1 – Introdução ao modelo de
dependência empobrecedora
2
– Cotejo da dívida com o PIB, a FBCF e os rendimentos do trabalho e da empresa
3 - Crédito concedido a particulares
ou famílias e empresas
3.1 – Crédito concedido a particulares
ou famílias
3.2 – Crédito concedido a empresas
3.2.1 – O crédito concedido por prazos
de reembolso
3.2.2 – Distribuição do crédito pela
dimensão da dívida
3.2.3 – Distribuição setorial do
crédito – A formação da deriva imobiliária
3.2.4 – A distribuição setorial do
crédito e do emprego
3.2.5 – A distribuição setorial do
crédito e a destruição de capital
3.2.6 – O divórcio entre o crédito e o
investimento
3.3 - Crédito malparado
Sublinhados
·
O
sistema financeiro constitui uma trama global que, controlando as empresas e
domesticando todas as instâncias políticas – Estados, partidos, sindicatos -
constitui os povos como os alvos de uma nova escravização e mesmo de genocídio;
·
A
dívida é uma amarra que o sistema financeiro utiliza para controlar as pessoas,
as empresas e os Estados;
·
A
dívida é uma peça central da financiarização das sociedades, das nossas vidas,
nesta fase do capitalismo neoliberal;
·
Os
Estados, dominados pelo sistema financeiro, transferem o ónus da dívida pública
para os trabalhadores e aliviam tanto quanto podem as empresas nacionais;
·
Portugal
é uma entidade periférica sem soberania, dirigida pelo capital financeiro
global (“troika”) através de um partido-estado, o PS/PSD;
·
Em
Portugal, em 1995, a dívida pública, das pessoas e das empresas correspondia a
64.5% do PIB; hoje equivale a 2.5 vezes. Não há qualquer relação próxima entre
o crescimento do endividamento, por um lado e, do PIB, do investimento, dos
rendimentos do trabalho, por outro, a partir do final do século passado;
·
A
gula financeira, depois de esgotado o filão das empresas, descapitalizadas,
garantiu junto das famílias, décadas de prestações pelo crédito concedido;
·
Os
bancos estimularam o desenvolvimento do improdutivo setor imobiliário dirigindo
para este a sua principal atenção e desestruturando totalmente uma economia,
historicamente frágil. O crédito dirigiu-se especialmente para setores de
atividade ligados ao imobiliário que, por sua vez, funciona como lavandaria de
negócios escusos e da evasão fiscal;
·
Nessa
volúpia ficaram comprometidas as pessoas, por atitudes próprias e pelo impacto
do endividamento do Estado e das empresas; até que, o próprio sistema
financeiro português também entrou em colapso;
·
O
Estado, controlado pelo sistema financeiro, tem sido um agente decisivo e cruel
no empobrecimento da multidão, beneficiando da falta de alternativas de uma
esquerda institucional, ferozmente keynesiana e estatista, quando não
nacionalista;
·
A
descapitalização das empresas obrigou os governos a aproveitar a boleia da
“troika” para acrescentar ao caderno do capital internacional, medidas
desastradas e desastrosas para os trabalhadores, como a passagem de 11% para
18% do salário bruto, a quotização para a Segurança Social;
·
Desde
1979, o crédito às famílias cresceu mais de 310 vezes enquanto os rendimentos
do trabalho aumentaram 24.7 vezes; e o Estado que tudo facilitou naquele
sentido, é agora o principal instrumento do empobrecimento da multidão, em
rendimentos e direitos;
·
O
grande crescimento da dívida das empresas, a longo prazo, é um claro sintoma de
dificuldades financeiras e não o produto de um esforço investidor. Nas últimas
décadas, a FBCF concentra-se na construção e vem reduzindo o seu peso no PIB;
·
O
crédito considerado malparado pelos bancos cresce acentuadamente desde o início
da actual recessão, particularmente titulado por empresas e, entre estas, as
dos setores da construção e do imobiliário;
·
Por
razões que se prendem com a valorização das ações dos bancos, estes vão
diluindo a assunção de perdas com o malparado e vão ocultando perdas que estão
latentes, com o colapso da economia portuguesa;
·
Este
modelo está a destruir empregos e vidas e ainda, milhares de empresas, tornando
perdidos equipamentos, instalações e poupanças, negando a propaganda do
enriquecimento pessoal por via do “empreendorismo”. Essa destruição de capital
é apadrinhada pelas instâncias comunitárias, reconhecendo a debilidade das
empresas e dos capitalistas portugueses, com o total desprezo para com os
trabalhadores;
·
Urge
encerrar este modelo. Para isso é preciso sangue, suor e lágrimas para derrubar
o predomínio do capital e da democracia de mercado que não nos representa.
A
dívida de pessoas e empresas – a dependência eterna
1 – Introdução ao modelo de
dependência empobrecedora
A dívida é um instrumento de domínio
de credores sobre devedores inserido nas relações do poder capitalista, que
assentam na elevada concentração de riqueza e poder político ou económico num
pequena maioria de indivíduos e instituições.
Que o capitalismo se baseia numa
segmentação primária entre possuidores de meios de produção – os capitalistas –
e trabalhadores é um bom princípio de análise da realidade. Porém, em cada
momento histórico há uma configuração específica, mais ou menos temporária
entre o conjunto dos capitalistas, como há uma segmentação no imenso conjunto
de trabalhadores e ex-trabalhadores.
No seio desses conjuntos sociais há
divisões e grupos com interesses específicos, relações de força que se manifestam
em contradições e disputas que encontram no Estado um instrumento essencial, um
intérprete especial dado o seu monopólio de produção de leis e do exercício do
poder coercivo ou repressivo.
Entre os capitalistas, no seu conjunto
há uma primeira segmentação do poder entre sistema financeiro, multinacionais e
capital mafioso, em que o primeiro funciona como o organizador, o pivot. Mais
abaixo na hierarquia capitalista estão empresas grandes, médias, pequenas,
micro, nano, que têm óbvias queixas do torniquete financeiro tal como elas
existem por parte das famílias endividadas junto dos bancos. No entanto, no que
se refere à exploração do trabalho, à utilização do Estado como instrumento de
criação de condições mais favoráveis para a acumulação capitalista, há uma
grande sintonia entre a tríade referida e os escalões inferiores da hierarquia
do capital. Convém ter sempre presente que o grande objetivo estratégico de
qualquer pequeno empresário é aumentar as vendas, recrutar mais trabalhadores,
por menor preço e tornar-se um grande empresário.
A dívida constitui uma forma de
redistribuição continuada de rendimento; e diz-se continuada porque é gerada
uma dependência do crédito e essa dependência é fixada para toda a vida,
garantindo a favor do sistema financeiro, verdadeiras rendas. A partir do
vínculo do crédito, gerou-se uma verdadeira servidão, como nos tempos feudais,
quando se pagavam dízimas ao senhor e à Igreja, porque estes, em conjunto, é
que viabilizavam a vida individual. Nesses tempos, a fuga era possível, para as
cidades, onde os senhores perdiam o rasto do fugitivo; agora não porque as
bases de dados em que estamos inseridos nos mantêm os liames da servidão,
tornando-nos localizáveis a todo o momento.
Atualmente, passada uma fase em que os
quase únicos destinatários eram as empresas, o sistema financeiro amarrou os
particulares, as famílias e, ocupando e controlando o Estado, tornou este um
continuado e incontrolado devedor. E, tornando-se este um devedor compulsivo
através de vários expedientes o mesmo sistema financeiro que controla o Estado,
organiza a lei orçamental e fiscal para garantir um fluxo permanente e
crescente, de rendimentos, para pagar a dívida, o deficit… cuja existência é
criada e dimensionada pelo próprio sistema financeiro e pelos seus
assalariados, os mandarins.
No caso concreto de Portugal, (gráfico
1) a pressão do sistema financeiro global exerce-se através da troika
(UE+BCE+FMI) em articulação com os bancos lusos, membros subalternos daquele
mesmo sistema e dele dependentes para se refinanciarem, pelas ligações
acionistas e pela condução estratégica do processo global de financiarização. A
troika, por seu turno, monitoriza a atuação do governo português que,
acrescenta, acopla às recomendações da troika, elementos acessórios, importantes
para a viabilização e acumulação das empresas portuguesas. Os bancos nacionais,
participam na construção e execução da política orçamental e fiscal,
assegurando a assinatura pelo Estado de incentivos, deduções, contratos,
parcerias, concessões e rendas; e, em paralelo, procuram assegurar a
dependência das empresas e das famílias face ao crédito, minimizando os riscos
de implosão do sistema de crédito.
O Estado, é possuído pelo sistema
financeiro nacional, como intermediário do sistema global; os bancos
portugueses são como Mobutu que enriquecia enquanto favorecia as multinacionais
que saqueavam o povo congolês e o seu território. E todas as suas dificuldades
são repercutidas na vida da multidão, da esmagadora maioria dos residentes em
Portugal, trabalhadores, em funções ou no desemprego, reformados e pobres em
geral; hoje, pela mão de um verme Passos, ontem pela de um facínora, Sócrates.
Finalmente, na amálgama de empresas há
a considerar as de regime, ora ligadas ao sistema financeiro, ora ao capital
estrangeiro, com uma forte capacidade de influenciar as decisões dos mandarins
(aumentos de preços, obtenção de recursos comunitários, posições dominantes de
monopólio…); e ainda toda a vasta ganga de pequenos e médios capitalistas que,
podem não ter capacidades técnicas ou de gestão mas, que sabem explorar e
reprimir os seus assalariados, transmitir para estes, a pressão exercida pelos
bancos.
O exercício
do poder político e económico em Portugal gráfico
1
O capitalismo, produzindo cada vez
menos riqueza efetiva, promovendo uma evolução do consumo muito aquém das suas
necessidades de acumulação, dedica-se à especulação financeira, à
financiarização da vida de todos nós e, no âmbito desta, à cativação de
rendimentos futuros através do crédito e da escravização através de uma dívida
impagável; pela sua enorme dimensão, agravada pela quebra geral de rendimentos
por parte dos devedores.
