goldman Sachs e do Horta Osório que largou o Santander Totta para
rumar a Inglaterra; todos os eméritos gestores que andam por aí, vivem
demasiado bem para o país e muitos deles sob o aval do Estado ou do PS/PSD, que
é a mesma coisa que Estado.
Dizem alguns dos globalizados
plumitivos que temos de acompanhar aquela gente como se paga lá fora, tal como
pagamos pelos bens e serviços disponíveis em Portugal, o mesmo que os outros
europeus. E se lhes levantarem a questão dos muito mais baixos salários que
vigoram em Portugal, dir-vos-ão que a produtividade é mais baixa, embora se
saiba que a produtividade depende muito mais do investimento, dos equipamentos,
da qualidade da gestão, do que do nível salarial. Cada um deles canta de acordo
com as ordens do seu “Kappelmeister”.
Recentemente, um estudo (17)
revela os custos e os benefícios sociais de várias profissões. Assim, um
operário da reciclagem gera o valor de £-12 por cada libra que recebe e um
banqueiro destroi £-7 de valor social por cada uma libra das £-500000 a £-10
milhões que aufere. E essa análise confirma o que modestamente já afirmámos em “Afinal
qual a função social do capitalista” (18); isto é, capitalista é
desperdício sob a forma de gente.
Finalmente, em relação a
Mexia, o homem do avental (v. “A gestão
energética, a REN e as mexidas de Toto Mexia na EDP”) (19) recordamos que o
famoso gestor antes de ir para a EDP demonstrou as suas qualidades na Galp,
onde a sua preocupação exclusiva pela criação de valor para os accionistas o
fez esquecer a segurança da refinaria de Matosinhos onde morreram dois
trabalhadores. Incompetências de alto coturno branqueadas, mesmo que possam ser
configuradas como crime de assassínio por negligência.
3.11 - Os intocáveis na
gestão do Estado socratóide
O
caso do TGV
Um
dos factores de gasto público para os próximos anos é o TGV Lisboa-Madrid.
Considera-se que a alta velocidade se trata de um investimento estruturante na
integração territorial e no alívio da carga poluente do sistema de transportes.
Isso, se for complementado com políticas de penalização do transporte
rodoviário e aéreo por conta da sua pégada ecológica, que favoreçam a
utilização do caminho de ferro na movimentação de mercadorias em longas
distâncias (> 600 km). Porém, nada obriga ao sacrifício da grande maioria da
população com a sobrecarga necessária para pagamento de um TGV, francamente
adiável por uns anos.
Gastos
militares
Outro
factor é o caso dos parasitários gastos militares. Enquanto a despesa
orçamental para 2010 decresce, as verbas para a defesa (ninguém sabe onde está
o inimigo) cresce 15.8%.
|
Fonte: OE-2010
Por outro lado e para se ter uma
noção mais prática do que significa o desperdício militar, refira-se que, no
total dos programas orçamentais do governo português se incluem € 2412 M com a
defesa, o que representa o valor necessário para a manutenção de 360 centros de
saúde.
Benefícios em sede de IRC
No capítulo dos benefícios fiscais
em sede de IRC, o PEC diz tanto como nada; nem sequer no que se refere aos
apoios aos traficantes que utilizam o offshore da Madeira que se mantém,
enquanto se abocanha o parco rendimento dos mais pobres.
Política de regeneração urbana que
não há
Numa conjuntura recessiva manda o
catálogo keynesiano proceder a um acréscimo de gastos públicos com rápido
efeito multiplicador no produto e no emprego. Neste contexto, poderia ser promovida a expropriação
dos prédios devolutos que os proprietários não recuperem ou parcerias com os
proprietários na sua recuperação com aplicação do dinheiro da Segurança Social
em habitações económicas. Claro que a especulação imobiliária e a banca não
gostariam desta concorrência…
A evasão fiscal: dois pesos, duas
medidas
Amaral Tomás, antigo secretário de
Estado do Teixeira dos Santos revela que no PEC se verifica “um apagão
relativamente à fraude e à evasão
fiscal”; e, por seu turno, Leite de Campos refere que existem € 13000/14000 M de dívidas ao
Estado a boiar nos tribunais, naturalmente pouco recuperáveis, para não
prejudicar a competitividade dos nossos “empresários”.
Sobre este tema há muito pormenor a
listar. Debruçámo-nos recentemente (“Capitalistas
e Estado: a mesma luta”) (6) sobre o assunto.
A propaganda socratóide afadiga-se a
apontar baterias para um objectivo de cobrança, em 2010, de € 400 M de dívida à
Segurança Social. Parece muito mas, não é, pois a esse ritmo a dívida total
precisaria quase de dez anos para ser recuperada, sem contar que todos os dias
há nova dívida a constituir-se, sem que a Segurança Social estabeleça formas
práticas de intervir, tempestivamente, nessas situações.
Inversamente, a bruxa Helena André
informou um combate, com meios reforçados, contra os “recibos verdes” que têm
dívida contabilizada na Segurança Social por não pagarem do seu bolso os € 159
mensais, independentemente da remuneração. Na realidade esses valores deveriam
ser pagos pelos empresários negreiros, por conta das suas responsabilidades
para com os assalariados mas, a lei da cleptocracia isentou-os dessa
responsabilidade, em nome da omnipresente competitividade.
