1 - A ordem medieval inscrita nas ordens profissionais
2 - Um país de merda, com uma justiça de merda
3 - Um grande negócio num país de merda – a Fertagus
4 – Costa a brincar aos comboios
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Bem no seio da
estreiteza intelectual e política que se vive na paróquia lusa estão as ORDENS
PROFISSIONAIS, uma emanação corporativa de tempos medievais, replicada pelo actual
regime pós-fascista a antigas e novas profissões.
Se um Estado
reconhece um diploma emanado das suas próprias instituições (temos mais dúvidas
em relação aos emitidos por algumas instituições privadas de venda de diplomas),
o diplomado deveria ficar livre de tutelas corporativas de grupos mais ou menos
mafiosos de profissionais encartados que se arrogam ao direito de condicionar a
entrada de jovens na profissão que escolheram e, depois de tecnicamente tomados
como habilitados a tal.
As castas ou gangs
que dominam as Ordens equiparam-se aos medievais mestres das artes e ofícios
que decidiam o enquadramento na profissão e avaliavam as qualidades dos
aprendizes do ofício bem como a sua progressão. Na Idade Média as corporações
eram autónomas do aparelho de Estado, pela simples razão que aquele era
embrionário. Hoje, ao contrário dos tempos medievos, o Estado intervém nas
Ordens da pior forma, validando condicionamentos no acesso ao exercício da
profissão, para que os barões da mesma tenham um vasto mercado.
As Ordens impõem as
regras, os percursos e todos os passos para aceitarem um novo membro.
Daí surgem as
obrigações de estágios, organizados pela Ordem e pagos pelos estagiários (ou
melhor, pelas suas famílias), depois de terem arcado com as propinas de um
ensino privado ou público. No caso de uma estagiária de advocacia que
conhecemos, o seu patrono – dono de um conceituado escritório de advogados - no
âmbito de um caso que entregara à estagiária para resolver, decidiu que ela
deveria deslocar-se a uma cidade do norte do país, com as despesas … a seu
cargo… mesmo que ela não auferisse um cêntimo durante o estágio.
No caso dos
psicólogos, os recém-licenciados começam a sua relação com a Ordem com a
inscrição e o pagamento de quota mensal, mesmo que não tenham qualquer
rendimento próprio. Depois, têm de encontrar onde possam estagiar – um estágio
remunerado – o que no modelo neoliberal de redução constante dos direitos no
âmbito do trabalho, não é coisa fácil. E ainda são obrigados a frequentar cursos
de formação, ministrados pela Ordem e pagos, por quem ainda não tem o direito
de trabalhar na sua profissão, sem o aval dos oligarcas.
Como a psicologia é
desprezada pelos governos, muito mais próximos da classe médica (psiquiatras,
neste caso, que tendem a resolver as situações com antidepressivos ou com
fármacos à base de lítio), Portugal está nos primeiros lugares na parcela da
população com problemas de ordem psíquica – 22% (contra 9% em Espanha).
Espanta, como num
cenário político e económico tão neoliberal, onde se sublinham as delícias do
empreendedorismo, da competitividade, do auto-emprego, da empregabilidade,
existam Ordens de onde exala um fedor medieval e oligárquico, cuja função é
hierarquizar os profissionais entre ricos, pobres e desempregados e obter o seu
quinhão na partilha
dos impostos.
Salazar, nunca
conseguiu levar até ao fim o seu projeto de instaurar o modelo de “Estado
Corporativo” gerado na Itália fascista; e é interessante verificar a
criatividade do regime pós-fascista (leia-se PS/PSD) no aprofundamento da ordem
corporativa a muitas mais profissões do que Salazar conseguiu.
Nesse contexto,
existe uma coisa parasitária chamada CNOP – Conselho Nacional das Ordens
Profissionais - que afirma ter por objetivo “promover a autorregulação e a
descentralização administrativa, com respeito pelos princípios da harmonização
e da transparência”; que visa “a autorregulação de profissões cujo exercício
exige independência técnica”; e que as Ordens não podem exercer funções
sindicais (à atenção de Ana Rita Cavaco…).
Vamos de seguida
enumerar as profissões regidas por Ordens por ordem alfabética, para que tudo fique
na devida…ordem: arquitectos, biólogos, contabilistas certificados,
despachantes oficiais, economistas, enfermeiros, engenheiros, farmacêuticos,
médicos, médicos dentistas, médicos veterinários, notários,
nutricionistas, psicólogos, revisores oficiais de contas e solicitadores e
agentes de execução. Falta a fabulosa Ordem dos advogados que não se mistura
com as anteriores, eventualmente requerendo uma CNOP… só para si.