O gráfico 2 evidencia de forma sumária
e separada a evolução da dívida do Estado, das empresas não financeiras e dos
particulares ou famílias, desde 1995. Neste último ano, a dívida daqueles
conjuntos, somada, ficava muito aquém do valor global do PIB – 64.5% - e,
atualmente ultrapassa duas vezes e meia o PIB, sabendo-se que a evolução deste
nos próximos tempos não irá permitir muitas possibilidades de redução da dívida
e pagamento de juros. Aqui levanta-se a questão da necessidade de uma
estratégia como a do Equador, com suspensão de pagamento da dívida pública,
avaliação das cláusulas fraudulentas e corruptas nos contratos e para obtenção
de fortes reduções no volume da dívida; e uma estratégia que faça os bancos
arcar com as suas responsabilidades no endividamento insano de pessoas e
empresas. Essa estratégia está bem distante de ser conseguida no quadro
institucional presente, mesmo considerando um futuro papel de alguma relevância
da esquerda do regime; e só poderá ser conseguida num quadro de rotura com o
modelo económico e de democracia de mercado, de âmbito europeu, dada a
irrelevância de Portugal, em qualquer contexto geopolítico, mesmo que restrito
à Ibéria.
gráfico 2
Fonte
primária: Banco de Portugal
O volume da dívida, para todos os
grupos de devedores condiciona a vida das pessoas, sabendo-se que 2.5 M de
agregados familiares correspondem a 54% dos créditos à habitação e que têm um
rendimento médio de € 914[1]
… antes da aplicação da nova taxa de 18% de descontos para a Segurança Social,
o aumento do IMI e outros desastres que se acham na incubadora governamental.
Isto porque os mandarins se encarregam de onerar as famílias com o impacto da
dívida pública nos orçamentos familiares já muito comprometidos com prestações
bancárias próprias. Quanto às empresas, os caminhos são poucos – falência,
fusões ou compra por capitais estrangeiros; e em todas as situações com perdas
para os bancos e, sobretudo no acervo das dívidas ao fisco e à Segurança
Social.
Neste texto, vamos debruçar-nos apenas
no endividamento não público, das empresas e das famílias, no seguimento de
outras abordagens da dívida, mormente pública[2].
2 – Cotejo da dívida com o
PIB, a FBCF e os rendimentos do trabalho e da empresa
Tomando o período 1979/2011 para os
valores correntes do PIB, da FBCF, dos rendimentos do trabalho e da empresa ou
da propriedade e, do crédito concedido em final de cada ano, pela banca a
empresas ou particulares, observam-se disparidades relevantes.
Na análise do gráfico 3, na evolução
daquelas cinco variáveis, destacam-se várias situações:
·
Há
uma razoável proximidade no paralelismo entre todas até 1998, ano a partir do
qual o volume do crédito concedido evolui imparável, em divórcio total
relativamente às outras grandezas, num crescimento que só nos últimos anos
estagnou;
·
As
variáveis de rendimento, evidenciam um crescimento, face a 1979, no caso dos
rendimentos do trabalho, inferior à da marcha global da economia e dos
rendimentos da empresa, acima, de modo mais marcante na década de noventa,
antes da entrada no período de anemia que carateriza o presente século;
·
A
FBCF, que apresenta desde o período recessivo de 1993/95 um crescimento
inferior ao das outras variáveis, estagna com a entrada no século XXI,
regredindo nos últimos anos;
·
Não
se denota qualquer relação entre o aumento do crédito concedido pela banca e o
aumento da capacidade produtiva, do investimento; o crédito não tem grande
aplicação em investimento e, este não tendo promovido, um aumento da capacidade
produtiva, não induz a geração de rendimentos para amortizar o capital e pagar
os juros de tamanha massa de crédito.
gráfico 3
Fonte primária: Banco de Portugal
Outra forma de observar essa realidade
consiste em tomar a situação, no início e no final do período considerado e
ainda em dois anos especiais – 1990 e 1998. Assim, 1990 é o ano em que o
crédito pesa menos para as variáveis selecionadas; por exemplo, o PIB era 2.3
vezes superior ao crédito concedido no final desse ano e o valor da FBCF
correspondia a 64% do crédito bancário. Em 1998, o total dos rendimentos do
trabalho já só correspondia a 65% do crédito e os rendimentos das empresas a
menos de um terço e todos beneficiavam dos incentivos e das facilidades
concedidas pelos bancos. Finalmente, no último ano, já na quebra do crédito
fácil, a massa salarial correspondia a um terço do crédito, os rendimentos
empresariais a uns simples 15% e a FBCF somente a 12%. Um endividamento
crescente e improdutivo.
Rend. trabalho/
Crédito
|
Rend. empresa/
Crédito
|
PIB/Crédito
|
FBCF/Crédito
|
|
1979
|
84
|
34
|
156
|
53
|
1990
|
108
|
67
|
233
|
64
|
1998
|
65
|
30
|
133
|
36
|
2011
|
34
|
15
|
67
|
12
|
Fonte primária: Banco de Portugal
Essa evolução, pode quantificar-se
também, continuando a utilizar os níveis correntes de preços, com outras
variáveis globais com as quais aqueles agregados de créditos se podem comparar.
Evolução 1979/2011
Credito acumulado total (jun 2012)
|
60.3 vezes
|
Credito acumulado a empresas (jun
2012)
|
30.1 vezes
|
Credito acumulado a particulares
(jun 2012)
|
310.8
vezes
|
PIB
|
26.8 vezes
|
Rendimento disponível
|
24.1 vezes
|
Remunerações do
trabalho
|
24.7 vezes
|
FBCF
|
14.3 vezes
|
Consumo privado
|
28.9 vezes
|
Exportações
|
36.1 vezes
|
Importações
|
35.2 vezes
|
Fonte
primária : Banco de Portugal
É evidente o desequilíbrio entre o
crescimento do crédito concedido e o das outras variáveis, nomeadamente no
capítulo do endividamento das famílias,
extremamente distanciado da evolução registada para os rendimentos do
trabalho; assim sendo, demonstra-se que as famílias comprometeram de forma
brutal os seus rendimentos futuros, para pagar os empréstimos, o que assume particular
gravidade perante a deriva empobrecedora em curso.
Torna-se necessário detalhar agora a
composição do crédito concedido e, seguidamente, do investimento.
3 - Crédito concedido a particulares
ou famílias e empresas
Entre o crédito concedido pela banca,
observe-se, em primeiro lugar, a sua distinção consoante os devedores são
empresas ou pessoas individuais, famílias. A evolução, no gráfico 4 espelhada,
revela uma modificação estrutural imensa, plena de significado e que se prende
com o fracasso total da gestão política e económica protagonizada pelo
partido-estado, PS/PSD e. pelos banqueiros que os orientam. Se o fracasso fosse
só deles e para eles, teríamos razões para dormir descansados; e é, por
continuarmos – nós - a dormir descansados que eles têm margem de manobra para
repercutir sobre a multidão, o evidente desastre. Recentemente[3],
a propósito da dívida das empresas à Segurança Social, tecemos considerações
sobre a política dos banqueiros em meados dos anos noventa, quando se achava em
desmantelamento a frágil estrutura industrial de Portugal, a troco de fundos
comunitários.
No final dos anos setenta, a
esmagadora maioria do crédito era dirigido para as empresas (89.2%); porém, e
até 1996, há uma redução contínua do peso das empresas que se situa então, em
49.3% do total. De então para cá, o crédito às famílias passou a maioritário,
fixando-se em mais de 55% nos últimos anos.
Os anos que se seguiram à integração
na então CEE mostram uma queda do peso do crédito às empresas no total e os efeitos
da crise recessiva de 1993/95 estão bem à vista no gráfico 4, mantendo-se uma
relativa estabilidade, posteriormente. Em 1995, a dívida das empresas à
Segurança Social duplicou face a 1990[4];
a adesão à CEE e, sobretudo a integração ibérica, tornava inviáveis empresas de
gestão muito tradicional e descapitalizadas; os fundos comunitários animavam as
obras públicas, atividades de consultadoria e os negócios fraudulentos da
formação profissional. Tudo isso devidamente embrulhado com o anúncio de um nível
de vida europeu para os próximos tempos e o fim de dez anos de cavaquismo dava
um ar de renovação nas mentalidades e nas políticas; por seu turno, a evolução
tecnológica na área das comunicações e na informática gerou no final do século
a ilusão da e-economia, a qual se finou poucos anos depois.
gráfico 4
Fonte primária: Banco
de Portugal
Os bancos conheciam muito bem o estado
das empresas portuguesas, o seu grau de endividamento, a sua baixa capacidade
de auto-financiamento e inovação tecnológica ou de gestão e, decidiram
desenvolver de modo desmesurado um mercado facilmente cativo; o imobiliário e o
crédito aos particulares. Fomentado pelo sistema financeiro e pelos mandarins,
o consumismo tornou as famílias fáceis presas do endividamento, numa época em
que o futuro parecia assegurado e risonho. Tornou-se vulgar a compra de
habitação - e de segunda habitação para os mais endinheirados; a inclusão no
empréstimo de viagens, mobiliário, carro, bens ou serviços com uma vida útil
limitada mas, com uma presença na prestação bancária para o resto da vida. Para
facilitar o empréstimo, as avaliações bancárias eram sobreavaliadas para que o
valor do empréstimo cobrisse a totalidade do valor da compra e, se o comprador
fosse ambicioso, abrangeria também a compra de um carrinho novo. Essa prática
da sobreavaliação inflacionava os preços do imobiliário a pedir pelo construtor
e induzia no comprador a ideia de que adquiria um bem mais valioso do que preço
de compra. Numa população pobre, de iliteratos telespetadores, habituada às
dores da penúria, as facilidades no acesso ao dinheiro, trariam forçosamente,
indigestão.
