quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Novos partidos ou mais do mesmo?

Fala-se na paróquia lusa da criação de novas agremiações políticas, uma vez que é evidente a incapacidade, a inutilidade tal como a nocividade das existentes, no capítulo da melhoria das condições de vida em Portugal.

Nas últimas décadas, assinalam-se vários movimentos pretensamente regeneradores de que a História, provavelmente, nem em rodapé fará menção.

Da UEDS, formada por PS’s anti-soaristas, sobra hoje, o António Vitorino, influente mandarim que não é socialista e, menos ainda, de esquerda. A Esquerda Liberal, surgiu nos anos 80 com propósitos pedagógicos sendo seus progenitores o António Barreto e o Pacheco Pereira, que se mantêm como críticos sistemáticos mas, conservadores do regime. Os renovadores do PC (que já vão na enésima versão), mais coisa menos coisa engrossam as hostes e os lugares oferecidos pelo PS. Recordamos ainda o PRD, construído à sombra do Eanes, com Hermínio Martinho como executor, que pretendia apresentar-se como um conjunto de gente séria, não corrupta, fora da politiquice dos partidos, tecnocrático quanto baste. Estoirou em pouco tempo, a sua figura de proa voltou para a escola e o Martinho inscreveu-se no PSD de Cavaco que o nomeou como gestor da Companhia das Lezírias.

Há poucos anos surgiu por aí, o Compromisso Portugal, com um ar muito distinto, repleto de quadros, profissionais, gestores de topo, ricaços com queda para a política, com vontade de influenciar a governação PS/PSD, com posturas pedagógicas. Agora surge um tal MEP - Movimento Esperança Portugal que parece uma emanação pobre (em dinheiro e ideias) do Compromisso mas, que parece encontrar simpatia nos media, sempre à procura de novidades para fixar audiências ou, porque o fundador do tal MEP traz consigo o cheiro das sotainas inspiradoras. Temos ainda o MMS – Movimento Mérito e Sociedade com um discurso algo naif sobre as capacidades da pátria e dos portugueses. E não esquecemos o MIC do Manuel Alegre que permanece num voluntário banho-maria, sem vontade ou capacidade para combater dentro do PS o ogre socratóide, nem tão pouco para se aventurar cortar p cordão umbilical.

Esta nova vaga de regeneradores pretendem colocar-se entre o PS e o PSD, o que de facto não é lado nenhum. Recordamos as Opções Inadiáveis formado por membros ilustres do PSD, liderados por Sousa Franco e que se dispersaram logo de seguida, falhado o seu posicionamento nessa Quinta de Nenhures que é o espaço entre o PS e o PSD.

Interessa-nos aqui reflectir mais sobre as características ideológicas desses regeneradores do que nas suas propostas concretas, inscritas numa matriz idealista ou no esterco PS/PSD, bem conhecidas. Em regra, alicerçam-se na tecnocracia, na “morte do pai” (os partidos existentes), na pretensa neutralidade do Estado, nos méritos da juventude e, na total ausência de alternativas políticas ou organizativas globais.

A aposta forte nas qualidades tecnocráticas, faz-se com referências à eficiência, (por exemplo, um hospital bem gerido é onde se gasta menos), à inovação (as empresas na hora, como se tem visto não chegam para incentivar o investimento produtivo), à qualidade da gestão, à competitividade, à produtividade, ao empreendorismo (que os desempregados ou os precários não têm, por razões ignotas, naturalmente), ao profissionalismo, ao mérito… Inovam também na terminologia; os trabalhadores entre precários ou pré-despedidos chamam-se colaboradores.

Verberar contra as mordomias, a corrupção da classe política, o nepotismo, a falta de qualidades políticas, culturais ou profissionais do mandarinato é garantia de largo consenso. A questão é como lhe pôr cobro.

Substituir o actual mandarinato por outro, com as mesmas regras de base, é uma mera mudança nas moscas. A operação Mãos Limpas na Itália, que rebentou com os partidos gerados no pós-guerra não impediu a ascensão de Berlusconi ou dos seus concorrentes da coligação Olivo, criada em torno de Prodi. Aqui, o afastamento dos quadros do regime fascista, após o 25 de Abril, não impediu a sua reciclagem nos partidos “democráticos” ou a conversão de muitos ditos “democratas” em vulgares corruptos.

Os regeneradores precisam de se afirmar, sobranceiramente contra as ideologias tradicionais para camuflar o conservadorismo da sua própria ideologia. Pretendem, de facto reembrulhar o pacote para o tornar mais vendável no mercado; protagonizam uma operação de marketing, replicando a prática da amálgama neoliberal PS/PSD.

Outro dos elementos fortes dos regeneradores é a afirmação da sua própria juventude, como se a substituição de pessoas mais velhas por jovens (alguns com mais de 40 anos…), fora do contexto natural da renovação das gerações, seja garantia de qualquer coisa. Recordamos que Sarkozy é vinte anos mais novo que Chirac e que ganharam os franceses com isso? Paira na cabeça dos tristes regeneradores o primado absoluto da juventude ignorando que há jovens senis como há idosos lúcidos; jovens e velhos conservadores ou reaccionários como progressistas ou revolucionários. As sociedades tradicionais, preocupadas com a captação da experiência dos mais velhos, aceitam um papel importante destes na condução dos destinos colectivos, fazendo-se a transição geracional de modo gradual e natural.

A modernidade é outro chavão dos regeneradores mas, não são originais, pois Sócrates também aprecia as coisas modernas, o simplex, a competitividade, as virtudes da iniciativa privada urbi et orbi, a globalização, a flexisegurança, os seguros sociais privados, etc. Porventura preferem os modernos Delfins ao vetusto J S Bach.

Como encaram os regeneradores a dicotomia trabalho-capital e a apropriação da riqueza criada pelos capitalistas? De modo conservador ou reaccionário, defendem a unidade de todos (trabalhadores e patrões), a repartição de sacrifícios, etc para a salvação da pátria. Como temos aqui defendido, a resolução das contradições faz-se pela clarificação das divergências e das clivagens sociais, com a eliminação do capitalismo.

O neoliberalismo é tomado como um facto consumado. O desemprego e a precaridade resultam, para os regeneradores, das leis do mercado e não de correlações de forças sociais com a intervenção da mão bem visível do Estado. A educação, a saúde, a cultura, a segurança social obedecem a estreitos conceitos economicistas e não o princípio da prevalência da promoção da qualidade de vida dos cidadãos. E o tratado de Lisboa, a quem serve? Quais as funções do Estado? Acreditam num sistema judiciário isento, com leis e regulamentos criados pelo poder executivo ou legislativo?

A nossa posição face aos partidos existentes é de que são organizações estatais, parasitárias, umas marcadamente criminosas, outras, em fila de espera para os substituir nas diversas instâncias do poder. Não defendemos a profissionalização da acção política mas, fórmulas de organização de base onde os representantes da multidão actuam com mandatos expressos dos representados e a todo o momento substituíveis. Democracia é a participação de todos nas decisões, é a responsabilidade de todos na gestão social, dispensando essa figura execranda do Estado, com os seus burocratas, senhores dos processos e da decisão, em constante antagonismo com a multidão.

Por isso, a criação de novos partidos não nos gera qualquer entusiasmo embora mantenhamos alguma esperança que a multidão não se deixe convencer por novos grupos de charlatães. Mais do mesmo não, obrigado, quando o mesmo já é demais

Março 2008

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