O financiamento do SNS-Serviço
Nacional de Saúde
Outro intocável é o modelo de
financiamento do SNS, sobre o qual vamos fazer preencher algumas linhas.
Ana Jorge chegou a ministra porque a sua voz de
constipada induz a doença, constituindo portanto, uma excelente promotora da
venda de vacinas da gripe A, como se recordam. E, por isso, mostra-se admirada
pelo facto de os médicos, acossados pelas penalizações para a reforma, se
sentirem animados na antecipação da saída, com eventual transferência para o
sector privado, numa estratégia, aliás, há bastante tempo concertada pelos
governos e pelos grupos privados, à procura de uma maior rendabilidade.
Na
sequência desses abandonos, o governo, para gradualizar a morte do SNS, procura
soluções engenhosas e caras que passam por contratos com empresas de
fornecimento de serviços médicos (aluguer de gente), reformados a recibo verde,
encontrando aliados objectivos nas corporações médicas (Ordem, SIM, etc) que
procuram esticar a corda do saque.
Para
reduzir os gastos públicos com a saúde, qualquer estudante de gestão pode
conceber soluções fáceis, como estas, a título de exemplo:
- Porque não têm os postos de saúde recolhas de fluidos para análise, alimentando serviços privados que, como cogumelos se espalham nas suas imediações, pagos com o dinheiro dos impostos? O facilitismo do Estado para favorecer os negócios privados é tal que 75% dos laboratórios de análises não têm licença (20)
- Se uma consulta privada de especialidade custar uns € 80/90 em termos de mercado, um médico em duas horas diárias pode cobrar, nesse intervalo € 600/800. Por seu turno, a maioria dos seus clientes está integrada em sistemas públicos (SNS, ADSE…) e só paga directamente uns € 3 sendo aquelas instituições que pagam o resto, com o dinheiro dos impostos. O enorme volume de beneficiários dos sistemas públicos não oferece a massa crítica para contratações directas de médicos, muito mais baratos, no regime da administração pública?
As
mordomias da classe política
Este
assunto é o grande tabu da política portuguesa, a sua grande face oculta. Não
consta do OE; não contribui para a suavização dos sacrifícios impostos à plebe;
não é referida pelos media, embora estes andem sempre em entrevistas com os
mandarins, tomando nota de todas as suas futilidades, evasivas e mentiras. E o
PEC não os toca.
- Quantos mandarins, reformados como tal e com menos de 65 anos estão activos, recebendo, em acumulação proveitos do exercício de funções públicas?
- Como os mandarins se mostram – na conversa – muitos sensíveis com as dificuldades dos pobres, porque não acabam com as escandalosas reformas dos titulares de cargos políticos ao fim de 12 anos? Os deputados até, votaram em Julho de 2008, (v. “Erradicação da pobreza por lei?”) (21) uma proposta do PS, que torna os responsáveis por situações de pobreza violadores de direitos humanos! Sócrates e Cª. que tal a cadeia?
- E as ajudas de custo, a utilização privada de veículos do Estado, as compras de carros de luxo que não páram, não constituem gasto público? Ao Jaime Gama faria bem uma dieta.
- Não seria de congelar também as subvenções públicas aos partidos parlamentares ao nível de 2009? E acabar com as isenções de impostos de que beneficiam?
- Os gabinetes ministeriais onde pululam bandos de elegantes jotinhas não poderão ser reduzidos? Para mais, não evitam a contratação de consultores externos para tudo e para nada; e nem sequer foram capazes de elaborar o PEC a partir das orientações da Comissão Europeia.
Mesmo
relativamente às pessoas com quem trabalham, os mandarins consideram-se como
uma casta de novos brâmanes, com direitos especiais. Segue-se uma revelação
pitoresca.
Na
AR existe um restaurante para deputados onde não podem entrar livremente outras
pessoas, se não por convite de uma eminência. Para funcionários da AR,
assessores e até polícias existe um refeitório, frequentado também pelos
deputados do BE, do PC e dos Verdes, por opção. Há, portanto uma postura
elitista e racista de quem montou esta discriminação, acatada gostosamente por
toda a direita, PS/PSD e CDS.
- - -- -
Naturalmente,
os aspectos aqui tratados, não esgotam as malfeitorias do governo e, de modo
mais alargado do PS/PSD, anos após ano. Essas malfeitorias atingem a esmagadora
maioria da população e reveste formas triviais de crime, como nos vários casos,
mais ou menos encalhados nos tribunais, sendo o mais recente o dos submarinos,
revelador de como se geram rapidamente fortunas.
Notas:
(8) Jornal “I”,
16/3/2010
(9) Jornal de
Notícias, 24/3/2010
(10)Jornal “I”,24/3/2010
(11) Destak, 24/3/2010
(12) Diário Económico, 29/1/2010
(16) (Jornal
“I”, 5/3/2010
(17) Eilis Lawlor et alia, “Calculating
the Real Value to Society of Different Professions” divulgado na edição
portuguesa do Monde Diplomatique (Março/2010)
(20) Visão, 11/17 Fev 2010
(21)
http://esquerda_desalinhada.blogs.sapo.pt/21226.html
Abril 2010
Abril 2010
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