Os prazos de amortização foram
crescendo, para alimentar a hidra financeira, chegando aos cinquenta anos. Os
riscos para os bancos mostraram-se incomparavelmente menores do que os
observados no crédito às empresas; as casas ficavam hipotecadas pelos bancos
mutuantes, os seguros de vida obrigatórios constituíam outra segurança para os
bancos e ainda uma via muito lucrativa para as seguradoras, muitas, não por
acaso, ligadas aos bancos, que tornavam esses seguros de realização obrigatória
junto das seguradoras do grupo. Por outro lado, a posse de habitação constituía
um património a conservar por parte das famílias que, só em caso extremo iriam
faltar aos seus compromissos prestacionais.
O Estado, naturalmente, não foi peça
despicienda nesta trama. Mostrou-se distraído na permissão da inclusão, acima
citada, de viagens, automóveis, nos empréstimos para habitação, disfarçando
assim, parte substancial do crédito para consumo, como democrático exercício do
direito à habitação, em conivência com os agentes de viagens e o poderoso setor
do automóvel. O Estado ofereceu deduções em IRS para parte das prestações do
crédito para habitação, onde se incluía, portanto, parte relativa a bens de
consumo imediato ou duradouro e contribuiu para o espanto da “troika” ao
encontrar nas estradas portuguesas maior profusão de altas cilindradas do que
na Europa rica. Para favorecer e apoiar os bancos, o Estado ofereceu deduções
em IRS para os seguros de vida e isenções de IMI e bonificações de juros para
que os jovens se endividassem mais facilmente. Nunca mais ninguém falou de
política de habitação, de habitação social, ficando o “mercado” como regulador
exclusivo desta área essencial na vida das pessoas.
Estava escondida uma versão lusa do “subprime”
norte-americano. Perante as suas dificuldades financeiras, o Estado e os bancos
mudaram recentemente as regras do jogo. Restringem o crédito para empresas e
particulares, apossam-se das habitações das pessoas atingidas pelo desemprego
(19500 entre 2008 e junho último… e a procissão ainda vai no adro)[5],
em condições leoninas protegidas pelos deputados da maioria e no âmbito de uma
cadeia corrupta que envolve leiloeiras e funcionários das execuções, para
conduzir imobiliário barato para gangs organizados e afastar concorrentes
particulares; tudo isso dentro de uma forte tradição que tornou a corrupção
como a componente essencial da acumulação capitalista em Portugal. Os governos
reduzem ou anulam as deduções em IRS relativas à habitação e propõem-se
aumentar substancialmente o IMI para alimentar as mafias partidárias
autárquicas e preparar vendas precipitadas e baratas de casas, a adquirir por
“investidores” que as lançarão, posteriormente, para arrendamento. Como há
décadas, acontece, continua em vigor a religião do mercado, sem qualquer
arremedo de política de habitação, dentro do quadro anti-social da atuação do
partido-estado.
De acordo com o último censo, o
inventário das habitações existentes registava 3997 mil habitações principais,
1133 mil secundárias e … 735 mil vagas, sem qualquer função útil para além
de gerarem receita camarária. Nos vinte
anos terminados em 2011 foram construídas 1034 milhares de alojamentos,
sensivelmente um por cada três famílias ou, de outro modo, pode dizer-se que
mais de 1/6 do parque habitacional tem menos de vinte anos, que mais de 25% das
pessoas têm pelo menos duas casas e que 1/8 das casas estão desocupadas. A
ausência de uma política de habitação deixou o assunto entregue ao “mercado”,
com custos financeiros enormes, com evidente deseconomia de capital, impactos
tremendos na balança comercial (importações) e um colossal desperdício de espaços
com baixíssima ou nula utilização e consequências ambientais e paisagísticas
refletindo a cultura dos autarcas. Tudo isso confraternizando em cidades
repletas de ruínas, prédios emparedados ou esventrados, à espera que as
autarquias permitam o abate, qualquer dia; até porque os autarcas também não
tocam na degradação do edificado, depois do desinteresse do “mercado” no que
concerne às SRU e assistem mudos e quedos.
O empenhamento dos bancos na promoção
deste novo-riquismo, neste desperdício de capacidade de alojamento, na ocupação
desordenada do espaço suburbano e rural é conhecido; é o modelo da “edge city”
norte-americana, centros urbanos degradados, entregue a gente pobre e
imigrantes e uma periferia invadida de bairros, vivendas e condomínios. Se não
houvesse mais nenhuma, esta herança do PS/PSD e dos bancos que os vêm
patrocinando seria suficiente para responsabilizar os banqueiros e preencher
muitas cadeias com caciques locais com responsabilidades nos PDM’s, no
licenciamento, na urbanização de terrenos. Pode mesmo dimensionar-se essa casta
peçonhenta; presidentes de câmara, vereadores responsáveis pelo urbanismo e da
área financeira, são umas mil pessoas, na sua grande maioria do partido-estado.
Retomando a linha central deste texto,
refira-se que para além de financiarem os “consumidores” finais de casas, os
bancos financiaram a montante, os construtores civis, na sua grande maioria,
uma miríade de construtores civis, ex-trolhas promovidos a industriais, sem
capacidades de gestão, nem capitais mas, muita habilidade para utilizar o
trabalho barato de imigrantes cabo-verdianos ou ucranianos.
As obras a nível local constituíram
outra forma de enriquecimento tendo as câmaras como vértice do ínvio
financiamento partidário e de familiares de autarcas. Confiantes na perenidade
do financiamento comunitário e do constante aumento de receitas autárquicas
obtidas a partir do imobiliário (IMI ou IMT) as câmaras dedicaram-se também ao
uso e abuso do crédito bancário[6];
ora como o Estado, local, regional ou
nacional, não vai à falência, os bancos aplicaram também ali os seus capitais, permitindo
aos autarcas construírem pavilhões, lombas e rotundas, empresas municipais e
eventos que lembrassem à plebe as capacidades do presidente e o mostrassem como
reincarnação de senhores feudais rodeados de séquitos de motoristas,
secretárias, consultores e assessores.
Quer no caso dos adquirentes de
habitação, quer no caso dos construtores, os bancos pouco se importavam com a
solvabilidade respetiva uma vez que as hipotecas estavam constituídas e, num
contexto altista dos preços do imobiliário, a posse por incumprimento de
habitações ou prédios inconclusos até seriam excelentes elementos de lucros
chorudos.
3.1 – Crédito concedido a
particulares ou famílias
Como evoluiu o crédito aos
particulares que os simpáticos bancos forneceram prazenteiros mas, com poucos
riscos?
A evolução do crédito a particulares,
comparando com os valores de 1979, apresenta uma evolução meteórica; em 1979
cifrava-se em € 441M e em junho último atingiu € 137063 M. Como se disse atrás,
há uma parcela de crédito incluído sob a etiqueta de habitação que, de facto,
se refere a consumo. E, convém recordar que, entre 1979 e 2011, os rendimentos
do trabalho cresceram apenas 24.7 vezes.
Total
|
Habitação
|
Outros
fins
|
|
1986
|
8.5
vezes
|
10.4 vezes
|
5.1 vezes
|
1998
|
100.9
vezes
|
113.0
vezes
|
78.3 vezes
|
2001
|
172.2
vezes
|
199.9
vezes
|
120.7
vezes
|
2011
|
310.8
vezes
|
389.5
vezes
|
164.2
vezes
|
Fonte primária: Banco
de Portugal
No final dos anos 70, a habitação
absorvia 65% do crédito às famílias, crescendo depois mais acentuadamente em
1983/85, uma vez que a crise recessiva então vivida fez estagnar o crédito com
outros fins, fixando-se em torno de 80% do total até 1989. Indicadores desta
grandeza só voltam a registar-se depois de 2010, já bem dentro da atual crise, novamente
como resultado da retração no crédito com outros fins.
Mais recentemente, o volume do crédito
concedido para habitação decresce € 2700 M em junho último face ao final de
2010, ficando mesmo abaixo do acumulado observado no fim de 2009. Por seu
turno, o número de devedores por crédito à habitação começa a reduzir-se a
partir de junho do ano passado, como resultado dos contratos cancelados e da
estagnação das vendas de novas habitações. Contudo, a dívida média por
aquisição de habitação apresenta uma ténue redução desde finais de 2010,
cifrando-se de acordo, com os últimos dados em € 48.4 m.
O crédito para outros fins apresenta
desde finais de 2009 uma quebra de 13.8%, a qual se deverá acentuar no resto do
presente ano. O seu valor médio por devedor decresce, sobretudo desde finais de
2010.
Dívida média dos particulares (€)
Habitação
|
Outros
fins
|
|
03-2009
|
48513
|
8862
|
12-2009
|
48850
|
8902
|
12-2010
|
48898
|
8724
|
12-2011
|
48542
|
8138
|
06-2012
|
48356
|
7812
|
Fonte primária: Banco de Portugal
3.2 – Crédito concedido a empresas
A abordagem do crédito às empresas é
mais diversificada. No final de junho último, o volume do crédito em carteira,
concedido pelos bancos às empresas não financeiras cresceu umas 30 vezes, um
pouco acima dos rendimentos das empresas e da propriedade que aumentaram 25.5 vezes
no período 1979/2011. Nos últimos anos esse volume mantém-se numa ligeira
regressão, tendo em conta as limitações financeiras dos bancos em adquirir
liquidez e o grau de endividamento ou de solvabilidade das empresas.
3.2.1 – O crédito concedido por
prazos de reembolso
O crédito a menos de uma ano, em regra
de caráter comercial, mantém-se a um nível constante neste século, o que se
altera num sentido decrescente, desde meados de 2009, como claro indicador da
quebra da atividade económica e das vendas, na parcimónia dos bancos na
concessão de crédito e a falta de solidez financeira da grande maioria das
empresas.
Gráfico
5
Fonte primária: Banco de Portugal
O crédito concedido por um a cinco
anos constitui, com poucas excepções, o segmento mais dinâmico até 2004.
Reflete os baixos níveis de capitais próprios, a tradição da fuga ao
autofinanciamento e a facilidade na obtenção de crédito. Os empresários
portugueses alicerçam o crescimento das empresas no crédito, esperando que num
prazo médio, a marcha favorável dos negócios, para além de remunerar o
empréstimo, permita margens de lucro que permitam capitalizar a empresa, sem
claro está, perturbar a conhecida promiscuidade entre gastos da empresa e
gastos pessoais, que por tradição, tem merecido, forte complacência da
administração fiscal. Esta questão será abordada numa perspetiva de comparação
internacional, em breve, em outro documento.