A própria
designação de bastonário para a figura realenga do chefe da Ordem tem um cunho
medieval, pois designava o portador do bastão de uma confraria numa procissão; ou
um apetrecho também usado por marechais… onde existam. Se um bastão tiver uma
curva na ponta passa a chamar-se báculo e é usado por outra figura de
autoridade com odor medieval – um bispo. Não confundir báculo com… um bácoro
que por vezes empunha um bastão!
Para replicarem
totalmente a prática das ordens profissionais da Idade Média, falta-lhes (?)
arranjarem um santo padroeiro e terem fundos para apoio social das famílias com
problemas. E mais, porque não ostentarem os seus pendões e bandeiras nas
marchas ditas populares de Santo António? Os turistas deveriam achar very interesting a rivalidade entre a
marcha dos advogados, de negro fardados e, a dos médicos de branco ataviados,
com os respetivos bastonários à frente, fazendo piruetas com os bastões. Wonderful!
A mesma lógica
corporativa vem-se verificando com a criação de sindicatos como pequenos grupos
profissionais fechados, com escasso número de elementos, com poder de chantagem
sobre os governos e a sociedade e, desligados de qualquer integração com outros
trabalhadores. Pequenas mafias e nada mais. Cada um é uma Cosa Nostra.
Neste contexto
corporativo, é muito sentida a falta de Ordens para arrumadores de carros,
condutores da Uber, canalizadores, eletricistas, reparadores das linhas
telefónicas, pedreiros, vidraceiros, sem esquecer a Ordem dos Abrolhos para os
membros da classe política…É injusta a discriminação!
2 - Um país de merda, com uma justiça de merda
Nesse país (que não
referimos para não sermos processados) foi descoberto, imagine-se, um juiz de
merda (cujo nome não dizemos para não sermos processados). E cuja verdadeira
vocação melhor teria sido a instrutiva leitura, a grupos de imbecis, de um compêndio
de sacras idiotices, pelo menos duas vezes milenar.
Claro que a coisa
não ficou por aí porque o dito juiz, frustrado nessa sua vocação, decidiu dar a
bênção aos energúmenos que maltratam as mulheres; e isso, aliás, tem toda a
coerência, dado que as coisas se passam num país de merda, com uma justiça de
merda onde um juiz que não seja de merda, destoa e se arrisca a ser sancionado.
No tal velho
compêndio, as mulheres são tratadas abaixo de cão, como se diz no vernáculo …
com o nosso pedido de indulgência pela referência ao canídeo perante os
circunceliões que gostam muito dos animais, sobretudo se forem… de raça e
encerrados todo o dia num terceiro-esquerdo, à espera de uma saída para largar
a bosta. Adiante.
Esse tratamento decorre,
apesar do esforço de muitos séculos de elevadas discussões teológicas, até que pelo
século XVIII, os estudiosos do compêndio descobriram que, afinal, as mulheres
também tinham alma! Há vários milénios a alma só havia sido outorgada, no
compêndio, aos machos, o que não deve espantar ninguém pois o compêndio foi
inventado em masculinas meninges. Para complicar e a despeito de tanto estudo
teológico, essa coisa da alma, afinal, não existe em homem ou mulher, cão ou
periquito, magnólia ou couve-lombarda.
Embora se saiba que
a alma não é coisa alguma que fique por aí a circular depois da morte do seu
dono - para se livrar do enterro ou do fogo da cremação - o tal juiz de merda
continua a basear-se no vetusto e divertido compêndio, despido dessas
modernices que elevam as mulheres a ter prerrogativa masculina, como essa de
ter alma. Imagine-se! E, zás, manda lavrar em acta.
“Se uma mulher é
espancada é porque o merece dado que… muito justamente não tem alma, nem o
discernimento e a propensão dos machos para a liderança. O lugar da mulher é
abaixo e debaixo do homem”, diz o pouco imaginoso juiz, sentenciando a
espancada fêmea ao sacrifício inerente à sua condição de subalterna, de saco de
boxe, libertador dos maus humores do viril companheiro.
E, sela a sentença
com uma martelada na mesa que encima o cenário tribunaleiro onde também costuma
figurar uma estátua de mulher de olhos vendados com uma espada na mão; nos
tempos que correm, melhor seria tirarem-lhe a venda e deixaram-na com um
telemóvel com jogos, muitos e cretinos, para se entreter, já que não é possível
lavar loiça na sala de audiências embora haja uma bandeira que serviria para a
secagem.