Na primeira metade da década inicial do
século, o volume do crédito de médio prazo estagna para retomar a evolução
ascendente no período 2006/2009, a partir do qual regride consideravelmente, atingindo
em junho último o nível de seis anos antes. Mesmo com essa irregularidade, este
segmento do crédito aumenta 42 vezes entre 1979 e meados de 2012.
A evolução referida no parágrafo
anterior contrasta com o crescimento constante do crédito a mais de cinco anos,
desde 1993 quando sofre uma retração relacionada com a crise económica do
“oásis” que lançou para a História o ministro Braga de Macedo; enquanto a crise
assolava a Europa, o ministro dizia que Portugal era um oásis que, rapidamente
se revelou em desastre. Decididamente, o apelido Macedo no governo parece ornar
ministros idiotas ou facínoras. Esse pendor ascensional só começa a decair em
meados de 2011, com o agudizar das dificuldades económicas e financeiras
trazidas pela “troika”, como bagagem própria ou satisfazendo as encomendas do
governo e do valente patronato lusitano.
Pelo seu potencial de gerador de
aumentos da capacidade produtiva – investimento – o crédito a longo prazo pode
ser comparado com a FBCF. Há um plano global de acentuado paralelismo entre
essas duas grandezas sensivelmente até ao final do século XX; durante a década
de noventa, a FBCF cresce mais do que o crédito a longo prazo, porventura
devido à construção das grandes infraestruturas – CC Belém, Expo98, ponte Vasco
da Gama, linha férrea de Coina a Setúbal, autoestradas, etc – também altamente
financiadas por fundos europeus.
Gráfico 6
Fonte primária: Banco de Portugal
Já este século a FBCF estagna e
decresce depois de 2009. Entretanto, o crédito a mais de cinco anos, aumenta,
tendo como base o ano de 1979, 11.7 vezes até 1998, 25 vezes até 2001, até
alcançar 93.2 vezes no final do ano passado.
O crescimento anémico da economia
portuguesa na última década tornou as empresas ainda mais dependentes do
financiamento exterior e os bancos não se fizeram rogados, refinanciando-se nos
seus congéneres de maiores dimensões, com cabedais disponíveis. Mantendo-se o
investimento relativamente estável, o crescimento do crédito a longo prazo,
prende-se com o recurso a uma presença mais permanente do capital alheio nas
empresas, uma menor rotatividade dos mesmos; e em muitos casos de maior
desespero, a reestruturação das dívidas aos bancos, com aumento dos prazos de
pagamento. Nos últimos anos, essa situação é particularmente nítida com o
aumento do crédito a longo prazo em paralelo com a queda das existências de dívidas
enquadradas nos outros segmentos, mormente das que têm pagamentos aprazados por
lapsos de tempo entre um e cinco anos.
A situação não é fácil para muitas
empresas, sobre-endividadas, procurando alongar o futuro do reembolso das
dívidas, à espera de uma retoma que se vem fazendo rogada em aparecer. E o
memorando da troika, associado à lógica de redução salarial e do preço do
trabalho em geral, acrescentada por Passos, na política habitual da
competitividade assente no baixo salário – que nenhum mandarim assumiu – vem
tornando essa retoma uma quimera. Assim sendo, assistem-se a falências ou
encerramentos, despedimentos, “downsizings”, numa inevitável destruição de
capital que se irá agravar nos próximos anos. Não é muito provável uma grande
entrada de capital estrangeiro para comprar essas empresas, por várias razões;
uma, é que há muitos lugares no mundo com baixos salários e baixas
qualificações, depois porque as empresas portuguesas não estão, em geral bem
apetrechadas de equipamentos e tenologias, para serem apetecíveis e,
finalmente, porque os capitais querem-se líquidos para saltitar pelo mundo à
procura dos lucros fáceis da especulação. A crise social está em pleno
desenvolvimento e não se observa uma madura movimentação popular para tirar
proveito da situação e modificar radicalmente a estrutura política e económica.
Também, os simpáticos bancos –
coitados – estão cheios de problemas, entre outras causas, relativas à não
solvabilidade das empresas. Ficar com fábricas, oficinas e equipamentos nunca
fez sorrir os bancos, mesmo em conjunturas menos sombrias. Aboletarem-se em instalações
dos falidos, neste momento, também não é interessante, pois o “boom”
imobiliário acabou e não vão construir-se mais umas dezenas de centros
comerciais e umas centenas de condomínios.
Que fazem então, os bancos, com a
torneira do refinanciamento fechada? Colaboram com as empresas em dificuldades
reescalonando o crédito para prazos superiores, embora saibam que muito desse
crédito nunca será reembolsado; e vão dilatando o tempo em que assumem essas
perdas, para as diluírem no tempo e reduzirem ao mínimo o impacto nos lucros e
nas cotações das suas ações em bolsa, papéis que pouco mais valem que o
higiénico. Em suma, os valores dos créditos malparados estão muito subavaliados
e os balanços dos bancos não retratam a sua triste realidade, com toda a
conivência do BCE, da “troika”, do BdP, da CMVM e do governo, mormente do
sonolento Gaspar; todos sabem que a verdade nos balanços seria um género de
pneumónica para o sistema bancário global, uma vez que essa mascarada não
acontece só em Portugal.
A palavra mascarada é a mais adequada
embora seja um espetáculo que promove a precariedade na vida de todos nós. O
sistema bancário goza de uma proteção total por parte do seu Estado, com a
conivência das instituições do sistema financeiro global – BCE, UE, FMI; uma
proteção que contrasta em absoluto com o desprezo e criminalização com que são
tratadas as vítimas dos desmandos do setor financeiro. O memorando da “troika”
contempla € 12000 M de endividamento público para apoio do Estado à
recapitalização dos bancos, parte do qual já foi concretizado.
O pior cenário, revelador do que atrás
se disse sobre o malparado encoberto, mostra que este é um género de bomba com
explosão marcada. A Standard & Poors, uma das célebres e temidas agências
de “rating” prevê uma ajuda pública aos bancos, para breve, de € 51000 M (cerca
de 30% do PIB)[7],
sobretudo se a situação em Espanha se agravar. Isso demonstra o caráter global
do sistema financeiro e a interdependência entre os seus elementos. Já em
princípios de 2011, a vice-presidente do governo espanhol, Elena Salgado, dizia
textualmente “Portugal não precisa de ajuda internacional”[8];
ela sabia perfeitamente das ligações entre bancos portugueses e espanhóis, da forte
presença acionista de bancos espanhóis no sistema financeiro português e,
portanto o contágio em Espanha de uma pneumónica lusa.
E ainda poderíamos citar a espantosa
intervenção do partido-estado no BPN e no BPP, com custos enormes para o erário
público, dado o zelo com que aquela estrutura mafiosa trata o sistema
financeiro local.
3.2.2 – Distribuição do crédito
pela dimensão da dívida
Outra forma que os bancos utilizam
para fazer face à situação é a discriminação entre os seus clientes, facilitando
o financiamento às grandes empresas, às do regime, às que têm ligações
estreitas com o mandarinato, em detrimento das mais pequenas, anónimas, sem
acesso aos decisores superiores das instituições bancárias.
Empresas
por escalão da dimensão da dívida (em € 1000)
<
20
|
20
– 50
|
50
– 100
|
100
- 200
|
200
- 400
|
400
- 1000
|
1000
- 5000
|
>
5000
|
||
12-2002
|
(a)
|
8.0
|
46.8
|
94.0
|
177.0
|
325.7
|
659.5
|
2021.6
|
20459.9
|
(b)
|
50.6
|
13.7
|
10.0
|
8.4
|
6.3
|
5.4
|
4.4
|
1.1
|
|
06-2012
|
(a)
|
6.7
|
32.0
|
70.2
|
139.7
|
278.1
|
617.5
|
2048.7
|
21887.9
|
(b)
|
43.3
|
17.8
|
11.5
|
9.1
|
6.8
|
5.7
|
4.4
|
1.4
|
(a)
endividamento
médio (€ 1000 ) Fonte:
Banco de Portugal
(b)
Parcela
das empresas (%)
É bastante claro, na análise do quadro
anterior que, entre 2002 e 2012, se reduziu a dívida média das empresas aos
bancos, em todos os escalões, excepto os dois que contemplam maiores valores
médios, superiores a € 1 M. Esse decrescimento foi de 31.6% para as empresas
com 20/50000 euros de dívida, reduzindo-se essa percentagem com o aumento da
dívida, até se chegar a um aumento de 7% para a dívida média de quem deve mais
€ 5M, sabendo-se que essa média, na última coluna, se posiciona acima dos € 20
M.
Em paralelo, a representatividade das
mais pequenas dívidas no total – 50.6% em 2002, reduz-se em 2012 para 43.3%,
com o aumento do peso no total, dos devedores com maior sobrecarga de dívida.
A lógica dos bancos é a forçosa
viabilização dos grandes devedores uma vez que estes, se falirem trazem danos
grandes aos bancos, independentemente da existência de garantias; e daí que
tenha aumentado a maior representatividade dessas empresas, para além da dívida
média. Inversamente, os bancos têm menos atenção aos pequenos devedores,
procurando apenas reduzir os seus compromissos, quer com créditos menores ou,
com ausência de crédito, justificando-se assim, em parte, a perda de peso das
mais pequenas dívidas. Para as pequenas dívidas os bancos preocupam-se por
serem muitas, sabendo que muitas delas irão encerrar ou procurar manter as
dívidas com os prazos já vencidos, o que significa acesso encerrado ao crédito.
No caso das grandes dívidas, aí concentra-se toda a atenção dos bancos até
porque normalmente, em cada uma delas estão comprometidos vários bancos,
procurando cada um as melhores condições de sair do atoleiro, sem prejuízo da
alguma unidade entre eles; essas, constituem o lugar de confraternização entre
mandarins, gestores e capitalistas privados, de reciclagem de uns nas funções
dos outros, lugar de concertação e fusão de interesses entre Estado e
capitalistas.
3.2.3 – Distribuição setorial do
crédito – A formação da deriva imobiliária
Seguidamente, procede-se a uma sumária
avaliação da distribuição do crédito concedido, pelos principais setores da
atividade económica.
O conjunto formado pelo chamado setor
primário (agricultura, pesca… indústria extrativa), pela indústria
transformadora e ainda a produção ou distribuição de energia e água, absorvia
em 1979 mais de metade do crédito (50.8%), ultrapassando, em regra, essa marca
até 1990. Assiste-se, posteriormente, durante uma década, a uma queda acentuada
dessa posição relativa, passando a partir de 2004 a quedar-se por menos de 1/5
do crédito global concedido às empresas.
Gráfico 7
1+2+3+4 – Agricult+Ind. Extrat+Ind.
Transform+Eletricif, gás, água
5+8+11 – Construção+
Hotelaria+Imobiliário
Fonte primária: Banco de Portugal
Naquele conjunto de atividades a mais
relevante em termos do crédito concedido pela banca é a indústria
transformadora. O seu peso no total apresenta uma queda quase sem interrupção
em todo o período, excepto no princípio e no final da década de 80 do século
passado. Desde 2006 que não ultrapassa 13% daquele total. Em valores absolutos,
é bem clara a estagnação em 1985/87, 1992/98, 2000/2007 e de 2008 em diante, em
patamares distintos, esclareça-se.
A agricultura que absorve mais de 4%
do crédito em 1981/89, decresce até atingir um valor mínimo (1.1%) em 2000,
recuperando depois, lentamente daí em diante, sem contudo ultrapassar 1.8% do
total.
No conjunto construção, hotelaria e
imobiliário, observa-se uma relativa estabilidade da sua relevância no crédito
total com valores pouco acima dos 10% até 1997, crescendo brutalmente em 1998
para continuar a sua marcha ascendente até 2007, estagnando posteriormente.
Note-se que a evolução observada no quadro anterior quase coincide com a
verificada para o total do crédito concedido; note-se ainda que, depois de
2000, o conjunto daqueles três setores ultrapassa largamente o peso relativo do
outro conjunto refletido no gráfico 7.
A construção é o setor mais relevante
entre os três setores em valores absolutos do crédito que lhe foi concedido e
tem um período de relativa estagnação no segundo lustro dos anos 80: multiplica
por nove, em 2005, o valor do crédito existente em 1996, crescendo muito mais
lentamente até atingir um máximo em 2009, decaindo desde então.
A hotelaria tem um papel residual no
crédito bancário até 1996, crescendo mais de 15 vezes no ano seguinte,
iniciando aí uma evolução ascendente daí em diante, mesmo nos últimos anos de
crise e restrição de crédito.
Por seu turno, o imobiliário apresenta
uma evolução dos seus valores de crédito quase sempre ascendente até 2009,
decaindo desde então.
O quadro seguinte pormenoriza a evolução
registada entre 1979 e junho último, em paralelo com a importância relativa de
cada setor na distribuição do crédito, nos anos extremos do período
considerado.
Os cinco setores de maior crescimento,
destacam-se claramente da média global. O crescimento, enorme, em termos
relativos dos serviços de educação… revela a expansão da participação do
capital privado nestes setores, bem como a vulgarização de entes do setor
público em recorrer ao financiamento privado; dito de outro modo, significa a
mercantilização daqueles serviços sociais, cujo caráter coletivo aconselharia à
sua exclusão de uma lógica mercantil, da sua integração no campo da
financiarização, o que é muito pouco provável no contexto neoliberal e de
democracia de mercado em que estamos afogados.
Quanto ao crescimento do crédito
concedido aos serviços de informação e comunicação, constitui o resultado da
sua própria expansão, normal no plano da evolução da estrutura económica das
sociedades no lapso de tempo considerado, superior a trinta anos.
Setor
de atividade
|
Crescimento
1979/2012 (vezes)
|
Peso
no total - 1979
|
Peso
no total – jun 2012
|
Educ., saúde serv. sociais e pessoais
|
4797
|
0
|
4,4
|
Hotelaria
|
2931
|
0,1
|
5,3
|
Inform e comunicação
|
684
|
0,1
|
1,2
|
Imobiliário
|
130
|
3,2
|
13,7
|
Construção
|
98
|
6,2
|
20,0
|
Comércio
|
32
|
11,5
|
12,3
|
Total
|
30
|
100,0
|
100,0
|
Transportes
|
28
|
7,8
|
7,3
|
Consultoria
|
28
|
6,8
|
6,3
|
Eletric, gás, água
|
23
|
5,6
|
4,3
|
Soc gest partic sociais
|
22
|
13,6
|
9,8
|
Ind. extrativas
|
18
|
0,7
|
0,4
|
Agricultura…
|
15
|
3,7
|
1,8
|
Ind. transformad
|
10
|
40,9
|
13,0
|
Fonte primária: Banco de Portugal
Mais rico de significado é o grande
aumento do crédito concedido à hotelaria. Por um lado, este setor está
intimamente ligado ao imobiliário que abordaremos mais adiante e, por outro,
convém referir que constitui, ainda como parceria do imobiliário, uma área
marcada pelo afluxo do capital mafioso que os considera os mais adequados para
a lavagem de dinheiro de origem duvidosa e integração na economia formal. Como
os bancos são auxiliares discretos e interessados no reforço da sua liquidez, é
natural que contribuam e colaborem na execução de projetos hoteleiros e
imobiliários.
Consideramos desajustada a relevância
que os governos têm dado ao turismo, nomeadamente quando o tomam como um
alicerce do desenvolvimento económico. As razões são abundantes.
Embora Portugal tenha uma diversidade
razoável no clima e na paisagem e tenha um ambiente social bastante susceptível
de fornecer segurança aos visitantes, não possui elementos de uma conspícua
personalização num contexto de massificação da oferta de destinos turísticos.
Entre os provenientes do exterior preponderam espanhóis e pessoas da Europa
Ocidental e, não é de esperar que os portugueses venham a ser grandes
dinamizadores do turismo, tendo em conta as perdas de poder de compra e a
estratégia geral de tornar os portugueses associados a salários baixos.
A presença próxima da Espanha, com um
ambiente natural e social muito semelhante, apresenta no entanto, vantagens não
despiciendas; o caráter quase único no cenário europeu, da presença da arte e
cultura muçulmana antiga, a existência de uma cultura cigana ligada ao flamenco,
um património arquitetónico mais impressivo, a presença de museus de grande
nomeada, Picasso, Dali, Gaudi, Tapies, etc
A falta de qualquer ordenamento global
nas principais zonas turísticas provocou danos irreparáveis na paisagem em
muitos locais e não parece que a proliferação de campos de golf, vocacionados
para ricos tenha grandes impactos financeiros globais. Até mesmo o turismo religioso
centrado em Fátima – localidade sem qualquer atrativo para além da sua recente
e bela basílica – tem patinado e continua dependente das peregrinações rituais
de uma população pobre, envelhecida ou supersticiosa. A criação dos célebres
PIN – Projetos de Interesse Nacional, viabilizados pelas instâncias do
partido-estado garantem o atropelo da salvaguarda das restrições ambientais e
paisagísticas, as excepções às áreas protegidas, como asseguram o oleamento das
finanças partidárias ou dos corruptos locais.
A canalização de turistas estrangeiros
depende essencialmente, de agências e grandes operadores turísticos globais que
extraem a principal fatia dos lucros, deixando parte menor para os detentores
da infraestrutura. O turismo, ou se insere numa economia desenvolvida, como
complemento ou, tornando-se a principal atividade, criando turismo-dependência,
alicerça uma população pouco qualificada, com empregos sazonais, inviabilizando
as restantes atividades, mormente industriais e agrícolas, conduzindo ao gasto
das receitas do turismo na importação de bens e serviços para a satisfação das
necessidades dos visitantes.
Neste, como em outras situações
torna-se claro que a conjugação na atuação entre o capital financeiro e o
Estado – este gerido pelo partido-estado - não visam a produção de bens e
serviços, a geração de bem-estar para os residentes em Portugal mas, a produção
de rendimentos e lucros para o sistema financeiro e para os restantes
intervenientes no processo de implantação e convencimento da multidão das
maravilhas das economias baseadas no turismo e no imobiliário. Não consta que
as regiões polarizadas no turismo – Algarve e Madeira – tenham construído
estruturas económicas e sociais de bem estar, acabando por se tornarem veículos
de lavagem de dinheiro e abrigo de uma população com direito a trabalho - pouco
qualificado - somente alguns meses em cada ano.
O crédito para a produção de
imobiliário atinge 13.7% do total em junho último, contra apenas 3.2% no final
de 1979. Uma parte desse imobiliário liga-se ao setor da hotelaria e turismo,
como atrás se disse; e a outra, à concepção e promoção de habitações. Em muitos
casos, este setor encontra-se ligado a empresas de construção civil e em
outras, dá a estas a empreitada da edificação dos prédios e empreendimentos
imobiliários.
Os bancos, como se verifica, têm
apoiado o setor de imobiliário, iniciando por aqui uma cadeia de crédito que
começando no imobiliário, envolve o setor da construção depois de aprovado o
projeto pelas câmaras ou, mais excepcionalmente, pelo governo (os PIN) e, numa
terceira fase, através do financiamento das famílias incentivadas à aquisição
de habitação, à sua integração na dependência do sistema financeiro. As
responsabilidades dos bancos no leviano incentivo à integração na lógica
imobiliária e financeira foram muito para além da estupidez sistémica;
promoveram a desestruturação do sistema produtivo, hiper-inflacionaram o volume
do crédito global concedido, endividaram brutalmente empresas e particulares,
preencheram excessivamente o espaço com habitações, condenadas a ficar vazias
ou, com largos períodos nessa situação. Trata-se, numa escala e contexto
político diferente, do que se passa na China[9]
ou em Espanha, onde a bolha especulativa gerada para alimentar o setor imobiliário
criou enormes cidades de casas vazias, rodeadas de infraestruturas inacabadas
que as tornam inabitáveis, milhões de desempregados e endividados que assistem,
impotentes à fuga de capitais[10]
pertencentes aos responsáveis do desastre e que vão à procura de novos locais
onde fixar a sua nefasta existência.