Entretanto, porque
os serviços de advocacia contribuem decididamente para o aumento do PIB, o tal
juiz de merda (que não nomeamos para não sermos processados) contrata um
advogado de merda para tratar um assunto que é de merda e tem por cenário, um
país de merda (que não referimos para não sermos processado) e onde vigora uma
justiça de merda.
(texto escrito em
momento crítico, na casa de banho)
3 - Um grande negócio num país de merda – a Fertagus
A Fertagus é uma mini-empresa ferroviária
pertencente ao grupo Barraqueiro que iniciou atividade em 1999, ligando Lisboa
ao Fogueteiro, e de seguida estendida até Coina antes de, em 2005, chegar a
Setúbal. A Fertagus foi a beneficiária da subtração de um novo e suculento
tráfego que deveria ter cabido à CP, como empresa única (e pública) de
transporte ferroviário, até então; dessa subtração resultaram evidentes
benefícios para o grupo Barraqueiro, com não menos evidentes e nefastos efeitos
nas contas da CP cujo sub-investimento é crónico e com acrescidos custos para o
erário público, que vai arcando com os seus deficits, fruto da desastrosa
gestão dos sucessivos gangs governamentais.
Trata-se de mais um caso do tipo parceria
público-privada que o Tribunal de Contas considerou …um caso de sucesso único
na Europa; portanto, com menos mediatismo do que as parcerias que alimentam
parasitas como as pestilências que empestam as área da saúde ou das
autoestradas, as escolas privadas com contratos com o Estado, etc.
Desde o início se tornou escandalosa a diferença
nas tarifas autorizadas à Fertagus, quando comparadas com as cobradas pela CP
em tráfego urbano/suburbano para distâncias equiparadas. Essa diferenciação
deverá ter correspondido a políticas emanadas dos gangs governamentais de… desarmonização
regional, pois resultaram na oneração das populações da Margem Sul. O
favorecimento é tal que um comboio da CP vindo do Sul para Lisboa, por exemplo,
não pode parar e transportar pessoas para as estações intermédias entre o
Pinhal Novo e o Pragal; os passageiros terão de sair no Pinhal Novo e comprar
um bilhete da Fertagus, porque naquele troço da linha não pode haver
concorrência; o funcionamento do sacrossanto “mercado” foi esquecido.
No entanto a adjudicação é dada como tendo
resultado na "proposta mais vantajosa para o interesse público, definido
pelos menores preços para os clientes
e menores encargos e riscos para o estado, desde que garantido um serviço de
transporte seguro e de qualidade". O desaforo das mafias governamentais é
tanto quanto a mansidão das populações.
Todos os gangs das duas últimas décadas são
responsáveis pela situação. Primeiro, Guterres com os seus ministros Cravinho,
Jorge Coelho e Ferro Rodrigues; seguiu-se uma dupla de luxo, Santana/Mexia e,
mais recentemente, a intervenção do governo Sócrates onde brilharam Teixeira
dos Santos e Mário Lino. Os gangs seguintes garantiram a continuidade da
situação.
O momento mais delicioso surgiu, em 2005, com o
alargamento da circulação até Setúbal. Sabendo-se que a Fertagus não tinha
composições que permitissem a continuidade das frequências nesse percurso
expandido, a CP aprestou-se a alugar carruagens para que o serviço se
mantivesse, proposta recusada pela referida dupla de luxo Santana/Mexia, que
preferiu alargar os tempos de passagem de comboios.
Presentemente, fruto de um cuidado planeamento
(?), António Costa e Pedro Marques – o criminoso introdutor do fator de
sustentabilidade – lançaram um novo regime de passes sociais - cujo lançamento
peca por muito tardio - e com um tempo de funcionamento delimitado. Como é
óbvio, daí surgiu um aumento da utilização do transporte público e a Fertagus,
sempre muito pouco dada ao investimento decidiu reduzir o número de lugares
sentados, num contexto em que, hoje, nas horas de ponta, as viagens se fazem
com grande número de passageiros de pé.
Não se ficam por aqui os favores do regime ao
grupo Barraqueiro. Certamente, por intervenção divina, alguém deve ter
descoberto uma vocação do grupo para o transporte aéreo, dando-lhe uma
participação qualificada na TAP; e, antes disso, com a atribuição da linha de
metro de superfície, na Margem sul do Tejo. Decididamente, o grupo Barraqueiro
é recebido com passadeira vermelha nos antros da corrupção que enformam o
regime pós-fascista.
4 – Costa a brincar aos comboios
Em pompa pré-eleitoral António Costa promete muitos
investimentos na ferrovia, numa lógica provinciana, da sua distribuição por todo o
território. Só faltou falar de uma linha férrea entre … Ponta Delgada e Angra
do Heroísmo...