A construção constitui o elo material
da construção deste sistema. A empresa imobiliária projeta, reúne o capital
(próprio e alheio, bastas vezes de origem pouco honesta), o banco viabiliza e
garante o seu papel de pivot no negócio, a empresa de construção edifica e
alguns agregados familiares irão comprar, com crédito facilitado pelo banco,
para fechar o circuito e garantir mais uns quantos escravos do crédito para o
resto da vida. Para corresponder às necessidades deste percurso do capital, a
banca que destinava à construção 6.2% do crédito total em 1979, passou a
dedicar ao setor 20%, dotando-o de um papel de grande destaque, no conjunto da
economia.
Na construção civil encontram-se
grandes empresas do regime – Mota-Engil, Soares da Costa, Teixeira Duarte –
intimamente ligadas ao Estado para o efeito de beneficiarem de inúmeras obras
públicas propiciadas pelos fundos comunitários. A sua interligação com o
mandarinato e o partido-estado garante-lhes a conivência quanto à dimensão dos
trabalhos a mais nessas obras públicas; por outro lado, tratando-se de
contratos de grande dimensão financeira, os bancos concorrem para o seu
financiamento. Também neste caso, o circuito é conhecido; o aproveitamento dos
fundos comunitários casa-se com a sede de encomendas das grandes empresas
construtoras que chegam mesmo a patrocinar junto dos governos inventários de
necessidades e cadernos de projetos para as suprir, surgindo de novo os bancos
como pivot do financiamento dos órgãos do Estado – com relevo para um cancro
designado por Estradas de Portugal -
como dono das obras e as construtoras. Assim surgem estádios de futebol
a esmo, autoestradas em catadupa, cuja inviabilidade é suprida por tarifas
elevadas e expectativas de tráfego irrealistas mas, de cobertura financeira garantida
pelo Estado, que recorre ao crédito bancário e a uma agravada punção fiscal
para lhe fazer frente.
Ligados a essas grandes empresas por
cadeias de subempreitadas posicionam-se milhares de empresas de construção de
média e pequena dimensão, demasiadas vezes, pertença de trolhas reciclados como
empresários, cujas dificuldades técnicas são supridas pelos baixos preços do
trabalho de imigrantes e as financeiras, pelo omnipresente sistema financeiro.
Como a crise financeira contaminou a economia, está em curso uma verdadeira
hecatombe no setor da construção, ainda
que temperada pelo aumento do trabalho informal; recordamos que no final do
século, o consumo de cimento era umas quatro vezes superior à média europeia, o
que naturalmente, era um indicador insustentável.
Na parte inferior do quadro anterior
encontra-se a indústria, transformadora ou extrativa e a agricultura, setores
que perdem parte substancial da sua representatividade no crédito concedido.
3.2.4 – A distribuição setorial do
crédito e do emprego
Procede-se em seguida a uma comparação
para os setores da indústria transformadora, da construção e do imobiliário das
suas representatividades na distribuição do crédito em paralelo com a do pessoal
ao serviço das empresas, revelado regularmente pelo GEP do Ministério do
Trabalho.
gráfico 8
Entre 1995 e 2000 há uma quebra
acentuada no peso da indústria transformadora no crédito, muito para além da
ligeira redução da sua representatividade no pessoal ao serviço das empresas. A
partir de 2005, continua a reduzir-se a parcela do setor no total do efetivo de
pessoal, mantendo-se mais ou menos constante o seu peso no crédito concedido.
A situação na construção é muito distinta
da observada na indústria. Em 1995 observava-se uma grande proximidade no peso
do setor no pessoal ao serviço das empresas como na distribuição do crédito;
porém, a partir de 2000 o parcela do crédito global concedido aumenta
substancialmente, posicionando-se com uma dimensão sensivelmente dupla do peso
da construção no total do pessoal ao serviço das empresas, mesmo que o emprego
no setor se venha contraindo tanto em valores relativos como absolutos.
gráfico 9
No caso do imobiliário, o seu peso no
crédito é completamente desajustado da parcela que ocupa na distribuição do
pessoal ao serviço das empresas, que é muito diminuta. Naturalmente que o
sistema financeiro tem objetivos de gestão que passam pela rendabilidade dos
capitais e não pela criação ou manutenção do emprego. E também os governos se
alheiam do estabelecimento de uma política de crédito, deixando a distribuição
dos capitais mutuados ao sabor do “mercado” o que na realidade significa os
interesses do sistema financeiro que domina o próprio aparelho de Estado e os seus
mandarins.
gráfico 10
Apesar de não aumentar o seu peso no
total do crédito, o conjunto das empresas gestoras de participações sociais não
financeiras absorve quase 1/10 do total, ocupando o quinto lugar entre todos os
setores de atividade. Em 1979, obtinha um lugar de maior relevo na distribuição
do crédito, só ultrapassado pela indústria transformadora; vivia-se, então num
período de acelerada recomposição do capital e a banca, nacionalizada, atribuía
a essa atividade grande relevância, cumprindo o seu papel de reorganizador do
tecido empresarial. Porém, nos últimos anos, o crédito acumulado nessa
atividade é apenas mais uma forma de rendabilizar capital, sem a produção da
coisa alguma.
3.2.5 – A distribuição setorial do
crédito e a destruição de capital
O afluxo de capitais - e o seu
posterior refluxo e destruição - evidenciam o caráter selvagem e predatório do
capitalismo, criando ou destruindo capital, recursos e emprego, sem qualquer preocupação
social. A acumulação capitalista autojustifica-se.
O quadro seguinte revela que o
“empreendorismo” é apenas uma forma de propaganda para a mobilização de
poupanças, esforços e sonhos pessoais de potenciais empresários, por parte do
Estado que o promove e integra num ambiente hostil e amoral que é o
funcionamento do capitalismo neoliberal; rapidamente a grande maioria desses
candidatos são trucidados pelo “mercado”, vítimas das suas incapacidades
próprias e da ilusão mediática de que a riqueza está ao alcance de qualquer um.
A partir de 2008 começa a observar-se
uma quebra do numero de empresas em Portugal, com uma forte aceleração no
último ano para que se dispõe de dados, sendo de prever que posteriormente a
tendência não se terá alterado. Na indústria transformadora, o número de
empresas existente em 2010 – 35.3 milhares – é pouco superior ao registado em
1991; porém, a sua representatividade no total altera-se substancialmente – 23.2%
em 1991 e 12.5% dezanove anos depois – decaindo regularmente desde 2006. No
caso da construção há um período de ouro, no final do século, quando o número
de empresas cresce por ano 21.2% a que se segue uma quebra de dinamismo que se
manifesta com o abate de mais de 1/5 do total em 2010. Finalmente, no caso do imobiliário,
a destruição de empresas começa mais tarde do que na construção, medindo-se em
1/4 do total no último ano conhecido.
Evolução anual do número de empresas (%)
Total
|
Ind. Transf.
|
Construção
|
Imobiliário
|
|
1991/95 (média anual)
|
7,3
|
3,3
|
8,9
|
-
|
1995/2000 (média anual)
|
10,0
|
4,8
|
21,2
|
-
|
2005/2000 (média anual)
|
6,7
|
0,6
|
6,3
|
-
|
2006
|
0,8
|
-1,9
|
-0,9
|
-
|
2007
|
7,2
|
-1,2
|
9,0
|
3,6
|
2008
|
0,6
|
-2,3
|
-1,3
|
4,6
|
2009
|
-2,1
|
-4,6
|
-6,4
|
-5,4
|
2010
|
-19,4
|
-14,6
|
-21,5
|
-25,6
|
Fonte: Quadros de pessoal, Min Trabalho
3.2.6 – O divórcio entre o crédito
e o investimento
Como se observou no gráfico 1, há um
distanciamento crescente entre a evolução do PIB e, sobretudo do crédito
concedido, relativamente à FBCF. O gráfico que se segue revela um peso
decrescente da FBCF no PIB, evidenciando as crises de 1983/85, de 1993/95 e a atual
que, em termos do investimento, se iniciou em 2000 e vem assumindo os valores
mais baixos de todo o período. Note-se que a queda dos valores correspondentes
ao investimento coexistem com a estagnação ou mesmo a redução do PIB.
Em termos globais, há uma grande
distância entre o endividamento e volume dos capitais comprometidos com o
investimento. Por outro lado, a queda da parcela do PIB destinada ao
investimento está longe de corresponder às caraterísticas de economias maduras
e avançadas, revelando, antes pelo contrário, que os elementos de
subdesenvolvimento e pobreza estão bem presentes apesar dos elevados níveis de
endividamento de empresas e famílias. Isso resulta tanto do baixo nível de
investimento observado nos últimos anos como à errada afetação do mesmo aos
setores da economia.
gráfico 11
Fonte primária: Banco
de Portugal
No entanto, a composição da FBCF não
apresenta grandes variações no período 1979/2011, revelando, no entanto, um
aumento do peso relativo da construção, que nunca se situou abaixo dos 60% do
total desde 1992, bem como dos “outros” onde avulta a aquisição de ativos
incorpóreos, próprios da modernização tecnológica, como por exemplo, software.
Composição
média da FBCF
(%)
Máquinas e
equipamento
|
Material
transporte
|
Construção
|
Outros
|
|
1979/88
|
23,7
|
10,9
|
60,9
|
4,5
|
1989/98
|
24,0
|
10,6
|
60,7
|
4,7
|
1999/2011
|
22,5
|
9,2
|
62,1
|
6,2
|
Fonte primária : Banco de Portugal
No caso da construção, numa primeira
fase, sem dúvida que o seu impacto como consumidor de bens industriais é
elevado, embora, o produto final – os edifícios – estejam longe de produzir
rendimentos dinamizadores da economia e do emprego.
Entre as construções, há a considerar
instalações comerciais, industriais e turísticas, susceptíveis de geração de
rendimentos monetários nas atividades em que se irão inserir, embora a
multiplicação de centros comerciais, sendo tomada como investimento, esteja
longe de constituir um elemento de desenvolvimento; é apenas gerador de rendas
para “investidores” imobiliários. Por outro lado, no segmento da habitação, os
seus compradores apenas retiram um valor de uso, não incorporado anualmente no
rendimento global de uma economia monetarizada.
Porém, essa aquisição de imobiliário promove, a posteriori receitas para
os municípios – sisa/IMT ou IMI – que constituem verdadeiras rendas a favor do
mandarinato autárquico. Como já se referiu atrás, a cadeia do imobiliário,
antes de terminar com a aquisição final de uma casa por uma família, enche os
bolsos de “empreendedores”, autarcas e respetivos partidos, alimentando
portanto, alguns braços do polvo mafioso; onerando naturalmente o valor de
aquisição. No caso das segundas casas, até mesmo aquele valor de uso é
reduzido, funcionando as mesmas como um fator de capitalização, de
entesouramento e, bastas vezes de endividamento; não escapa, contudo, da
sanguessuga fiscal embora, em muitos casos, o aluguer informal conduza a um
rendimento não declarado, nomeadamente em áreas de atração turística.
Voltando à composição da FBCF, agora ao
segmento das máquinas e aparelhos, evidencia-se a estagnação do seu valor desde
1999 e que a sua dimensão em 2011 foi a mais baixa desde 1998, resultado de uma
interação entre o processo de desindustrialização e a recessão, quer a nível
nacional, quer a nível europeu embora seja aí que, de facto, reside um dos elementos
centrais do verdadeiro investimento. Tendo em consideração a evolução do
crédito às empresas, não é evidente que o seu crescimento tenha um sequência na
modernização técnica do aparelho produtivo. Como se viu atrás, a evolução
meteórica do crédito concedido por mais de cinco anos não encontra explicação
através dum esforço investidor do patronato luso; este tipo de crédito está sem
dúvida relacionado com o alargamento de prazos de pagamento de dívidas
comerciais ou de curto prazo, obtido por empresas em dificuldades.
No caso do material de transporte, em
muitos casos, é uma falácia considerá-lo como investimento, como
estatisticamente se procede. Na realidade, não há “empresário” que dispense a
aquisição pela sua empresa do seu veículo particular (quando não também o dos
familiares), de preferência de marca prestigiada. E essa prática é estendida a
trabalhadores dos escalões superiores ou outros, convencidos de que esse
pagamento em espécie e imediato é mais vantajoso do que uma pensão de reforma
condigna umas décadas depois. Esta prática vulgarizada e permitida pela
administração fiscal torna como custo dedutível os encargos com os veículos,
com esse salário pago em espécie e reduz a base tributária para efeitos de IRS
e de contribuição para a Segurança Social. Enfim, mais uma forma de transferir
rendimentos do Estado para as empresas, de descapitalizar a Segurança Social,
de ajudar à criação de planos privados de reforma ou de empobrecimento a longo
prazo de muitos dos que ficam felizes por possuírem carros oferecidos pela
empresa.
Sabe-se o enlevo que os portugueses
têm para com os carros, o modo carinhoso como tratam os veículos, como
constroem a sua imagem pública pela modernidade ou a cilindrada do automóvel.
Trata-se de um caso de fetichização, talvez típico de povos recém-urbanizados,
com uma vivência ou memória próxima de escassa mobilidade nos meios rurais,
poucas décadas atrás, por falta de estradas decentes ou meios próprios de
transporte. Esse enlevo, para além do propiciado por patrões interessados na
docilidade do assalariado, é prolongado pelo efeito de imitação, ancorado na
facilidade do crédito e torna abundantes os casos de pequenos e médios
trabalhadores que, para se promoverem na imagem pública do carro, se
endividaram levianamente para o efeito.
Ainda relacionado com o material de
transporte está o impacto da integração europeia - mormente no âmbito ibérico -
que, associado à paulatina desindustrialização e fraco desenvolvimento da
produção agrícola, vieram a conduzir à hipertrofia dos sistemas de distribuição
em geral, particularmente, a associada à hipertrofia da construção civil
(materiais de construção, mobiliário, eletrodomésticos, etc), particular
contribuinte para a circulação de pesados e veículos comerciais nas estradas. Por
outro lado, o frenesi consumista, obriga a uma distribuição retalhista
acelerada para satisfazer o consumidor num lapso de tempo, acelerando o aumento
enorme de veículos de formatos e dimensões diversas que enchem as estradas e as
ruas das cidades – devidamente munidas de regras laxistas de estacionamento ou
de rendas pelo mesmo a favor de câmaras ou “empreendedores” privados – sem se
curar pela qualidade ambiental.
Como as distâncias são curtas dada a
dimensão do país ou, mesmo do cenário ibérico; como o sistema ferroviário foi
criado (até às primeiras décadas do século XX) num país rural, não está
adequado para servir concentrações urbanas de população, nem foi adaptado para
o efeito. A influência no poder dos empresários do betão, a facilidade de
financiamento através de fundos comunitários e o lobby do automóvel conduziram
mais ao fecho de linhas ferroviárias do que a sua adaptação à nova geografia
demográfica. Mesmo nas grandes distâncias que são necessárias para o transporte
internacional de um país importador, o negócio do transporte foi entregue
basicamente à rodovia, social e ambientalmente mais cara. E, para terminar este
sumário revelador da ausência de uma política de transporte, de racionalidade
da distribuição de mercadorias ou do transporte de passageiros, foi considerado
inteligente e um acto saudável de poupança pelo governo Passos/Portas -
devidamente representado nesta área pelo impagável Álvaro - a redução brutal na
utilização do transporte público, na sequência das imposições do capital
financeiro, através da “troika”, em paralelo com grandes aumentos dos preços. É
mesmo uma aberração económica reduzir-se a oferta de transporte aumentando os
preços, deixando por satisfazer uma procura conhecida e consolidada. Aplaudem
essa estupidez os revendedores de combustíveis e o setor da venda/reparação de
automóveis que assim amortecem os efeitos da recessão. Não acreditamos que a
qualquer coisa Cristas, ministra do ambiente, dos ovos e de mais não sabemos
quantas áreas, tenha pensado nos impactos de tal estupidez.
Passado esse período de euforia que se
seguiu à integração europeia e que comportou forte investimento em meios de
transporte, este estagnou entre 1998 e 2007, a partir do qual se vem reduzindo
rapidamente, atingindo em 2011 os valores registados em 1994.
Em suma, grande parte do que é
incluído a FBCF não corresponde, na realidade a um investimento reprodutor de
rendimento e, mesmo sem esse reparo, não é possível justificar o grande
crescimento do crédito às empresas com uma euforia investidora.
3.3 - Crédito malparado
Apesar de todas as regras prudenciais,
os banqueiros incorrem em riscos de incumprimento por parte dos seus devedores;
são os custos da ganância, da lógica da maximização insaciável dos capitais
disponíveis para participarem na financiarização da vida de todos nós, para
mostrarem os lucros necessários para satisfazer os acionistas, obterem uma
postura simpática das empresas de rating que afeta favoravelmente a cotação das
ações e, as facilidades de refinanciamento junto dos congéneres mais poderosos.
É dura a vida dos banqueiros…
Recentemente, o peso do malparado
global na totalidade do crédito concedido ultrapassou os níveis de 1997,
fixando-se em 4.7%. A responsabilidade para essa subida cabe às empresas (8.4%)
e menos aos particulares (3.5%), observando-se que o pendor ascendente dos dois
conjuntos de devedores se vem diferenciando a partir de 2008 e, de modo muito
vincado.
Estes indicadores são muito inferiores
aos registados recentemente em Espanha[11]
– 9.42% correspondentes a € 164000 M, em junho; isto é, 11.5 vezes o registado
em Portugal no mesmo momento. Em Itália, em fevereiro, o crédito malparado era
de € 107600 M, representando 16.5% do total[12]. Porém, sendo os sistemas bancários e
as economias nacionais espanhola e italiana muito mais fortes que a portuguesa,
a proporcionalidade não se deve aplicar às dificuldades das populações
respetivas. Por exemplo, o caso Bankia e o das caixas de aforro, em Espanha têm
uma dimensão muito acima do BPN e o endividamento autonómico tem uma gravidade
bem acima das leviandades do Bokassa madeirense e do seu gang; e no entanto, a
troika governa Portugal e em Espanha, os capitalistas espanhóis (ainda) se
recusam a um plano de resgate, com intervenção externa direta.
gráfico 12
Fonte primária :
Banco de Portugal
Em 1997, o malparado registado por
conta das empresas era de € 2048 M contra € 1082 contabilizado como cobranças
duvidosas a particulares; em junho último, esses valores eram, respetivamente €
9539 M e 4834 M. Considerando a relação entre o crédito duvidoso gerado pelas
empresas e os particulares, observa-se - até 2004 - uma redução resultante da
quebra consistente do malparado gerado pelas empresas e do lento crescimento do
crédito de cobrança duvidosa atribuído a particulares. A partir de 2007, o
ratio começa a subir acentuadamente revelando um forte aumento do malparado
referente a empresas, muito superior ao imputado a particulares. Pode
resumir-se o significado deste ratio dizendo que em meados deste ano por cada €
1000 de malparado imputado aos particulares havia € 2000 relacionado com
empresas.
gráfico 13
Fonte primária :
Banco de Portugal
No caso das empresas, relativamente a
1997, o crédito malparado cresceu 4.8 vezes até junho último, mais do que o
total do crédito concedido que aumentou 3.5 vezes.