A modernização – palavra mágica de todos os
gangs governamentais - cai sempre bem na pastosa plateia dos telejornais.
Vejamos alguns exemplos.
A internacionalização tem de estar sempre nos
lábios dos mandarins – é um dever de ofício. E assim, surge o projeto turístico
da linha do Douro ao qual falta o tipicismo e a inovação de colocarem …os
turistas a carregar cestos de uvas das encostas do rio para o comboio. Depois,
surgem na grandiosa internacionalização do Costa, os projetos de ligação entre
os portos de Sines e Leixões, respetivamente, a terras de Castela e da Galiza e
que já têm barbas brancas; sempre num plano de grande preocupação ambiental[1] –
coisa que se tornou obrigatório nos discursos da classe política, dos mais à
direita aos menos à direita. Essa preocupação ambiental sobressai, quando a par
dos novos passes para o transporte urbano e suburbano - um tal Medina, o grande
gentrificador de Lisboa, aumenta a capacidade de estacionamento em Lisboa e… as
receitas da sua EMEL.
Costa
falou na
aposta na ferrovia, de grandes projetos para o sec XXI enunciando
melhorias que já deveriam ter sido efetuadas há 30 ou 40 anos! Como dono e
senhor da paróquia sabe que vai convencer o povo com menos instrução da Europa
através dos telejornais, dos plumitivos de serviço e beneficiar da vacuidade dos
grilos falantes da AR.
Nos últimos anos o PS/PSD depois do encerramento de
milhares de quilómetros de linhas, na sequência da desertificação da maior
parte do território; depois do encolhimento das oficinas de manutenção e
reparação do material em contrassenso com a acumulação de equipamento para
reparação; da privatização e entrega a uma multinacional do negócio da carga
acompanhado de muito material circulante; e das carências que promovem brechas
no cumprimento de carreiras, horários e na qualidade do transporte, teve como
única aposta o abandono doa via ferroviária.
Qualquer plano sério para o século XXI (pese
embora o atraso) deveria contemplar linhas TGV para Madrid e Europa, em
substituição das velhas carruagens que a Renfe coloca naqueles troços
internacionais; recorde-se que o AVE entre Madrid e Sevilha foi inaugurado há
28 anos! Coisa que Costa não referiu perante o silêncio dos seus aliados, que continuam
focados nas pequenas coisas, sem pingo de visão estratégica.
Sendo Portugal claramente periférico no âmbito
europeu, maior é a premência para encurtar as distâncias a percorrer para
chegar à Europa transpirenaica ou mesmo à maior parte do território do estado
espanhol … para ganhar competitividade, não é assim que se diz?. Porém, um TGV
tem um adversário de peso com influência nos gangs governamentais PS/PSD – a
Vinci que explora os aeroportos; mesmo que a via ferroviária seja
incomparavelmente menos nociva para o ambiente.
Em consonância com o que atrás se disse, a
salvação da pátria passará pelo aeroporto do Montijo susceptível do aumento dos
negócios da Vinci na área de Lisboa, admitindo que os turistas continuarão a
inundar as terras do burgermeister
Medina e que o binómio Ota/Montijo tenha viabilidade assegurada.
A Vinci também está atenta à continuidade dos
voos Lisboa/Porto e vice-versa que seriam mais confortável e ecologicamente
efetuados por um comboio de velocidade elevada, próprio para uma distância de
300 km que separa as duas cidades. E aí a Vinci tem como aliados os protegidos
operadores de autoestradas, com farta influência nos gangs governamentais.
Na falta de empenho na alta velocidade haverá
também, na classe política, algo do bacoco nacionalismo que pretende manter as
distâncias com a Espanha e minimizar as dependências daquela, preferindo-se
assim um tipo de bypass, com a via
aérea e a pouca atração de ligações internacionais terrestres[2]. Esse nacionalismo
é tanto mais bacoco quando se sabe que os capitais espanhóis têm uma relevância
determinante na indústria e no setor financeiro português e que a Espanha é, de
longe, o principal parceiro comercial de Portugal.
Curiosamente o TGV não está na agenda dos
governos portugueses mas já se concretizou em Marrocos, no percurso Casablanca/Tanger.
Este e outros textos em:
[1] Para azar dos saloios, a
neutralidade carbónica fixada para 2050 acaba por ser antecipada para 2030 pela
nova presidente da CE, Ursula von del Leyen
[2] A distância por caminho de ferro
entre Lisboa e Madrid é de 10/12.30 horas, o que significará, na melhor das
hipóteses uma estonteante velocidade de 60 km/h, ou de 13/15 h de Lisboa a Irun
(cerca de 900 km)
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