No gráfico 14, observa-se que até
2007, o volume dos riscos de não cobrança evoluiu lentamente, ainda que com um
maior pendor ascendente da construção e do imobiliário, enquanto que os outros
setores, nomeadamente a indústria transformadora apresentam períodos com
índices inferiores aos registados em 1997. A partir daquele ano de 2007, o
malparado cresce, sob o impacto dos setores da construção e do imobiliário que,
em junho último, apresentam créditos de cobrança duvidosa 12.5 e 10.5 vezes
respetivamente, face aos níveis de 1997. A concentração do crédito em
atividades tão voláteis tanto pode originar períodos de euforia no negócio
bancário e repercussões no rendimento nacional como dificuldades diante as
quais todos os anteriores beneficiários se voltam para o Estado clamando por
apoios, encomendas, exceções, isenções e “medidas estruturais” jargão
abrangente e nebuloso que, em regra, se consubstancia em dificuldades para a
multidão.
gráfico 14
Fonte
primária : Banco de Portugal
Perante esta evolução a composição
setorial do crédito malparado altera-se substancialmente. O referido binómio construção/imobiliário
ultrapassa em 2004 a indústria, atingindo 30% do total, para chegar a 56.3% em
junho último; o problema bancário com o malparado resulta essencialmente do
modo leviano como os banqueiros financiaram aquelas atividades e, como o
crescimento da economia durante anos foi alicerçado no betão (como em Espanha
mas, a uma escala menor) com os outros setores a refletirem a crise, tornando-a
geral, a partir de 2008.
Em 1997, a indústria transformadora
era o setor com maior risco e a melhoria deste ter-se-á devido também a
falências e encerramentos de empresas, no âmbito da desindustrialização, com a
assunção de incobráveis pelos bancos mas, numa escala muito maior, pelo Estado
e pela Segurança Social[13]. O processo de desindustrialização
ainda em curso constitui o pano de fundo para essa situação, cabendo todo o
relevo aos entes públicos na participação nos custos da destruição de capital,
da reestruturação do perfil setorial da economia portuguesa e europeia, no
contexto de uma forte subalternidade.
Essa destruição de capital é
claramente defendida pelas instâncias da UE. Daniel Gros, diretor do Centro de
Estudos de Políticas Europeias considera que “Governo deve deixar as empresas
ineficientes irem à falência, em vez de as salvar só para preservar a produção
e os postos de trabalho”[14] sublinhando que em Portugal é preciso
destruir capital e fazer desaparecer largas dezenas de milhar dos chamados
“empresários”. Muito “tecnicamente” refere que “o consumo em Portugal tem de
cair entre 10% e 15% e os salários têm de ser reduzidos até 20% para que o país
volte a ter um excedente das contas correntes”. De modo mais prosaico,
decreta-se que os portugueses estão todos gordos e receita-se uma dieta de pão
e água. O miserável Passos tenta cumprir, submisso mas, com empenho.
Note-se que a crise do malparado é
anunciada através do aumento do peso relativo do setor da construção em
2003/2005 amplificando-se a partir daí; porém no imobiliário, o malparado começa
a aumentar a sua incidência a partir de 2007. A falta de novas encomendas na
construção estrangula a tesouraria das empresas com reflexos no cumprimento das
obrigações para com os bancos, enquanto as empresas imobiliárias iam vendendo;
até que estas, reduzindo o volume e o valor de casas vendidas e arcando com
parte substancial do invendável, começam por seu turno a não cumprir. No caso
das obras públicas passou-se a uma situação semelhante, não tendo sido possível
ao governo Sócrates lançar um novo ciclo de obras – nova travessia do Tejo,
aeroporto, TGV – que alimentasse as construtoras do regime, com encomendas a
financiar pelos bancos.
gráfico 15
Fonte primária :
Banco de Portugal
Tendo como base o ano de 1997, o
crédito malparado dos particulares cresce até 2003, estabilizando até ao começo
da crise atual quando acelera o seu crescimento, atingindo um patamar quatro
vezes mais alto do que no momento inicial da série.
Para além dos “outros” tipos de
créditos que se mantêm ao mesmo nível até 2008, sofrendo depois o efeito de
arrastamento da crise global, a evolução do crédito ao consumo tomado como
incobrável acelera fortemente a partir de 2005 demonstrando que, entre as
pessoas com dificuldades de pagamento, o incumprimento neste tipo de créditos é
uma decisão mais fácil do que incumprir as prestações do crédito concedido para
habitação.
gráfico
16
Fonte primária : Banco
de Portugal
No crédito para habitação, a evolução,
no período apresenta claramente três períodos distintos. Um período inicial,
até 2003, marcado por alguma ligeireza nos critérios de concessão do crédito
por parte da banca – seria um género de “subprimes” lusos, seguido de um
segundo ( 2003/2006) de estabilização, marcado pela confluência entre maior
contenção por parte das pessoas aliado a condições mais exigentes criadas pelos
bancos. Finalmente, um terceiro, gerado como produto de situações de despedimento
e desemprego que lançaram muitas famílias na pobreza, criando um dinâmico
“mercado” de execuções e leilões de casas expropriadas, com a alegre conivência
e a imensa sensibilidade social do PS/PSD; comandada – como toda a atividade
governativa – pelo sistema financeiro.
A evolução atrás observada conduz a
alterações na repartição do crédito malparado pelos diversos destinos do
crédito originário.
Repartição
do crédito malparado (%)
Habitação
|
Consumo
|
Outros fins
|
|
1997
|
31,0
|
21,5
|
47,6
|
2005
|
59,3
|
14,7
|
26,0
|
jun
2012
|
43,9
|
31,4
|
24,6
|
Fonte
primária : Banco de Portugal
Os “outros fins” constituem o
principal fornecedor de incobráveis até 1999, cedendo depois o lugar aos
débitos por motivo de compra de habitação, tornando-se aliás o segmento de
menor contributo para a totalidade, a partir de 2007. O crédito ao consumo
apresenta um contributo crescente nos últimos anos, em detrimento dos
incobráveis relacionados com a habitação. As maiores dificuldades quanto a
trabalho e remuneração e as exigências dos bancos, eles próprios sem
financiamento, limitaram o surgimento de novos empréstimos; e as execuções,
sendo efetuadas produzem um efeito de redução do malparado.
Torna-se particularmente interessante,
observar a relação entre o crédito malparado relativo aos diversos tipos de
aplicação do crédito originário e o total deste último.
gráfico
17
Fonte primária : Banco de Portugal
Na sequência do que é público, os
simpáticos bancos portugueses vão assumindo as suas responsabilidades,
transferidas, de modo direto ou indireto, para o seu Estado à multidão. Em 2011
os bancos aumentaram em € 1600 M as provisões para cobertura de não cobranças
de crédito malparado, o que corresponde a uns 23% do total daquele, imputável
às empresas. No entanto, o crédito mal parado cresceu, no caso das empresas €
2261 M contra € 685 M do imputável às famílias, denotando-se que as novas
provisões apenas vieram a cobrir cerca de 54% do acréscimo total do malparado,
sabendo-se que entre este há diferenças razoáveis de risco.
Aumento de provisões significa redução
de lucros, sem dúvida mas, também redução dos rendimentos passíveis de imposto,
para um setor já muito beneficiado com a benevolência da legislação e da
compreensão fiscal para com a banca. Não nos esqueçamos que a legislação é
feita por sociedades de advogados que participam na mediação e no dirimir de
conflitos entre os bancos e a administração fiscal, esta para mais
hierarquicamente submetida ao ministro das finanças, por tradição alguém muito
chegado ao sistema financeiro Nos créditos relacionados com a habitação embora
haja uma ligeira degradação do indicador, este mantêm-se inferior a 2%,
revelando a atenção e o caráter estrutural da casa para as pessoas, mesmo que
em dificuldades financeiras; o que revela a argúcia dos banqueiros quando
alicerçaram o desenvolvimento da sua atividade no crédito à habitação,
obviamente com um risco de perda muito reduzido. O mesmo não sucede com os
créditos com outros propósitos para os quais o peso do malparado sobe
acentuadamente depois de 2007 situando-se próximo dos 11% do total.
E reduzindo-se a receita fiscal para a
qual os bancos se apresentam sempre como relutantes em oferecer um contributo
equiparado à sua capacidade de gerar lucros, gritam os mandarins que é preciso
cortar nos salários dos trabalhadores da administração pública, nos pensionistas,
nos gastos com a saúde, aumentar o IVA, onerar os trabalhadores com mais 7% de
TSU, numa ladainha entoada diariamente nos media, várias vezes, como
antigamente o toque dos sinos apelava para que a existência de Deus não fosse
esquecida.
Tudo o que se afirmou revela elementos
do sistema financeiro, no quadro das instituições capitalistas, no seio das
quais não surgirá um vislumbre de colocação em causa da financiarização da
economia global e, menos ainda da assunção da falência do capitalismo. A
situação de dívida do Estado, das empresas ou das pessoas, pela sua dimensão,
não é pagável mas também inibe o sistema de o assumir, assistindo-se apenas à
toma de placebos para adiar para tão longe quanto possível o desmoronamento
desse frágil castelo de cartas que é o sistema financeiro global, manobrando
dentro do possível para que um acontecimento, como a falência de um grande
banco ou a cessação de pagamentos de uma grande dívida nacional, não provoque esse desmoronamento.
A questão é se a multidão está ou não
disposta a servir de pasto para o banquete dos banqueiros, dos especuladores
dos chamados empresários e dos seus mandarins.
- - - - - - - - - - - -
Este e outros textos em:
ttp://pt.scribd.com/doc/66860865/Divida-publica-%E2%80%93-Os-principais-tipos-de-gasto-publico-2%C2%AA-parte-
[3] http://pt.scribd.com/doc/101455663/A-divida-a-Seguranca-Social-o-longo-conluio-entre-empresarios-manhosos-e-o-Estado
[4] idem
[5] http://economico.sapo.pt/noticias/metade-das-familias-com-credito-a-habitacao-ganham-menos-de-914-euros_151498.html
[6] € 5120.6 M de dívida a médio ou longo prazo
em 2010, de acordo com o Anuário dos Municípios Portugueses - 2010
[10]
http://economia.elpais.com/economia/2012/08/31/actualidad/1346402710_181010.html
[12] http://economico.sapo.pt/noticias/malparado-da-sinais-de-alarme-em-espanha-e-italia_142821.html
[13] http://pt.scribd.com/doc/101455663/A-divida-a-Seguranca-Social-o-longo-conluio-entre-empresarios-manhosos-e-o-Estado
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